INFÂNCIA E JUVENTUDE. APELAÇÃO. ATO INFRACIONAL GRAVE. MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA. INTERNAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONCORRÊNCIA PARA O ATO INFRACIONAL. MENOR IMPORTÂNCIA DE PARTICIPAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO. NULIDADE. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. MÉRITO PREJUDICADO. A aplicação da medida de internação, sem exame de exclusão das demais medidas sócio-educativas, além de violar o princípio constitucional de sua excepcionalidade, nega vigência ao mandamento inserto no artigo 93, IX, que manda sejam fundamentadas todas as decisões do Poder Judiciário, sob pena de nulidade. Recurso de apelação nº 2539-1, da Vara da Infância e da  Juventude da comarca de Curitiba TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ. relator: Dilmar Kessler. 19.04.99.

 

 

 

 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ

 

 

Recurso de apelação nº 2539-1, da Vara da Infância e da  Juventude da comarca de Curitiba 

 

 
Apelantes: ... e ... 


Apelado   : Ministério Público 


relator: Dilmar Kessler 


INFÂNCIA E JUVENTUDE. APELAÇÃO. ATO INFRACIONAL GRAVE. MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA. INTERNAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONCORRÊNCIA PARA O ATO INFRACIONAL. MENOR IMPORTÂNCIA DE PARTICIPAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO. NULIDADE. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. MÉRITO PREJUDICADO. A aplicação da medida de internação, sem exame de exclusão das demais medidas sócio-educativas, além de violar o princípio constitucional de sua excepcionalidade, nega vigência ao mandamento inserto no artigo 93, IX, que manda sejam fundamentadas todas as decisões do Poder Judiciário, sob pena de nulidade. 

                                                VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Apelação nº 2539-1, da Vara da Infância e da Juventude da comarca de Curitiba, em que são apelantes ... e ... , e apelado o Ministério Público: 


                                                1. ... e ... apelam contra a sentença que julgou procedente a representação que lhes atribuiu a prática do ato infracional previsto no artigo 157, § 2º, I e II, e 3º, do Código Penal, com a consequente aplicação da medida sócio-educativa de internação. 
                                                O apelante ..., pedindo a improcedência da representação, aduz,  em preliminar, que houve cerceamento de defesa porque teve indeferido pedido de reconstituição dos fatos; que a verdade não foi apurada; que o co-representado, ..., deveria ser ouvido novamente para esclarecer os fatos, uma vez que sua negativa de autoria vai de encontro a todas as evidências, que o apelante não concorreu de forma alguma para a realização do ato infracional.

 
                                                O segundo apelante. ..., alega que deve ser aplicada a regra da participação de menor importância na ação que lhe foi atribuída, pelo que faz jus à medida sócio-educativa mais branda, especialmente por ser pessoa de bom relacionamento familiar e social;  alternativamente,  pede redução da pena de internamento que lhe foi fixada em seis meses. 


                                                A dra. Promotora de Justiça manifestou-se, a f. 369/374, pelo improvimento dos recursos. 

 
                                                Despacho de manutenção da sentença, a  f. 375. 

 
                                                Nesta instância, o parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça, a f. 381/408, é, alternativamente, pela decretação da nulidade da sentença, por ilegalidade e ausência de fundamentação, ou sua reforma, substituindo-se a medida de internação por liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade. 

 
                                                2. Procedente o pronunciamento da douta Procuradoria Geral de Justiça. 

 
                                                É nula a sentença recorrida.

 
                                                O julgador singular considerou, apenas, um dos pressupostos para decidir pela aplicação da internação aos apelantes, previsto no artigo 122, do Estatuto da Criança e do Adolescente, qual seja, o de terem cometido ato infracional mediante violência a pessoa. 


                                                Esse requisito encontra-se configurado na ação dos adolescentes, de cujo procedimento resultou a morte da vítima .... 

 
                                                Contudo, a gravidade da ação praticada não é o bastante para determinar a internação dos seus autores. 

 
                                                A Constituição Federal, no artigo 227, § 3º, V, estabelece, entre outros, o princípio da excepcionalidade, quando da aplicação de qualquer medida privativa de liberdade  ao adolescente, levando em conta a sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. 


                                                Esse princípio recebeu contornos objetivos na Lei nº 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) que dispõe, no parágrafo 2º, do artigo 122, que "Em nenhuma hipótese será aplicada a internação havendo outra medida adequada". 


                                                Ora, tal regra, derivada do referido princípio acolhido na Constituição Federal, importa em que, no exame do caso, ao decidir pela internação, proceda o julgador à demonstração de que as outras medidas sócio-educativas elencadas na mesma lei não são adequadas. 

 
                                                É o juízo de exclusão ao qual está sujeito o aplicador da lei, de modo inarredável.

 
                                                Assim, deve ele dizer por que não são apropriadas as medidas sócio-educativas que precedem a internação, em gravidade, quais sejam, a semi-liberdade, a liberdade assistida, a prestação de serviços à comunidade, a obrigação de reparar o dano causado e a advertência, todas de cunho pedagógico de grande alcance. 

 
                                                Registre-se que tais medidas podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente. 


                                                A esse raciocínio não procedeu o dr. Juiz, limitando-se a constatar a gravidade da infração e a dizer: 

 
"Outra saída não vemos que não a aplicação... da medida extrema de internamento, solução ... única capaz de nortear-lhes a conscientização, recuperação e aprendizado sobre os valores da vida humana por eles foi ceifada ..." (sic. f. 315).

 
                                            Com propriedade, registra o parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça, que 

 
"Em função do mencionado PRINCÍPIO DA EXCEPCIONALIDADE que rege a aplicação de medidas privativas de liberdade, reputa-se verdadeiramente IMPRESCINDÍVEL que a sentença que opta por tal solução exponha de forma completa e minuciosa todo o raciocínio que levou o julgador a concluir pela necessidade da segregação do adolescente do convívio familiar e comunitário, o que obviamente importa na análise - e afastamento, através de argumentos jurídicos idôneos de todos os dispositivos legais e constitucionais que estabelecem como REGRA ABSOLUTA justamente o oposto, ou seja, a aplicação de medidas sócio-educativas preferencialmente em meio aberto. Assim sendo, quando entender necessária a aplicação de medidas sócio-educativas privativas de liberdade, não pode o magistrado deixar de consignar EXPRESSAMENTE A RAZÃO DE TER ELE CONCLUÍDO PELA IMPOSSIBLIDADE, INVIABILIDADE OU INADEQUAÇÃO À ESPÉCIE DAS MEDIDAS EXEQÜÍVEIS EM MEIO ABERTO... sem o que estará ... VIOLADO O PRINCÍPIO  LEGAL E CONSTITUCIONAL  da EXCEPCIONALIDADE  da imposição de tais medidas (f. 394).

 
                                                Não tendo a sentença demonstrado que as demais medidas sócio-educativas são inadequadas, além de descumprir o referido princípio da excepcionalidade, feriu também o princípio constitucional inserto no artigo 93, IX, da Constituição Federal que impõe sejam fundamentadas todas as decisões do Poder Judiciário, sob pena de nulidade. 

 
                                                Assim, preliminarmente, é de se decretar a nulidade da sentença, restando prejudicados os apelos.

 
                                                ACORDAM os integrantes do Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, decretar a nulidade da sentença, prejudicados os apelos. 


                                                Participaram do julgamento os Excelentíssimos Desembargadores Accácio Cambi e Regina Afonso Portes. 

 
                                                Curitiba, 19 de abril de l999. 


                                                Sydney Zappa 


                                                Presidente 


                                               Dilmar Kessler 

 
                                               Relator