HOMOSSEXUALIDADE E
ADOLESCÊNCIA
Stella R. Taquette
Médica – Doutora em Medicina, SP.
Marília de
Mello Vilhena
Psicanalista – Doutora em Comunicação, SP.
Resumo
Vivemos numa sociedade homofóbica que discrimina com
violência a homossexualidade, fazendo com que homossexuais se exponham a riscos
para a saúde por medo de terem a sua orientação sexual revelada. A adolescência
é um momento de grande intensificação das manifestações sexuais, fase em que o
jovem passa a ter uma nova imagem corporal e posição sexual. Para isso, pode
buscar o caminho tanto da homossexualidade como da heterossexualidade. A partir
de conhecimentos oriundos da psicanálise, antropologia e pesquisas médicas, o
artigo se propõe a contribuir com os profissionais de saúde que atendem adolescentes,
oferecendo-lhes distintas informações acerca da homossexualidade para que proporcionem
aos seus clientes um atendimento ético, sem discriminação, auxiliando-os a se
tornarem aptos a enfrentar seus impasses.
Abstract
We live in a
homophobic society that violently discriminates homosexuality, making them
expose to health risks, as they fear that their sexuality be revealed. The
adolescence is a moment of great intensification of sexuality manifestations,
where the teenager starts to develop a new corporal image and sexual
positioning. Regarding this, the teenager may search his/her way through
homosexuality or heterosexuality. Taking in consideration knowledge from
psychoanalysis, anthropology and medical researches, this paper look for
contributing with health professionals that work with adolescents, offering
diverse information concerning homosexuality. The goal is to promote an ethical
attendance without discrimination and guide health professionals to help
teenagers to face their impasses.
Introdução
A sexualidade, característica essencial dos seres humanos,
pode ser definida como o conjunto de fenômenos da vida sexual e diz respeito a
todas as sensações corporais que designam prazer no mais amplo sentido que o
termo pode abarcar. Na adolescência evidencia-se
o ponto crítico da sexualidade humana, ou seja, a subordinação da sexualidade à
função reprodutiva (genitalidade). Muitos confundem sexualidade com
genitalidade. Isso é um equívoco, pois reduz a atividade sexual ao
funcionamento dos órgãos genitais, sendo que na realidade a sexualidade está
presente desde os primórdios da vida e engloba toda uma série de excitações em
todo o corpo.
A partir das modificações impostas ao corpo pelo processo de
maturação biológica, os processos identificatórios da infância, na
adolescência, são postos em questão. O que até então parecia fixado numa
identidade que leva o sujeito a sentir-se menino ou menina – cores, personagens
infantis, brincadeiras, etc. – requer uma outra significação.
A psicanálise freudiana descobre a sexualidade
infantil ao investigar a relação do corpo com a mente, na decifração dos
mistérios do desejo humano. No texto escrito em 1905 (Freud, 1981a), intitulado
“Três Ensaios para uma Teoria da Sexual”, Freud desenvolve a teoria de que a sexualidade
infantil é fragmentada e desviada em direção a objetos singulares e múltiplos,
tais como a boca, a região anal, genital, etc. A sexualidade humana é vista
como um desvio do instinto animal, não emergindo como algo pronto e seu
percurso é longo e sujeito a interrupções. Freud mostra-nos que a sexualidade
infantil em sua origem liga-se à função somática vital da nutrição. Numa época
em que o início da satisfação sexual ainda está vinculado à ingestão de
alimentos, a sexualidade tem um objeto sexual fora do corpo do próprio infante,
o seio da mãe. Freud chega a conceber uma criança que suga o seio materno como
o protótipo de toda relação amorosa, a mãe como o primeiro objeto de amor. Ao
separar-se da fome, a sexualidade separa-se da função não sexual em que antes
se apoiava e da necessidade de seu objeto natural pré-determinado (Vilhena,
2000).
Segundo a psicanálise, em todas as etapas da vida humana, a
sexualidade está presente com inúmeras variações. Desde seus primeiros
escritos, Freud assinala a perda da inocência infantil. A seu ver, a
sexualidade da infância no século XIX revela-se através de mecanismos de
controle e vigilância exercidos sobre a criança. Na obra "Três
Ensaios", a teoria sexual infantil desenvolvida por Freud consiste em
fundamento psicanalítico essencial e provocou profunda reação na época.
As crianças trazem ao mundo, com elas, rudimentos de
atividade sexual; já gozam de satisfação sexual quando começam a alimentar-se e
procuram repetir insistentemente a experiência no conhecido gesto de
"sugar o polegar". Na infância, a sexualidade é auto-erótica, ou
seja, a atividade sexual é inicialmente dominada por diversas e não
hierárquicas zonas erógenas corporais do próprio indivíduo, das quais se
experimenta satisfação e o desejo de repeti-la. A primeira organização sexual
reconhecível, a chamada fase "oral" ou "canibalesca",
durante a qual predomina ainda a ligação original entre a excitação sexual e a
nutrição, deixa marcas permanentes em todo sujeito humano. A sexualidade
anárquica do período do auto-erotismo começa a se organizar, posteriormente, em
torno de zonas privilegiadas, antes de adquirir uma organização global em torno
da zona genital. Nos acréscimos de 1915 aos "Três Ensaios", a noção
de organização pré-genital infantil abarcará a organização "oral", a
"anal" e, em 1923, a "fálica".
Situada entre os dois e quatro anos, a fase anal,
segunda fase pré-genital da sexualidade infantil, momento de aquisição da
capacidade de controle esfincteriano, caracteriza-se pela primazia da zona
anal. É na fase anal que se constitui a polaridade atividade-passividade que
Freud faz corresponder à polaridade sadismo-masoquismo.
Após as fases oral e anal, na fase fálica já há um predomínio
dos órgãos genitais. Esta fase apresenta um objeto sexual, e certa convergência
dos impulsos sexuais sobre este objeto. Trata-se aí de uma organização genital
infantil distinta da fase genital madura, porque nela a criança reconhece
apenas o órgão genital masculino.
Com o início da puberdade, o desenvolvimento da sexualidade
começa a tomar sua forma adulta sob a égide da zona genital. Nesta fase, ocorre
a descarga dos produtos sexuais, subordinando a sexualidade à função
reprodutora. Na "tempestade da puberdade", período de profundas
transformações corporais e de intensos e desenfreados desejos sexuais, a satisfação
por meio da descarga caracterizada pelo orgasmo, única capaz de proporcionar
uma satisfação final ou “prazer final” pode se dar, entretanto, através de
prazeres preliminares, ou seja, prazeres nos quais as zonas genitais não
assumiram ainda seu papel preponderante. Assim sendo, a genitalidade torna-se
apenas um dos inúmeros caminhos humanos possíveis de satisfação sexual.
A sexualidade humana é composta de vários aspectos. O que é
ser homem ou ser mulher também é variável conforme a sociedade e o período
histórico em que se vive. Na literatura médica e na psicologia elaboram-se
diversas visões a respeito da composição da sexualidade. A organização social
da sexualidade nunca é fixa ou estável (Weeks, 1999). O que se pensa sobre sexo
em nossa sociedade pode inexistir em outras culturas.
Podemos destacar quatro aspectos que compõem a
sexualidade: o sexo biológico, a identidade sexual, o papel sexual e a
orientação ou desejo sexual (Picazio, 1999). O sexo biológico é determinado no
nascimento e se refere às características genotípicas e fenotípicas do corpo. Pode-se
nascer homem ou mulher e, excepcionalmente, hermafrodita, sendo o hermafroditismo,
uma anomalia genética rara, em que ambos os órgãos genitais estão presentes. A
identidade sexual ou identidade de gênero é o senso de ser homem ou mulher, que
se estabelece geralmente aos três anos de idade. O papel sexual se refere ao comportamento
do indivíduo, que pode ser masculino, feminino ou misto, variando conforme a
época e a cultura em que se vive. A orientação ou desejo sexual se refere ao
padrão de atração emocional ou desejo sexual do indivíduo e define-se
geralmente no final da adolescência, início da idade adulta, e pode ser
heterossexual, homossexual ou bissexual.
Os estudos de Kinsey e cols.(1948, 1953) revelaram que os
indivíduos apresentam comportamentos sexuais variados durante a vida, estáveis
ou transitórios e propõem sete categorias de orientação sexual: 0- exclusivamente heterossexual; 1- ocasionalmente homossexual; 2- mais hetero do que homossexual; 3- igualmente hetero e homossexual; 4- mais homo do que heterossexual; 5- ocasionalmente heterossexual; 6- exclusivamente homossexual.
No campo da psicanálise, ainda nos “Três Ensaios”, Freud
denominou invertido sexual o sujeito que se dirige sexualmente a alguém cujo
sexo é igual ao seu. O tipo de inversão também pode ser variável entre os
invertidos. Há os invertidos absolutos, anfígenos e ocasionais. Os absolutos
são os que só se sentem atraídos por pessoas do mesmo sexo. Pessoas do sexo
oposto provocam-lhe repulsa. Para os invertidos anfígenos o objeto sexual pode
pertencer indistintamente a ambos os sexos. Quanto aos ocasionais, na falta do
objeto sexual preferido podem adotar um objeto sexual de seu mesmo sexo e
sentir prazer no ato sexual com ele praticado.
A sexualidade humana é algo multiforme, que assume novas
formas a cada passo do ciclo da vida ao permear todos os aspectos de nossa
existência. O controle sobre o livre exercício da sexualidade do ser humano
sempre ocorreu, em todas as épocas e em todas as culturas (Freud, 1981b). Esta
interdição à sexualidade reside no fato do homem, diferentemente dos animais,
não ter a reprodução como objetivo primordial. No caso da homossexualidade, um
desejo persistente por pessoas do mesmo sexo, na maioria das vezes impossível
de ser impedido, sem fins reprodutivos, tem sido considerado, por este motivo,
uma doença, um desvio. Sabemos que, historicamente, a sociedade rechaça
práticas sexuais não reprodutivas (Richards, 1993).
A orientação sexual de alguém é um processo não totalmente
conhecido pela ciência. Vários estudos já foram realizados com o objetivo de se
estabelecer uma causa para suas origens, sem que nenhum deles tenha conseguido
plenamente o seu intento. Hipóteses foram levantadas, mas não comprovadas.
Algumas teorias, entre elas a psicanalítica, a genética, a endócrina e a teoria
do aprendizado social, já contribuíram de modo enriquecedor para o entendimento
da homossexualidade, sem terem esgotado o tema. Ainda restam, talvez, irredutivelmente,
zonas obscuras a serem desvendadas. Parece que os fatores envolvidos na origem
da sexualidade são variados, biológicos, psíquicos, sociais, etc. Tanto os
homossexuais quanto os heterossexuais constituem um grupo heterogêneo, sem um
padrão uniforme de personalidade, aparência física ou comportamento que o
distinga do grupo. Os homossexuais existem em todas as classes sociais e em
todas as culturas.
Não há, portanto, uma explicação única aceita pela
ciência para a origem da orientação sexual. Porém, podemos entender, através de
uma análise histórica e antropológica, as razões que levaram a homossexualidade
ter sido considerada uma doença e o porquê do preconceito contra os
homossexuais existente em nossa sociedade.
Desde o começo da era cristã, considerou-se inicialmente que
Adão e Eva perderam o paraíso porque se relacionaram sexualmente. Já no século
IV, Santo Agostinho, numa nova leitura da Bíblia Sagrada, interpretou que a
perda do paraíso deveu-se não à atividade sexual em si, mas sim ao prazer do
ato, à concupiscência da carne. Ou seja, a finalidade do sexo não seria o
prazer e sim a procriação (Ariès, 1995). Esta leitura religiosa permanece até
os dias de hoje, sendo a igreja católica contrária a qualquer método anticonceptivo
ou a qualquer prática sexual que não vise a reprodução, estando aí incluída a
homossexualidade.
A diferença entre os sexos é construída na cultura.
Antigamente a mulher era definida do ponto de vista sexual como um homem
invertido. Ela possuía todos os órgãos sexuais do homem, só que internamente.
Essa concepção científica foi dominante até o século XVIII (one-sex model). A distinção entre homens
e mulheres não se referia à diferença dos sexos e sim à posição social. A
mulher era um homem invertido e inferior, porque tinha corpo e cérebro
anatomicamente menores, daí ser menos capaz e menos inteligente, e seu corpo
ter como função principal a procriação (Costa, 1996).
A repressão à atividade sexual foi também uma conseqüência do
desenvolvimento do sistema capitalista. Reprimiu-se a sexualidade por ela ser
incompatível com o trabalho. Na exploração da mão de obra do trabalhador, era
intolerável que os indivíduos se perdessem em prazeres que não aqueles que
permitissem a procriação (Foucault, 1988).
Cerca de 10% da população é constituída por indivíduos
homossexuais (Costa, 1994). Os estudos de Kinsey revelaram que 37% dos homens
já experimentaram orgasmo com outros homens.
Durante a adolescência passamos a ter um objeto sexual, que
mais comumente é alguém do sexo oposto. Porém, podem acontecer manifestações
sexuais entre pessoas do mesmo sexo que estão se descobrindo, experimentando o
que é ser homem ou ser mulher. São as meninas que convivem com suas amigas
intimamente, trocando confidências,
carinhos e os meninos que buscam parceiros para brincadeiras e vivências. É uma
fase de experimentação sexual que contribui na construção da identidade sexual
futura.
Os relacionamentos homossexuais entre adolescentes já foram
mais freqüentes do que são nos dias de hoje. Na Idade Média era comum a relação
sexual entre um adolescente e um homem mais velho, a título de ensino da
sexualidade e experimentação. Antes do advento da pílula anticoncepcional e da
“revolução sexual”, época de mudança dos costumes na qual a mulher passou a ter
mais liberdade sexual, era comum o chamado “troca-troca” entre os adolescentes
do sexo masculino. Na geração atual isso já não acontece, pois os adolescentes
estão podendo ter relação sexual com suas namoradas e amigas, nesta fase de experimentação
sexual.
Aqueles que sentem atração por alguém do mesmo sexo
inicialmente sentem-se diferentes, sem saber o porquê. A consciência do desejo
sexual acontece progressivamente. Em alguns casos ela se dá desde a infância.
Geralmente os homossexuais descobrem sua inclinação sexual no início da
adolescência, têm fantasias homoeróticas, passam a ter experiências sexuais e
assumem a sua homossexualidade no início da vida adulta. O intervalo de tempo
entre descobrir-se homossexual e revelar-se pode ser longo. A maioria dos adolescentes tende a se
manifestar quando já se considera independente e sente-se mais seguro em relação
à sua orientação sexual. Alguns não se revelam nunca.
É difícil para um adolescente assumir sua homossexualidade
devido à rejeição e à discriminação existentes na sociedade. Por isso, muitos
homossexuais não se expõem e se isolam, pois não têm coragem de contar nem de
compartilhar com alguém este sofrimento, tentando se defender da homofobia
presente na sociedade. A homofobia, definida por atitudes irracionais contra
homossexuais, é responsável por altos índices de violência contra estes (Mott,
1996).
O comportamento dos adolescentes homossexuais é tão variado
quanto dos heterossexuais. A inversão sexual pode irromper na infância,
adolescência ou na idade adulta, durar toda a vida, desaparecer
temporariamente, aparecer após um longo tempo de atividade sexual heterossexual,
etc.
Homens e mulheres homossexuais são tão diferentes entre si
como todos os demais seres humanos.
A definição de masculino e feminino, do ponto de vista
psíquico e sociológico, é extremamente complexa. Todo ser humano apresenta uma
mistura de caracteres biológicos, psíquicos, masculinos e femininos. Apenas uma
minoria de homens e mulheres homossexuais tem trejeitos caricatos do sexo
oposto ao seu. A maioria dos gays e lésbicas não se manifesta de modo
estereotipado, o que lhes permite manter sua orientação sexual velada. Alguns
heterossexuais relatam que tiveram atração sexual por pessoas do mesmo sexo em
alguma época da vida, mas não se tornaram homossexuais. Outras pessoas têm
relacionamentos homossexuais ocasionais (Heilborn, 1996).
Podemos encontrar adolescentes homossexuais que nunca tiveram
experiência sexual. Outros já tiveram experiência apenas heterossexual ou
homossexual. Existem aqueles que experimentaram relacionamentos tanto homo como
heterossexuais.
Em função da inquietação e discriminação existentes na
sociedade em torno da prática homossexual, vide a homofobia, o adolescente,
temendo ser rejeitado, muitas vezes esconde sua condição e se isola, colocando
sua saúde em risco.
Depressão e comportamento suicida são mais freqüentes entre
homossexuais do que entre os heterossexuais (Neinstein, 1996). Outros
transtornos comuns são: isolamento social e emocional, evasão escolar, uso de
álcool e drogas, transtornos alimentares, conflitos familiares, fuga de casa,
prostituição, delinqüência e violência.
A relação homossexual masculina genital anal é traumática e isso aumenta a probabilidade de
doenças sexualmente transmissíveis. O índice de DST/AIDS é maior entre gays do
que na população geral e, entre as lésbicas, é menor. A homossexualidade feminina
é menos diagnosticada em atendimento médico e menos visível socialmente. As
relações sexuais entre mulheres em geral não são traumáticas e não aumentam o
risco de doenças sexualmente transmissíveis. Neste caso, mais freqüentemente
ocorrem transtornos psicossociais como isolamento, depressão, tentativas de
suicídio, rejeição da família, dificuldades escolares, etc.
Outro fato digno de nota é a exploração sexual de
adolescentes de baixa renda pela sociedade. Adolescentes do sexo masculino têm
sido alvo de homossexuais mais velhos, que lhes oferecem presentes e dinheiro.
Por vezes, estes adolescentes se prostituem com homossexuais como tentativa de
reafirmar sua masculinidade, pois se sentem tão potentes que até com
homens conseguem manter relações sexuais.
Um adolescente raramente busca atendimento médico em razão de
sua homossexualidade. Às vezes a família a descobre e o traz à consulta, à sua
revelia e querem ajuda médica para tentar mudar a orientação sexual.
Os profissionais de saúde devem estar atentos, ao atender
adolescentes, às dificuldades mais comuns que estes podem apresentar na área da
sexualidade, já que a adolescência é a etapa da vida em que as manifestações
sexuais se intensificam e a identidade sexual se reafirma. Às vezes, numa
primeira consulta, os adolescentes não conseguem se abrir e fazer confidências,
mas é importante que eles percebam que há espaço para tal.
Os problemas médicos principais do adolescente homossexual
masculino são as doenças sexualmente transmissíveis, os traumas do coito e os
problemas psicossociais relacionados aos desajustes da identidade homossexual
como a depressão, isolamento social,
baixa auto-estima, abuso de drogas. Recomenda-se um exame físico cuidadoso da
região genital, anal, pele, gânglios, garganta. O estado de imunização também
deve ser averiguado.
O adolescente e sua família precisam ser acolhidos em suas
dúvidas. A empatia e a busca da maior neutralidade possível em seu atendimento
viabilizam que ele fale sobre suas questões sexuais. Espera-se com esta
abordagem auxiliá-lo a ser sujeito de seus próprios desejos, ao invés de mero
objeto, joguete dos desejos e roteiros sexuais alheios e que se proteja dos
riscos inerentes à sua prática sexual (Paiva, 1996). Informações sobre a homossexualidade
e o caráter não patológico da mesma podem ser benéficas. Aos adolescentes
homossexuais que se rebelam contra a sua orientação sexual, pode-se indicar um
tratamento psíquico.
A experiência da Clínica da Sexualidade–CLINISSEX, do Núcleo
de Estudos da Saúde do Adolescente da Universidade Estadual do Rio de Janeiro –
NESA-UERJ - mostra-nos que os adolescentes de maior risco são os do sexo
masculino com experiências homossexuais (Taquette, 2002). Eles geralmente
procuram atendimento devido a doenças sexualmente transmissíveis e nem sempre
revelam, na primeira consulta, sua prática homossexual. Alguns apresentam
sinais e sintomas característicos de relações sexuais anais e mesmo assim as
negam. Alguns têm dúvida quanto à orientação sexual, sentem-se atraídos tanto
por homens como por mulheres. Outros expõem toda a dor de serem humilhados e
rejeitados pela família e amigos.
Em resumo, vale a pena lembrar que a homossexualidade, tanto
do ponto de vista médico como psicológico, não constitui uma doença, distúrbio
ou perversão. Ela já foi considerada uma doença antes do último código
internacional de doenças (CID-10), quando daí foi retirada. O Conselho Federal
de Psicologia publicou resolução em 22 de março de 1999, que estabelece normas
de atuação para os psicólogos em relação à questão da orientação sexual. Esta
resolução considera que a homossexualidade não constitui uma doença, distúrbio
nem perversão e resolve que os psicólogos devem contribuir, com seu
conhecimento, para uma reflexão sobre o preconceito e o desaparecimento de
discriminações e estigmatizações contra aqueles que apresentam comportamentos
ou práticas homoeróticas. Quanto à psicanálise, como já pudemos constatar, o
prazer não se inscreve apenas numa referência biológica, sujeitando-se inteiramente
às complicações do psiquismo. A ética psicanalítica se constrói num espaço
singular de escuta que deve permitir, a todo sujeito, aproximar-se o máximo
possível de seu desejo, seja ele qual for, inclusive um desejo homossexual.
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