TRABALHO
RURAL INFANTO-JUVENIL E A DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL
Ricardo Tadeu Marques da Fonseca(*)
Procurador
Regional do Trabalho, SP.
O trabalho rural desperta, no
Brasil, profundas discussões, tanto no que diz respeito aos adultos
trabalhadores, quanto aos pequenos cidadãos que também ativam nesse mister.
Até 1988, havia marcantes
desigualdades entre o operário e o lavrador, pois a CLT excluía o segundo de
seu manto tutelar. O Estatuto do Trabalhador Rural, Lei 4.214, de 2 de março de
1963, trouxe, pela primeira vez, direitos sociais ao homem do campo.
As sensíveis transformações do sistema
produtivo brasileiro levaram à publicação da Lei 5.889/73, que consolidou de
forma ampla toda uma gama de direitos peculiares ao homem do campo,
revolucionando o próprio alcance do Direito do Trabalho, ao determinar que os
direitos compreendidos naquele diploma fossem estendidos, quando couberem, a
todos os trabalhadores, empregados ou não.
Logo, a proteção social devida ao
rurícola assumiu grandes proporções.
Entretanto, no que diz respeito às
crianças e adolescentes, a lei em comento previa grande iniqüidade ao
estabelecer salário-mínimo correspondente à metade do devido ao adulto. Isto
com relação aos adolescentes até dezesseis anos.
A norma não foi recebida pela
Constituição em razão de disposição expressa, que veda a discriminação salarial
em razão da idade. Este trabalho pretende enfocar a realidade existente no
campo, sob a ótica da doutrina da proteção integral de crianças e adolescentes,
consagrada pela nova Carta Política.
A Constituição de 1988 incorporou a
teoria da proteção integral de crianças e adolescentes,
atingindo ponto culminante da evolução do conhecimento jurídico concernente ao
tratamento institucional conferido aos pequenos cidadãos.
Procuraremos, em breve síntese,
perquirir a valoração do trabalho infanto-juvenil ao longo do tempo, com vistas
a dimensionar o direito à profissionalização, no conjunto de direitos que,
pautados pela teoria acima mencionada, orientam a nova posição social dos
jovens.
Informam os historiadores e os
juristas[1], que se debruçaram sobre o tema, que a
humanidade percorreu longo caminho de maturação até que pudesse vislumbrar a
plena dignidade de seu trabalho.
Com efeito, nos primórdios, as
relações entre os homens orientavam-se pela força. Na busca de território para
a caça e extração de alimentos ou mesmo para o seu cultivo, os povos de maior
poderio subjugavam os demais, escravizando-os. A força de trabalho vinha,
então, desta relação de dominação.
O Evangelho noticia, porém, que
contribuiu decisivamente para a formação de Jesus a vivência com seu pai José,
filho de David, o qual lhe transmitiu conhecimentos acerca do ofício que
abraçara.
"'José amou a Jesus como um pai
ama a seu filho, tratou dele, dando-lhe o melhor que possuía, José, cuidando
daquele Menino, como lhe havia sido ordenado, fez de Jesus um artesão:
transmitiu-lhe seu ofício."(Mons. Escrivá)"[2].
Esta referência evangélica demonstra
que, desde a Antigüidade, a família se constituía não apenas como unidade
mínima de aproximação social, mas, também, como veículo de transmissão de
conhecimentos profissionais, mormente daqueles mais qualificados. Revela,
finalmente, a importância para a formação do indivíduo que o ensino
profissionalizante pode assumir.
De qualquer modo, o próprio
Cristianismo alterou as relações de trabalho. Na Idade Média, o vínculo
existente entre o senhor e os servos centrava-se numa troca em que o primeiro
garantia a terra e a proteção militar ao segundo, que, por sua vez, retribuía
com trabalho servil. Repugnava a Igreja o quadro outrora reinante. Não mais a
força de um se impunha sobre a do outro; havia uma relação colaborativa, embora
apenas na forma, pois na substância a dominação ainda imperava.
Ainda, na Idade Média, a transmissão
de conhecimentos, para o desempenho de ofícios tecnologicamente complexos,
passou a se desenvolver nas chamadas corporações de ofício, em que os mestres,
detentores desta tecnologia, tratavam de formar os aprendizes e companheiros,
submetendo-os à intensa disciplina e hierarquia rigorosa.
Na Idade Moderna, com a expansão
comercial do mercantilismo e com a Revolução Industrial dos séculos XVIII e
XIX, mais uma vez convulsionam-se as relações laborais, posto que a
complexidade do trabalho, outrora exigido para a confecção
dos produtos manufaturados, minuciosamente executado pelos membros das
corporações de ofício, cedeu lugar à força das máquinas a vapor que
propiciaram um aumento significativo na produção, bem como uma simplificação do
trabalho humano.
O trabalho do antigo artesão e mestre
perdeu espaço e foi substituído por homens, mulheres e crianças em linhas de
produção que exigiam gestos rápidos, simples e repetitivos, fazendo com que as
chamadas "meias-forças" passassem a compor o mercado de trabalho.
Exacerbou-se a exploração do labor infantil e feminino, tanto que, após as
convulsões sociais de reação organizada dos trabalhadores, veio a lume a
primeira lei de Direito do Trabalho, em 1802, na Inglaterra (Moral and Health
Act). Esta lei cuidava de questões inerentes ao ambiente de trabalho, limitando
a jornada em 12 horas apenas para os pequenos trabalhadores, cuja idade mínima
para o trabalho fora fixada em 8 anos.
Leis como esta foram sendo editadas em
toda a Europa, até que, em 1919, com a fundação da Organização Internacional do
Trabalho, a idéia de que o trabalho de adolescentes mereceria proteção especial
assumiu relevância universal e várias convenções daquele organismo
internacional passaram a limitar a idade mínima para o trabalho, inicialmente
em 14, e, posteriormente, em 15 anos. Sucederam-se acordos internacionais nos
vários ramos da economia, até que, em 1973, a Convenção 138 da OIT fixou de
forma generalizada a idade mínima de 15 anos,
admitindo exceções nos países em desenvolvimento, em que se permite o labor aos
14 anos, devendo, estes países, assumir o compromisso de, progressivamente,
elevar esta idade aos parâmetros gerais.
O Brasil não ratificou a Convenção 138[I], mas adotou suas diretrizes na
Constituição de 1988 que fixa a idade mínima de 14 anos, salvo na condição de
aprendiz, elevando-a em relação à Carta anterior, que a balizava em 12 anos.
A falta de ratificação daquela
convenção, no entanto, não afasta o compromisso de elevarmos a idade mínima
para o trabalho aos 15 anos.
A nação brasileira, todavia, passou a
professar, desde 1988, a teoria da proteção integral das crianças e
adolescentes e, no campo do trabalho, as disposições mais relevantes que a
consagram são: o art. 7º, inc. XXX e XXXIII, e o art. 227, caput e § 3º, ambos
da Constituição Federal.
A teoria da proteção integral é a
compreensão de que as normas que cuidam de crianças e adolescentes devem
concebê-los como cidadãos plenos, sujeitos, porém, à proteção prioritária por
se tratarem de pessoas em desenvolvimento físico, psicológico e moral. Não são
tomados mais como cidadãos latentes, potenciais. Sua cidadania, como já foi
dito, é plena, sendo-lhes conferidos todos os direitos a ela inerentes,
inclusive o de participação política, quando se faculta, por exemplo, ao
adolescente de 16 anos o voto, ou quando o art. 53 do ECA
estimula a participação de crianças e adolescentes na política estudantil, com
vistas à crítica de currículo ou da organização escolar.
Assinale-se que o conceito de
cidadania aqui defendido não é o tradicional, aquele que vislumbra apenas a
possibilidade de votar ou de ser votado. Reflete, isto sim, a concepção de que
cidadão é todo aquele do povo e, por isso, destinatário dos esforços do Estado
para que obtenha o pleno desenvolvimento como pessoa.
Outro desdobramento da teoria da
proteção integral é a criação dos conselhos nacionais, estaduais e municipais
de defesa das crianças e dos adolescentes, bem como dos conselhos tutelares.
Estes últimos executam as políticas traçadas pelos primeiros, que gozam de
poderes normativos. Todos os conselhos possuem composição paritária, com representantes
do Poder Executivo e da sociedade civil organizada, sobrelevando, desta
maneira, a ação paritária da sociedade na defesa dos direitos em tela.
A legislação anterior à
"Constituição-Cidadã" espelhava a doutrina da situação irregular. O
Código do Menor de 1979, V.g., possuía normas voltadas aos adolescentes
infratores, ou dispositivos de conteúdo assistencialista,
destinados aos socialmente desprovidos. Por isso que a doutrina afirma,
em uníssono, que a Constituição atual e o Estatuto da Criança e do Adolescente
representam maturação ideológica, por conterem as características da teoria da
proteção integral, concebendo os jovens e infantes como cidadãos plenos e
merecedores de maior atenção por parte do Estado e da sociedade.
Fato que deve ser ressaltado é que o
art. 227 da Constituição espelha a Convenção dos Direitos da Criança, que foi
votada em Nova Iorque em 1989. A sociedade civil brasileira,
conhecedora dos termos da convenção que viria a ser votada, mobilizou-se
no ano de 1987 e fez com que o texto do artigo em questão se incorporasse à
Carta Constitucional, por meio de emenda popular subscrita por duzentos mil
adultos e por mais de um milhão de adolescentes.
Logo, a doutrina da proteção integral
universalizada pela Convenção de Nova Iorque somou-se ao direito brasileiro por
meio de ação política direta da sociedade civil, antes mesmo de se tornar
universal pelo instrumento internacional que só foi aprovado em 1989.
Esta doutrina elevou o direito à
profissionalização ao nível de direito fundamental de que são titulares os
jovens.
A profissionalização é definida como
um processo metódico em que se alternam experiências teóricas e práticas[3] com uma sucessão de tarefas
gradualmente mais complexas e tendentes à aquisição de um trabalho qualificado
ou de uma profissão.
O professor Oris de Oliveira
classifica[4] as formas de aprendizagem em:
aprendizagem escolar e empresarial. A primeira subdivide-se em estágio
profissionalizante e aprendizado em escolas de profissionalização. A segunda,
em aprendizagem stricto sensu, realizada na empresa e nos serviços nacionais de
aprendizagem, além de aprendizagem metódica na própria empresa.
Entendemos que a nova ordem
constitucional não recebeu o Decreto-Lei nº 2.318/86, que criou a figura do
menor assistido, não o fazendo por vários motivos: o primeiro deles é a
determinação expressa pelo inciso XXX, do art. 7º, da Constituição, que veda
qualquer discriminação de "critério de admissão ou de salário em razão do
sexo, da idade, da cor e do estado civil"; o segundo decorre do caput do
art. 227, também da Carta Magna, que assim se lê:
"É dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão".
Sublinhe-se, ademais, o parágrafo 3º,
do mesmo art. 227, que preceitua:
"O direito à
proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
I- idade mínima de quatorze anos para
admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII;
II- garantia de direitos
previdenciários e trabalhistas;
III- garantia de acesso do trabalhador
adolescente à escola;
IV-
............................................."
No meio rural, importantes
transformações foram propiciadas por este quadro institucional. Ressalte-se, a
princípio, que os Conselhos Municipais devem estabelecer políticas de absorção
dos filhos de trabalhadores que, eventualmente, estejam sendo levados ao
trabalho em razão da necessidade de suplementação de renda das famílias e de
falta de serviços municipais voltados aos cuidados que lhes deveriam ser
destinados.
É notória a crescente precarização de
direitos destes trabalhadores, pais de famílias, que são remunerados por
produção e que, na condição de bóias-frias ou de falsos cooperados associados a
cooperativas de mão-de-obra rural, necessitam do apoio dos filhos para aumentar
a produção individual e, com isso, restabelecer os ganhos outrora auferidos.
A imprensa tem noticiado que o número
de crianças e adolescentes na lavoura vem aumentando e a razão não é outra se
não aquela acima descrita.
É premente a necessidade de se retirar
as crianças e adolescentes do trabalho do campo. Esta
necessidade não é lastreada apenas no intuito formal de fazer cumprir o
dispositivo constitucional que veda o trabalho insalubre aos adolescentes e
qualquer trabalho às crianças, tampouco a disposição do Estatuto da Criança e
do Adolescente que também proíbe o trabalho penoso, norma esta em pleno vigor.
Trata-se de garantir, com esta medida, a plena escolaridade e o desenvolvimento
saudável daqueles brasileiros que se encontram em fase de crescimento.
Em diligências realizadas na região da
citricultura, em São Paulo, pudemos apurar que o número de adolescentes e
crianças na lavoura de laranja vem aumentando e que tais adolescentes não
conseguem acompanhar a atividade escolar, eis que o trabalho lhes é
extremamente extenuante, sendo de se frisar que as caixas de laranjas portadas
pelos pequenos trabalhadores pesam cerca de 27 quilos, quando a CLT proíbe-lhes
o trabalho que demande peso acima de 20 quilos.
Tivemos a oportunidade de exibir estes
fatos por meio de vídeos gravados a partir de matérias publicadas pela imprensa
televisiva, em palestra proferida no Congresso de Direito do Trabalho Rural,
patrocinado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, no ano de 1997,
no município de Águas de Lindóia, comunicando, naquela oportunidade, as medidas
que vêm sendo tomadas pela Procuradoria da 15ª Região, ou seja, várias ações
civis públicas para coibir a utilização das cooperativas fraudulentas.
Também há notícias de trabalho de
adolescentes no corte de cana, trabalho este insalubre, conforme já apurou a
FUNDACENTRO, em laudo médico circunstanciado que instruiu Ação Civil Pública
promovida pelo Ministério Público Estadual no Município de Matão, Estado de São
Paulo.
Em Audiência Pública realizada por
esta Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região, em 08 de março de 1996,
reuniram-se todos os Dirigentes Sindicais representantes dos trabalhadores
rurais do interior do Estado de São Paulo, os quais noticiaram que, embora
exista o trabalho de adolescentes no setor da cana, este
vem sendo progressivamente reduzido. Há, todavia, trabalho constante de adolescentes nas lavouras de tomate, algodão, amendoim, etc.
Lidam os pequenos trabalhadores da
chamada "lavoura branca", com agrotóxicos, sem a utilização dos
equipamentos de proteção individual e em jornadas integrais.
Deverá, outrossim, intensificar-se a
fiscalização e combate a este trabalho porque é contrário aos desígnios
constitucionais.
É conhecida a bem sucedida política de
renda mínima que vem sendo implantada pelo Governo Federal no Estado de
Pernambuco, para retirar os adolescentes do corte da cana e mantê-los na
escola. No Estado da Bahia, tem sido divulgada a incidência
de alto número de trabalhadores adolescentes na lavoura de sisal, com a
utilização de maquinário absolutamente precário, que tem ocasionado mutilação
em centenas de trabalhadores, inclusive adolescentes. Também lá,
implanta-se política de renda mínima.
Estamos convencidos de que o trabalho
dos adolescentes no campo é inadequado, pois demanda intensa força física e
expõe o trabalhador às intempéries, caracterizando-se como penoso, insalubre,
e, por isso, proibido.
Estamos seguros, ademais, de que não
deve haver qualquer vacilação no sentido da ação acima defendida, de vez que o
trabalho não é a alternativa em relação à marginalidade dos adolescentes. Tanto
esta como aquele hão de ser encarados como problemas sociais, para cuja solução
existem recursos, os quais devem ser bem administrados.
Os Conselhos Municipais têm o dever de
estabelecer campanhas, inclusive para arrecadação de fundos, de vez que são
beneficiários de quantias percentuais sobre o Imposto de Renda a pagar por
pessoas físicas ou jurídicas. Deveriam aumentar as campanhas de arrecadação de fundos
e esclarecimento da população, para o estabelecimento de políticas de renda
mínima, a exemplo do que vem sendo feito ao nível federal e em alguns estados e
municípios brasileiros.
Além da possibilidade de arrecadação
dos Conselhos Municipais, há recursos que fluem ao Fundo de Amparo ao
Trabalhador (FAT), os quais podem ser aplicados para a profissionalização,
sendo possível a sua utilização pelos Sindicatos Profissionais e Patronais.
Outra fonte de recursos oficiais é o
PAS - Plano de Assistência Social, constituído de 1% do que é faturado pela
indústria sucro-alcoleira com a produção do açúcar e 2% do que a indústria
obtém com a produção do álcool.
Este fundo deve reverter em atividades
sociais em favor dos trabalhadores, mas a sua utilização não vem sendo
convenientemente fiscalizada.
Inicia-se, porém, uma atuação conjunta
entre o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho e os
Ministérios da Previdência e do Trabalho, justamente para a apuração da
destinação dos recursos devidos ao PAS, havendo a preocupação prioritária de se
investir tais verbas no combate ao trabalho infantil e juvenil, no campo.
A profissionalização, no meio rural, é
oferecida pelo SENAR (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), criado em 1991,
exatamente como desdobramento da nivelação, de direitos entre trabalhadores
urbanos e rurais.
Destarte, se houver trabalho de
adolescentes no campo, deverá ser um trabalho absolutamente especial e voltado
à formação profissional.
A automação do trabalho rural é
crescente e inevitável, seja porque a necessidade de produção aumenta, seja
porque há que se racionalizar os custos da produção agrícola.
Já se conhece a possibilidade de
cultivo e colheita automatizados em vários setores da área rural, sendo recente
o desenvolvimento de máquinas que possibilitam o corte da cana, a colheita do
café e da laranja, etc.
Como se vê, a própria mão-de-obra
rural tende a se tornar escassa e altamente qualificada.
Urge, portanto, a priorização da formação
de mão-de-obra neste setor e o alargamento das atividades do SENAR, o qual, por
ora, não atende adolescentes.
As grandes economias mundiais já
passaram por um processo de automação da área rural. Tal processo não tardará a
se generalizar em nosso país.
Ao pregarmos a extinção do trabalho de
adolescentes e crianças no campo, temos a atenção voltada para a história e
para a necessidade de modernização das relações de trabalho urbano e rural e
somos partidários da certeza de que há alternativas, as quais não devem tardar,
sob pena de o Brasil naufragar nos mares do mercado internacional.
O trabalho familiar, no entanto, como
sendo aquele em que o adolescente labora exclusivamente para o pai ou no âmbito
restrito da família e em propriedade desta, deve ser tolerado desde que
consentâneo com as regras aqui expostas, eis que o cuidado que os genitores
dedicam aos próprios filhos é evidente.
Fato extremamente relevante e que deve
ser sublinhado nesta oportunidade é o de que a Emenda 33-M à Carta Constitucional
que trata da reforma previdenciária já está aprovada. A Emenda em testilha
altera o conteúdo do inciso XXXIII, do art. 7º da Constituição, e, quando
entrar em vigor, elevará a idade mínima para o trabalho aos 16 anos, tolerando
a aprendizagem a partir dos 14[II].
A mudança não deve causar espécie,
mormente ao se considerar a elevação do prazo de contribuição para
aposentadoria por tempo de serviço. O texto mencionado é o seguinte:
"XXXIII - proibição de trabalho
noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a
menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze
anos;"
Conclusão:
1- a Constituição Brasileira equiparou
os trabalhadores urbanos e rurais em direitos, sem, no entanto, olvidar as
peculiaridades do trabalho dos camponeses;
2- adotou, outrossim, a Carta Magna, a
doutrina da proteção integral de crianças e adolescentes,
garantindo-lhes todos os direitos de cidadania, os quais lhes devem ser
conferidos por ação prioritária do Estado e da sociedade civil;
3- a legislação brasileira proíbe
qualquer trabalho a menores de 14 anos e atividades insalubres, perigosas,
noturnas e penosas aos adolescentes no campo ou na cidade;
4- o trabalho no campo, se não for
insalubre, é, no mínimo, penoso, e, por isso, inadequado, ao menos da forma
como se vem realizando;
5- há várias alternativas para as
famílias carentes, alternativas estas que defluem de recursos oficiais, como o
PAS, o FAT, os projetos de renda mínima e as políticas a serem implantadas
pelos Conselhos Municipais, que podem arrecadar fundos para tanto;
6- o trabalho
desprotegido não é alternativa para a marginalidade dos adolescentes no
campo; tanto esta como aquele são problemas que devem ser enfrentados pela
sociedade;
7- a Emenda Constitucional nº 33-M de
1995 eleva a idade mínima para o trabalho para os 16 anos, tolerando a
aprendizagem a partir dos 14.
Notas
(*) Procurador Regional do Trabalho,
Professor do Curso de pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade São
Francisco em Campinas, Especialista e Mestre em Direito do Trabalho pela
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
[1]
Nascimento, Amauri Mascaro, " Curso
de Direito do Trabalho", Ed. Saraiva, 1989, pp. 03 a 38 e Vianna, Segadas,
" Instituições de Direito do Trabalho", LTr, 1991, p.27 a 54.
[2]
Zenklussen,
Holger, "A Oficina de Nazaré", tradução de Frei Luís Maria A.
Sartori, OFM, São Paulo, LTr,1993, p. 39.
[3]
Convenção 142 e Recomendação 117 da OIT
[4]
Oliveira, Oris, "O trabalho da criança e do
Adolescente", LTr, 1994, p. 89 a 98.
[I] Nota do Conselho Editorial do Acervo Operacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente: a Convenção 138 da OIT foi promulgada pelo
Decreto 4.134, de 15 de fevereiro de 2002.
[II] Nota do Conselho Editorial
do Acervo Operacional dos Direitos da Criança e do Adolescente: o artigo 7º, inciso
XXXIII, da Constituição da República foi alterado pela Emenda Constitucional
20, de 15 de dezembro de 1998.