Internação - Medida sócio-educativa inadequada ao caso concreto, mesmo em se considerando a gravidade do ato infracional - Menor gestante que, se internada, certamente seria separada do filho - Inexistência, no Estado, de estabelecimento adequado para a internação de infratoras - Recurso desprovido. APELAÇÃO CRIMINAL Nº 000.186.792-8/00 - COMARCA DE SABARÁ - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS. Relator: KELSEN CARNEIRO. Data do acordão: 06/03/2001.

 

 

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS

 

Número do processo: 1.0000.00.186792-8/000(1)

Relator:                      KELSEN CARNEIRO

Relator do Acordão: KELSEN CARNEIRO

Data do acordão:       06/03/2001

Data da publicação: 21/03/2001

Inteiro Teor:               

EMENTA: Internação - Medida sócio-educativa inadequada ao caso concreto, mesmo em se considerando a gravidade do ato infracional - Menor gestante que, se internada, certamente seria separada do filho - Inexistência, no Estado, de estabelecimento adequado para a internação de infratoras - Recurso desprovido.


APELAÇÃO CRIMINAL (APELANTE) Nº 000.186.792-8/00 - COMARCA DE SABARÁ - APELANTE(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS, PJ COM. SABARÁ - APELADO(S): GFS - RELATOR: EXMO. SR. DES. KELSEN CARNEIRO
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO.


Belo Horizonte, 06 de março de 2001.


DES. KELSEN CARNEIRO - Relator


NOTAS TAQUIGRÁFICAS


O SR. DES. KELSEN CARNEIRO:


VOTO
A respeitável sentença, de fls. 143/148-TJ, aplicou à menor GFS  medidas sócio-educativas de liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade, pela prática de ato infracional análogo ao crime previsto no art. 121, § 2º, II e IV, do Código Penal, porque, no dia 09 de novembro de 1.999, por volta das 09:00 horas, às margens da BR-262, Bairro Borba Gato, em Sabará, juntamente com os maiores  ......., matou com pauladas e golpes de faca Maria de Fátima.


Inconformada, recorreu a Promotora de Justiça, pretendendo a substituição das medidas sócio-educativas impostas na sentença pela de internação, a seu ver a mais adequada, em face da gravidade do ato infracional praticado.


Contra-arrazoado o recurso e mantida a decisão pelo despacho de fls. 161, subiram os autos e, nesta instância, manifestou-se a douta Procuradoria de Justiça pelo desprovimento.

 
É o relatório resumido e no que interessa.


Conheço do recurso, presentes os requisitos legais de admissibilidade.


A apelante não tem razão, "data venia".


Embora não se possa negar que, de certa forma, as medidas sócio-educativas têm também um caráter retributivo, buscam elas, antes de mais nada e precipuamente, a reinserção social do menor, devendo-se, na aplicação das mesmas, levar-se em conta as necessidades pedagógicas, "preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários" (art. 100 ECA).


Como muito bem lembrado pela douta Procuradoria de Justiça no seu judicioso parecer de fls. 169/173:

 
"O direito do menor é um direito que aspira a ser formador do homem. Nesse sentido, afasta-se do direito penal, pois a punição não é buscada. Assim, não aplicam penas ao menor, mas medidas educativas, que têm por fim tutelar o próprio infrator. O caráter de cuidado e de amparo dessas medidas prevalece sobre o lado expiatório das mesmas. Destarte, as medidas socio- educativas possuem fundamento diverso das penas para sua aplicação. A medida mais grave não corresponde, necessariamente, ao ato infracional gravíssimo, mas a uma maior carência do próprio menor, que não se recuperaria caso permanecesse em seu meio".

 
De acordo com OLYMPIO SOTTO MAIOR,


"para o adolescente autor de ato infracional a proposta é de que, no contexto da proteção integral, receba ele medidas sócios-educativas (portanto, não punitivas), tendentes a interferir no seu processo de desenvolvimento objetivando melhor compreensão da realidade e efetiva integração social.


O educar para a vida social visa, na essência, ao alcance de realização pessoal e de participação comunitária, predicados inerentes à cidadania.


Assim, imagina-se que a excelência das medidas sócio-educativas se fará presente quando propiciar aos adolescentes oportunidades de deixarem de ser meras vítimas da sociedade injusta que vivemos para se constituírem em agentes transformadores desta mesma realidade.


Nesta ótica, não temos dúvida em afirmar que, do elenco das medidas sócio- educativas, a que se

mostra com as melhores condições de êxito é a da liberdade assistida, porquanto se desenvolve direcionada a interferir na realidade familiar e social do adolescente, tencionando resgatar, mediante apoio técnico, as suas potencialidades. O acompanhamento, auxílio e orientação, a promoção social do adolescente e de sua família, bem como a inserção no sistema educacional e do mercado de trabalho, certamente importarão o estabelecimento de projeto de vida capaz de produzir ruptura com a prática de delitos, reforçados que restarão os vínculos entre o adolescente, seu grupo de convivência e a comunidade.


E, no outro extremo deste mesmo olhar, vislumbra-se que a internação é a medida sócio-educativa com as piores condições para produzir resultados positivos. Com efeito, a partir da segregação e da inexistência de projeto de vida, os adolescentes internados acabam ainda mais distantes da possibilidade de um desenvolvimento sadio. Privados de liberdade, convivendo em ambientes, de regra, promíscuos e aprendendo as normas próprias dos grupos marginais (especialmente no que tange a responder com violência aos conflitos do cotidiano), a probabilidade (quase absoluta) é de que os adolescentes acabem absorvendo a chamada identidade do infrator, passando a se reconhecerem, sim, como de má índole" (Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado - comentários jurídicos e sociais, divs. autores, Ed. Malheiros, 2ª ed., pág. 240).

 
Examinando a questão sob este prisma, tenho que a MMª Juíza acertou no aplicar as medidas de liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade, afastando a da internação que, considerada a gravidade do fato, simplesmente, poderia igualmente ser aplicada, mas não era a melhor e mais recomendável para o caso.


A adolescente em questão, de passado sofrido e traumático, na data de hoje, presumivelmente é mãe de uma criança de 06 meses (fls. 156) e da qual certamente seria separada, se internada, o que, convenhamos, não é o melhor.


Por outro lado, conforme realçado pela ilustre sentenciante, o nosso Estado infelizmente não dispõe de estabelecimento adequado para a internação de menores infratoras.


Além do mais, a menor infratora está abrigada em estabelecimento especializado (SETASCAD), onde vem recebendo a assistência de que necessita.


Não se pode esquecer, por fim, que, nos termos do § 2º do art. 122 do ECA, "em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada".


Pelo exposto, nego provimento ao recurso.


Custas, na forma da lei.


O SR. DES. RONEY OLIVEIRA:


VOTO
De acordo.


O SR. DES. MERCÊDO MOREIRA:


VOTO
De acordo.


SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO.