ESTADO DO TOCANTINS

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

 

APELAÇÃO CÍVEL N.º 2163

COMARCA                   : PALMAS

APELANTE                  : VALDEMI NUNES RIBEIRO

DEFENSORA

PÚBLICA                      : MARIA DE LOURDES VILELA

APELADO                    : MINISTÉRIO PÚBLICO

PROCURADOR

DE JUSTIÇA                : ALCIR RANIERI FILHO

RELATOR                    : DES. JOSE NEVES

 

RELATÓRIO

 

Valdemi Nunes Ribeiro, menor infrator qualificado, sofreu representação ministerial onde lhe atribuiu prática do ato infracional descrito no art. 121, § 2º, IV. Primeira figura, do Código Penal, em decorrência de, na data de 22 de fevereiro de 1998, ter ceifado a vida da vitima Jairo Francisco Gomes.

 

Insurge-se o apelante contra a decisão monocrática que responsabilizou o menor infrator pela prática do ato infraciona1, aplicando a medida sócio-educativa de inserção em regime de internação, inicialmente pelo prazo de 06 (seis) meses, a ser cumprida na Casa de Internação, improvisada nas antigas instalações do 4º Distrito Policial desta Capital.

 

Alega que a magistrada, ao responsabilizar o apelante, o fez somente baseando-se no evento morte, deixando. de analisar o contexto dos acontecimentos.

 

Aduz que o representado agiu em legítima defesa. repelindo as agressões que sofria da vitima e de seu irmão.

 

Afirma ainda, que as testemunhas ouvidas foram unânimes em declarar que nunca souberam de qualquer fato que desabonasse a conduta do apelante, e que ele é um bom rapaz e trabalhador.

 

Por fim, requer o conhecimento e provimento do recurso para reformar a decisão, reconhecendo a tese da legitima defesa.

 

Contra-arrazoando o recurso, o Ministério Público de primeira instância pugnou pela confirmação da sentença, eis que inconsistentes as razões da apelação.

 

Às fls. 113/114, a Juíza monocrática, com supedâneo no art. 198, inciso VII, do Estatuto da Criança e do Adolescente, manteve a decisão recorrida, determinando a remessa dos autos a este Sodalício que, após o recebimento, por sorteio foram a mim distribuídos.

 

Instado a se manifestar, o Órgão de Cúpula Ministerial também opinou pela manutenção da sentença no seu inteiro teor.

 

E o relatório em síntese.

 

VOTO

 

Cuida-se, nesse recurso de Apelação, interposta pela Defensoria Pública desta Capital, em favor do menor infrator Valdemi Nunes Ribeiro, contra sentença do Juízo da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Palmas, que o condenou a medida sócio-educativa de internação pelo prazo de 06 (seis) meses, para ser cumprida na Casa de Internação, improvisada pela Vara Especializada, no 4º Distrito Policial desta Capital, entendendo haver praticado a conduta típica definida no art. 121, § 2º, inciso IV, do ‘Código Penal.

 

Primeiramente, cumpre ressaltar que compete à Câmara Cível o julgamento de recursos afetos a Justiça da Infância e da Juventude conforme disposto no caput do art. 198, do Estatuto da Criança e da Juventude, verbis:

 

“Art. 198 — Nos procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude fica adotado o sistema recursal do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 5.869, de janeiro de 1973, e suas alterações posteriores, com as seguintes adaptações:

(...);

 

Prosseguindo, a autoria e a materialidade do fato não são negadas pela defesa. Extrai-se dos autos que o inconformismo do apelante se limita a alegação de que o menor infrator agiu em legítima defesa e que as testemunhas ouvidas foram unânimes em declarar que nunca souberam de qualquer fato que desabonasse a conduta do apelante, e que ele é um bom rapaz e trabalhador.

 

No que diz respeito à tese da legítima defesa do recorrente, que não foi acolhida pela juíza a quo, esta realmente não merece prosperar.

 

Diz o apelante que fora provocado pela vítima - e mais que isso - chegou a ser agredido por ela.

 

Ressai dos autos que o menor infrator encontrava-se, armado com uma faca e ameaçou sacá-la contra o irmão da vítima Jaires Francisco Gomes.

 

Com o intuito de defender seu irmão, ao ver que o menor infrator estava armado, a vítima o empurrou e no momento em que saía foi surpreendida com golpes de faca.

 

Verifica-se pelo Laudo de Exame Médico Pericial de fls. 28 usque 34, que a vítima sofreu 07 (sete) golpes, sendo um na região axilar, outro na região infraclavicular esquerda e o restante dos golpes, 05 (cinco), atingindo a vitima pelas costas.

 

Veja-se como relata o lamentável episódio a testemunha ocular Elizeu Geraldo de Meio, verbis:

 

“... a vítima e seu irmão foram saindo do salão do bar e quando já estavam do lado de fora Valdemi deu uma facada na vítima, atingindo-a na regido das costas.” (depoimento da testemunha Elizeu Geraldo de Meio. fls. 74).

 

Essa versão, que evidentemente não apoia as alegações de defesa do apelante, está confirmada por outra importante testemunha ocular Jaires Francisco Gomes irmão da vítima vejamos:

 

“... que apesar de não ter havido uma séria discussão, o representado chamou o depoente para conversarem, indo os dois para o lado de fora do estabelecimento; que ao começarem tal conversa o representado levou a mão a cintura, como se pretendesse sacar uma arma; que vendo a atitude do representado a vítima, para proteger o depoente aproximou-se e empurrou o representado, derrubando-o ao chão; que logo em seguida o representado deu uma facada na vítima...“ (fls. 73)

 

Sidney Brito Rocha, testemunha que também presenciou o fato, afirma:

 

‘(...) que o depoente percebeu que existiam duas pessoas armadas, uma das quais o representado e a outra um rapaz que o depoente não conhece; que as armas vistas pelo depoente nas mãos das pessoas acima mencionadas eram facas; que o depoente não viu direito mas sabe que a vítima recebeu duas facadas, sendo uma no pescoço e outra na regido das costas; (....) que a vítima estava andando no momento em que foi esfaqueada (...) (fls. 83).

 

Subsiste que o menor infrator, juntamente com uma pessoa que o acompanhava, eram os únicos que estavam armados e, visando repelir um empurrão sofrido, sacou de uma faca e ceifou a vida da vítima.

 

Não se pode, jamais, achar-se em legítima defesa quem, se dizendo sob efeito de ameaça verbal, ou de um simples empurrão, crava a faca seguidas vezes na vítima quando esta não mais oferecia resistência.

 

A jurisprudência também é firme neste sentido, vejamos:

 

 

“EMENTA: JÚRI LEGÍTIMA DEFESA. DESNECESSIDADE DO MEIO EMPREGADO. DECISÃO ANULADA. Não está sob o pálio da legítima defesa, quanto à necessidade do meio empregado, o agente que, após imiscuir-se em contenda iniciada por seus amigos, revida um tapa com uma facada mortal à desarmada vítima. Apelo provido para anular a decisão do Júri” (TJGO 2ª Câm. Criminal - Ap. Crim. N. 13981.3.213 - Rel. João Canedo Machado).

 

No mesmo sentido:

 

“EMENTA: LEGÍTIMA DEFESA — NÃO OCORRÊNCIA -  INCORRE A LEGÍTIMA DEFESA QUANDO O RÉU USA DE UMA FACA PARA REVIDAR UM SIMPLES TAPA - AQUELA, NO CASO, É MEIO DESNECESSÁRIO E DESLEAL.” (TJDF - Turma Criminal, Ap. 05011.80 Rel. Des. Lúcio Arantes).

 

Assim, a legitima defesa não ficou provada, seja pela inexistência da injusta agressão, atual ou iminente (art. 25 do Código Penal), seja porque não se demonstrou a ocorrência de qualquer indício de razoável suposição, pelo menor infrator, de situação de fato que, se existente, tomaria legítima a sua conduta.

 

Por fim, quanto a afirmação de que o apelante “um bom rapaz e trabalhador”, também não merece crédito, eis que se contradiz com os fatos do caso em testilha, onde se encontrava ingerindo bebida alcoólica em um bar, de posse de arma branca., até as 4:00 horas da manhã.

 

Além do mais, como afirma em seu depoimento as fls.55, não estuda e não reside com os pais.

 

Assim, não existindo amparo legal capaz de sustentar as pretensões do recorrente, nego provimento ao recurso, para manter incólume a sentença atacada.

 

É como voto.

 

Palmas,

 

Des. JOSÉ NEVES

Relator