Estatuto da Criança e do adolescente - Medida sócio-educativa de internação - Necessidade de
representação do Ministério Público e da observância do princípio do
contraditório - Recurso desprovido. APELAÇÃO
CRIMINAL (APELANTE) Nº 000.135.740-9/00.
Relator: LUIZ CARLOS BIASUTTI . 02/03/1999.
mero do processo: 000135740-9/00(1)
Relator: LUIZ
CARLOS BIASUTTI
Relator do Acordão: LUIZ CARLOS BIASUTTI
Data do acordão: 02/03/1999
Data da publicação: 05/03/1999
Não é possível impor ao menor/infrator medida
sócio-educativa mais grave (internação), no curso de outra mais branda
(prestação de serviços comunitários), sem a devida apuração do fato que
justificaria essa alteração e sem a obediência integral dos princípios
constitucionais do contraditório e da ampla defesa.
APELAÇÃO CRIMINAL (APELANTE) Nº 000.135.740-9/00 - COMARCA DE BELO HORIZONTE -
APELANTE(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS,
PJ V JUST INF JUV COMARCA BELO HORIZONTE - APELADO(S): G Q S - RELATOR: EXMO. SR. DES. LUIZ CARLOS
BIASUTTI
ACÓRDÃO
(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das
notas taquigráficas, EM , À UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO
MINISTERIAL.
Belo Horizonte, 02 de março de 1999.
DES. LUIZ CARLOS BIASUTTI - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. LUIZ CARLOS BIASUTTI:
VOTO
Conheço do recurso, presentes os pressupostos de sua admissibilidade.
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Representante do Ministério
Público, inconformado com a decisão da MMª.
Magistrada de 1º grau, exarada nos autos de processo administrativo para apurar
a prática de ato infracional pelo menor G Q S que
indeferiu o pedido ministerial no sentido de agravar a medida sócio-educativa
aplicada ao menor/infrator, por ausência do devido
processo legal.
Argumenta o apelante em suas razões recursais, em síntese, que a cumulação de
remissão com medida sócio- educativa, como forma de exclusão
do processo, é de competência do Ministério Público, tendo natureza
administrativa, e se justifica pela transação com o adolescente. Ao Magistrado,
portanto, cabe apenas a homologação da remissão com a medida prevista ou a sua
remessa à Procuradoria-Geral de Justiça, como bem dispõe o art. 181, §2º, do
E.C.A.
Alega, ainda, que, no caso, a MMª Juíza, em sua 1ª
sentença, homologou a remissão com a medida ali prevista pelo Ministério
Público. Porém, deixou o menor/infrator de cumprir a
medida de prestação de serviços comunitários que lhe foi imposta, além de ter
completado a maioridade penal (18 anos) antes de seu cumprimento.
Por este motivo, baseado no art. 128 do E.C.A., requereu o RMP que lhe fosse
aplicada medida mais grave, no caso, internação em estabelecimento adequado, o
que foi indeferido pela Juíza de 1º grau.
Assim, pretende seja decretada a nulidade de tal decisão, impondo-se ao apelado
a medida sócio-educativa da internação.
O apelo foi contrariado, manifestando-se o menor/infrator,
por sua defensora dativa, pelo provimento do recurso ministerial, ao fundamento
de que deva ser aplicada ao menor a medida sócio-educativa da internação, como
a única forma de tentar garantir a reeducação, ressocialização
e futura reintegração do menor à sociedade, eis que o menor, hoje, com 18 anos
de idade, encontra- se em franco processo de marginalização, sendo dependente
de drogas, conforme alegação de sua própria mãe, contida nos autos.
Ouvida, opina a douta Procuradoria-Geral de Justiça pelo desprovimento do
recurso ministerial, eis que inadmissível a conversão da medida
sócio-educativa, aplicada em cúmulo com a remissão, em internação, por ausência
do devido processo legal.
Da análise dos autos, verifica-se que, no correr do processo administrativo
instaurado para apurar a prática de ato infracional
previsto no art. 155, caput, c/c art. 14, II, do
Código Penal, pelo menor Greison Queiroz da Silva,
foi-lhe concedido pelo Representante do Ministério Público a remissão,
combinada com a prestação de serviços à comunidade, excluindo-o do processo,
nos termos do art. 126 e 180, II, da Lei 8.069/90, sujeita a
homologação judicial (fls. 41).
Conforme decisão de fls. 42, foi concedida ao menor/infrator
a remissão, cumulada com a medida sócio-educativa, pelo prazo de 04 meses.
Descumprindo o menor a medida que lhe foi imposta,
requereu o Dr. Promotor de justiça, às fls. 46-v, que lhe fosse aplicada medida
mais severa, qual seja, a de internamento em estabelecimento educacional
adequado.
De início, há que se registrar que, embora seja permitido ao Ministério Público
conceder a remissão por força de exclusão do processo, é imperativa a
homologação judicial quando implicar em aplicação de medida sócio-educativa,
garantido o contencioso administrativo.
Neste sentido é a orientação jurisprudencial. Confira-se a ementa in verbis:
"Remissão - Homologação judicial - O Ministério Público pode conceder a
remissão por força de exclusão do processo - Urge, porém, homologação judicial,
quando implicar aplicação de medida sócio-educativa. Embora não se trate de
pena (sentido criminal) é sanção, garantido o contencioso administrativo (Const. art. 5º, LV)" (STJ - RESP 24.433-3 - Rel.
Vicente Cernicchiaro, DJU de 28.03.94).
No caso, não é possível impor ao menor/infrator
medida sócio-educativa mais grave (internação), no caso de outra mais branda
(prestação de serviços comunitários), sem a devida apuração do fato que
justificaria essa alteração.
Ora, não se pode, sob pena de nulidade ipso iure, aplicar medida sócio-educativa, principalmente em se
tratando de internação, que implica em privação da liberdade do menor, sem
obediência às garantias constitucionais estabelecidas no art. 111 do Estatuto
da Criança e do Adolescente.
O apelado tem direito ao devido processo legal, que se inicia com a
representação do Ministério Público e prossegue obedecendo aos princípios do
contraditório, conforme estabelecido nos arts.
184,186 e seguintes do Estatuto do Menor.
Esse é o ensinamento prevalente nas decisões de nossos Tribunais, conforme
consubstanciado na ementa que se transcreve:
"Ora, o art. 227, §3º, inciso IV, da Constituição Federal, reiterado pelo
art. 111 do Estatuto da Criança e do Adolescente, assegura ao adolescente os mesmos princípios e direitos processuais do adulto, como
o contraditório, a ampla defesa, a imediatidade, a
concentração, o duplo grau de jurisdição, etc., de tal modo que, no Estado
Democrático de Direito, ao adolescente infrator só se aplicará a medida máxima privativa de
liberdade após o devido processo legal, mormente se decorrer do descumprimento
reiterado e injustificado de outra medida sócio-educativa menos gravosa
aplicada primitivamente"(TJSP - AI 28.172-0/9 -
Rel. Cerqueira Leite).
Assim, conforme bem decidiu o MM Magistrado de 1º grau, não é possível impor ao
adolescente medida
sócio-educativa mais grave, no curso de outra mais branda, sem a apuração do
fato que justificaria tal alteração, mediante o devido processo legal, observado
o contraditório e a ampla defesa.
De resto, há que se acrescentar, ainda, que foi nomeada defensora dativa ao
menor infrator (fls. 48-v).
Todavia, em todas as intervenções processuais, em lugar de exercer a defesa do
menor, assumiu a Dra. Advogada a postura de
"Assistente de Acusação", adotando, integralmente, a penalidade
sugerida pelo Órgão Ministerial, inclusive, taxando seu cliente de adolescente "sem limites que
apesar de morar com sua mãe, não a respeita, ficando mais tempo nas ruas do que
em sua residência. Possui várias passagens neste Juizado, onde não cumpriu
nenhuma das medidas sócio-educativas a ele aplicadas. Não trabalha e não
estuda. Seu processo de marginalização já está em bem avançada (sic), o que
dificulta sua recuperação com as medidas sócio-educativas mais leves"
(razões penais, às fls. 53).
Chega a ser mais enfática na necessidade de punição do menor com pena mais
grave que o próprio Promotor de Justiça!
Embora advertida pelo MM Juiz de Direito Substituto,
conforme se vê às fls. 52, prosseguiu na mesma toada até nas contra-razões
recursais de fls. 72/73.
Ora, tal defesa, se assim pode ser chamada, equivale à ausência de defesa, pois
nenhuma palavra foi dita para amenizar a situação do menor/infrator.
E a falta de defesa inquina de nulidade o processo.
Assim, com essas considerações, nego provimento ao recurso ministerial,
confirmando, integralmente, a decisão recorrida.
Custas, ex lege.
O SR. DES. GUDESTEU BIBER:
VOTO
De acordo.
O SR. DES. EDELBERTO SANTIAGO:
VOTO
De acordo.
SÚMULA : À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO MINISTERIAL.