O ABUSO SEXUAL COMETIDO CONTRA A CRIANÇA E O
ADOLESCENTE: UMA VISÃO INTRAFAMILIAR
Especialista em Direito Processual, RS.
1 Introdução
O
presente artigo versa sobre o abuso sexual cometido contra a criança e o
adolescente sob uma visão intrafamiliar e tem por finalidade averiguar a
vinculação direta da família na maioria dos casos de violência imposta à
infância e juventude, principalmente no que diz respeito ao abuso sexual,
buscando-se, dessa forma, explicar por que os pais são os principais agressores
e quais são as conseqüências de tal ato brutal que faz da criança e do
adolescente vítima, bem como se analisa o perfil do agressor e o papel da
família e do Estado frente a tal violência que pode ser
considerada uma das maiores tragédias da humanidade, onde pais violentam
suas proles como se estas fossem objetos de manipulação.
Tema
esse, extremamente relevante e delicado, apesar de ser muito divulgado na mídia
e pouco discutido nos meios jurídicos, podendo ser considerado a pior violência
cometida contra a criança e o adolescente e que a cada dia
que passa tem se mostrado mais assustadora para não se dizer aterrorizante.
Ademais, a realidade da
justiça brasileira não se mostra eficiente, visto que a própria previsão legal
para a proteção das vítimas desse tipo de violência é insuficiente, pois apesar
de os direitos da criança e do adolescente tenham sido recepcionados pela Carta
Magna, abrindo portas para legislação específica de proteção da infância e
juventude e que os considerassem sujeitos em desenvolvimento e cidadãos de
direito, mesmo assim, deixa o Estatuto da Criança e do Adolescente a desejar,
pois não define com clareza o crime de abuso sexual, e por sua vez, deixa de
proteger as vítimas dessa violência.
Da mesma forma, há de se
criticar nosso Código Penal Brasileiro que também não faz menção à proteção de
crianças e adolescentes vítimas da violência sexual e doméstica, sendo
inclusive conivente com essa espécie de violência, visto que é capaz de aplicar
penas a pessoas próximas da criança e o adolescente de forma mais branda do que
se a mesma violência fosse intentada por um terceiro ou estranho à vítima.
Com o
presente trabalho tenta-se mostrar que a família não é sagrada, nem intocável e
que pode em alguns momentos, e não raramente, apresentar grandes riscos à
integridade física, moral e emocional de uma criança ou adolescente.
Com efeito, perseguindo a
nossa legislação escassa e a doutrina por muitas vezes diversa da do direito,
observa-se a violação dos direitos fundamentais da
pessoa humana dentro do próprio lar da criança e do adolescente, sendo que as
seqüelas, mais cedo ou mais tarde, irão apontar uma infância ou juventude
impregnada de ódio e de violência, capaz de levá-los a um círculo vicioso sem
fim.
É
dessa maneira, que dedico o presente artigo a todas as crianças e adolescentes
vítimas da violência, mormente àquelas que são abusadas sexualmente todos os
dias, na sua maioria vitimizadas pela própria família, pela sociedade que cala
e pelo Estado que não reage, diante de uma das maiores tragédias da humanidade.
Dedico,
também, a todas aquelas pessoas que militam pela abortagem de tal violência,
que não fecham os olhos, que não se ensurdecem ou emudecem diante de tal
situação, que preferem conjugar o verbo agir ao verbo ignorar, e que lutam para
que a sociedade autofágica em que vivemos torne-se capaz de proteger suas
crianças e adolescentes, não deixando que seus direitos fundamentais, entre
eles a convivência familiar, sejam burlados de forma a matá-las, destruí-las ou
violá-las como se estivessem apenas imolando-as.
2 O pesadelo refletido na palavra “violência”
2.1 Um breve histórico sobre
a criança e o adolescente, sob o enfoque da violência
Ao longo dos tempos observa-se o desenvolvimento
da infância e da juventude alicerçado sobre bases repletas de um alto grau de
violência, facilmente transformável em violência direta e abusos. E é buscando
essas bases históricas que preceitua Afonso, dizendo que: “Ao longo da história
as crianças e os adolescentes estiveram sujeitos às mais bárbaras formas de
punição, inclusive as mesmas aplicadas aos adultos”. (2)
Assim, a violência pode ser considerada uma
forma de relação social que expressa modos de vida, padrões de sociabilidade e
modelos de comportamentos vigentes numa sociedade em determinado momento
histórico. Representa, ainda, relações entre classes sociais e relações
interpessoais, e o que é mais importante e triste, encontra-se impregnada nas
relações entre adultos e crianças, resultando na coisificação das últimas.
Assim, o ato violento cometido contra a criança
e o adolescente pode ser considerado a negação dos valores universais como: a
liberdade, a igualdade e, acima de tudo, ao direito primordial do ser humano,
que é o direito à vida. Dessa forma, a violência apresenta-se como uma
manifestação de sujeição e coisificação do ser humano, atentando contra a
construção de uma sociedade de homens livres, passando a ser considerada uma
ameaça constante ao direito à vida.
Elaborada, por vez, uma reconstrução
crítica da história da cultura da violência, pode-se estabelecer um paralelismo
que nos permite entender a sua forma mais brutal, qual seja, o extermínio de
crianças e adolescentes por parte de determinadas categorias.
Na Grécia, os governos eram formados
a partir da vontade do chefe da família, sendo que as crianças débeis
geralmente eram mortas, enquanto que as sadias permaneciam vivas em número
suficiente para a defesa do Estado. Em Roma isso também acontecia, sendo que
eram mortas as crianças com problemas mentais, bem
como as do sexo feminino. O mesmo aconteceu na cidade de Esparta e na antiga
Cartago onde a prática comum era o oferecimento das crianças aos deuses como
prova do sacrifício dos adultos, sendo que elas eram imobilizadas, drogadas e
posteriormente queimadas.
Diferentemente das sociedades
já mencionadas, o povo hebreu, que não admitia nem o aborto
nem o sacrifício das crianças, pois tinham como princípio a perpetuação
da espécie, defendiam, contudo, a venda dos filhos dos escravos para que assim
fosse resolvido o problema da pobreza. Platão e Aristóteles admitiam o
infanticídio e o extermínio das crianças, chegando ao ponto em que Aristóteles
propôs a elaboração de uma legislação de controle de natalidade, na qual decidia-se as crianças que deveriam perecer, tirando desses
seres humanos o direito que têm à vida.
Na Idade Média, se uma
criança viesse a falecer, o que não era raro, outra criança a substituía com a
maior facilidade, passando a história da infância e juventude a ser coroada
como:
“um pesadelo do qual
recentemente começamos a despertar. Quanto mais atrás regressamos na história,
mais reduzido o nível de cuidado com as crianças, maior a probabilidade de que houvessem
sido assassinadas, abandonadas, espancadas, aterrorizadas e abusadas sexualmente. (3)”
A
vida das crianças no século XVII até a segunda metade do século XVIII não era
fácil. Conquanto nascidas de famílias abastadas, elas eram encaminhadas às nutrizes e depois permaneciam em média quatro ou cinco
anos com os pais até irem para os conventos ou colégios internos. As crianças
pobres eram aleitadas também por nutrizes e muitas acabavam morrendo ou
engrossando as fileiras dos despossuídos que vagavam pelo mundo. De uma forma
ou de outra, o que se sentia de maneira concreta era que as crianças viviam em
perene estado de abandono, quer físico, quer moral, quer sentimentalmente.
Até
essa época as crianças tinham pouco significado no seio da família, havia uma
indiferença pela sua sorte, tanto pelo pai como pela mãe.
Assim entre o século XVII e
XVIII a natureza infantil não tinha especificidade, nem valor. A criança
deveria ser educada através de castigos corporais introduzidos pelos adultos.
Essa espécie de violência se configurava como importante enquanto imposta às
crianças, visto que o flagelo de seu corpo era considerado importante para
salvar a sua alma.
Sendo
assim, pode-se observar que quanto mais se retorna ao princípio da história da
humanidade, cada vez mais encontramos o pouco envolvimento dos pais nos
cuidados aos seus filhos e que se hoje nos espantamos com a quantidade de
crianças vítima de violências, maiores são os números ao regredirmos na nossa
história.
Por
muitos séculos a importância do pequeno ser humano foi tão banalizada, de forma
que até os animais tinham uma Sociedade de Proteção, enquanto que a criança nem
sequer era respeitada como ser humano dentro de sua própria família.
A
história brasileira da criança e do adolescente vítimas
da violência doméstica surgiu, como em qualquer parte do mundo, como se fosse
um instrumento de educação e submissão dos filhos aos pais. Essa violência
institucionalizada no lar permeia a história das crianças e dos adolescentes na
sociedade brasileira, por meio de diferentes práticas, culminando na maioria
das vezes, na repressão e no silenciamento destes.
Assim,
pode-se dizer que o resgate da história de crianças e adolescentes
brasileiras objetiva a percepção dos diferentes processos que foram submetidos
e sua relação com o exercício da violência, principalmente aquela que mais lhe
é imputada, ou seja, a violência doméstica e, mais minuciosamente, o abuso
sexual.
A
sociedade brasileira está habituada a considerar a violência como uma transgressão de regras e leis aceitas pelo todo e das
quais depende para continuar existindo. Dessa forma, a violência está longe de
ser considerada estranha à sociedade; bem pelo contrário, muitas vezes ela é
utilizada como forma de regular as relações sociais e superar os conflitos.
Para tanto, é preciso que se
analise a configuração do poder na família, a imagem da criança em seu seio, de
acordo com as conjunturas históricas das diferentes épocas, para que se possa compreender os vários momentos da violência no âmago
da família brasileira.
O
fenômeno da violência contra a criança e o adolescente em nosso país
possivelmente esteve presente tanto no Brasil Colônia (1500-1822), quanto no
Brasil Império (1822-1889) e no Brasil República (1889 – até os dias de hoje)
Sabe-se,
no entanto, que a idéia de aplicação de castigos físicos em crianças foi
introduzida pelos jesuítas, pois para eles o mimo deveria ser repudiado, sendo
que os vícios e os pecados deveriam ser combatidos com os açoites e castigos, e
os espancamentos tinham como objetivo ensinar as crianças que a obediência aos
pais era a única forma de escapar da punição.
Nesta
época aconteceu muito que se pode chamar de violência-escravidão,
principalmente quando caracterizado pela violência sofrida por crianças e/ou
adolescentes escravos, que passavam pelos mais terríveis castigos físicos e por
sevícias sexuais (crueldades sexuais) como estupros perpetrados por rapazes
brancos.
A
sociedade legitima essa espécie de violência, pois, só em 1927, com o advento
do Código de Menores, que tal matéria foi disciplinada, e mesmo assim, o nosso Código Penal, datado de 1940, tratou apenas dos
castigos imoderados, sendo que a violência contra a criança e o adolescente só
é considerada crime quando praticada de forma imoderada, agora quando praticada
para a correção é considerada lícita.
Assim,
o disciplinamento corporal de crianças e adolescentes
está longe de ser uma prática do passado, pois vive entre os povos até hoje,
ganhando dimensões cada vez mais amplas, à medida que as denúncias vão
ocorrendo e os números vão aparecendo.
Dessa forma, a
violência doméstica cometida contra a criança e o adolescente pode ser
conceituada da seguinte fora:
“É
todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra a
criança e o adolescente que – sendo capaz de causar dano
físico, sexual e/ou psicológico à vítima – implica de um lado, numa
transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, de outro, numa
coisificação da infância, isto é, numa negação do direito que crianças e
adolescentes têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar
de desenvolvimento”. (4)
A
violência doméstica afigura-se como um abuso do poder/dever de proteção
familiar de que a infância e a adolescência precisa para se desenvolver, caracterizando-se
aqui pela influência do pátrio poder, ou melhor, do pátrio dever que tem os
pais de assegurar a proteção de seus filhos, podendo levar ao que se chama de
coisificação da criança e do adolescente em virtude do poder que é exercido de
forma demasiada e agressiva por parte dos pais.
Seguindo, ainda, o pensamento
de Guerra, pode-se dizer que a violência doméstica consiste:
a)
numa transgressão do poder disciplinador do adulto, convertendo a diferença de
idade, adulto/criança/adolescente, numa desigualdade de poder intergeracional;
b) numa negação do valor da liberdade: ela exige que a criança ou o adolescente
seja cúmplice dos adultos, num pacto de silêncio; c) num processo de
vitimização como forma de aprisionar a vontade e o desejo da criança ou do
adolescente, de submetê-la ao poder do adulto a fim de coagi-la a satisfazer os
interesses, as expectativas e as paixões deste. (5)
Por conseguinte, a violência
doméstica que encobre o abuso sexual cometido contra crianças
e adolescentes representa toda a forma de omissão praticada pelos pais,
parentes ou responsáveis, capazes de causar danos físicos, sexuais e/ou
psicológicos à vítima.
Buscando os fatos históricos,
conclui-se que foi apenas após a Revolução Francesa que os direitos relativos
às crianças e aos adolescentes começaram a despontar em diversos países,
aperfeiçoando-se e ganhando força. Todavia, apesar de nessa época terem surgido
as primeiras sociedades protetoras da infância, com a
conseqüente responsabilização do Estado, a violência continuou e ainda continua
até hoje, sendo que em muitos casos patrocinada pelo próprio Estado que não
garante a sua população os direitos que a eles são inerentes.
Demonstra-se
dessa forma que a violência doméstica sempre esteve presente de forma endêmica
nesta sociedade, sendo considerada resultado lógico de uma sociedade que
incorpora a força física como meio de educar uma parcela de nossa população que
corresponde às crianças e os adolescentes, sem sequer se preocupar com a
extinção dessa população que poderia aprender a viver sem violência se contra
ela não fosse infligida tal.
2.2 As espécies de violências domésticas
praticadas contra a criança e o adolescente
Segundo
Edson Passetti, com a violência cometida contra a criança e o adolescente,
encontra-se o “reaparecimento do suplício, que não é mais considerado como
espetáculo público, mas como tragédia privada”. (6)
Assim, a violência doméstica cometida
contra a criança e o adolescente, segundo Josiane Rosa Petry Veronese, pode ser
classificada e resumida da seguinte forma:
-
é uma violência interpessoal;
-
um abuso do poder disciplinador e coercitivo dos pais ou
responsáveis;
-
é um processo de vitimização que às vezes se prolonga por vários meses e até
anos;
-
é um processo de imposição de maus-tratos à vítima, de sua completa
objetalização e sujeição;
-
é uma forma de violação dos direitos da criança e do adolescente como pessoa e,
portanto, uma negação de valores humanos fundamentais como a vida, a liberdade
e a segurança;
-
tem na família sua ecologia privilegiada. Como esta pertence à esfera do
privado, a violência doméstica acaba se revestindo da tradicional
característica do sigilo. (7)
Os
maus-tratos podem ser classificados em intrafamiliares e institucionais. Os
primeiros podem ser cometidos pelos pais, demais familiares ou pessoas próximas
a convivência, da criança e do adolescente, podendo
ser facilmente perceptíveis, pois podem ser classificados em maus-tratos
físicos (quando há lesões orgânicas facilmente diagnosticadas); emocional e/ou
psicológico (que prejudicam a competência emocional da criança); negligência
que se configura pela omissão de nutrientes e estímulos; e ainda os abusos
sexuais, que segundo Farinatti:
“...
correspondem a atos sexuais impostos a uma criança ou adolescente por um adulto
que explora seu poder sobre ele/ela, sob forma de toques, de relações sexuais
orais, anais ou genitais e violação, isto é, relações sexuais que não
sintonizam o nível de desenvolvimento da criança, a qual é incapaz de dar o seu
consentimento. (8) (1997, p. 87)".
Já os maus-tratos
institucionais são violências ou negligências que ocorrem em instituições que
se dizem protetoras das crianças e dos adolescentes como: hospitais, escolas,
instituições para crianças que estejam em situação de risco ou adolescentes
infratores.
O
tema da violência na infância é considerado abrangente. Pode-se situar, dentro
desse quadro, a criança abandonada, a desassistida, a
agredida física, psicológica e sexualmente, além daquelas que estão
excluídas do ensino, que são submetidas a drogadição e ao alcoolismo precoce,
aquela assassinada por grupos de extermínio, civis ou militares, aquela que
desaparece para servir no comércio internacional de órgãos humanos.
Quando
se fala da violência que tem como vítima a criança, logo a associamos ao
fenômeno dos maus-tratos e da violência sexual. De fato, essas duas formas são,
de certo modo, as mais visíveis. Além disso, os meios de comunicação social têm
demostrado aberrações que ocorrem nesse campo no nosso país.
A violência doméstica se
apresenta sob quatro tipos reconhecidos e já citados: a violência física,
violência sexual, violência psicológica e negligência, que para efeitos de
estudos e didaticamente, são separadas, embora se saiba que podem, em termos de
um mesmo caso, surgir em conjunto, como é o caso do abuso sexual, tema do
presente artigo. Esse é um problema que deve ser tratado com muito cuidado,
pois diz respeito à violência sexual em suas múltiplas abordagens como: o
estupro, o atentado violento ao pudor, a prostituição, a corrupção de menores,
a pornografia e acima de tudo a violência sexual mais silenciosa e menos
aparente entre elas, que é o abuso sexual que ocorre dentro da própria família,
tendo o aval da sociedade e do descaso por parte do Poder Público.
Segundo
o que preceitua Veronese, a violência ou abuso sexual doméstico “é aquele que
tem por vítima a criança ou o adolescente e como vitimizador os próprios pais -
biológicos ou por afinidade, responsáveis, tutores, guardiões – e demais
parentes, como irmãos, avós, tios, primos...” (9).
Percebe-se que a violência
circunda nossas crianças e adolescentes, sendo que a pior de todas as violências
é aquela que ocorre dentro do lar, aquela cometida pelos pais ou mesmo por
outro conhecido da criança e do adolescente. Observa-se, também, que de todas
as violências domésticas a que mais seqüelas pode trazer
é aquela que diz respeito à violência sexual, caracterizada minuciosamente por
todas as facetas que o abuso sexual pode mostrar.
3
O abuso sexual e a relação intrafamiliar
3.1
Conceito de abuso sexual e a sua vinculação direta e indireta com a família
Segundo
Azevedo e Guerra, abuso-vitimização-sexual é todo:
“ato
ou jogo sexual, relação heterossexual ou homossexual entre um ou mais adultos e
uma criança menor de 18 anos, tendo por finalidade estimular sexualmente a
criança ou utilizá-la para obter uma estimulação sexual sobre sua pessoa ou de
outra pessoa. (10)”
Entretanto,
trata-se aqui de abuso-vitimização-sexual doméstica. Daí deve-se substituir na
definição acima a expressão adulto - genérica demais – por pais e parentes (biológicos
ou por afinidade), responsáveis, tutores, podendo, inclusive, classificar essa
violência como sendo incestuosa, que se configura pela “atividade sexual
realizada entre um adulto e uma criança e/ou adolescente, em que há traços de
consangüinidade, seja de afinidade ou de mera responsabilidade”. (11).
Seguindo uma linha de
pensamento podemos classificar os abusos sexuais cometidos contra a criança e o
adolescente da seguinte maneira:
Abusos Sensoriais (pornografia, exibicionismo, linguagem sexualizada), podendo
estar aqui caracterizada a pedofilia;
Abusos por Estimulação (carícias íntimas, masturbação, contatos genitais incompletos),
podendo caracterizar o atentado violento ao pudor; e
Abusos por Realização (tentativa de violação ou penetração oral, genital ou anal),
podendo caracterizar o estupro.
Assim,
entende-se que a infinita maioria dos abusos sexuais, sem dúvida alguma, ocorre
dentro da própria casa da criança e do adolescente, cujo arquétipo pode ser
representado pelo incesto entre pai e filha, sendo raros, mas não impossíveis,
os abusos sexuais entre mãe e filho, pois é ela que se ocupa diretamente da
criança desde a tenra idade.
O abuso sexual doméstico é um
fenômeno que envolve medo, vergonha e culpa. Por isso é cercado por uma espécie
de complô do silêncio, tão difícil de ser rompido, podendo ser descobertos por
meio de indicadores comportamentais inapropriados para a idade como:
1.
uma criança que, por palavras, brincadeiras ou desenhos sugere um conhecimento
sexual inapropriado à sua idade;
2.
uma criança que se preocupa extensivamente com questões sexuais e um
conhecimento precoce de comportamento sexual adulto;
3.
uma criança mais velha que se conduz de modo sexualmente precoce, isolando-se
de seus grupos de colegas e atrai comportamento crítico e sedutor por parte dos
adultos;
4.
os pedidos de informações sobre métodos contraceptivos não são raros em
crianças sexualmente abusadas e podem ser um grito de ajuda (12).
Segundo
Pavlovsky, citado por Martha Herzberg, “o silêncio cúmplice tem se tornado
também pornograficamente visível”. (13) E, para complementar a citação,
pode-se dizer que a exclusão, o desrespeito, a violência e a omissão produzidas
contra a criança e o adolescente encontram-se naturalizados na cultura
patriarcal, não sendo considerado a rigor invisível, mas invisibilizado.
Assim,
geralmente, nas famílias em que há o abuso sexual, há, também, o
estabelecimento de um tipo de aliança solidária entre o abusador e o seu
cônjuge, pois dificilmente um exercerá este tipo de violência sem a
cumplicidade silenciosa do outro, passando, por vezes, o companheiro
não-agressor a fugir da situação, sem nem sequer tomar as devidas precauções
frente à vítima, que, por sua vez, acaba por ser inserida nesta aliança devido as diversas ameaças que sofre e quando rompe com essas
barreiras, por muitas vezes, defronta-se com o descrédito dos adultos.
Uma
outra questão a ser considerada é que o abuso sexual cometido contra a criança
e o adolescente, não é denunciado, na maioria dos casos, seja por medo pela
forma com que a sociedade de modo geral possa compreender, seja porque ao
denunciar tais fatos, estes poderiam comprometer a imagem futura deste
miniadulto em potencial.
Ainda
não temos no Brasil e mesmo no mundo, uma forma de precisar as estatísticas que
circundam a violência doméstica que envolve a criança e o adolescente,
principalmente no que diz respeito ao abuso sexual, visto que são poucos os
casos denunciados, pois são acobertados, escondidos pelo “pacto do silêncio”,
que circunda esse tipo de violência e da qual acabam sendo co-responsáveis
outras pessoas da família, os vizinhos, a vítima e até mesmo os profissionais
que atuam no caso.
Cabe salientar, também, que a violência que
ocorre no interior da família, principalmente o abuso sexual, se apresenta como
uma das maiores responsáveis pela vitimização da infância, estimando-se que 63%
dos casos ocorrem no seio familiar, sendo que deste percentual, 71% dos abusos
sexuais são praticados pelos pais, padrastos, tios, dentre outros familiares da
vítima, devendo por vezes ser encarado como um problema de saúde pública. (Dado
do Programa Fantástico, 18/05/2003).
O
abuso sexual só não é a violência mais corriqueira porque muitos dos seus casos
encontram-se escondidos atrás de uma fumaça de silêncio e preservação da
família, pois se pode dizer que é a violência mais terrível,
cometida contra a criança e o adolescente deixando seqüelas
incalculáveis e de difícil reparo.
Sabe-se que quanto maior fora
o pacto do silêncio maiores serão os números dessa
violência que ficarão impunes, sendo que as necessidades biológicas e afetivas
(a dependência da criança e do adolescente) operam como justificativa moral
para perpetuar o modelo de quem manda e de quem é mandado. Surge aqui, uma
espécie de submissão da criança ao adulto, da filha ao pai, que age dessa forma
para cobrar uma dívida que para o pai nunca será paga.
O complô de silêncio que
ronda essa espécie de violência contribui, também, para que a sociedade se
mantenha descompromissada em termos de proteção à criança e o adolescente,
deixando de lado a discussão sobre as formas de proteção e política de
atendimento às crianças e adolescentes vítimas dessa violência que assola a
nossa realidade.
A violência doméstica treina
a criança a aceitar e tolerar a violência na medida em que tais atos feitos
pelos adultos destinam-se a ensinar obediência e submissão. Assim, a criança e
o adolescente que foram criados debaixo de mau tempo e de violência, tendem a
usar esse modelo de violência que causaram angústia, ansiedade, medo, terror,
ódio e hostilidade, dentro das suas relações com adultos e especialmente contra
seus filhos e pessoas queridas.
3.2 Motivos que levam os membros da família a serem os principais abusadores
A violência doméstica afigura-se
pelo abuso de poder que o adulto exerce sobre a criança ou o adolescente,
violando os direitos essenciais desta mesma infância e adolescência e
constituindo-se numa negação de valores humanos fundamentais.
Há, aqui, uma concepção
extensiva e ilimitada do pátrio poder, que leva os pais a pensarem que podem
decidir sobre a vida e a morte de seus filhos, mas não pensam eles que o filho
no momento em que sai do ventre de sua mãe está vindo para o mundo, para ter a
sua própria vida e não para servir, exclusivamente, aos caprichos e desejos de
seus pais.
Segundo a psicóloga Heleieth Safiiotti, citada num documentário produzido pelo “SBT Repórter” no ano de 1998,
e que tinha como tema o abuso sexual e a pedofilia, o agressor,
majoritariamente é homem, visto que a própria sociedade, desde os primórdios,
lhe permite um poder sem limites. É assim considerada por Heleieth uma hierarquia que legitima a violência, ou seja, se o
homem não consegue exercer o poder sem violência física ou sexual, ele o
exercerá através da violência seja o tipo que for.
Segundo Barison,
“a violência doméstica contra a criança e o
adolescente é um fenômeno que ainda é tratado com um certo pudor: a família é
considerada um santuário, onde ninguém tem o direito de interferir e questionar
as atitudes dos pais, pois há um mito que os envolve. Mito que confere aos
responsáveis uma imagem de protetor e guardião da criança. É que, pressupondo a
existência da relação de afeto (os pais sempre amam seus filhos), toda atitude
tomada pelos pais é ‘justificada’ pela sociedade. (14)”
Conforme Guerra, “diversos
autores na área da sociologia da família entendem que, no momento atual, a
família atravessa uma crise”, (15) sendo que as condições sócio-econômicas
da família não são determinantes para a violência, contudo nota-se que são nas
famílias mais empobrecidas que ocorrem os maiores índices de situações de
violência e de abusos sexuais.
Apesar de ter os seus maiores índices nas
classes mais desfavorecidas, há de se registrar que o abuso sexual ocorre em
qualquer classe sócio-econômica, não se caracterizando como um problema
associado à classe baixa, como originalmente se pensava. A única diferença é
que os abusos sexuais que ocorrem nas classes mais elevadas são, apenas, mais
difíceis de serem detectados, se apresentam vulneráveis a denúncias e à
vigilância, não sendo alvo de visitas da assistência social, sendo remotas as
possibilidades de intervenção do Poder Judiciário, uma vez que suas condições
econômicas e sociais permitem maior privacidade no mascaramento dos mesmos
excessos que ocorre nas classes mais miseráveis.
Dessa forma, o abuso sexual acontece em todos os
níveis sociais, mas, nas classes desfavorecidas, sua presença é mais evidente,
porque que nas classes bem-sucedidas a violência é filtrada, escondida debaixo
do tapete, sendo que inclusive os profissionais que atuam nessa área não
denunciam por medo de perder sua clientela. Já nas classes mais pobres é mais
freqüente, porque o atendimento as vítimas normalmente é feito em serviços
públicos de saúde.
Segundo Santos, “vários fatores são imputados
como predisponentes dos abusos sexuais em nosso meio: a promiscuidade familiar
nos locais de baixa renda, falta de estímulos ao lazer, uso de tóxicos, bebida
alcoólica, entre outros”. (16)
Quando o agressor é alguém da própria família, o
diagnóstico do abuso sexual é de difícil detecção, depende, inclusive, de um posicionamento de ruptura de
passividade, de um dos cônjuges ou mesmo da vítima, sem falar que segundo
Santos, “associa-se a esse fator, a dificuldade de comprovação de formas de
abusos sexuais, como as sevícias, a pedofilia, dos atos de libidinagem, o sexo
oral, e outros que não são detectados fisicamente”. (17)
Em casos de abusos sexuais, a criança é
comparada a mulher que é estuprada,
preconceituosamente. Geralmente, não se dá crédito ao relato da criança ou
adolescentes abusados sexualmente, sendo considerado tal fato como se fosse
fruto da imaginação ou fantasias sexuais da criança, cabendo salientar que o
conhecedor da matéria sabe que uma criança não faz comentários sobre situações
sexuais que desconhece.
Outra situação que, segundo Guerra, tende a
levar para os atos violentos é aquela que diz respeito ao trabalho, pois o homem
despojado de sua força e prestígio no trabalho e na família tende a recuperar
seu entusiasmo e respeito através do emprego da violência, inclusive o abuso
sexual.
O trabalho é vital para a sobrevivência da família,
sendo que o desemprego também pode causar conseqüências possíveis de engendrar
atitudes violentas principalmente pelo homem, visto que ele se vê despossuído
da qualidade de responsável pela manutenção da família.
Dessa forma, o problema não
diz respeito à classe social, nem ao credo político ou religioso, de nível
educacional ou econômico, pois esse tipo de violência cometida contra a criança
e o adolescente ocorre em qualquer âmbito da sociedade, apesar de aparecer com
mais freqüência nas classes mais baixas, devido aos registros de ocorrência que
chegam até as delegacias de polícia todos os dias.
Os números dessa violência, nas classes
mais abastadas, por muitas vezes, acabam por ser camuflados,
escondidos numa fumaça de silêncio, pois a
vergonha de ver a família destruída ou falada perante a comunidade faz com que
essas pessoas escondam a verdade e gastem o dinheiro que for preciso para
tratar e fazer com que quem fora violentado esqueça o episódio como se nada
tivesse acontecido, como se aquilo fosse uma página rasgada da vida daquela
criança ou adolescente.
Faz-se importante destacar que as transformações
socioeconômicas ocorridas no nosso país, acompanhadas de graves problemas
comunitários no meio adulto, refletem também no que diz respeito às crianças e
aos adolescentes. Logo, o desemprego, o subemprego, os baixos salários, a falta
de moradia, o êxodo rural, os filhos não desejados, o alcoolismo e as drogas
são problemas comuns, causadores da desestruturação da instituição familiar,
que é a base para uma vida saudável no que diz respeito à criança e o
adolescente.
Conforme especificado acima preceitua, ainda,
Afonso dizendo que:
“A partir do momento que ocorre a
desestruturação da instituição familiar, ocasionada por fatores diversos ao meio,
ocorrem também, atos de violência e agressões mútuas, tornando o convívio
familiar uma ameaça. Desta forma surge a violência
doméstica contra a criança e o adolescente como um abuso do poder disciplinar,
coercivo que os pais têm em relação aos filhos. Tal abuso pode durar meses ou
anos, porque a família pertence a uma categoria privilegiada, ou seja, a esfera
do privado, logo, a violência doméstica acaba se revestindo da característica
do sigilo”. (18)
Há de se observar, também, que os fatores
estressantes, tais como: o luto e as separações são capazes de determinar em
certos momentos uma atitude agressiva por parte do adulto, sendo que toda essa
agressividade irá despontar no momento em que surgir
na frente do violentador uma “criança-alvo”, com seu jeito frágil e inocente
submisso a qualquer atitude do adulto.
Para finalizar este item é relevante citarmos
que os principais denunciantes dos casos de violência sexual
cometidos pelos próprios pais são, na maioria dos casos, os vizinhos e
conhecidos, sendo que a vítima e seus irmãos, geralmente, não denunciam visto
que se encontram emudecidos pelas ameaças do violentador.
3.3 De quem
é a responsabilidade no caso de abuso sexual intrafamiliar?
Por mais estranho que possa parecer, muitos
autores antigos entendiam que a criança desejava inconscientemente a invasão
sexual por parte do adulto, pois se isso não correspondesse à verdade a criança
ou o adolescente correriam de seu agressor, pediriam socorro ou ofereceriam
resistência. Entretanto, posteriormente, alguns profissionais concluíram que a
criança ou o adolescente está em fase de formação e não têm condições de
discernimento, visto que além de estarem numa posição de submissão ao abusador,
para eles é muito difícil impor-se, mesmo que desejasse, pois estaria submetida
a uma coerção física ou psicológica, fazendo assim, com que
ela não possa se defender da violência que a ronda.
Outros autores passaram a entender que a
responsável pela ocorrência dos abusos sexuais cometidos contra a criança e o
adolescente era culpa da mãe, sendo que a literatura, conforme Marli Satler,
mencionava que:
“Embora o aparente segredo do abuso, existe um
acordo tácito, entre o pai e a mãe sobre o papel da filha na família”, ou a mãe
por sua indisponibilidade como mãe e esposa oferece a filha como substituta no
seu papel sexual junto ao companheiro e não a protege”.
(19).
Mais tarde, conclui-se que a mulher, por
dificuldades pessoais, pode estar, realmente, falhando como mãe, pode estar
pouco disponível como mãe e mulher, pode não estar oferecendo boas condições de
vida para seus filhos se desenvolverem, mas nem por isso podem estar pedindo
para que seus filhos sejam abusados. Assim pode-se dizer que as mulheres têm
uma parcela de culpa quando silenciam a respeito da violência que seus filhos
sofrem, quando não os defendem da violência ou até quando são cúmplices do ato
violento proferido contra a criança e adolescente.
Nem sempre a culpa pelo que dá errado numa
família é culpa da mulher, visto que estudos recentes mostram que a maioria dos homens que abusam sexualmente de crianças e
adolescentes têm a oportunidade de ter relações sexuais com mulheres, ao
invés de abusar de uma criança. Mostram que a maioria dos abusadores tinha
fantasias sexuais com crianças, já antes da união com a sua companheira;
portanto, é possível afirmar que não é a indisponibilidade da mulher que leva o
abusador a procurar crianças e adolescentes para conter a sua lascívia.
Sobre a omissão das mães em relação à violência ocorrida
intrafamiliarmente, sabe-se que a maior parte das denúncias são realizadas
palas próprias mães, apesar de que algumas, ainda hoje, não se impõem ao
abusador porque se sentem incapazes de sobreviver sem o abusador, optando por
nada fazer, por serem dependentes financeiramente do companheiro-agressor, por
se considerarem incompetentes para denunciar a violência ou por medo de serem
agredidas da mesma forma.
O profissional que avalia a criança ou o
adolescente, supostamente vítima de abuso sexual, por muitas vezes sente
dificuldade em detectar a violência, visto que em muitos casos o abuso não
deixa marcas possíveis de serem vistas.
Na maior parte dos casos, a confirmação do abuso
sexual cometido contra a criança e o adolescente dentro da sua casa, leva muito
tempo para ser conhecida e provada, e muitas vezes a denúncia não ocorre porque
há várias dificuldades que a envolvem, como por exemplo: as ameaças do
abusador; a diminuição da renda familiar quando o abusador é afastado ou quando
ele é preso; a mãe passa a sofrer críticas de pessoas da sua família ou da
família do seu companheiro; os profissionais, freqüentemente adotam uma postura
de dúvida em relação à violência e por isso, muitas vezes a violência é de
difícil constatação; a mulher muitas vezes também não denuncia o abuso sexual
cometido contra seu filho porque sente que confessará publicamente o seu
fracasso como mãe.
Em muitos casos, especialmente, nas classes
médias e altas, as mães optam pela separação ao invés de denunciar o
companheiro-abusador, sendo que, quanto ao filho, o levam a tratamento com um
psicólogo ou outro profissional capacitado.
Dessa forma há a necessidade de se mudar de
conceitos fazendo com que a mulher seja ajudada
e encorajada a denunciar o agressor de seus filhos, visto que por muitas
vezes essa situação é bem-complicada, pois convém lembrar que, conforme
preceitua Sattler, “muitas dessas mulheres foram elas mesmas abusadas, quando
crianças e revivem essa situação, agora com suas filhas ou netas, pois, existe
uma clara tendência a repetição desse ciclo familiar”.
(20)
Quanto à oportunidade, pode-se dizer que da
maneira em que a família funciona há uma facilitação de ocorrência de tal
violência, qual seja: uma mãe deprimida, ausente,
sobrecarregada de preocupações, doente; uma criança carente que confunde
a aproximação sexual com o carinho e que não tem vínculo com pessoas próximas
para confidenciar tal violência que é praticada contra a sua pessoa. Observa-se
que nas famílias em que há pouca comunicação verbal e afetiva,
permitindo pouco espaço para a individualidade, o abuso sexual é mais
freqüente.
Pode-se observar que o culpado pelo abuso sexual
é, além do abusador, aquele que mesmo sabendo da violência se omite frente a
ela, assim os próprios profissionais que atendem crianças e adolescentes,
vítimas de abuso sexual, ao não denunciarem estão coniventes com a violência
que se perpetua a cada dia e de forma mais intensa.
4 Os
elementos do abuso sexual ocorrido intrafamiliar
4.1 As
vítimas e as seqüelas, como identificá-las?
É inaceitável considerar a criança e o
adolescente como vitimizadas, visto que, futuramente, podem se tornar um
provável violentador. Assim, é correto encarar essas crianças e adolescentes
abusadas sexualmente como violentadas e não vitimizadas, visto que muitas
produzirão tal violência, encontrando em outro sujeito o seu objeto
substitutivo.
Como visto anteriormente, o abuso sexual
cometido contra a criança e o adolescente não é apanágio de classe social, nem
de credo político ou religioso, de nível educacional ou de saúde mental, tal
como dizem os manuais de classificação de doenças mentais.
Não há de mencionar
estatísticas, visto que muitas delas são inverídicas, parciais ou tendenciosas,
pois a maior parte dos casos, infelizmente, permanece na clandestinidade,
cabendo informar que, conforme Azevedo e Guerra, as vítimas de abuso sexual em
“93,5% dos casos são do sexo feminino e 6,5% do sexo masculino”. (21)
Segundo os dados da
Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência
(ABRAPIA), citados por Veronese,
“a faixa etária
mais vitimizada (abuso físicos, abuso sexual, abuso psicológico, negligências e
outros) é a de 0 a 5 anos de idade (43%), enquanto que a de 6 a 10 anos
(25%);11 a 15 anos (19%); de 16 a 18 anos (6%) e sem dados (7%). (22)”
Quando a violência é cometida
no seio familiar, torna-se difícil a sua constatação. Estudos financiados pela
Organização Pan-Americana de Saúde e a Organização Mundial da Saúde, realizado em
1994, informa que apenas 2% dos casos de abuso sexual contra crianças, dentro
da família, são denunciados à polícia. Estima-se que, a cada caso denunciado,
exista quatro casos não denunciados.
As vítimas desse tipo de
violência podem ser compelidas ao silêncio por vários tipos de ameaça ou formas
de intimidação utilizadas pelo agressor. Essas medidas intimidatórias têm
contribuído, poderosamente, em muitos casos não denunciados, para ocultar esse
crime, dificultando conhecer sua amplitude e impedindo que se consiga combater
esse tipo de violência.
Assim, se a criança
ou adolescente abusados sexualmente não forem tratados no momento certo podem
vir a ser um adulto violento e, possivelmente, um abusador. É um círculo
vicioso, onde pais que abusam e maltratam seus filhos foram, na sua grande
maioria, abusados e maltratados durante a infância ou durante outra etapa de
sua vida, porém, esse passado forma parte de sua vivência levando-o a cometer o
mesmo crime, superando a fase de abusado passando a fase de abusador.
É muito difícil
identificar a vítima de abuso sexual, pois a criança não fala claramente sobre
a violência, sendo que às vezes nem sabe reconhecer o abuso como agressão. A
criança acometida dessa violência se retrai, bloqueia, sente medo, isola-se em
seu pequeno mundo, sente vergonha e culpa, pois acha que de alguma forma
provocou a situação.
A agressão, de
acordo com Veronese, na obra: Entre
violentados e violentadores:
“... por mais
singular que possa parecer é injustificada e sua repercussão, incalculável,
quase sempre passível de futura reprodução, uma vez que sofreram maus-tratos e
abusos durante a sua infância, em sua maioria reproduzem tal comportamento,
agredindo sua família e, mais especialmente, seus filhos, estruturalmente mais
frágeis e mais facilmente objetos de vitimização (23)".
Estudos realizados
no mundo inteiro revelam que o espancamento de crianças e outras formas de
maus-tratos, como é o caso do abuso sexual, com o objetivo de puni-las por seus
comportamentos agressivos, torna-as ainda mais agressivas,
demostrando até um maior índice de comportamento anti-social e possível
perpetuação da mesma violência ao se tornar adulto.
O atendimento de
crianças e adolescentes, que sofreram abuso sexual, exige paciência, o que não
significa que o profissional da área não terá de agir imediatamente. Muitos
casos exigem uma resposta imediata, visto que as seqüelas apresentadas
pela criança ou adolescente representam um fator de desenvolvimento da
personalidade, ocasionando a perpetuação cada vez maior da violência a que
foram submetidos.
Os abusos sexuais
deixam seqüelas terríveis, física e psicologicamente,
sendo que os sintomas possíveis são diferentes em relação às idades da criança
ou do adolescente.
De acordo com o compilamento
de várias pesquisas e de vários doutrinadores, podemos citar alguns sinais que
os maus-tratos, entre eles o abuso sexual cometido contra a criança e o
adolescente, podem deixar, tais como:
lesões físicas, contusões,
lacerações genitais e hemorragias; gravidez não desejada e fruto muitas vezes
de violência incestuosa; doenças sexualmente transmissíveis; infecções
urinárias; dor ou inchaço na área genital ou anal; desnutrição; doenças
freqüentes e não tratadas; perda ou excesso de apetite, resultando em vômitos ou
na anorexia; falta de controle para urinar e defecar (enurese e encorprese);
fadiga constante; vergonha excessiva; hiperatividade (criança que não pára
quieta); comportamento agressivo/rebelde; comportamento inadequadamente
sexualizado ou sedutor, muitas vezes assume papel maternal na família;
promiscuidade sexual/prostituição; fuga do contato físico; tentativa ou idéia
de suicídio ou automutilação; fugas/relutâncias em voltar para casa; problemas
de aprendizagem; dores e queixas psicossomáticas; regressão da linguagem e do
comportamento; distúrbios do sono (terror noturno); depressão, agitação e medo;
queda no rendimento escolar; gera um sentimento de raiva contra o agressor;
gera um autoritarismo capaz de fazer com que aja assim quando adulto, frente a
outras crianças ou adolescentes, inclusive seus filhos; leva a uma falta de
confiança nos adultos da família ou medo acentuado de homem; isolamento social:
a criança brinca sozinha e vive num mundo de fantasias; reluta em participar de
atividades físicas ou de mudar a roupa para atividades físicas na frente de
outras pessoas; em comportamento
anti-social, com possibilidade de se tornar um infrator; abusa ou torna-se um
dependente de álcool ou drogas; por muitas vezes tem ataque de histeria.
Sob o ponto de vista
da revelação da violência, é fundamental permitir que a criança e o adolescente
sintam-se livres para expressar suas emoções e traumas após o abuso, devendo
ser oferecido a eles a oportunidade de falar sobre essa violência o mais cedo
possível. Quanto mais tarde discutir o problema, mais graves serão as
conseqüências, pois a criança e o adolescente, em virtude do segredo que ronda
essa violência, pela falta de proteção a que é submetida por ter sido cometido
por uma pessoa de sua família, acaba por cair na armadilha de adaptar-se,
aprendendo a aceitar a situação e encontra um meio de sobreviver a ela.
Saffioti, citado
por Lamarão e Britto, destaca, com muita oportunidade, que a violência sexual
praticada contra a criança e o adolescente determina
“a destruição de
espaços psíquicos, abrindo, muitas vezes, um caminho sem volta, sobretudo se
essa agressão tem caráter incestuoso, uma vez que a vítima perde os
referenciais da família enquanto instituição básica. Daí à prostituição, a
distância não é muito grande. (24)”
Infelizmente a
prostituição passa a ser uma das alternativas achadas pela criança e pelo
adolescente vitimadas sexualmente. Assim, ao buscar a rua, como espaço de
libertação, caem definitivamente na teia da sociedade machista, levando-as a
prostituírem-se, de forma que de tal atividade não conseguem se libertar
facilmente.
Muitos comportamentos
violentos que se encontra na sociedade são provenientes de experiências que
remontam à infância de seus autores, desta forma é necessário que a sociedade
chame para si a responsabilidade de proteger suas crianças para tratar e
prevenir que estas passem de agredidas a futuras agressoras, pois segundo
Rosário
“seria correto afirmarmos que
crianças e adolescentes expostos à violência intencional e repetitiva aprendem
estes padrões como ‘verdades’, e estas verdades internas, padrões mentais
representacionais afetivos, serão mediadores de suas relações sociais. (25)”
A violência dirigida contra a
criança e o adolescente é capaz de trazer prejuízos ao seu desenvolvimento e
lesar sua potencialidade de evoluir para a idade adulta, pois “... as primeiras
experiências da criança é que irão modelar a personalidade, as emoções e as
relações com os outros, no estágio adulto” (26).
A criança ou o adolescente
que sofre esse tipo de violência acaba por ter seu desenvolvimento psicológico
e afetivo comprometidos irremediavelmente. O abuso,
por muitas vezes, não deixa sinais físicos, mas com certeza ficarão marcados na
memória da criança como se tivesse sido tatuada em sua pele com brasa, jamais
sendo esquecida nem com o passar do tempo, sendo revivida a cada dia, a cada
instante em que algo a faça relembrar do acontecido.
Na maioria das vezes, a
criança que apanha em casa ou que sofre abusos sexuais age de forma violenta
nas suas relações pessoais, reproduzindo a violência que sofreram, nas relações
com colegas de escola, com amigos, contra o patrimônio público, sendo que
outros acabam entrando no mundo da promiscuidade, da prostituição ou da
infração, que tem sua história cultivada na própria casa do menor por meio dos
constantes casos de incestos que ocorrem mundo afora, sem distinção de classe,
condição financeira ou cor.
Outro fator a ser
considerado, é que conforme Rouyer, “as medidas judiciais que são tomadas em
relação ao adulto incestuoso provocam quase sempre um rompimento da família, do
qual a criança é considerada a responsável, agravando a sua culpa”. (27)
Assim, pode-se dizer que nos casos
de abuso sexual em que o agressor fica em contato com a criança ou o
adolescente após a denúncia, estima-se uma taxa de 50 a 60% de reincidência,
utilizando-se o autor dos mesmos métodos para violentá-los.
5 O papel da família e do
estado frente ao abuso sexual
5.1 O atendimento da criança e do adolescente
vítimas do abuso sexual na família
Nos últimos anos tem-se
discutido sobre a violência que ocorre na órbita familiar. E aí cabe questionar
até onde alcança e o que contempla o conceito de educar, por parte dos pais ou
responsáveis, e se nesse educar está implícito os castigos físicos,
psicológicos e o abuso sexual, incorporando todas as espécies
de maus-tratos cometidos contra a criança e o adolescente.
De qualquer forma, a
autoridade que o adulto infringe sobre a criança ou adolescente reproduz de
forma dominante a autoridade de uma determinada sociedade. Entretanto, essa dominação adulto/criança/adolescente é pensada como
natural e não como social. Assim, a criança/adolescente deve se submeter aos
caprichos do adulto, pois se isso não fizer estará desrespeitando o seu
superior, podendo, assim, ser punido pela desobediência, visto que transgrediu
os direitos de superioridade do adulto.
Por conseguinte, passando a família
por uma certa crise, será ela desqualificada para a proteção da criança e do
adolescente, passando de protetora para solapadora dos direitos da infância e
da juventude. Assim, por mais que se apregoe a liberdade da criança e do
adolescente, eles continuarão sendo seres dominados pela pessoa adulta, sendo
que o autoritarismo pode atingir a sua face mais aguda, qual seja a da
violência doméstica aplicada como forma de punição pelos adultos.
A Lei n.º 8.069/90 estabelece
uma nova concepção da criança e do adolescente, concepção que engloba um
universo de pessoas, independente de sua suposta “situação irregular” que foi
muito utilizado pelo antigo Código de Menores e que os menorizavam, passando a
nova lei que dispunha da criança e do adolescente a contemplar a “proteção
integral” e, portanto, considerando a criança e o adolescente como cidadãos, o
que equivale dizer, sujeitos de direitos. Isso significa que há lentamente um
compromisso institucional de romper com a cultura que coisifica a infância e a
juventude, retirando-as da condição de objetos e elevando-as à de autores da
própria história, o que não é fácil, porque implica mudança de valores, de
idéias e de condutas.
Sabe-se que a
solução para o problema da criança e do adolescente abusados sexualmente está
na proteção da família, da sociedade e do Estado, conforme preceitua o caput do art. 4º do Estatuto da Criança
e do Adolescente e o art. 227, caput da
nossa Carta Magna:
Art. 4º - É dever
da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar,
com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde,
à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. (28) [grifo nosso]
Art. 227 - É dever
da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e
à convivência familiar e comunitária, além de colocá-la a salvo de toda forma
de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão. (29) [grifo nosso]
Desta forma, cabe
aos pais (família) garantir o cumprimento das funções de assistência material,
moral, cultural e afetiva a que têm direito as crianças e os
adolescentes, mas isso, muitas vezes, não acontece, pois a relação menor
e família encontra-se escondida pelo pacto do silêncio, representado em forma
de tortura muitas vezes contínua, dia após dia, e que cronicamente como a fome
pode provocar males terríveis, que vão desde a agressão física, psicológica,
podendo até levar a morte.
Entende-se que a
intervenção estatal na ordem familiar tem caráter supletivo,ou seja, na falta
do mecanismo familiar, torna-se necessária a
intervenção do Estado para suprir as necessidades básicas dos infantes. Por
outro lado, a interferência do poder estatal possui, também, caráter
complementar, pois é dever do Estado, juntamente com a família e a sociedade,
garantir os direitos fundamentais de todas as crianças e adolescentes.
A violência contra
a criança e o adolescente afronta os Direitos Humanos mais elementares
existentes e é por isso que exigem uma reação não apenas do Estado, mas de toda
uma sociedade e porque não dizer de todo o mundo.
É impossível se
pensar numa família protetora se não se elimina o seu aspecto de instituição
disciplinadora, visto que enquanto os membros da família estão correndo risco
dentro dela mesma e enquanto os direitos humanos não forem realizados de forma
mais concreta e decisiva que a atual, não será a família considerada um refúgio
de amor, carinho, compreensão e proteção e, sim, uma forma de violação dos
direitos da criança e do adolescente.
5.2 O dever de proteção do
Estado
A vitimização da
criança e do adolescente revela a fragilidade da sociabilidade. Existem várias
pesquisas que demonstram o rol de denúncias que explicitam as condições de
violência em que crianças e adolescentes são submetidas, sobremaneira em
relação aos espancamentos e abusos sexuais que ocorrem intrafamiliarmente. Com
toda a violência que é exercida contra a criança e o adolescente e com o
excesso de autoridade paterna e materna, acaba-se por obstruir a apreensão do mínimo
de autoridade capaz de guiar uma criança ou até o adolescente para o caminho
correto a ser seguido.
A situação das
crianças e adolescentes, hoje em dia no Brasil, está longe de alcançar as supostas
garantias instituídas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, impedindo-os
da realização de um mínimo dessa sociabilidade, levando-os potencialmente ao
caminho da infração, como forma de chamar a atenção ou de revoltar-se contra o
tratamento que recebem.
Cabe pontuarmos que
os direitos das crianças são constantemente apregoados, mas foi somente em
20.11.1959 que a Assembléia Geral formalizou uma Declaração específica dos
Direitos da Criança. A Declaração dos Direitos da Criança, entre seus dez
princípios básicos, destacava os direitos da criança à liberdade, à igualdade,
à satisfação de suas necessidades básicas (alimentação, saúde, educação, lazer,
etc.), bem como o fato de que a criança deve receber amor, carinho, compreensão
por parte dos pais e da sociedade, sendo que deve ser protegida
contra quaisquer formas de abandono, crueldade
e exploração.
Fato
que se deve observar é que a sociedade legitima a violência doméstica, pois só
em 1927, com o advento do Código de Menores que tal matéria foi disciplinada,
sendo que o nosso Código Penal, datado de 1940, apesar
de ser posterior, tratou apenas dos castigos imoderados, sendo que a violência
contra a criança e o adolescente só é considerada crime quando praticada de
forma imoderada, sendo lícita para os meios de correção.
O Código de Menores
de 1979 não dispensava tratamento diferenciado às vítimas de violência
doméstica, enfeixando o problema sobre a rubrica de que “situação irregular”
sob a qual mesclava tanto aquele “menor” vítima de maus-tratos ou de castigos
imoderados impostos pelos pais ou responsáveis, quanto aquela
vítima de negligência ou autor de infração penal.
Na área da Infância
e da Juventude, que é o que nos interessa, iniciava-se na década de 1980, uma
ampla luta de questionamento pela “Política de Bem-Estar do Menor” e do “Código
de Menores”, que se dizia um regime muito autoritário. Nesta mesma época, ampliava-se as denúncias sobre a gravíssima situação
enfrentada pela infância e a juventude brasileira, bem como a constante violação
de seus direitos.
No Brasil,
portanto, a década de 1980 foi de extrema importância para a perpetuação e
garantia dos direitos da criança e do adolescente, visto que com a mudança da
Constituição Pátria, chamada de “Constituição Cidadã”, alcança-se uma grande
vitória na Assembléia Nacional Constituinte, qual seja a sedimentação dos
direitos da Criança e do Adolescente no artigo 227 da Constituição Federal de
1988, sendo que o caput desse artigo
introduziu um enfoque ao que dizia a Convenção Internacional dos Direitos da
Criança. Assim, conquistada a grande vitória na Constituição de 1988, restava
que se elaborasse uma lei ordinária que revogasse o Código de Menores e seu
autoritarismo, culminando, assim, com a aprovação da Lei 8.069 de 13 de julho de
1990 passando a chamar-se Estatuto da Criança e do Adolescente.
Somente com a
implantação do Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, que a situação se
modifica, principalmente no sentido de se denunciar este tipo de violência, de
se propor medidas de intervenção nas famílias agressoras, protegendo-se a
vítima e estabelecendo-se uma forma de prevenção de tal fenômeno.
Segundo o Código
Penal Brasileiro, o abuso sexual não se encontra implicitamente especificado,
sendo ele considerado um crime comum (crime de estupro – artigo 213 do CPB,
crime de sedução – artigo 217 do CPB ou crime de atentado violento ao pudor –
artigo 214 do CPB), podendo ser considerado um crime hediondo segundo a Lei
8072/90, quando a perpetuação do abuso sexual resulta em estupro qualificado
(art. 213 combinado com o artigo 223, caput e parágrafo único do CPB) ou quando
resulta em atentado violento ao pudor qualificado (artigo 214 combinado com o
artigo 223, caput e parágrafo único do CPB).
Nos mesmos moldes,
a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 227, parágrafo 4º, determina que
“A lei punirá severamente o abuso, a
violência e a exploração sexual da criança e do adolescente”. (30)
[grifo nosso].
Assim, em face da repugnante
realidade provinda das várias espécies de violências contra a criança e o
adolescente cabe ao Estado garantir e implementar o preceito do artigo 130 do ECA de afastamento do autor da violência contra a criança
e o adolescente de sua casa, em vez de
afastar a criança-vítima.
O artigo 130 do Estatuto da
Criança e do Adolescente assim preceitua:
Verificada a hipótese de maus
tratos, opressão, ou abuso sexual
impostos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária poderá determinar,
como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia em comum. (31)
Portanto, ao confrontarmos
casos de violência que ocorrem contra a criança e o adolescente, a autoridade
judiciária deverá determinar, como medida cautelar, a retirada do violentador
da moradia comum.
Veronese, ao fazer uma análise
sobre o artigo 130, diz que:
“defende tal medida cautelar
não somente na hipótese de efetiva prática da violência, o que importa que a
mesma deve ser aplicada quando há um risco iminente,
plausível de que a criança ou o adolescente venha sofrer maus-tratos e
opressão. (32)”
Assim, também se
pode citar, segundo Guerra, a influência da Convenção das Nações Unidas sobre o
Direito da Criança e do Adolescente (ONU – 20.01.1989) que, em seu artigo 19,
coloca que:
A criança deve ser
protegida contra todas as formas de violência física ou mental, abuso ou
tratamento negligente, maus-tratos ou exploração, inclusive abuso sexual,
enquanto estiver sob custódia dos pais, seu representante legal ou qualquer
outra pessoa responsável por ela. (33)
Defende-se os direitos da criança e
do adolescente com unhas e dentes, mas a própria sociedade os solapa, uma vez
que o reconhecimento desses direitos implicaria modificações no seio da família
e da sociedade.
Há
muito que se deve fazer pela criança e o adolescente vítimas
de abuso sexual e precisa-se da ajuda do Estado para que se possa alcançar
nossos objetivos.
Há a
necessidade primeira de se eliminar a mentalidade conservadora do Poder
Judiciário, visto que o Estatuto da Criança e do Adolescente pode ser considerado
um dispositivo legal educacional para nossos ilustres magistrados, eminentes
promotores e inclusive para os advogados que estão instalados atrás das suas
qualificações acadêmicas.
Há
de se fazer por meio do Judiciário uma lavagem cerebral nos técnicos do nosso
Estado, tanto dentro do poder judiciário, no poder executivo, como dentro da
área da saúde e porque não dizer do nosso país por inteiro, para que se possa
superar com isso, em muitos casos, um julgamento moral precipitado escudado na
cientificidade dos seus pareceres, como ocorreu numa Vara da Infância e da
Juventude de Viamão, RS, que gerou um agravo de instrumento deferido em relação
à decisão de uma juíza do Juizado da Infância e Juventude local, que indeferiu
o afastamento do pai-agressor do lar conjugal, determinando o afastamento de
uma criança que inclusive fora abusada sexualmente pelo pai.
Dessa
forma há de se citar o acórdão de tal decisão bem como parte do voto que lhe
foi atribuído pela 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul:
“Agravo de Instrumento no 593032915 – 3ª Câmara Cível - Viamão.
PÁTRIO PODER. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO. PROTEÇÃO AO MENOR OU ADOLESCENTE.
AFASTAMENTO IN LIMINE, DO
PAI-AGRESSOR.
Havendo
fortes indícios de agressões físicas e sexuais por parte do pai contra a filha
menor, cabe o afastamento daquele do lar comum, forte no que dispõe o art. 130
do Estatuto da Criança e do Adolescente, liminarmente. Recurso provido, para
determinar o afastamento do pai-agressor do lar comum, e não da vitima menor, como
determinado no decisum a quo. Ministério Público,
agravante - A. D. L. S.. agravado.
ACÓRDÃO
A 8ª
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul,
unanimemente, acorda em dar provimento ao agravo de instrumento. Custas ex lege. Participaram do julgamento,
além do signatário, os Exmos. Srs. Des. João Andrades Carvalho, Presidente, e
Dr. José Carlos Teixeira Ciorgis, Porto Alegre, 03 de março de 1994. Eliseu Comes Torres, Relator.
PARTE
DO VOTO
Pelo
exposto, havendo indícios fortes de agressões físicas e sexuais por parte do
agravado contra sua filha, a menor E., de apenas nove anos, cabe o afastamento
daquele do lar comum, forte no que dispõe o art. 130 do ECA,
conforme requerido pelo órgão ministerial, devendo ser desconstituída a decisão
agravada, que nega tal afastamento. O voto é pelo provimento do agravo de
instrumento, cassando-se a decisão hostilizada para determinar o afastamento, in limine, do agravado, do lar comum,
até que a ação de perda do pátrio poder seja definitivamente julgada, tornando,
em conseqüência, sem efeito a autorização de afastamento da menor E. P. S. do
lar e sua entrega à pessoa idônea.
O Dr. José Carlos Teixeira
Giorgis e o Des. João Andrades Carvalho De acordo. (34)
Podendo
a juíza a quo conceder o afastamento in limine do agressor, com fundamento no
artigo 130 do ECA, não o fez por se achar incompetente
para tal, achando que a retirada do agressor só seria possível com a separação
de corpos do casal através de requerimento da esposa. Com a determinação do
afastamento da vítima de seu lar a magistrada do juízo a quo violou o direito da criança de ter
assegurada a convivência familiar (art. 42 do ECA) além do que praticou,
conforme o relatório da decisão, constrangimento quando retirou da mãe a guarda
da filha, sem o devido processo legal (arts. 165 e segs do ECA).”
Além
disso, assim preceitua a jurisprudência pátria quando tocamos no assunto de
violência cometido contra a criança e o adolescente e principalmente no que diz
respeito ao abuso sexual, como o caso do exemplo de Viamão, mostrando-se os
vários fundamentos que a juíza teria para afastar o agressor e não a criança de
casa, bem como retirá-lo o pátrio poder:
“27054321 - ATENTADO VIOLENTO
AO PUDOR - Crime e autoria comprovados. Não se tem dúvidas
sobre o crime de atentado violento ao pudor e sua autoria, quando a vítima, em
depoimento confiável, descreve o abuso sexual sofrida e vem ao encontro da
confissão do apelante perante a autoridade policial. Condenação mantida. (TJRS
- ACr 698252335 - RS - 6ª C.Crim. - Rel. Des. Sylvio Baptista Neto - J.
10.09.1998)
AGRAVO
DE INSTRUMENTO - SEPARAÇÃO DE CORPOS - Acesso à oficina de trabalho e visitas.
Deve ser vedada o acesso do agravante a oficina de
trabalho instalada nos fundos da casa onde reside a agravada com as filhas, se
há indícios de abuso sexual praticado por ele contra a enteada. A visitação,
pelo mesmo motivo, só pode ser apreciada após o esclarecimento dos fatos
relacionados ao abuso. Segredo de justiça (TJRS - AI 598011310 - RS - 7ª C.Cív.
- Rel. Des. Eliseu Gomes Torres - J. 27.05.1998)
PÁTRIO
PODER - DESTITUIÇÃO - ABUSO SEXUAL - DIREITO DE VISITA A FILHO - SUSPENSÃO
TEMPORÁRIA - REVOGAÇÃO DA MEDIDA LIMINAR - Destituição de pátrio poder.
Visitação suspensa. Revogação de liminar. Razoabilidade da decisão.
Desprovimento do recurso. Sendo razoável e cercada de cautelas a decisão
revogatória de liminar, que suspendeu o direito de visitação ao pai, acusado de
práticas sexuais com a filha menor, nega-se provimento ao recurso que postula a
sua cassação. (TJRJ - AI 3081/96 - (Reg. 260397) - Cód. 96.002.03081 - 1ª
C.Cív. - Rel. Des. Marlan Marinho - J. 19.11.1996)”
Assim,
segundo o Prof. Dr. Rogério Gesta Leal, na sua obra: Perspectivas hermenêuticas
dos direitos humanos e fundamentais no Brasil, nota-se:
“a
falta de preparo do juízo monocrático prolator da decisão reformada, proferindo
uma sentença que, taxativamente, foi de desencontro aos interesses superiores
da menor, vítima na lide, precarizando ainda mais o seu estado, causando-lhe
profundos abalos psicológicos e emocionais, eis que praticamente inverteu os
papéis de réu e de vítima, determinando o afastamento de sua casa e deixando
que nela ficasse o pai malfeitor. (35)”
Assim,
fica mais que evidente que, quando se trata de direitos humanos, muitos
julgadores se distanciam do tema ou simplesmente ignoram as normativas pátrias
e internacionais vigentes na país, como é o caso da já
citada Convenção dos Direitos da Criança que, em seu artigo 3º, preceitua que:
1.
Em todas as medidas relativas às crianças, tomadas por instituições de
bem-estar social públicas ou privadas, tribunais, autoridades administrativas
ou órgão legislativos, terão consideração primordial os interesses superiores da
criança. (36)
Com
o exemplo acima, pode-se dizer que nossas crianças e adolescentes estão a mercê das decisões descabidas de alguns juizados da
Infância e Juventude e que as leis nacionais e internacionais de proteção as
crianças e adolescentes não são conhecidas e, por conseqüência, pode-se
observar as injustiças a que são submetidas. A exemplo da decisão proferida
pela juíza a quo pode-se observar que
ela procurou tão-somente preservar a união familiar que já estava com a
falência decretada, do que preservar a integridade da criança que ali estava
exposta a formas de violência horrendas e que é capaz de chocar a qualquer um,
menos a juíza que deveria ter afastado imediatamente o seu agressor do lar.
Assim,
analisa-se a função do Estado-juiz frente às questões de direitos humanos
fundamentais e principalmente aos direitos inerentes a crianças e ao adolescentes. Observa-se que não é possível a reparação
posterior dos direitos fundamentais, assim a de se conceder soluções por parte
do Estado no que diz respeito à segurança de criança e adolescentes vítimas de
violência doméstica, principalmente no que diz respeito ao abuso sexual, visto
que se a segurança não se impuser de pronto.
Como
a família transforma-se em espaços de drama, o Estado, por sua vez, tenta
incorporar as conseqüências dessa violência contra criança e o adolescente,
através de políticas assistenciais e sociais e reformas legislativas no que
tange aos direitos humanos, mas isso de nada resolve, visto que estamos
impregnados da mentalidade de que essa espécie de violência só ocorre com os
miseráveis.
Da
mesma forma podemos dizer que os preceitos coletivos atuais estão a privilegiar
as leis, do que os direitos. Assim, conforme Passetti “a questão da preservação
da moral enfim se explicita quando, na defesa dos direitos da criança e do
adolescente, a legislação considera mais grave a exibição de um filme “impróprio” do que um espancamento”. (37)
Tentando
compreender a atuação estatal, no que diz respeito à
satisfação das garantias às crianças e adolescentes, o que se deve buscar
são as justificativas das condições colocadas pelo próprio Estado para conter a
violência contra elas, sob o regime da propriedade privada com intervenção
estatal.
O Estatuto da Criança e do
Adolescente - ECA, no artigo 1º, anuncia ser a lei que “dispõe sobre a proteção
integral à criança e ao adolescente“, mas mesmo assim, e apesar de ter superado
o Código de Menores, ele possui várias lacunas. Dentre essas lacunas pode-se
destacar aquele que não define com precisão o que sejam maus-tratos, que se
apresenta esparsamente em seus artigos 5º e 18, conforme se transcreve:
Art. 5º - Nenhuma criança ou
adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer
atentando, por ação ou omissão, ao seus direitos
fundamentais.
Art. 18 – É dever de todos
velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer
tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. (38)
No momento que o Estado não
cumpre com o que propôs legalmente, está vitimizando e desrespeitando os
direitos da criança e do adolescente, podendo, assim, ser considerado, também,
violentador, por não cumprir a responsabilidade que ele próprio se atribuiu,
qual seja, a atividade de tutor. Em outras palavras, pode-se dizer que o Estado
enseja a prática de maus-tratos quando não cumpre com as responsabilidades que
traça para si mesmo, ao promulgar uma legislação como é o ECA.
Combater os maus-tratos é
prestar, segundo Passetti, “assistência jurídica e social, acompanhada de
condenação individual do violentador, pelo Estado” (39). Eis uma
pergunta que fica no ar e que não consegue ser respondida: E quando o Estado é
o violentador quem vai condená-lo?
O Estatuto carece de uma
definição que pontue esse tipo de pergunta, não tem ele uma definição clara e
precisa, o que são os maus-tratos para além do cidadão, visto que nem sequer o
conceito de maus-tratos define fielmente, utilizando-se de um conceito
elaborado na década de 40 e que se encontra descrito no artigo 136 do Código
Penal Brasileiro.
Assim, ao tomar emprestado o
referencial alheio, o Estatuto da Criança e do Adolescente equivoca-se, visto
que os maus-tratos elencados no artigo 136 do Código Penal Brasileiro não
contempla todas as esferas que, segundo o ECA, devem garantir os direitos das
crianças e adolescentes, criando-se, assim, um vazio entre as punições
elencadas no CPB e as prevenções aludidas no ECA.
Outras implicações surgem,
também, quando se pretende dar um tratamento diferenciado e novo a questão dos
maus-tratos, visto que por vezes a Justiça se dá na contenção dos excessos, mas
ela mesma legitima uma ordem de excesso em nome da autoridade dentro das
instituições. Ao distinguir o Código Penal Brasileiro, por exemplo, uma pena
menor para os casos de maus-tratos quando em excesso, segundo o artigo 136 do
CPB, beneficia os principais agressores de crianças e adolescentes, os pais,
sendo que a pena prevista para os casos de lesões corporais em alguns caso é menor do que a pena dos maus-tratos
(intrínseco está o abuso sexual), conforme demonstra tabela abaixo. Há de se
frisar, assim, que a Justiça, segundo Passetti: “administra um código
jurídico-médico-assistencial do excesso”. (40), não se importando com a
real gravidade da violência frente à vítima.
Assim
há de se observar o quadro comparativo em que fica claro que pais e
responsáveis por crianças vítimas de abuso sexual estão sendo privilegiados ao
causarem as mesmas lesões que preceitua o artigo 129 do CPB e que elenca as
lesões corporais.
QUADRO 1 –
Comparativo entre o Art. 136 e Art. 129 do Código Penal Brasileiro
Maus-tratos (Art. 136 CPB) |
Lesão Corporal (Art. 129 doCPB) |
||
Tipo |
Pena |
Tipo |
Pena |
Simples (caput) |
Detenção
de 02 meses a 01 ano, ou multa. |
Simples (caput) |
Detenção de 03 meses a 01 ano |
Se resulta lesão de natureza grave (§
1º) |
Reclusão de
01 04 anos |
Lesão corporal de natureza grave (§§ 1º e 2ª) |
§ 1º - Reclusão de 01 a 05 anos / § 2º -
Reclusão de 02 a 08 anos |
Se resulta morte (§ 2º) |
Reclusão de 04 a 12 anos |
Lesão corporal seguida de morte (§ 3º) |
Reclusão de 04 a 12 anos |
Majorante se menor de 14 anos (§ 3º) |
Aumenta a pena em um terço |
Majorante contra menor de 14 anos (§ 7º c/c §
4º do art. 121) |
Aumenta a pena em um terço. |
Com a comparação feita no quadro
acima se mostra a distinção na aplicação de penas para dois casos iguais, sendo
que o artigo do Código Penal que fala dos maus-tratos se dirige por excelência
aos responsáveis pela criança e pelo adolescente, sendo que nessa modalidade é
imputada pena menor, provando-se que as lesões corporais que são causadas pelos
pais, por exemplo, mesmo que causem os mesmos danos que se outra pessoa
imputasse, mesmo assim, o artigo 136 beneficiaria a violência que ocorre no
seio familiar.
A distinção entre lesões
corporais e maus-tratos contra a criança e o adolescente legitima o lado
repressivo do pátrio poder, expresso pela tolerância penal em relação às
instituições básicas da sociedade, como é a família, caracterizada pelo pátrio
poder.
Casos diversos
devem ser analisados com cuidado quando são levados ao conhecimento judicial.
Um exemplo disso são os processos citados por Passetti, numa pesquisa realizada
no antigo Serviço de Advocacia da Criança – SAC -´podendo citar o seguinte
caso:
“Processo
562/88
Criança de 3 anos
do sexo feminino
Violentador:
Provavelmente o pai
Denunciante:
Assistente Social de Hospital
A criança deu
entrada no hospital com rompimento de períneo. Submetida à cirurgia, voltou para
casa. Dois dias depois retornou ao hospital com novo rompimento e sangramento
na vagina. Foi novamente submetida à cirurgia, quando então o SAC foi
comunicado. A mãe afirmou que a criança no primeiro internamento havia caído
sobre um ferro.
O SAC comunicou o
comunicado ao juiz e pediu a expedição de ordem para manter a criança no
hospital até verificação da conveniência de se autorizar o retorna da criança
ao convívio com os pais.
O juiz determinou
que a criança não fosse entregue aos pais até apuração dos fatos e designou
audiência.
Seis meses depois,
sem mais nenhuma informação, foi determinado que o processo deveria aguardar no
arquivo do SAC” (41).
Nota-se com o exemplo acima o
descaso do Estado frente à violência sexual que é cometida contra a criança e o
adolescente. Observa-se, também, a atitude errônea de afastar a criança do seio
familiar enquanto que o abusador continua no mesmo lugar, sem nem sequer ser
penalizado pelo que cometeu.
5.3 As políticas de atendimento às vítimas
Para o real cumprimento das
garantias do Estatuto da Criança e do Adolescente, há a necessidade de uma
abordagem no que diz respeito às “Políticas de Atendimento” que, segundo o
artigo 86 do ECA, far-se-ão através de um conjunto
articulado de ações governamentais e não governamentais, da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios, sendo que o mesmo dispositivo repetindo a
preocupação do artigo 5º, no artigo 87, mostra as linhas de atendimento,
preceituando no seu inciso III o que segue:
Art. 87 – São linhas de ação
da política de atendimento:
I....
II...
III –serviços especiais de
prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência,
maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão. (42)
Como vamos falar com
tranqüilidade em políticas de atendimento às vítimas de violência, inclusive no
que diz respeito ao abuso sexual, se nestas instituições de atendimento, por
muitas vezes, de forma explícita, crianças e adolescentes são submetidos a
torturas, castigos, abusos sexuais, estupros e outras coisas do gênero? Estas
instituições, na maioria das vezes, incentivam a revolta, o confronto por parte
de crianças e adolescentes que passam a eternizar a violência em seu cotidiano,
passando a incorporá-la como forma de vida, de proteção e de sobrevivência.
Busca-se construir
instituições para atender crianças abusadas sexualmente, mas não se tem programas de prevenção socioeducativas para dar suporte
as famílias. Preocupamo-nos com a criança e o adolescente, mas não se pode
esquecer de sua família, pois se deve trabalhar a reinserção desta criança ou
adolescentes no seio familiar, visto que o confinamento de
crianças abusadas sexualmente representam para elas, além de certa
fragilização, pelo que lhe ocorreu, um certo castigo, pois ela é tirada do núcleo
familiar enquanto que o seu agressor permanece.
Assim, toda intervenção de
agentes sociais, dos conselheiros tutelares e da própria comunidade deve ser no
sentido de reestruturar a família e afastar o agressor do lar e não a criança
ou o adolescente vítimas do abuso sexual. Infelizmente
o que ora fora preceituado não é todo verdade, visto
que não raramente as vítimas de abuso sexual é que são afastadas de casa e não
o agressor. Vê-se que além de vítima, a criança ou o adolescente que sofre tal
violência passam a ser comparados a culpados da
situação, pois são arrancados do seio familiar como meio de proteção, passando
a conviver em instituições ou hospitais, até que as coisas melhorem e que eles
se recuperem do trauma.
Há de se observar que nem
sempre o passado está longe, por muitas vezes ele vive no presente e torna-se
traumatizante quando a criança, ao retornar para casa, dá de frente com o seu
agressor, pronto para violentá-la novamente.
Segundo Veronese, ”quando se
adentra no campo da violência doméstica, diagnosticando-se o quadro familiar, encontramo-nos frente a uma situação complexa ou mesmo antagônica,
pois as crianças e adolescentes têm direito à convivência familiar”. (43)
Sendo assim, o Estatuto da Criança e do Adolescente fala claramente nisso, no
artigo 19:
Art. 19 – Toda criança ou
adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da família e,
excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e
comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de
substâncias entorpecentes. (44)
A criança ou o adolescente levados a uma instituição, mesmo que tenha
supridas partes de suas necessidades, sentirão falta de sua família por mais
pobre que sejam os recursos financeiros e emocionais no núcleo familiar, mas
mesmo assim preferirão estar no seio da família a estar numa instituição em
meio a estranhos.
Assim, é difícil de lidar com
o afastamento da criança e do adolescente da sua própria casa, dos cuidados de
seus pais, segregando-os socialmente, tirando-os de toda e qualquer forma de
afeto, cuidado e proteção por parte dos pais que não o violentaram, pois a
medida correta a ser aplicada não é a de segregação da criança e do
adolescente, mas sim o afastamento de seu agressor de dentro da sua casa.
Se a criança for retirada do
seio familiar, provavelmente, vai achar que é ela a culpada por tudo que
aconteceu; agora se o seu agressor for retirado da sua convivência a sua
recuperação dentro da família será mais próspera do que dentro de uma instituição
cercada por pessoas estranhas ao convívio da criança ou do adolescente.
Há uma luta constante pela
construção de mais e mais instituições, mas não se tem
programas de prevenção socioeducativas para dar suporte as famílias,
pois não adianta preocuparmo-nos com a criança e o adolescente se não há um
amparo à família da criança ou do adolescente que foi abusado sexualmente.
A família não pode ser
esquecida em hipótese alguma, pois só com um trabalho árduo para ver o que está
acontecendo no seu seio é que se conseguirá corrigir os defeitos e tentar a
reinserção desta criança ou adolescente em sua família, novamente.
Conforme preceitua Nascimento
“quanto menor for a permanência numa instituição
melhor será o desenvolvimento psicosocial de uma criança ou adolescente
violentado sexualmente”. (45) Talvez ingenuamente se pense que
suprimindo as necessidades de alimentação, banho, roupas, se está fazendo
grande coisa para a criança ou o adolescente abusado sexualmente. Isso é mero
engano, porque eles precisam muito mais do que isso e lhes oferecendo só o que
foi enumerado estaríamos varrendo para baixo do tapete as responsabilidades que
a sociedade tem em relação a essa situação.
Assim, a cada instituição
construída a sociedade sente-se cumpridora de sua missão, mas esquece que com
isso está sinalizando seu descompromisso com os maus-tratos e com o abandono.
A
criança/adolescente abusados sexualmente nem sequer sabem o porquê de estarem na
instituição, dando a essa segregação um sentido de castigo. Um exemplo claro
dessa segregação é que a criança/adolescente abusados
sexualmente, fragilizados pelo que lhe aconteceu são trazidos para a
instituição para melhor resguardá-los do agressor, mas isso não acontece, pois
enquanto eles estão separados da família seu agressor continua no seio desta
esperando o seu retorno para rescindir em tal violência.
Tenta-se através da
instituição reduzir o sofrimento das crianças e adolescentes vítimas de abuso
sexual prestando a eles um assistencialismo, mas talvez isso atrapalhe um trabalho maior, que seria reduzir diferenças básicas que estão
incutidas na sociedade e que transforma a violência invisível.
Andrade diz que “a partir da
institucionalização o indivíduo recebe um rótulo, passa ser um ser instituído e
vai levar isso para o resto da vida”. (46)
Continuando o pensamento de
Andrade, pode-se notar que há muitos fatores que colaboram para que o
desenvolvimento da criança e do adolescente seja dificultado, sendo que o principal
é a sua retirada deles do núcleo familiar, pois mesmo a família sendo falha nas
suas perspectivas financeiras, ela é o referencial desta criança ou adolescente
e a separação, com certeza, deixará importantes lacunas e marcas na sua
história.
Hoje em dia há uma evolução
no que diz respeito a desinstitucionalização, procura-se uma prática cada vez
mais próxima da família, mas mesmo assim é preciso que se acredite que um dia
“a sociedade estará preparada para aceitar a singularidade de cada um e aí não
precisará de um lugar específico para colocar crianças e adolescentes,
estaremos mais preparados para ajudar a família num todo”. (47)
Toda
criança e adolescente merecem cuidados especiais, pois eles ocupam uma posição
frágil na sociedade. É por isso que a violência contra essas crianças e
adolescentes os tornam cada vez mais fragilizados, sendo que, quando adultos,
muitos se tornam seres fracos, sem vontade de lutar contra as injustiças e sem
bases para fortalecerem-se de forma que possam enfrentar a realidade do mundo
sem se apoiar na droga, no álcool e em atos violentos igualmente.
Infelizmente,
não se pode acreditar que políticas sociais de atendimento a crianças e
adolescentes violentadas sexualmente são as soluções para resolver esse tipo de
problema que assola a sociedade atual, bem pelo contrário, não se pode tirar a
criança e o adolescente do seio familiar deixando nele o violentador. Deve-se
punir ou tratar quem comete tal delito e, ao mesmo tempo, proteger a criança e
o adolescente de tal violência, defendendo, assim, seus direitos fundamentais.
Conclui-se,
dessa forma, que as entidades de atendimento a crianças e adolescentes vítimas
da violência, mormente do abuso sexual, tema de nosso estudo, pode ser
considerada uma utopia, visto que as vítimas não são tratadas de forma eficaz,
faltando-lhes recursos financeiros, humanos e profissionais habilitados para
atender tais crianças e adolescentes.
Resta
claro que a violência doméstica, principalmente o abuso sexual, permanece
inadministrável. Ela apenas denuncia a fragilidade de enunciados formais que
declaram crianças e adolescentes sujeitos de direitos e comprova a ineficácia
de políticas sociais de atendimento, que mascara uma forma de proteção do
Estado que não pode ser considerada efetiva, pois peca em muitos aspectos, não
podendo de forma alguma utilizar as instituições de amparo para substituir a
família.
Dessa
forma, resta claro que é melhor atitude é a retirada do abusador de dentro do
lar, sendo que essa família deve ser submetida a medidas de ajuda, e a criança ou o adolescente, devem permanecer com seus
familiares após ampla investigação de quem foi conivente com tal violência.
6 Considerações finais
Existe
em cada um de nós um compromisso de mudança da situação atual que envolve o abuso
sexual cometido contra a criança e o adolescente. Nossa contribuição será pouca
se trabalharmos sozinhos, mas somados aos trabalhos de toda a comunidade, tanto
na denúncia dessa violência como na forma de ajudar a família a se erguer como
tal, melhorando as condições das crianças e adolescentes, talvez poderemos,
dar-lhes o exercício de um futuro e do papel de pais e adultos diferentes
daquele passado e desse presente.
Sabe-se
que romper com essa cadeia não é fácil, porque o modo violento de viver dessas
crianças e adolescentes está entranhado em nosso cotidiano. Entretanto, mesmo
que a luta seja difícil, vale a pena enfrentá-la, assim como vale a pena seguir
vivendo.
É
aterrorizante a constatação de que a família trouxe para dentro de si uma
espécie de suplício, praticando violências das mais variadas formas contra suas
crianças e adolescentes, constituindo-se numa sociedade familiar autoritária,
passando a criança ou o adolescente de vitimizada para violentada. Desta mesma
forma, pode-se dizer que a sociedade e o próprio Estado são coniventes com tal
fato, visto que silenciam ao presenciar essa violência que se legitima a cada
dia que passa.
Outro
fator de grande relevância e que deve ficar registrado é que a sociedade em si
não conhece a realidade de tal violência, pois há a falta de
diagnósticos e estatísticas confiáveis, falta de serviços padronizados e
falta de participação do cidadão na prevenção e na denúncia dos casos de
violência.
Conclui-se,
que a violência na sociedade brasileira, em qualquer das modulações, mas
principalmente naquela que diz respeito ao abuso sexual cometido contra a
criança e o adolescente, deve ser coibida e refutada, apontando a necessidade
de mudanças e de mais justiça social, através de normas capazes de incriminar o
agressor e puni-lo de forma eficaz.
A
defesa incondicional dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes, nos leva
a resgatar um pouco da solidariedade para com estas vítimas de todas as
espécies e violência existentes, e, principalmente, no que diz respeito ao
abuso sexual que assola, mormente as famílias, correspondendo a uma agressão
que lesiona fisicamente, moral e psicologicamente suas vítimas.
A
única solução para essa realidade fétida é a união de todos na luta pela
abolição. Se isso não for possível, lutaremos pela diminuição da agressividade
que é imposta aos nossos pequenos infantes, a começar pela família e por meio
de medidas efetivas de proteção e leis mais sérias e perceptíveis a tal
violência.
A
violência doméstica cometida contra a criança e o adolescente pode ser
considerada um câncer que se espalha de casa em casa, em qualquer cidade. Por
isso, as tentativas de políticas de atendimento a criança e ao adolescente,
vítimas dessa violência, são uma forma de esparadrapo ou curativo que cura
momentaneamente a doença tapando-a, mas não a elimina, podendo inclusive se
alastrar para outras partes do corpo ou melhor para outros componentes da
família se não for remediado logo, ou seja, através da retirada do agressor da
casa e não da criança ou do adolescente.
Sabe-se
que o momento é agora e a geração é essa. Precisamos agir de forma diferente em
relação às futuras gerações, encontrando alternativas para as dolorosas
punições e abusos sexuais cometidos contra a criança e o adolescente. Só com a
alteração desse quadro caótico que diz respeito à infância e a juventude que se
poderá transformar a história de nossas crianças e adolescentes, alterando,
dessa forma, o curso de nosso mundo e das gerações que estão por vir.
Devemos
lutar por um mundo melhor para nossa infância e juventude, por um sentimento
que respeite os corpos, os desejos e a personalidade de cada criança e
adolescente, de forma que seus direitos não sejam feridos, nem violados da
mesma forma que o direito dos adultos não o são.
Há a necessidade de um
resgate ético, devemos lutar por um sistema mais humanitário, pois um país que
nega às suas crianças e aos seus adolescentes o direito de ser realmente o que
são, não tem condições de considerar-se, no início do século XXI, uma nação
cidadã, pois se não protege o seu futuro não tem como viver o seu presente e
deve se envergonhar do que fizera no passado.
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67p.
__________.Os
direitos da criança e do adolescente. São Paulo: LTr, 1999. 208p.
Notas:
(1) Bacharela
em Direito, Especialista em Direito Processual e Assessora de Contratos da
Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC.
(2) AFONSO, Grace. Maus-Tratos:
violência de pais contra filhos.
Florianópolis, 1997. P. 01. Monografia (Curso de Graduação em Direito da
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC).
(3) DeMAUSE citado por GUERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Violência de pais contra filhos: a tragédia
revisitada. 3 ed. São Paulo: Cortez, 1998. p. 53
(4) AZEVEDO, M.A., GUERRA, V.N.de A. Pele de asno não é só
história...- um estudo sobre a vitimização sexual de crianças e adolescentes em
família. São Paulo: Roca, 1988. p. 36
(5) GUERRA, Viviane
Nogueira de Azevedo. Violência de pais
contra filhos: a tragédia revisitada. 3 ed. São Paulo: Cortez, 1998. p. 32
(6) PASSETTI, Edson. Violentados. Crianças, adolescentes e
justiça. 2 ed. São Paulo: Imaginário, 1999. p.16
(7) VERONESE, Josiane Rose Petry. Entre
violentados e violentadores? São Paulo: Cidade Nova, 1998.
p. 86
(8) FARINATTI, Franklin Augusto dos Santos. A criança maltratada. In:
CANDELORO, R. J., SILVA, J. C. da, SILVA, J. A. (Org.). Barbarói, Santa Cruz do Sul: EDUNISC, n 7, p. 87, set.1997.
(9) VERONESE, Josiane Rose
Petry. Entre violentados e violentadores?
São Paulo: Cidade Nova, 1998. p. 33
(10) AZEVEDO, M.A., GUERRA,
V.N.de A. Pele de asno não é só história...- um estudo sobre a vitimização
sexual de crianças e adolescentes em família. São Paulo: Roca, 1988. p. 53-54
(11) Ibidem, p.
54
(12) Ibidem, p.
74
(13) HERZBERG, Martha.
Violência no cotidiano. In: CANDELORO, R. J., SILVA, J. C. da, SILVA, J. A,.
(Org.). Barbarói, Santa Cruz do Sul:
EDUNISC, n 7, p. 96, set. 1997.
(14) BARISON, Mônica Santos.
Famílias envolvidas em situação de maus-tratos contra a criança e o
adolescente. Cadernos da CBIA. Rio de Janeiro, ano 1, v. 4. p. 39. 1992.
(15) GUERRA, Viviane
Nogueira de Azevedo. Violência de pais
contra filhos: a tragédia revisitada. 3 ed. São Paulo: Cortez, 1998. p. 89
(16) SANTOS, Hélio de
Oliveira. Crianças espancadas.
Campinas: Papirus, 1987. p. 80.
(17) Ibidem, p.
81.
(18) AFONSO, Grace. Maus-Tratos: violência de pais contra filhos. Florianópolis, 1997. p. 26
Monografia (Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa
Catarina – UFSC).
(19) SATTLER, Marli Kath. De quem é a
responsabilidade no abuso intrafamiliar. In: CANDELORO, R. J., SILVA, J. C. da,
SILVA, J. A,. (Org.). Barbarói, Santa
Cruz do Sul: EDUNISC, n 7, p. 102, set. 1997.
(20) Ibidem, p.
104.
(21) AZEVEDO, M.A., GUERRA,
V.N.de A. Pele de asno não é só história...- um estudo sobre a vitimização
sexual de crianças e adolescentes em família. São Paulo: Roca, 1988. p. 53
(22) VERONESE, Josiane Rose Petry. Os
direitos da criança e do
adolescente. São Paulo: LTr, 1999. p. 45.
(23) VERONESE, Josiane Rose
Petry. Entre violentados e violentadores?
São Paulo: Cidade Nova, 1998. p. 32
(24) LAMARÃO, M. L, BRITTO, R.C. de
C. Crianças, violência e cidadania.
Belém: Unama, 1994. p.119
(25) ROSÁRIO, Maria do. Os
direitos humanos das mulheres e meninas. In: Relatório Azul. Comissão de Cidadania e Direitos Humanos - Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul.
Porto Alegre, 1998/1999. p. 44
(26) FARINATTI, Franklin Augusto dos
Santos. A criança maltratada. In: CANDELORO, R. J., SILVA, J. C. da, SILVA, J.
A. (Org.). Barbarói, Santa Cruz do
Sul: EDUNISC, n 7, p. 86, set.1997.
(27) ROUYER, Michèle. As
crianças vítimas, conseqüências a curto e médio prazo. In. Marceline
Gabel (Org.). Crianças
vítimas de abuso sexual. Tradução de Sonia Goldfeder. São Paulo: Summus,
1997. p. 65.
(28) OLIVEIRA, Juarez de
(org.). Constituição da República
Federativa do Brasil. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p.01
(29) Ibidem, p.
116
(30) OLIVEIRA, Juarez de (org.). Constituição
da República Federativa do Brasil. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 117
(31) OLIVEIRA, Juarez de (org.). Estatuto
da Criança e do Adolescente. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p.30
(32) VERONESE, Josiane Rose Petry. Entre violentados e violentadores? São
Paulo: Cidade Nova, 1998. p. 91
(33) GUERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Violência de pais contra filhos: a tragédia revisitada. 3 ed. São Paulo:
Cortez, 1998. p.39
(34) LEAL, Rogério Gesta. Perspectivas
hermenêuticas dos direitos humanos e fundamentais no Brasil. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2000. p.180-183
(35)
Ibidem, p. 183
(36) OLIVEIRA, Juarez de (org.). Estatuto da Criança e do Adolescente. 8
ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p.144
(37) PASSETTI, Edson. Violentados.
Crianças, adolescentes e justiça. 2 ed. São Paulo: Imaginário, 1999.
p.42-43
(38) OLIVEIRA, Juarez de (org.). Estatuto da Criança e do Adolescente. 8
ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 02 e 04
(39) PASSETTI, Edson. Violentados.
Crianças, adolescentes e justiça. 2 ed. São Paulo: Imaginário, 1999. p.63
(40) Ibidem, p.
32
(41) PASSETTI, Edson. Violentados.
Crianças, adolescentes e justiça. 2 ed. São Paulo: Imaginário, 1999. p.77
(42) OLIVEIRA,
Juarez de (org.). Estatuto da Criança e
do Adolescente. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 17
(43) VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente.
São Paulo: LTr, 1999. p. 199
(44) OLIVEIRA,
Juarez de (org.). Estatuto da Criança e
do Adolescente. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 05
(45) NASCIMENTO, Stela Maris do. Intervenção na situação de mau-trato.
In: CANDELORO, R. J., SILVA, J. C. da, SILVA, J. A,. (Org.). Barbarói, Santa Cruz do Sul: EDUNISC, n
7, p. 108, set. 1997.
(46) ANDRADE, Leila Lima Ferreira.
Violência invisível. In: CANDELORO, R. J., SILVA, J. C. da, SILVA, J. A,.
(Org.). Barbarói, Santa Cruz do Sul:
EDUNISC, n 7, p. 111, set. 1997.
(47) Ibidem, p.
113.