PELO ANDAR SE FAZ UM CAMINHO! UMA PROPOSTA METODOLÓGICA DE EDUCAÇÃO EM
SAÚDE PARA ADOLESCENTES
Ana Sudária de
Lemos Serra[1]
Lucimar R. Coser Cannon[2]
A transformação do ser humano deve corresponder a uma transformação das influências exteriores, e estas devem realmente alcançar o ser humano em sua disposição interna adequada. A imagem da chave e da fechadura logo nos ocorre: é necessário que ambas possam se adaptar plenamente para que o mecanismo funcione... Rudolf Steiner
Em 1977, os Estados membros da Organização Mundial de Saúde firmaram o compromisso de atingir as metas do programa Saúde para Todos no Ano 2.000; tendo como uma das conseqüências, a discussão em diversos eventos internacionais que evidencia a relevância e o significado da promoção de saúde como um novo paradigma, para melhor entendimento do processo saúde-doença e sua influência na construção de modelos mais eficientes e resolutivos em saúde pública.
A Carta de Ottawa (1986) conceitua a Promoção à Saúde como o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo. Para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social, os indivíduos e grupos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente. A saúde deve ser vista como um recurso para a vida e não como objetivo de viver.
Para a promoção da saúde, além da ação comunitária e do desenvolvimento de habilidades pessoais, é necessária a criação de ambientes saudáveis, a reorientação dos serviços de saúde, baseados em políticas públicas voltadas para essa área.
No Brasil, as diretrizes das políticas de saúde integral voltadas para a adolescência - pessoas na faixa etária de 10 - 19 anos - preconizam, assim, a ênfase nas ações de promoção da saúde e prevenção de agravos, por meio de ações educativas, de cunho multiprofissional e intersetorial, com participação efetiva dos adolescentes na elaboração, implementação e avaliação dessas políticas.
Dessa forma, uma das estratégias utilizadas pela Área de Saúde do Adolescente e do Jovem do Ministério da Saúde é o apoio à capacitação de adolescentes como promotores de saúde, na perspectiva de que estes promovam mudanças de atitudes e de comportamento próprios entre seus pares, que os leve a fazer escolhas mais saudáveis e a exercer melhor controle sobre a saúde e o meio ambiente.
Essa proposta metodológica de educação em saúde visa esses objetivos, por meio de um processo educativo que tem como foco central o desenvolvimento da pessoa, segundo a teoria de Carl Rogers, que é expressa “em comportamentos voltados à maior flexibilidade, à maior aceitação de si e das pessoas, assim como à criatividade e à percepção mais distintas e diversificadas, tanto dele mesmo como do outro e da realidade sócio-cultural”.
Sulamy Britto (1993) aborda três conceitos básicos para o melhor entendimento dessa teoria:
· Predisposição à auto-realização, a força natural que motiva o ser humano ao desenvolvimento psicossomático, à saúde, ao engajamento social, à autonomia, enfim à auto-realização;
· Noção do "Eu", que representa a imagem que a pessoa tem de si mesma, construída pela experiência, composta de percepções, valores, sentimentos e emoções vividas, além de sua interação com as outras pessoas e com o meio ambiente;
· Autovaloração, natural do ser humano que valoriza e busca atividades que o auxiliem no seu desenvolvimento como pessoa.
A partir dessa tendência humana para a auto-avaliação, a pessoa vivencia ou evita as experiências que considera válidas ou não, para o alcance de seus objetivos, de acordo com sua predisposição auto-realizadora.
Utilizando esse conceito, ferramentas educacionais serão construídas para facilitar ao adolescente a mudança de atitude, que o tornará mais confiante em suas escolhas, nos conhecimentos que possui, passando a viver como pessoa mais individualizada, com maior criatividade, maior receptividade e com mais responsabilidade. Assim, ele poderá se tornar o agente de seu desenvolvimento e protagonista, em seu contexto social - na família, na escola, na comunidade.
Essa metodologia, que media o processo de capacitação, favorece o desenvolvimento de potencialidades e de possibilidades de auto-realização, imprescindíveis para o desenvolvimento da pessoa e sua inter-relação com a realidade. Essas são as bases do conhecimento que precisam ser adquiridas de forma crítica, consciente e responsável, em função da transformação e aperfeiçoamento social, político, econômico e cultural que o adolescente sofre.
O modelo metodológico proposto para a educação em saúde do adolescente resultou da sistematização da prática de ações educativas utilizadas e avaliadas por equipes multidisciplinares, em oficinas para adolescentes realizadas em vários estados brasileiros.
O modelo aplicado é de educação para o autocuidado, conceituada como:
Desenvolvimento da auto-estima e de atitudes saudáveis a partir da percepção da necessidade de adotar um estilo de vida de baixo risco.
O trabalho busca a transformação e as mudanças de atitudes e comportamentos. As idéias fundamentais e facilitadoras desse processo educativo, são:
· Adolescente, você tem poder de poder mudar! Esta é uma frase de uma música composta por adolescentes, que ressalta a força transformadora do jovem como elemento fundamental no desenvolvimento do indivíduo e das características antropológicas que essa sociedade tem.
· Quem é esse homem que se quer formar? Que homem que se quer formar? Este é o núcleo do processo educativo.
· Respeitar e entender as especificidades dessa fase evolutiva e os interesses do adolescente, aproveitando-se as forças modificadoras internas, criando estratégias de ensino, predominantemente grupais que têm um caráter formador e integrativo integral. Tudo isso procura criar espaços educativos, nos quais o adolescente possa assumir o papel de sujeito de sua história e da História - o seu próprio agente de mudanças, em termos individuais e sociais.
A junção dessas três idéias fundamenta as visões de homem, de mundo, e o instrumental teórico-prático para ações educativas em saúde integral do adolescente.
Usando essa concepção pedagógica que serve como base estrutural para a apreensão do novo conhecimento, que conduz a atitudes saudáveis, procura-se:
· Desenvolver a reflexão crítica num processo gradativo e crescente de compreensão de si mesmo e do mundo. Dessa maneira, o conhecimento prévio do adolescente sobre o tema em discussão, construído a partir daquilo que ele pensa que sabe, de seus valores, crenças, tabus e preconceitos, é enriquecido e, às vezes, mudado com a apreensão de outros elementos. As novas informações conduzem a uma análise mais ampla e aprofundada desse processo;
· criar um clima de liberdade psicológica de vontade e escolha que comprometa e faça emergir a motivação para a aprendizagem;
· favorecer o sentimento de confiança na relação profissional e adolescente;
· permear o processo educativo com situações lúdicas e de incentivo à criatividade que favoreçam a manifestação do “espaço potencial criativo” de cada adolescente;
· facilitar o desenvolvimento da auto-estima;
· acatar valores pessoais e sócio culturais do adolescente.
O conteúdo programático aborda os seguintes temas que nas experiências que baseiam esta proposição foram discutidos com grupos de adolescentes e considerados como os de maior importância para a promoção à saúde:
· Crescimento e Desenvolvimento;
· Sexualidade e Saúde Reprodutiva;
· Relações Familiares e Sociais;
· Higiene e Nutrição;
· Violência;
· Acidentes;
· Uso Indevido de Drogas;
· Projeto de Vida.
É importante assinalar que esse conteúdo programático deverá ser adaptado a cada grupo de adolescentes, de acordo com suas necessidades e interesses. O enfoque metodológico favorece o desenvolvimento da autoconfiança e a percepção criativa da vida, proporcionando ao adolescente a oportunidade de sedimentar atitudes saudáveis em sua vida real.
As oficinas educativas refletem, em sua programação e execução, o enfoque transformador, como ferramenta importante de trabalho, conforme o diagrama a seguir.
Alguns tópicos são indispensáveis ao bom desenvolvimento dessa metodologia e à construção de uma base estrutural; apreensão do novo conhecimento e mudanças de atitudes para o autocuidado.
Este se centra no grupo de educandos, respeita suas características e, pela canalização da atenção e motivação, procura direcioná-las de maneira a facilitar a aprendizagem.
Utiliza-se dos produtos resultantes da tarefa grupal como referência inicial e apoio ao desenvolvimento do tema que vai abordar. Procura mostrar, de maneira clara, as ligações entre o novo conteúdo, conhecimento prévio e a experiência cotidiana dos adolescentes sobre o assunto em pauta.
Incentiva as discussões em subgrupos após a execução da tarefa pela utilização, principalmente, de técnicas de projeção de conhecimentos (colagens, cartazes, desenhos), para que o relato em plenário traga idéias para serem desenvolvidas e enriquecidas, não se restringindo ao campo descritivo.
Procura salientar as idéias criativas, a boa execução da tarefa, a organização conseguida, valorizando os menores pontos produtivos, utilizando-os como “ganchos” para repassar as informações que são necessárias à apreensão do novo conhecimento.
Esclarece as dúvidas, desfaz os equívocos e idéias distorcidas sobre o assunto em pauta, sem salientá-los como erros.
Recebe todas as idéias como válidas e passíveis de constituir pontos de reflexão sobre o tema em discussão, levando o grupo a pensar criticamente, a analisar o contexto em que se desenvolve a discussão e a decidir sobre a pertinência das idéias trazidas.
Observa atentamente as discussões e comportamentos do grupo. Isso poderá modificar sua ação, fazendo com que introduza novas estratégias de ensino ou de manejo de grupo e novos assuntos para adequá-la à motivação. Assim, sentindo-se atendido em suas necessidades, o grupo não perderá o estímulo e o interesse.
A linguagem do educador-facilitador deve ser entendida por todos pela simplicidade dos termos utilizados, adequados ao nível de entendimento do grupo.
Essa postura do educador-facilitador favorecerá a “aprendizagem significativa” que, no pensar de Carl Rogers, é aquela que se espraia sobre outros contextos vivenciais, fazendo com que o adolescente encontre soluções diferenciadas e criativas para os impasses que a vida lhe trouxer.
O conteúdo programático é de suma importância neste enfoque metodológico. Além de veicular as informações científicas atualizadas sobre saúde, que dentro de uma visão integral, deverá refletir o interesse dos adolescentes, seus sentimentos, questionamentos e necessidades. Este conteúdo é advindo de uma cuidadosa observação prévia da população-alvo e de sua situação sócio-política, econômica e cultural, e deverá desenvolver-se por meio de informações curtas, de forma a motivar o interesse e a participação do grupo de adolescentes, uma vez que longas exposições levam ao cansaço e à dispersão do grupo.
Deverá suscitar ainda a análise contextual das informações da vida real do adolescente e suas conseqüências, contribuindo para a apreensão crítica do conhecimento. Isso levará o adolescente a utilizá-la em suas tomadas de decisão em relação a adotar um estilo de vida de baixo-risco.
As técnicas não deverão ocupar o lugar do educador e, sim, ser uma forma de mediação entre ele, o grupo de adolescentes e o tema que está sendo abordado. Por isso, poderão ser modificadas no decorrer do processo ensino-aprendizagem, se não estiverem atingindo os objetivos para os quais foram propostos. Servirão como facilitadoras do processo educativo, podendo ser utilizadas como meio de sensibilização para o tema a ser abordado, como estímulo para a projeção de conhecimentos prévios sobre o assunto que será discutido. São espaços de reflexão, levantamentos e problematização do assunto em pauta, “aquecimento” do grupo, incentivando a espontaneidade e favorecendo a comunicação e a integração grupal. Devem ser escolhidas após uma análise dos objetivos que se quer atingir, dos temas que serão abordados e da profundidade de aprendizagem que se quer imprimir ao processo educativo.
Outro quesito a ser analisado é o tempo que se dispõe para o trabalho, para que as técnicas não ocupem todo o espaço da discussão grupal, da troca de idéias e vivências pessoais. Essas são as mais importantes no processo de apreensão crítica do conhecimento novo.
A observação do grupo para o qual serão programadas é fundamental para sua adequação à faixa etária predominante, à linguagem utilizada, ao nível de escolaridade, à capacidade de compreensão, à motivação para o treinamento, ao nível de relacionamento no grupo e a outros fatores como hábitos, modos de vida e interesses.
Na medida do possível, elas deverão conter um caráter lúdico que é motivador para o adolescente. Deverão favorecer a expressão criativa e vivencial do tema em estudo, facilitando o engajamento dos adolescentes nas tarefas propostas.
Por fim, é necessário que o educador conheça bem o alcance das técnicas que vai desenvolver, principalmente daquelas mediadoras de assuntos que podem fazer emergir emoções fortes, como relações familiares e autoconhecimento. Deve-se ter o cuidado de utilizá-las dentro dos limites determinados pela escuta e a observação atenta do grupo, com a finalidade de detectar e trabalhar as situações emergentes que poderão desestabilizar o grupo ou trazer dificuldades em sua condução.
O planejamento das oficinas deve ser concebido a partir das diretrizes metodológicas, cujo conteúdo comenta-se a seguir.
· Apresentar o grupo;
· Aquecer o grupo;
· Fazer emergir a motivação do grupo;
· Projetar conhecimentos prévios sobre o tema programado;
· Analisar criticamente o tema programado;
· Aprofundar o conhecimento sobre o tema programado;
· Verificar a apreensão do conhecimento.
1) Apresentar o grupo
A apresentação do grupo é indispensável no início da oficina. Além de atingir seu objetivo primordial, é por meio dela que serão conhecidas as expectativas dos participantes sobre o trabalho que será feito. Essas expectativas poderão redirecionar a programação prévia, adequando-a para as necessidades emergentes do grupo.
A integração grupal será favorecida se, em todos os dias da oficina, forem utilizadas diferentes técnicas criativas de apresentação as quais servirão para ampliar o conhecimento interpessoal, favorecer o autoconhecimento e facilitar a comunicação grupal.
As técnicas de apresentação do grupo vão desde a troca de informações de identificação pessoal até a utilização de expressão criativa como: desenhos, cartazes, construção com sucatas, construção de nomes, entre outros, devem expressar expectativas quanto ao trabalho a ser realizado, para mostrar sentimentos e valores pessoais e o desejo de integração no grupo.
2) “Aquecer” o grupo
O grupo estando relaxado, mobilizado e flexível, torna-se aquecido. Ficará mais espontâneo, podendo com mais facilidade se engajar na tarefa proposta, organizando-a e desenvolvendo-a com mais produtividade, evidenciando os resultados da integração grupal.
No “aquecimento”, poderão ser utilizadas, entre outras, técnicas lúdicas de movimento corporal apropriadas ao grupo ou técnicas de relaxamento com música, exercícios respiratórios e outras que forem adequadas a esse objetivo.
3) Fazer emergir a motivação do grupo
A motivação é implícita no ser humano, sendo o combustível central da aprendizagem significativa, aquela que se repete em todos os contextos vivenciais da pessoa, facilitando mudanças de atitudes e comportamentos. Para que ela apareça e permaneça, é necessário que o processo educativo seja encaminhado dentro dos parâmetros já apresentados e que na programação das oficinas sejam pensadas estratégias que a movimentem, facilitando o interesse pelo conteúdo que será discutido.
Uma das estratégias mais utilizadas tem sido iniciar a apresentação do conteúdo programático, correlacionando-o a um estímulo concreto e lúdico. Por exemplo, a sexualidade a partir de músicas atuais que abordem questões que se quer discutir. A partir desse estímulo e de sua ressonância no grupo, desenvolvem-se os conceitos do tema em foco.
4) Projetar conhecimentos prévios sobre o tema programático
O adolescente é o construtor de seu próprio aprendizado. O conhecimento e a experiência que possui sobre o tema que vai ser discutido, é necessariamente a fonte que desencadeia a exposição das novas informações.
Esse procedimento elimina o desnível entre o educador e o educando, valorizando a pessoa e seu conhecimento prévio, o que influenciará positivamente no seu autoconceito, tão importante nas mudanças qualitativas que levam ao autocuidado. Para isso, pode-se utilizar exposição oral individual, da discussão do tema em subgrupos com a apresentação do consenso final, da confecção de cartazes, frases e outras atividades facilitadoras da comunicação do conhecimento prévio das pessoas sobre o tema.
5) Analisar criticamente o tema programático
A análise crítica do tema programado, a partir de técnicas que facilitem a troca de opiniões e de juízo sobre o tema, media o processo de conscientização. Esse leva o adolescente a compreender a realidade que o cerca. Através dessa experiência ele passa a dar um significado, um valor, ao que aprendeu e a se importar com o que acontece em sua vida real, ao seu redor.
A partir daí, passa a construir um projeto de vida pessoal inserido em uma visão mais ampla de cidadania. Começa a agir sobre sua vida real, baseado na compreensão que tem dela e dos valores que elegeu a partir dessa compreensão, sempre norteado por seu projeto de vida.
6) Aprofundar o conhecimento sobre o tema programático
Nesse momento, o aprofundamento do conteúdo programático será feito como parte do processo de conscientização, na medida em que novos conceitos e informações vão sendo analisados e discutidos. Essa análise e discussão acontecem à luz dos diversos aspectos - sociais, culturais, econômicos e outros, que os envolvem, e, principalmente, sobre os valores culturais, pessoais e éticos, cujo repensar é fundamental para as mudanças de atitude e comportamento.
7) Verificar apreensão do novo conhecimento
Esta verificação é necessária como balizadora dos resultados do processo educativo e norteadora da programação que deverá ser feita para o acompanhamento dos adolescentes promotores de saúde.
Aqui, a palavra conhecimento é usada em seu sentido mais amplo que engloba, não apenas o nível de informação que foi apreendido dos assuntos tratados, mas, também, as indicações de modificações qualitativas pessoais e grupais.
Assim, é importante que sejam avaliados os seguintes aspectos:
· A espontaneidade do grupo na realização das tarefas propostas;
· Aprofundamento e qualidade da reflexão sobre as idéias apresentadas, o surgimento de novos conceitos e os aspectos trazidos pelos adolescentes para as discussões e análises;
· A inclusão dos temas já apresentados, através de idéias que reflitam a boa apreensão das informações, nas discussões e trabalhos coletivos.
· A assiduidade e interesse dos adolescentes nas oficinas e no projeto final;
· A qualidade do projeto final a ser executado por eles, sua pertinência e factibilidade, a análise situacional feita, a priorização das necessidades e outros itens que sejam considerados importantes.
Análise preparatória para programação de oficina
A aplicação prática desse modelo metodológico de oficina educativa não terá consistência e, dificilmente alcançará seus objetivos se não for baseada em uma análise criteriosa da situação que será abordada, bem como o perfil do grupo no qual a oficina será aplicada. Para tanto, é importante, que se analise, também, a comunidade onde o grupo de adolescentes a ser trabalhado está inserido. Para tanto, a resposta às questões que se seguem são fundamentais.
POR QUE?
SOBRE O QUE?
PARA QUEM?
PARA QUE?
COMO?
O porquê reporta-se às necessidades levantadas através do diagnóstico situacional bem feito, abarcando os problemas de saúde da comunidade, os fatores da incidência de risco. Saber quais os grupos que convivem com maior risco, quais e quantos são os equipamentos sociais disponíveis na comunidade, bem como seus recursos físicos, humanos e financeiros é uma questão imprescindível.
A priorização das necessidades irá definir sobre o que iniciará a intervenção; quais as mais urgentes e/ou as que melhor desencadeariam o processo de educação preventiva. É preciso ressaltar que cada necessidade priorizada deverá ser abordada no conteúdo programático.
A comunidade, onde acontece a intervenção deve participar, para que o diagnóstico e a priorização retratem, realmente, suas necessidades. Essa participação é fundamental, uma vez que a continuidade do processo educativo dependerá de sua apropriação pela comunidade.
Os três momentos restantes - o perfil do grupo, definição dos objetivos e da metodologia - são conseqüentes ao diagnóstico e priorização das necessidades realizadas pelos profissionais que desenvolverão as oficinas.
O perfil do grupo-alvo deverá retratar, fielmente, suas características específicas, desde a faixa etária, situação sócio-econômica, familiar e cultural, nível médio de escolaridade, até a configuração das necessidades que influenciam no processo de saúde-doença.
A partir da análise do que for levantado, os objetivos serão determinados e, em conseqüência destes, serão escolhidos os recursos metodológicos que facilitarão o processo de ensino aprendizagem, nos quais não poderão faltar projetos com programação simplificada.
Feita a programação, esta será apresentada e discutida com o grupo-alvo na primeira oficina, podendo ser modificada para atender às novas demandas do grupo.
A prática desse modelo metodológico tem mostrado bons resultados comprovados, primeiramente pelas mudanças positivas na auto-estima dos adolescentes, medidas na Bahia, por instrumento criado pelo Dr. Álvaro Tamayo do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília. Essas mudanças mostraram-se constantes e estatisticamente significativas, um mês após a realização das oficinas. O instrumento foi aplicado no início da primeira e ao final da última oficina de capacitação e um mês após, para o mesmo grupo.
Outro resultado positivo observado foi o envolvimento constante dos adolescentes nos trabalhos realizados junto com os profissionais responsáveis pela continuidade da ação no Distrito Federal, Sergipe, Bahia e Ceará. Os projetos planejados e realizados por adolescentes promotores de saúde em suas comunidades no Distrito Federal, Bahia e Sergipe, revelaram-se bastante eficazes.
Outro ponto importante, levantado nas experiências já realizadas, é a continuidade dos projetos feitos por adolescentes. Observou-se que, ao cessar a fase de acompanhamento do grupo pelos profissionais responsáveis, a tendência dos adolescentes é diminuir e espaçar muito os seus projetos, contribuindo para a perda de continuidade, o que pode inviabilizar a ação educativa na comunidade.
Para que haja continuidade, além da apropriação dessas ações pela comunidade, é necessária a existência de um “ponto aglutinador” para o grupo de adolescentes promotores de saúde. Este pode ser, tanto uma pessoa da comunidade, quanto uma dos serviços, desde que esteja envolvida no processo. Funcionando como ponto aglutinador deverá ter conhecimento das características , dos fatores de risco e protetores próprios dessa fase evolutiva. Além de obter a confiança dos adolescentes, deve possuir disposição interna para entender e auxiliar o grupo.
Assim, esse ponto aglutinador torna-se necessário para impedir a dispersão do trabalho. Serve de apoio, orienta em caso de dúvidas, auxilia na elaboração de projetos e, em função das características do adolescente, inspira confiança no grupo promotor de saúde e está disponível para ajudar a suprir as necessidades que surgirem.
Dessa forma, fica evidente que uma ação educativa para o autocuidado durante a adolescência transcende a questão do simples repasse de informações sobre saúde. Faz parte de uma ação mais ampla de educação continuada que, na medida das necessidades, aprofundará ou direcionará as informações e ações subseqüentes em saúde na busca de soluções para os problemas emergentes. Sua finalidade maior é educar cidadãos para serem responsáveis, saudáveis, críticos e atuantes na sua comunidade, sem esquecer que:
“A mudança objetiva é dança muda de passos curtos e ligeiros, firmes e diretos como o xaxado e a catira. Nada a ver com os passos largos e lentos, esvoaçantes e volteados da valsa tradicional”.
Referência
bibliográfica
Britto, Sulamy, A Psicologia Centrada no Estudante, Campinas; Editora Papirus; 1983.
Costa, G. A.C.; Por uma Pedagogia da Presença; Brasília, Ministério da Ação Social, 1991.
Serra, Lemos; A.S.; Relatórios sobre a Formação de Adolescentes como Promotores de Saúde, Brasília, memo, 1991, 1992 e 1993.
Leif, Joseph; Brunelle, Lucien; O Jogo pelo Jogo, Rio de Janeiro; Zahar Editores; 1978.
Winnicott, D. W.; O Brincar e a Realidade; Rio de Janeiro Imago Editora; 1975.
Virgolim, A, M, R; Alencar, S, E; org. Criatividade Expressão e Desenvolvimento; Petrópolis; Ed. Vozes; 1994.
Ministério da Saúde; Promoção da Saúde; Brasília; 1996.
Notas:
[1] Ana Sudária de Lemos Serra - Psicóloga, psicoterapeuta de adolescente, especialista em Violência Doméstica e em Educação Sexual. Pioneira na implementação de Cursos de Adolescentes como Promotores de Saúde. Trabalhou como consultora de PROUNI/UNIA - Adolescente da Universidade de Brasília, para a Fundação Hospitalar do DF para formação de redes de apoio ao adolescente. Foi presidente do Conselho Regional de Psicologia da Região 01. Desde 1994 é consultora técnica/especialista da Área de Saúde do Adolescente e do Jovem.
[2] Lucimar Rodrigues Coser Cannon - Médica, ginecologista, MPH, PhD, especialista em Planejamento de Saúde. Trabalhou como coordenadora de Programas Especiais de Saúde do INAMPS/MPAS, consultora da OPAS para implementação e avaliação do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher/PAISM, coordenadora do Programa de Saúde do Adolescente/PROSAD/MS e Coordenadora Geral de Planejamento do Ministério da Saúde. Realizou consultorias internacionais para OPAS na área de saúde do adolescente. Integrou equipes de trabalho para elaboração de programas do FNUAP, UNICEF e outras agências. É conselheira do Conselho Nacional de Saúde e do CONANDA, bem como, membro da Comissão Nacional de População e de Desenvolvimento e do Comitê Assessor do Departamento de Saúde da Criança e do Adolescente da OMS/Genebra, representando a América Latina. Coordenou a Campanha Nacional de Prevenção do Câncer Cérvico-Uterino (1998) e, atualmente, coordena a Área de Saúde do Adolescente e do Jovem do Ministério da Saúde.
[3] Texto extraído em: http://www.adolec.br/bvs/adolec/P/cadernos/capitulo/cap27/cap27.htm