PRESCRIÇÃO INFRACIONAL OU INEFICÁCIA PEDAGÓGICA?

Reflexões sobre a impossibilidade de aplicação de medida sócio-educativa em decorrência da ação do tempo

 

 

Guaraci de Campos Vianna[1]

Juiz de Direito Titular da 2ª Vara da Infância e da Juventude.

 

 

Não há estudioso do direito natural que não se tenha debruçado sobre o diálogo de Antígone e Creonte, na peça de Sófocles, para distinguir, na literatura clássica, a norma justa do direito escrito. O confronto tenso, decorre do fato de ter a filha de Édipo enterrado seu irmão Polinice contra as expressas ordens do Rei de Tebas. Vale à pena transcrevê-lo, em parte:

 

"- Creonte: Responda-me, sem rodeios e em uma palavra: sabias que estava proibida de enterrá-lo ?

 - Antígone: Sabia. Como não havia de saber, se a ordem era clara ?

 - Creonte: E tu  atrevestes a  violar tais  leis ?

-         Antígone: Não era Zeus quem me impusera tais ordens, nem a justiça (Dike) que tem seu trono entre os deuses, quem ditou tais leis aos homens, nem acredito que teus asseclas te dêem tanta força. Para que tu, mortal, possa prevalecer sobre as Leis não escritas e inquebrantáveis dos deuses. Leis que não são de hoje, nem de ontem, mas que permanecem em todos os tempos e ninguém sabe como apareceram ... "

 

Muitas vezes trazemos diálogos de filósofos, que são lições sempre atuais, para indicar os caminhos a serem seguidos.  No que se refere aos direitos inatos, as lições de outrora ainda permanecem atuais.  Tanto isso é certo que o direito à vida, à liberdade física, à liberdade de consciência e outros são considerados direitos supra-estatais, fundamentais da pessoa humana.  Não são criação da Lei no sentido jurídico, não decorrem da vontade do Estado, porque antecedem à organização política.  O Estado não os outorgou, mas os reconhece e garante, no cumprimento de sua irrecusável missão de harmonizar as contingências da vida terrena, com os imperativos das Leis de Deus.  O Estado para dar integral cumprimento à sua missão deve preparar a pessoa humana para uma vida feliz e útil, pois essa é considerada, em última análise, a razão de ser do Estado democrático.

 

Dentro deste contexto, surge o sempre presente confronto entre o direito inalienável da liberdade, as suas restrições e, no campo penal e infracional, a necessidade (dever) de o Estado aplicar medidas e penas com o caráter retributivo, educador e ressocializante.  A liberdade pode ser suprimida, temporariamente, na hipótese da prática de conduta delituosa denominada de crime ou contravenção (para os penalmente imputáveis) ou de ato infracional (para os menores de dezoito anos, conforme art. 103 da Lei 8069/90).  Em ambos os casos, apurada, através do devido processo legal, a responsabilidade penal ou infracional, tem o Estado o poder/dever de aplicar uma pena ou medida adequada.

 

Ao contrário do que muitos afirmam, os menores de dezoito anos não ficam imunes às sanções quando suas condutas são revestidas de ilicitude.  Podem ser privados de liberdade (ver art. 106 da Lei 8069/90) e estarem sujeitos a outras medidas  (ver arts.101 e 112 da mesma Lei).

 

Entretanto, é bem de ver-se que quando se tratar de conduta praticada por criança (até doze anos) as sanções previstas em Lei (medidas específicas de proteção) são mais brandas (vide art. 105), e não importam em privação da liberdade conforme consta no art. 101, parágrafo único da Lei 8069/90. Daí não se falar em caráter retributivo e preventivo nas medidas específicas de proteção que podem e devem ser aplicadas enquanto perdurar sua necessidade ( à luz do art. 98 da Lei 8069/90) e obviamente, até a maioridade civil (art. 2º da Lei citada).

 

Dessa forma é correto dizer-se que para as crianças (repita-se, as que não são maiores de doze anos de idade) não há medidas que tenham por escopo  retribuir (ou castigar) pelo mal praticado (punitur  quia peccatum) ou mesmo prevenir a ocorrência de um mal futuro.

 

Situação diversa ocorre com os adolescentes (maiores de doze e menores de dezoito anos de idade). Apesar de alguns afirmarem - pelo fato de não se poder encarar a conduta infracional como fonte das penas previstas nas Leis Penais -  que as medidas não são de caráter retributivo, quando autores de um ilícito típico, os adolescentes estão sujeitos a uma imposição da perda ou diminuição de um bem jurídico prevista em Lei e aplicada pelo órgão judiciário.

 

Destarte, a imputabilidade infracional, que começa aos doze anos sujeita-se a uma finalidade retributiva (pois impões um mal - privação de um bem jurídico), preventiva (porque visa evitar a prática de crimes, seja intimidando a todos pelo exemplo, seja privando da liberdade o autor obstando a reincidência) e reeducativa - aqui o principal aspecto diferenciador das penas criminais , pois interferem no processo de desenvolvimento objetivando melhor compreensão da realidade e efetiva integração social .

 

Este aspecto reeducador das medidas aplicadas aos adolescentes infratores autoriza que, em cada caso o juiz, o órgão judiciário verifique a dosagem e o tipo de medida mais indicada in concreto; que dizer que a medida é aplicada tendo em vista não a conduta em si apenas, mas principalmente o perfil sociológico do agente.  É a expressão máxima do princípio constitucional da individualização da pena.  A Lei Tutelar não estabelece in abstrato os limites da medida e nem qual a correspondente ao ato praticado - isso fica a critério judicial.

 

As particularidades da imputabilidade infracional, entretanto, não autorizam a conclusão de que há uma separação absoluta dos princípios aplicados (e compatíveis com o sistema tutelar) no Direito Penal. Constata-se uma similitude entre as penas previstas no Código Penal e as medidas sócio-educativas.  A propósito, veja-se as medidas de prestação de serviço à comunidade (de igual nome no Direito Penal), a liberdade assistida (semelhante a pena de reclusão cumprida em regime aberto), a de semiliberdade (idem, no regime semi-aberto) e a de internação (regime fechado).  É óbvio que a finalidade reeducativa faz com que haja pequenas alterações, mas isso não retira a semelhança apontada. Em outro trabalho tivemos a oportunidade de fazer uma comparação individualizada de cada uma das medidas sócio-educativas com as penas previstas no Código Penal[2].

 

O argumento de que não há incriminação na esfera tutelar não convence por força do disposto no art. 103 da Lei 8069, que funciona como norma de extensão à tipicidade infracional. Chama-se de pena, medida sócio-educativa ou outro nome qualquer, mas a providência ou resposta do Estado tem o conteúdo de uma restrição ou supressão das vantagens ou comodidades que a vida livre oferece aos cidadãos.

 

Por outro lado, como não há penas perpétuas, não se pode admitir a existência de medidas que podem ser impostas a qualquer tempo, sem a menor preocupação com a justiça (impedindo a punição de um ato cujo dano ninguém se lembra mais) e com a utilidade social (impedindo que um indivíduo sofra uma medida quando, no meio tempo, portou-se de maneira comprobatória de sua readaptação ao convívio social), sem falar que com o tempo extingue-se a lembrança do ato infracional e, em conseqüência, a necessidade de exemplo público, além de o desaparecimento dos elementos de prova do ato e da autoria aumentar os riscos de uma punição injusta.

 

Dizer-se que as medidas sócio-educativas só podem ser aplicadas até a maioridade penal (para aqueles que entendem não ser possível a aplicação da Lei Tutelar após o agente completar dezoito anos) ou até a maioridade civil (conforme v.g. art. 2º, parágrafo único,  c/c art. 121, § 5º da Lei 8069/90) considerando a data do fato para fins de imposição de medida (vide art. 104, parágrafo único da mesma Lei) não resolve o problema.  Admita-se ad argumentandum tantum a prática de um ato infracional equiparado a direção perigosa, porte de arma, ou similar por um adolescente que conte treze anos de idade. Após o devido processo legal (arts. 110 e 171 e seguintes da Lei Tutelar) evadiu-se e foi apreendido (com base nos arts. 106 e 107 da Lei citada) quatro anos depois. Seria viável a imposição de uma medida sócio-educativa ?  Pensamos que não.  Na hipótese de ser o agente imputável penalmente, seria reconhecida de ofício a extinção da punibilidade pela prescrição.  Há, assim uma flagrante inconstitucionalidade em dar ao adolescente, nas normas benéficas, tratamento diverso, porque são vedadas quaisquer discriminações, inclusive referente à idade (ver art. 5º da C.F.).

 

É obvio que quando se trata de criança ou adolescente a adaptação legal da sanção é feita através da utilização de critérios diferenciados. Ao contrário do que acontece com os imputáveis, a gravidade do delito é critério secundário.  Em primeira linha se põe a personalidade do inimputável, suas condições sócio-econômicas, as necessidades pedagógicas (ver arts.100 e 113 da Lei 8069/90 - E.C.A.).  Da mesma forma a dosagem aritmética da medida (número de anos, meses e dias) subordina-se não ao delito (a lei penal fixa limites mínimos e máximos), mas ao critério fundamental da personalidade do infrator menor de idade.  Não se impõe a chamada pena-castigo ou intimidadora, mas uma série de providências defensivas, educativas, curativas, voltadas para a readaptação social.  Trata-se assim de um dever do Estado para com o infrator e para com a sociedade.  As medidas educativas são, certamente as mais eficazes, sobretudo na infância, porque a árvore nova pega melhor do que a velha e o essencial está em evitar aos menores de idade a entrada nas prisões, chamadas por Henrique Ferri de " estufas Pasteur para a cultura dos micróbios criminais " .

 

Pois bem, o Estado tem o poder/dever de sócio-educar.  Mas até quando?  Já deixamos claro que as medidas sócio-educativas só podem ser impostas a pessoas de até 21 anos de idade. É o termo final da aplicação da lei 8069/90 ou, se preferir, limite legal de aplicação da lei tutelar.  Não se trata de decadência ou prescrição.

 

Entretanto, voltando ao caso concreto já exposto: uma medida sócio-educativa imposta por causa da prática de um ato infracional equiparado à contravenção pode ser exeqüível quatro anos ou mais após a sua imposição ?

 

Já colhemos opiniões de ilustrados juristas, também de maneira informal, e alguns sustentam a aplicação subsidiária das normas previstas o Código de Processo Penal (conforme art. 152 da Lei 8069/90), incidindo o art. 61 daquele diploma (C.P.P.) que estabelece a extinção da punibilidade. Outros sustentam que a orientação da doutrina especializada (Celso Delmanto, Cód. Penal Comentado, 3ª ed., pág. 177 - Renovar; Mirabete - Manual de Direito Penal - 1/415, 4ª ed., e outros) e da jurisprudência (RT-710/360) é no sentido de que as normas de prescrição, como normas gerais que são, aplicam-se aos fatos incriminados por Lei especial, se esta não dispuser de modo diverso.  Outros, ainda, sustentam que por ser a prescrição assunto de direito material, não é possível a sua extensão ao direito da criança e do adolescente porque a Lei 8069/90 (E.C.A.) só permitiu a extensão às normas processuais, no caso de silêncio.  Apenas nos crimes praticados contra as crianças e adolescentes (e não nos atos infracionais por estes praticados) permitiu a Lei a aplicação das normas gerais do Código Penal (conforme art. 226 da citada Lei).

 

O signatário já chegou a esposar entendimento segundo o qual a prescrição sócio-educativa e da execução da medida sócio-educativa encontrava na Lei Penal comum o seu específico estatuto de regência, colocando algumas particularidades, tais como a inexistência da perempção ou decadência, por ser a ação sócio-educativa pública incondicionada (só se admite a interferência do particular como assistente do M.P., dominus litis da ação ), a fixação do prazo prescricional da pretensão sócio-educativa (da ação) em oito anos, qualquer que seja o ato infracional, pois seria regulado pelo máximo da medida mais extrema (art. 121, § 3º do E.C.A. :- o prazo máximo da internação é de três anos) dentro da tabela existente no art. 109 do C.P. e a fixação diferenciada de prazos para a prescrição subsequente, ou superveniente à sentença, inclusive a retroativa.

 

Se a internação fosse imposta por descumprimento reiterado e injustificado de outras medidas (art. 122, III), por ser o prazo máximo fixado em três meses (§ 1º do mesmo artigo) o prazo prescricional seria de dois anos (art. 109, VI do C.P).

 

Se a medida imposta fosse a de Liberdade Assistida, a prescrição dependeria do prazo fixado pelo órgão judicial.  Como o prazo mínimo é de seis meses (art. 118 § 2º da Lei 8069/90) e não há prazo máximo (entendemos que as regras do art. 121 §§ 3º e 5º são aplicáveis, ou seja, o prazo máximo é de três anos e a liberação compulsória se dá aos vinte e um anos), a prescrição poderia ser em dois anos (se o prazo fixado for inferior a um ano ), em quatro anos (se o prazo fixado para cumprimento da medida de Liberdade Assistida for igual a um ano e inferior a dois) ou em oito anos (se o prazo para a Liberdade Assistida for superior a dois anos - não pode exceder a três), tudo consoante à tabela do artigo 109 do C.P. 

 

Com relação às medidas de Prestação de Serviços à Comunidade, Obrigação de Reparar o Dano, Advertência (arts. 117, 116 e 115, respectivamente da Lei 8069/90), o prazo prescricional seria de dois anos (art. 109, VI, do C.P.).

 

Dessa forma, , as substituições de medidas (art. 113, c/c 99 do E.C.A.) só poderiam ser feitas se dentro do prazo prescricional e a cumulação de medidas, importariam em fazer com que o prazo prescricional fosse regulado pela mais gravosa, pelo caráter também reeducativo de que as medidas se revestem.

 

Nessa mesma linha de raciocínio não se poderia negar vigência a regras da interrupção da prescrição (recebimento da representação, prolação da sentença, cumprimento da medida, etc.) às que consideram determinados crimes imprescritíveis (art. 5º, XVIV, da C.F.) etc..

 

Entretanto, como faz parte da evolução humana a mudança de pensamento, após meditar profundamente sobre o tema e discuti-lo em algumas esferas, sobretudo informais, mudamos radicalmente de opinião. O caráter predominantemente reeducador das medidas previstas na Lei 8069/90 faz com que o Estado tenha o dever de aplicá-las para preparar a pessoa humana para uma vida feliz e útil. Inclusive pode-se chegar a uma responsabilização civil do Estado (responsabilidade subjetiva) pelo insucesso da medida.  Daí o interesse em se permitir o máximo de oportunidades ao Estado - Administrador para proteger (medidas específicas de proteção - art. 101 a Lei 8069/90) ou para sócio-educar (medidas sócio-educativas  - art. 112 da mesma Lei). Trata-se, repita-se, de um dever do Estado e não existe a prescrição ou decadência de um dever jurídico.

 

Destarte, somente quando não mais se mostrar necessário proteger ou sócio-educar pode o Estado-Juiz  deixar de aplicar medidas protetivas ou sócio-educativas.  Constatada essa circunstância, deixa-se de impor a medida ou de executá-la.  Para isso inexiste um lapso temporal pré-definido.  É uma constatação concreta, caso a caso. Como as medidas são aplicadas levando-se em conta as necessidades pedagógicas (art. 100 da Lei 8069/90, já citado), pode-se afirmar, como o fez o ilustrado jurista Públio Caio Bessa Cyrino, Promotor de Justiça no Amazonas, numa conversa informal, que somente a ineficácia pedagógica pode impedir a aplicação de uma medida específica de proteção ou sócio-educativa.  Na verdade opera-se uma absoluta falta de interesse processual em continuar com o processo ou procedimento.

 

Assim, se, v.g., um adolescente autor de um ato infracional equiparado a furto teve imposta, através de uma sentença, uma medida sócio-educativa qualquer em 1992, esta não poderá ser executada nos dias atuais se este adolescente estiver estudando, trabalhando regularmente, integrado à família, vivendo longe da marginalidade, etc., por absoluta ineficácia pedagógica.

 

Da mesma forma, um processo só se justifica quando houver imperiosa necessidade de colher provas para julgar.  Por vezes o extenso lapso temporal entre o fato e o julgamento ou entre qualquer dos dois e a execução da medida autoriza o Non liqued.  Com maior razão ainda admite-se a não instauração do procedimento quando inexiste o legítimo interesse (ou seja, a necessidade e a utilidade) em impor medidas protetivas ou sócio-educativas.

 

A questão aqui não é de aplicação de prazo prescricional ou outro prazo e sim do desaparecimento do poder de julgar ou de impor medidas.  Há um momento, no curso do processo, em que se irradia para o Juiz, o poder jurídico de julgar.  É o momento, ponto no tempo, em que nasce o dever jurídico de o Juiz prestar pelo Estado, o ato jurisdicional exigível.  Quem não pode, não tem poder.  Às vezes, a ação do tempo faz desaparecer o interesse do Estado não só em constatar a infração, como também em executar a medida.

 

Continuar ou iniciar com um processo já se sabendo que será inútil porque constatou-se a ineficácia pedagógica da medida que seria imposta (não porque seria tentar o impossível, porque o adolescente é irrecuperável ou porque o Estado tem o dever de, antes e acima de tudo, editar bem mais úteis reformas do que procurar aplicar, no campo social, o critério evangélico, moralmente justo, mas socialmente iníquo, de ovelha perdida.  Primeiro porque nem sempre todos são ovelhas perdidas e segundo porque não é inútil tentar, o que para muitos não é impossível, reeducar o indivíduo periculoso.  Além disso as medidas como, por exemplo, a internação, tem também por mira torná-lo inofensivo, não descurando contudo a sua reeducação e readaptação social) atenta contra os mais altos postulados do princípio da economia processual e como diz o mestre Galeno Lacerda, apud Weber Martins Batista, na obra Direito Penal e Processual Penal, pág. 158, Forense , " a função de economia no processo transcende à mera preocupação de poupar trabalho a Juizes e partes e visa, antes, a ânsia de perfeição da Justiça humana, o reconhecer e proclamar o direito com o menor gravame possível. "

 

Os reflexos psicológicos de uma medida imposta desnecessariamente são notados a olhos vistos. Pode gerar reincidência, descontentamento, revolta, etc. Assim, por todos os aspectos mostra-se ineficaz a imposição de medida quando esta é desnecessária.  Há uma absoluta falta de interesse e não se deve reconhecer a prescrição, absolver ou julgar improcedente a pretensão sócio-educativa e sim julgar extinto o processo, sem julgamento do mérito, na forma do art. 267, VI, do C.P.C., aplicável na espécie por força da norma de extensão contida no art. 152 da Lei 8069/90.

 

Portanto, a personalidade do infrator na época da aplicação da medida e não na época do fato, deve ser a protagonista da justiça infracional, devendo-se analisar, caso a caso, a necessidade pedagógica ou não de se destruir o delinqüente no homem e não destruir o homem delinqüente.  Se há necessidade de impor uma medida, não importa o lapso temporal entre o fato e o julgamento ou entre qualquer deles e a execução da medida. Deve-se atribuir ao infrator uma medida adequada para que a sociedade, para que a família, não recebam de volta uma pessoa inadaptada e irredutível a uma vida normal sem uma tentativa de recuperação.

 

O tema que foi abordado tem muitos pontos que exigem estudos mais aprofundados. Não são poucas e nem pequenas as possíveis controvérsias e nem de longe procurou-se apresentar o presente assunto com o definitivo.  Talvez, de lege ferenda, seja imperioso sanar a aparente omissão legislativa, para que o Juiz, o Ministério Público, os operadores do Direito não se vejam na contingência de atuar como se legisladores fossem.  Talvez não haja omissão e, de fato, inexista a necessidade de fixação de prazo para imposição de medida.  Mas apresentamos uma contribuição para regular uma aparente lacuna apontada.  É de convir-se, todavia, que deixar em aberto o prazo para imposição de medidas pode fazer com que alguém seja punido por um fato que mais ninguém se lembra e a punição ou reeducação se mostre totalmente desnecessária.  Seria o mesmo que dar um castigo a uma criança por ela ter mentido quatro anos atrás.  Qual a utilidade do castigo?  O direito, como disse Benjamin Cardozo, na esteira de Roscoe Pound, deve ser estável mas não pode permanecer imóvel. Como o viajante, deve estar pronto para o amanhã.

 

 

Notas

 

[1] Membro das Associações Brasileira de Magistrados, Brasileira de Juizes e Promotores da Infância e Juventude, de Magistrados do Estado do Rio de Janeiro e da Internacional de Juizes da Infância e Família;  Professor Universitário e da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro.

[2] Vide ensaios críticos sobre Direito Penal e Processual Penal, Editora Liber Iuris, pág. 09.