ADMINISTRATIVO. O objetivo do autor é o pagamento de verbas decorrentes do exercício de mandato de conselheiro tutelar do Município de Cobrado. Para tanto baseou a sua pretensão no artigo 20 da Lei Municipal nº 670/90, alterada pela Lei Municipal nº 733/91. Contudo a pretensão por ele deduzida não tem como ser atendida face a inexistência de lei que lhe assegure determinada remuneração - quantitativamente fixada. (Apelação Cível nº 104195-2, Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, Relator: Des. Ulysses Lopes, Julgado em 04/09/2001)

 

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ

 

RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO Nº 104195-2, DE COLORADO

REMETENTE JUIZ DE DIREITO

APELANTE MUNICÍPIO DE COLORADO

APELADO M. C.

RELATOR: DES. ULYSSES LOPES

 

 

ACÓRDÃO Nº 20399 – 1ª Câmara Cível

 

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível e Reexame Necessário 104195-2, de Cobrado - Vara Cível, em que é remetente Juiz de Direito, apelante o Município de Cobrado e apelado M. C.

 

1.      “Prestando jurisdição às fs. 246/254 o magistrado singular julgou procedente em parteo pedido inicial” formulado pelo apelado em face do apelante.

 

Condenou o vencido a pagar para M. C. (conselheiro tutelar), de verbas referentes à remuneração do período compreendido entre janeiro de 1998 a 18 de agosto do mesmo ano (item c. de fl. 6); diferenças da remuneração dos meses de junho, julho e agosto de 1977, com juros e correção monetária.

 

Apelação manifestada pelo vencido às fls. 260/263 onde está a alegar.

 

“a) não há qualquer amparo para o pagamento das verbas remuneratórias posto que inexiste contrato em relação ao período indicado na sentença ou legislação que determine o pagamento; b) da mesma forma é impossível o reajuste quanto à remuneração dos meses de junho, julho e agosto de 1997 porque não há amparo legal para tanto. Requereu o provimento com a condenação do apelado nas custas e honorários advocatícios.

 

Respondendo o recurso às fs. 266/268 o autor alega “que não pode ser conhecido o recurso porque não foi juntada procuração outorgada ao subscritor do recurso. No mérito, afirma que inexistência de contrato (que tinha por objetivo a fixação da remuneração - sic) não lhe tira o direito à percepção de verbas públicas (remuneração) porque esta comprovado que exerceu o cargo de conselheiro tutelar, com garantia aos reajustes referentes aos funcionários públicos. Pediu a manutenção da sentença”.

 

O Ministério Público de grau às fls. 283/287 opinou pelo “conhecimento e provimento dos recursos de apelação e de oficio com inversão do ônus da sucumbência”.

 

2.      O recurso deve ser conhecido por satisfazer todos os quesitos de sua admissibilidade.

 

Quando do aforamento do recurso o subscritor da apelação já era procurador do município apelante. É o que consta na certidão de f. 270.

 

“Pretende o autor, com base no artigo 20 da Lei Municipal no 670/90, alterado pela Lei Municipal nº 733/91, o pagamento de verbas decorrentes do exercício do mandato de conselheiro tutelar do município de Cobrado que, aliás, incorretamente indica na petição como sendo no período de 26/6/92 a 18/8/98.

 

Entretanto, não tem direito a qualquer verba porque inexiste lei que lhe assegure determinada remuneração -quantitativamente fixada - e, por conseguinte, os reajustes. E certo que a legislação municipal de Cobrado que trata da questão da remuneração dos conselheiros não lhe outorga a percepção de qualquer valor.

 

Com efeito. A Lei Municipal 670/90 (que trata da política municipal dos direitos da criança e do adolescente, o fundo municipal e o conselho tutelar) não determina qual será a remuneração para os conselheiros tutelares. No artigo 20 (com redação dada pela Lei 733/91), expressa que ‘os membros titulares do conselho tutelar serão remunerados pelo Fundo de que trata o artigo 14 desta Lei, com remuneração determinada pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente’, dispondo, no parágrafo único, que ‘a remuneração fixada não gera relação de emprego com a municipalidade e não pode exceder a pertinente aos dos Ocupantes de cargo em comissão ou de confiança símbolo CC-4 do quadro geral dos servidores do município’. Além da constitucionalidade duvidosa (‘Observo que a remuneração dos conselheiros tutelares não pode ser oriunda do fundo especial tratado no artigo 14 da Lei Municipal 670/90 (alterado pela Lei Municipal 733/91) porque não atende ao disposto no artigo 71 da Lei 4320/64, aplicável à espécie por força do contido no artigo 165, parágrafo 9°, inciso II, da Constituição Federal.

 

Explico. É que, conforme a predita lei federal (que vigora enquanto não editada a lei complementar tratada pelo constituinte), o fundo especial se vincula por lei a determinados objetos e serviços. No caso de Cobrado, mesmo sem considerar o manifesto equívoco (v. fl. 17 - art. 14) de que o aporte de recursos do fundo especial da infância e juventude destina-se à aplicação de cursos financeiros indispensáveis às atividades do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente’ (v. artigo 88, inciso IV, da Lei 8069/90 que determina apenas a vinculação - como órgão gestor - ao CMDCA), observa-se que o legislador municipal confunde conselho tutelar ao CMDCA. Outrossim, é determinado que o legislador municipal (frisado que a iniciativa da lei é do Executivo por importar em despesas) fixe a remuneração, não podendo ser definida por órgão deliberativo e controlador da política de atendimento a área infarto-juvenil (v. artigo 88, inciso II, da Lei 8069/90).

 

Bem como por isso, o Estatuto da Criança e do Adolescente determina que a lei municipal disporá sobre eventual remuneração dos membros do conselho tutelar (v. art. 134) e a jurisprudência tem sido no sentido de compelir o Executivo a providenciar a abertura de crédito para o Conselho Tutelar (‘Ao Conselho Tutelar é assegurado a previsão de recursos necessários ao seu funcionamento. Sendo órgão autônomo, não depende de valores reservados ao CMDCA, cabendo ao Executivo inserí-lo na lei orçamentária com dotação própria’ - TJSP, Ap. 39.888. 0/1-00, rei. ALVES BRAGA’), não garante ao conselho tutelar qualquer remuneração e muito menos reajuste.

 

O que ocorreu em Colorado foi uma solução absolutamente insólita para a pseudo resolução do problema criado pela legislação. Como os conselheiros tutelares não são funcionários públicos, exercendo função pública momentaneamente em razão de outorga de mandato pela sociedade (v. artigos 131 a 140 da Lei nº 8069/90), cabe à lei municipal, de iniciativa do Poder Executivo, determinar a remuneração e outros direitos a estes honoríficos. Em Colorado não foi assim determinado, normatizando-se a fixação da remuneração aos conselheiros tutelares pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (com divórcio ao sistema legalmente determinado para o processo legislativo e finanças públicas).

 

O CMDCA de Colorado não determinou a remuneração e não há lei municipal que o faça. Assim, o município, através de contratos de trabalho por prazo determinado absolutamente nulos (Todas as contratações do recorrido são nulas) porque, incontroversamente, não atendida a exigência contida no inciso II do artigo 37 da Constituição Federal. Não há vínculo regular. É que, tratando-se de contratação vinculada ao regime da CLT, penso que deve se aplicar aqui jurisprudência já cristalizada no âmbito da Justiça do Trabalho (primeiramente na Orientação Jurisprudencial 85 da Seção de Dissídios Individuais e, mais recentemente, no Enunciado 363 do TST: ‘A contratação de servidor público, encontra óbice no seu artigo 47, inciso II, e parágrafo 2°, somente conferindo-lhe direito ao pagamento de salários dos dias efetivamente trabalhados segundo a contraprestação pactuada’). Se assim é - se o único efeito do contrato nulo, nessas circunstâncias, é o direito aos salários, segundo a Justiça constitucionalmente competente para apreciar demandas trabalhistas - penso que serviço prestado irregularmente não pode conferir ao autor qualquer verba indenizatória (muito menos por justiça incompetente)’), com a finalidade de ‘especificar a remuneração’, no dizer do recorrido (v. fl. 268), determinou um salário ao membro do conselho tutelar em fixados períodos (v. contratos de fls. 23/24, período 1/8/95 a 1/8/96; fls. 25/26, período de 3/3/97 a 3 1/12/97; fl. 88, de 1/7/92 a 93).

 

Nesse contexto, repilo a tese do Magistrado de que a remuneração está garantida em lei (v. fl. 249) e que a alegação de nulidade dos contratos não procede, vinculando-se ao exercício de cargo de conselheiro tutelar em razão do conteúdo das atas juntadas (lavradas pelo CMDCA) que se referem a posse para dois mandatos (de 18/8/95 a 18/8/98 e de 18/8/98 a 18/8/2001 -v. documentos grampeados na fl. 7).

 

Concluo que o autor, como conselheiro tutelar do município de Colorado, não tem qualquer direito ao pagamento de remuneração, seja como amparo na Lei Federal 8069/90 e nas Leis Municipais 670/90 e 733/91, seja em razão de contratos de trabalho nulos (que sequer se referem a período pertinente a um dos pedidos deferidos pelo Magistrado - v. fl. 253, item 3.a).

 

Outrossim, não há que se falar em acessórios (forma de reajuste de remuneração) porque o pressuposto antecedente lógico não tem amparo legal.

 

É o inteiro teor do parecer da Promotora de Justiça Substituta de Grau VALÉRIA TEIXEIRA DE MELROZ GRILO, que se adota como razão de decidir.

 

Por tais fundamentos, voto pelo provimento do recurso e reformar a sentença sob reexame, condenando o vencido nas custas e na verba honorária que fixo em r$ 1.000,00 (hum mil reais).

 

Posto isso, acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso

e reformar a sentença sob reexame, nos termos do voto do Des. Relator.

 

Participaram do julgamento os Desembargadores J.VIDAL COELHO e ANTONIO PRADO FILHO.

 

Curitiba, 04 de setembro de 2001.

 

ULYSSES LOPES - Relator