1a VARA DE TRABALHO DE CUBATÃO
Processo n. 234/2002
Aos vinte e oito dias de agosto do ano de dois mil e dois, às 17:00
horas, na sala de Audiências desta Junta, foram por ordem do MM Juiz de
Trabalho, Dr. WILLY SANTILLI, apregoados os litigantes: Márcia Guedes da Costa,
Sociedade Brasileira de Estudos Pedagógicos e Companhia Brasileira de
Distribuição.
Ausentes as partes. Prejudicada a proposta final de conciliação, foi
proferida a seguinte
SENTENÇA
Márcia Guedes da Costa move ação Sociedade Brasileira de Estudos
Pedagógicos e Companhia Brasileira de
Distribuição postulando as verbas e providencias elencadas nos itens “a”
a “z” da inicial. Valor dado à
causa $ 8.500,00.
Respostas das reclamadas nas fls 46/53 e 67/76. As duas alegam carência
da ação e negam a caracterização de vinculo empregatício (alegam que a relação entre as partes foi de
estágio na segunda reclamada, intermediado regularmente pela primeira).
Instrução por documento e prova oral.
Inconciliadas as partes.
Relatados.
Decido:
1. A reclamante alega que
trabalhou para a segunda reclamada de 18/0101 a 18/01/02 em situação
característica de contrato de trabalho. Argumenta que o contrato de estágio foi
feita em fraude a lei e é nulo de pleno direito;
As reclamadas afirmam que jamais houve vinculo empregatício. A
reclamante teria trabalhado como estagiária nos estritos termos da Lei
6.494/77, inexistindo relação de emprego.
A questão é de mérito: ou o contrato de estágio é nulo e as
conseqüências são As perseguidas pela reclamante (reconhecimento de vinculo
direto com a segunda reclamada e pagamento de verbas típicas de contrato de
trabalho), ou é válido e a pretensão deve ser rejeitada. Não se trata de
nenhuma forma de carência da ação, pois in statu assertionis as partes
são legitimas, há interesse jurídico (necessário o recurso ao judiciário para
atender a pretensão, o procedimento escolhido é correto) e o pedido juridicamente (provimento
previsto no ordenamento jurídico). Rejeito as preliminares.
As provas orais encontram-se nas fls 91/92.
A reclamante, como se dessume dos depoimentos colhidos, trabalhou como
balconista e caixa de supermercado. Era estudante do curso secundário(sem
especificação profissional) e era remunerada através de uma bolsa: prestava
serviço seis horas diárias, com uma folga semanal (nem sempre coincidente com o
domingo), Havia intervalo de quinze minutos e não há provas de prorrogação.
O artigo 1o , da Lei 6.494/77, define o escopo do estágio de
estudantes: “As pessoas jurídicas de Direito Privado, os órgãos da
Administração Pública e as instituições de Ensino podem aceitar, como
estagiários, alunos regularmente matriculados em cursos vinculados ao ensino
público e particular” (caput,
transcrito).
Os parágrafos do artigo primeiro estabelecem os requisitos: freqüência
regular de curso de ensino (médio, profissional de nível médio e superior),
realização do estágio em unidade que tenha condições de proporcionar
experiência prática na linha de formação do estagiário e finalmente o estágio
deve propiciar complementação do ensino e da aprendizagem, devendo para tanto
serem planejados, executados, acompanhados e avaliados em conformidade com os
currículos, programas e calendários escolares.
A lei ainda propicia estágio desvinculado destes requisitos, como
atividade de extensão quando da participação de empreendimentos e projetos de
interesse social (o que claramente não é o caso).
Pois bem o “termo de compromisso
de estágio” não faz referencia a
nenhuma matéria compreendida no currículo de curso secundário geral, nenhum
relatório ou avaliação foram apresentadas que digam respeito à relação entre as atividade de estágio e as matérias
cursadas, sobretudo nada indica, nem mesmo na aparência que tenha havido acompanhamento
do estágio (observo que avaliações de chefia imediata, que não foram juntadas,
não se confunde com avaliação que revele desempenho escolar. O
recrutamento, revela a testemunha da reclamada, era feito pela SBEP, e o
supermercado, quando precisava de estagiários pedia a esta instituição (ou
seja, havendo necessidade de mão de obra solicitavam à instituição – caixas e
balconistas são profissões que não exigem qualificação técnica e são
necessárias para o desempenho da atividade da reclamada.
A conclusão é que houve um total desvirtuamento das finalidades da Lei
6.497/77 com a finalidade óbvia de evitar a aplicação das normas de
regulamentação do trabalho subordinado. Fraude à lei, nos termos do art. 9o
, da CLT.
Desta forma, considero que a reclamante foi empregada da segunda
reclamada de 18/01/00 a 18/01/01, o término do contrato configura dispensa
imotivada (pois não há requisitos de contrato por prazo determinado).
Aplicam-se os pisos salariais previstos nas normas coletivas de fls 21 e seguintes
(R$ 358,00, de admissão até 31/08/01 e R$ 390,00 de 01/09/2001 até o final do
contrato de trabalho).
A primeira reclamada fez o papel de intermediadora ilícita de mão de
obra e nestes termos responde solidariamente pelas verbas devidas à reclamante,
nos termos do art. 1518, do Código Civil.
O contrato de trabalho deve ser anotado na CPTS.
2. A reclamada tem direito a diferenças salariais, considerados os pisos
acima mencionados, bem como à integração destas diferenças para remuneração de
todas as verbas do contrato de trabalho tarifadas sobre o salário.
São devidos ainda aviso prévio, 13o salário de 2000 (11/12),
13o salário de 2001 (2/12), férias vencidas, férias proporcionais
(1/12), gratificação de 1/3 incidente sobre as férias vencidas e proporcionais,
FGTS do período trabalhado (incidente sobre os valores pagos sob a rubrica “bolsa”
, sobre as diferenças salariais, sobre o 13o e sobre a
indenização de aviso prévio), indenização complementar de 40%, multa pelo
atraso na quitação no valor de um salário mensal da reclamante.
Nos autos não há elementos para a concessão de indenização substitutiva
do seguro-desemprego (a reclamante não demonstra que possuía todos os
requisitos necessários para tanto, exceto o fato de não ter sido registrada).
3. Os pedidos de horas extras e reflexos são improcedentes, pois não
excedidos os limites diários e semanais de duração do trabalho nem suprimido o
intervalo para refeição (de quinze minutos, considerada a jornada reduzida).
É improcedente também o pedido relativo à estabilidade gestante, pois a
confirmação da gravidez deu-se em data posterior a dispensa (fls. 19).
4. Devido ao inadimplemento do piso previsto em norma coletiva, devidas
duas multas convencional normativas no valor de 10% do salário profissional
normativo,. Nada é devido em relação a quebra de caixa (não consta que a
reclamante pudesse ser responsabilizada por diferenças) nem por horas extras (que é direito previsto em lei).
5. Indevidos honorários advocatícios porque ausentes os requisitos da
Lei 5.584/70.
Isto posto, julgo procedente em parte a ação para rescindir o contrato
de estágio, reconhecer o vínculo empregatício entre a reclamante e a segunda
reclamada no período alegado na inicial e condenar solidariamente a
Sociedade Brasileira de Estudos Pedagógicos e a Companhia Brasileira de
Distribuição . a pagar á Márcia Guedes da Costa, observadas as disposições
contidas no corpo da sentença, diferenças salariais e integrações, duas multas
convencional normativas, aviso prévio, 13o salário de 2000 (11/12),
13o salário de 2001 (2/12), férias vencidas proporcionais (1/12),
gratificação de 1/3 incidentes sobre as férias vencidas e proporcionais, FGTS
do período trabalhado (incidente sobre os valores pagos sob a rubrica “bolsa” ,
sobre as diferenças salariais, sobre o 13o salário e sobre a
indenização de aviso prévio), indenização complementar de 40% multa pelo atraso
na quitação no valor de um salário mensal da reclamante.
Juros e correção monetária na forma da lei (isto é, a partir do vencimento
da obrigação – no caso de salários mensais a partir do mês subseqüente ao
trabalhado).
Oficie-se á DRT e ao INSS. Diante dos elementos contidos nos autos que
indicam prática contrária a direitos coletivos e individuais homogêneos dos
trabalhadores, oficio também ao Ministério Público do Trabalho.
Ficam indeferidos os descontos fiscais e previdenciários, pois o autor
não pode se beneficiar da limitação da progressividade e a responsabilidade
pelos recolhimentos, ex-vi legis é do empregador exclusivamente quanto a
salários não pagos ( Lei 8.213/91, art. 33, Parágrafo 5O ). Custas pelas reclamadas, no importe de R$
100,00, calculadas sobre o valor arbitrado para a condenação (R$ 5.000,00).
Intimem-se .
Nada mais.
Juiz do Trabalho