GUARDA NO NOVO CÓDIGO CIVIL
Wilson Donizeti Liberati[1]
Promotor de Justiça, RO.
Resumo: A guarda de crianças e adolescentes é um dos atributos do poder familiar. Sua existência legal está fundada na ordem constitucional, prevista no § 5º do artigo 226, que iguala os direitos pelo homem e pela mulher, na constância da convivência marital. A guarda obriga os pais, em conjunto, a velar e a zelar pelos direitos de seus filhos, possibilitando, inclusive, a co-responsabilização dos genitores pela descúria familiar. Consagrado pelo sistema legal vigente, a guarda não sofreu modificação com a vigência da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que instituiu o novo Código Civil. Manteve as expressões já consagradas na Lei nº 6.515/77, que disciplinou o divórcio entre nós. De igual forma, o direito de visita manteve-se inalterado, permitindo ao pai ou mãe separado a manutenção dos vínculos familiares através da atenção presencial. Embora implicitamente consagrada, a guarda conjunta ou compartilhada proporciona ao casal separado a possibilidade de, juntos, resolver as intercorrências da vida dos filhos. O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, disciplina a guarda para crianças e adolescentes nas situações de risco previstas no artigo 98, privilegiando a família do hipossuficiente. A guarda familiar surge como opção de vanguarda em nossa ordem jurídica, convocando a sociedade para garantir o direito à convivência familiar e comunitárias dos jovens protagonistas.
SUMÁRIO
1. Direito à convivência familiar e comunitária – ordem constitucional
2. A Guarda no novo Código Civil
2.1. Conceito de guarda e sua finalidade
2.2. A guarda na ruptura da sociedade conjugal e na união estável
2.3. A guarda compartilhada
3. O Direito de Visita
4. Modalidades de Guarda – A Guarda no Estatuto da Criança o do
Adolescente
Referências Bibliográficas
1. Direito à convivência familiar e comunitária – ordem constitucional
Toda criança tem o direito de ser criada em uma família. Se esta premissa não constasse em Convenções Internacionais ou nas leis internas dos países, nem por isso não teria força cogente. Em outras palavras, a convivência em uma família é direito natural da criança e do adolescente e, por isso, compreendida e respeitada por sua intrínseca relação entre seus componentes.
Tal assertiva fica mais evidente na lição de Mônaco da Silva (1995, p. 5), quando ensina que:
"Toda a sociedade encontra ou deveria encontrar na família o seu ponto de partida. A família é a célula-mãe da sociedade; é o espelho sem o qual a sociedade não poderá prosseguir seu caminho rumo ao bem comum. A família, enfim, é a base da sociedade, como prescreve o art. 226 da Carta Magna".
Mas, mesmo assim, nossa atual
Constituição decidiu consignar, explicitamente, a proteção ao direito à
convivência familiar, fixando, primeiro, no artigo 226, que "a família, base da sociedade, tem especial proteção do
Estado". Dispõe, no artigo seguinte, que "é dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde... à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão".
A regulamentação do artigo 227 da Constituição deu-se através da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), que materializou, no artigo 19, o direito da criança e do adolescente de ter uma família, ao dispor que "Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária...".
Em complemento, o artigo 25 do Estatuto dispõe que a família natural é "a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes".
Portanto, tem-se uma ordem jurídica garantista, integralista da completude de direitos e extreme de dúvidas, sobre a abrangência da proteção ao direito fundamental da criança e do adolescente de pertencer a uma família.
Pela evidência, seria desnecessário dizer que a prevalência desse direito pertence à família natural. Ou seja, a "criança e o adolescente têm o direito a ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta..." Dessa forma, a manutenção da criança em sua própria família segue a ordem natural do desenvolvimento do homem, que, desde criança, aprende a compartilhar, com os demais membros do grupo familiar, seus problemas, suas angústias, seus medos, suas alegrias, seus sucessos etc.
A novidade do mandamento constitucional acentua-se na forma de como esse direito deve ser garantido e protegido: com absoluta prioridade.
Na lição de Cury (1998, p. 1), "tanto a reintegração familiar quanto a colocação em família substituta se inserem na expressão convivência familiar, direito assegurado à criança e ao adolescente como prioridade absoluta, quer pela Constituição Federal de 1988 (artigo 227), quer pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (artigo 4º)".
Assim, o fato de a criança permanecer em sua família de origem foi erigido a direito fundamental pelo texto constitucional citado. Quando o direito é colocado nessa condição, significa que ele é a base para o desenvolvimento e aperfeiçoamento de alguma situação. Nesse caso, o bem jurídico tutelado é o vínculo familiar da criança com sua família.
É no seio da família que a pessoa desenvolve e completa o ciclo de socialização; por ele aprende a adquirir os valores sociais e a navegar entre as diferenças de comportamento.
Sem dúvidas, o espaço familiar é, por excelência, o local privilegiado, que desenvolve os valores da criança, orientando-a para a dura batalha de resolver seus próprios problemas e enfrentar as dificuldades do dia-a-dia. Uma instituição de amparo à criança, por exemplo, não tem condições de lhe oferecer esse direcionamento, já que não pode realizar esse intercâmbio afetivo, próprio das famílias.
É na família que a criança aprende o sentido da liberdade; é nela que se aprende e se inicia a atividade laborativa; é nela que se encontra o ambiente apropriado para o desenvolvimento do ser humano; é nela que a criança se sente protegida e em segurança para percorrer o caminho que a leva a se integrar na sociedade e no mundo.
Não se pode perder de vista que a família é a primeira instituição a ser convocada para satisfazer as necessidades básicas da criança, incumbindo aos pais a responsabilidade de sua formação, orientação e acompanhamento.
Como núcleo principal da sociedade, a família deve receber imprescindível apoio para proteger sua constituição, pois é no lar que a criança irá receber a melhor preparação para a vida adulta. Nessa evidência, se os pais não forem orientados e preparados, serão poucas as possibilidades de se proporcionar às crianças e adolescentes um ambiente adequado para seu desenvolvimento sadio e equilibrado.
Sendo o melhor ambiente para o aperfeiçoamento e crescimento infanto-juvenil, a família deve ser fortalecida, primeiro, com o respeito e moralização de sua finalidade; depois, com programas de auxílio comunitário ou governamental, que devem colaborar na reestruturação dos ideais domésticos. Caso não se verifique esse esforço de reordenamento da família, caberá a intervenção da sociedade ou do Estado. Se os pais forem considerados os responsáveis pela ameaça ou violação dos direitos da criança ou adolescente de desenvolver sadia e harmoniosamente sua personalidade, também intervirá o Poder Público para garantir esse direito de realização de sua vocação pessoal.
Perante isso, seria desnecessário continuar a enaltecer as qualidades, virtudes e, principalmente, a necessidade da convivência de uma criança com sua família natural. A convivência familiar decorre, simplesmente, da natureza do próprio homem. Viver em família é o natural, o lógico, a regra; viver fora ou separado da família é a exceção.
Entretanto, a ordem jurídica contemplou a excepcionalidade quando uma criança ou adolescente não pode ou, por algum motivo, não consegue conviver com sua família natural. Instituiu, sob o mesmo fundamento constitucional, o direito à convivência familiar e comunitária em família substituta.
Para Mônaco da Silva (1995, p. 8), a família substituta "é a que substitui a família natural; é a que vem em segundo plano, logo depois desta última; isso não significa dizer que a família substituta seja inferior, sob a ótica moral, religiosa, econômica etc, à família natural. Absolutamente não! O que a lei pretende expressar, ao dar prioridade à família natural em relação à família substituta, é que a regra, por motivos óbvios, traduz-se na permanência do menor no seio de sua família de sangue, apenas excepcionalmente em outra família".
Sem dúvida, a colocação de criança ou adolescente em família substituta ou alternativa, somente pode ser entendida como um meio de integração com a família natural. Entender de outra forma esse instituto seria colocar a exceção no lugar da regra, numa demonstração de desrespeito à ordem de preferência estabelecida pela lei.
Em outra oportunidade, comentamos que: "quando essa família (natural), por algum motivo, desintegra-se, colocando em risco a situação de crianças e adolescentes, surge, então, a família substituta, que, supletivamente, tornará possível sua (da criança e do adolescente) integração social, evitando a institucionalização" (LIBERATI, 2002, p. 25).
A família substituta, em nossa ordem jurídica, surgiu, especialmente, para impedir a institucionalização em estabelecimentos educacionais, creches, abrigos ou outras instituições herdadas das políticas de atendimento advindas do passado, tais como: o Decreto nº 17.943-A, de 1927, conhecido por "Código de Menores Mello Mattos", o Decreto-Lei nº 3.799/41, que criou o Serviço de Assistência aos Menores - SAM e pela instituição da Política do Bem-Estar do Menor, pela Lei nº 4.513/64, administrada pela Fundação do Bem-Estar do Menor - FUNABEM, que foi, por último, acolhida pela Lei nº 6.697/79, que instituiu o Código de Menores.
Todo esse histórico institucional de políticas de atendimento, especialmente de abrigamento, mostrou-se, inquestionavelmente, um retrocesso na construção dos princípios civilizatórios, morais e éticos de nossas crianças e adolescentes marginalizados e privados de uma família.
Lembra Ferreira (1999, p. 54)
que: "quando da colocação de uma criança ou adolescente
em família substituta devem ser obedecidos os seguintes princípios: a) a oitiva
da criança e do adolescente, sempre que possível e com consideração de sua
opinião. Trata-se da aplicação do direito à liberdade, consagrado no
artigo 16, II do ECA, sendo que é obrigatório quando
se tratar de adoção de adolescente. Por interferir diretamente em sua vida, a
criança e o adolescente devem ser ouvidos a respeito da família substituta
pretendente (ECA, art, 28, § 1º); b) observação do grau de parentesco e a
relação de afinidade ou de afetividade entre a criança ou o adolescente e os
requerentes do pedido de colocação em família substituta, com o objetivo de
minorar as conseqüências da medida (ECA, art. 28, § 2); c) a família deve
oferecer ambiente familiar adequado, devendo ainda o interessado não apresentar
qualquer incompatibilidade com a medida (ECA, art. 29)".
Complementando a relação de requisitos apresentados acima, Pereira (1996, p.229) inclui aquele descrito no caput do artigo 28 do Estatuto, que dispõe que a medida se aplica "independente da situação jurídica da criança e do adolescente".
A família substituta surgiu, portanto, para, supletivamente, desenvolver as funções da família natural e, sobretudo, para evitar a institucionalização de crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social. Deve, pois, a família substituta representar para a criança e o adolescente a melhor medida para sua proteção e desenvolvimento (comparada à institucionalização).
Por fim, deve-se fazer o registro de que a guarda, na sua concepção autônoma é estudada pelo Direito Civil, no âmbito do direito de família e pelo Direito da Criança e do Adolescente, nas interfaces especiais previstas pela Lei nº 8.069/90 - Estatuto da Criança do Adolescente. Em ambos os casos busca-se, indiscutivelmente, o melhor interesse da criança, no seu sentido mais amplo.
2. A Guarda no Novo Código Civil
O novo Código Civil, regulamentado pela Lei nº 10.406/02, não se preocupou em identificar, em capítulo próprio, o instituo da guarda. Entretanto, não ignorou o instituto, incorporando-o nas obrigações parentais.
De fato, a nova lei ao tangenciar o assunto, localiza a guarda como derivação do poder familiar, na constância ou na ruptura da sociedade conjugal ou da união estável, exercida sobre os filhos menores, ou da responsabilidade civil dos pais por danos decorrentes da prática de atos ilícitos praticados por seus filhos menores.
Por exclusão, o novo Código Civil, não trata da guarda quando crianças e adolescentes estão em situação de risco pessoal e social, definidas no artigo 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Dessa forma, a situação jurídica de crianças hipossuficientes, que foram relegadas pelo Estado e pela sociedade, por falta ou omissão dos pais ou responsável, as destituídas do pátrio poder ou, em outras palavras, daquelas consideradas em situação de risco, estarão abrigadas pelas normas específicas da Lei nº 8.069/90.
2.1. Conceito de guarda e sua finalidade
O novo Código Civil não conceitua a guarda; prefere integrá-la na relação dos deveres do casamento (art. 1.566, IV) e nos deveres dos companheiros, na união estável (art. 1724), reproduzindo o que já se firmara através do artigo 2º da Lei nº 9.278/96. Além disso, a guarda é tratada, no novo Código Civil, como obrigação imposta aos pais, como conseqüência da separação, divórcio, ruptura da união estável e concubinato.
Todavia, o sentido de guarda prenunciado pela novel lei não tem outro significado senão daquela prerrogativa inerente ao pátrio poder, embora não seja de sua essência.
Outra não é a posição de Fachin (1997, p. 590), quando assevera que, embora "conectada à idéia do ‘pátrio poder’, a compreensão dos deveres a ele inerentes remete à guarda. Ambos não se confundem e têm molduras jurídicas próximas".
Sob esse enfoque, pode-se dizer com Figueirêdo (1999, p. 15), que, dentre todos os atributos do poder familiar, a guarda "estaria colocada no ápice", em vista de sua importância para o perfeito desenvolvimento da criança e do adolescente.
É possível, entretanto, definir a guarda, com Strenger (1998, p. 32), como um múnus: "guarda de filhos ou menores é o poder-dever submetido a um regime jurídico-legal, de modo a facultar a quem de direito prerrogativas para o exercício da proteção e amparo daquele que a lei considerar nessa condição".
Sob o mesmo enfoque, França (1972) assevera que a guarda de menor é o conjunto de relações jurídicas existentes entre uma pessoa e o mesmo, em virtude de estar a criança ou adolescente sob o pátrio poder ou na companhia daquela, e da responsabilidade daquela em relação a estes, quanto à vigilância, direção e educação.
Sob a base oferecida por França, acima citado, Santos Neto (1994, p. 138-9), conceitua a guarda como sendo "o direito consistente na posse de menor oponível a terceiros e que acarreta dever de vigilância e ampla assistência em relação a este".
Mas, seguindo a lição de Grisard Filho (2000, p, 56) "é inquestionável que a guarda compreende o poder de reter o filho no lar, de tê-lo junto a si, de reger sua conduta. Na guarda está o dever de vigilância que, lenta e constantemente, atua decisivamente no desenvolvimento da personalidade do menor e na sua formação integral".
Para Abreu (191992, p. 136), "a guarda coloca a criança e o adolescente sob a responsabilidade de uma pessoa, que se obriga a prestar-lhes uma assistência material, moral e educacional". Na lição de Gonçalves (2002, p. 51) "a guarda é, ao mesmo tempo, dever e direito dos pais".
A guarda pressupõe não só a permanência de uma criança ou adolescente com seus pais ou guardião. Conforme resumem Bossert & Zannoni (1995, p. 535), "Dos genitores exige-se não somente a satisfação das necessidades materiais, mas também o cumprimento de deveres de índole espiritual, com vista à formação ética do filho".
De fato, a definição de guarda tem maior importância quando se junta à sua finalidade. O artigo 229 da Constituição Federal dispõe que "os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores...". O novo Código Civil não se preocupou em regulamentar este dispositivo constitucional. Essa ordem foi inserida no artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que dispõe: "Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais".
Em seguida, o Estatuto completa a disposição citada prenunciando, no artigo 33, que: "A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais".
Esse mesmo ideal foi consagrado, por princípio geral, no artigo 29 da Lei nº 8.069/90, que revela que a colocação em família substituta não será deferida a pessoa que revele "incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado".
A guarda assegura a toda criança e adolescente o direito de ter uma família ou responsável para protegê-la e para prestar-lhe toda assistência de que necessita na omissão ou ausência dos pais. É certo, porém, que a responsabilidade oriunda da guarda não se confunde com o poder familiar, sendo dele independente e podendo ser exercida de forma autônoma.
A mesma proposta finalista foi consagrada no novo Código Civil, pelo artigo 1.584, no âmbito da separação da sociedade conjugal, quando obriga a autoridade judiciária, a preservar o direito da criança e do adolescente, atribuindo a guarda "a quem revelar melhores condições para exercê-la". No parágrafo único, do mesmo artigo, a disposição se aproxima daquela prevista no artigo 29 do Estatuto, autorizando à autoridade judiciária a deferir a guarda somente "à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida".
Por equivalência das relações familiares, a atribuição da guarda de filhos, apresentada na união estável, será a mesma daquela prevista para a ruptura da sociedade conjugal, embora o novo Código Civil ficasse silente a respeito.
Em outras palavras, Villela (1980, p. 32) ressalta a finalidade da guarda, orientando o julgador para "o bem do menor, o que justifica a limitação dos pais, dos tutores e dos guardiães, desde que se preserve aquele valor, justamente para que o menor alcance a condição adulta sob melhores garantias, tanto de ordem material como de ordem moral".
Ao discorrer sobre os deveres do casamento, inscritos no inciso IV do artigo 1.566 do novo Código Civil, Lotufo (2002, p. 89) leciona que: "esses deveres que são fundamentais, correspondem às necessidades de qualquer ser humano não só de proteção material, em relação à habitação, saúde, alimentação, vestuário e instrução, como também à assistência educacional e moral, com a preocupação da sua formação, transmitindo-lhe valores necessários, que lhe darão segurança e dignidade, aumentando-lhe as possibilidades de se tornar uma pessoa integrada na sociedade em que viverá".
Reconhece-se que a conceituação de guarda, embora de difícil enunciação, congrega unanimidade no sentido de que ela é um atributo do poder familiar, integrada aos deveres do casamento ou da união estável, conferindo um poder/dever aos pais ou responsável, que pode ser oponível a terceiros, inclusive aos pais, visando o melhor interesse da criança ou adolescente.
Em vista disso, busca-se nas conseqüências da separação conjugal ou na ruptura da vida em comum, na união estável, a garantia de que os filhos serão respeitados em seu direito constitucional à convivência familiar.
2.2. A guarda na ruptura da sociedade conjugal e na união estável
A disciplina da guarda, na dissolução da sociedade conjugal ou da união estável, recebeu a mesma atenção e status do legislador, embora não tenha dispensado um dispositivo exclusivo, no âmbito da união estável, como o fez em relação à dissolução da sociedade conjugal.
De fato, o disposto no artigo 1.584 do novo Código Civil destina-se para ambas as situações, vez que, como acima citado, os deveres do poder familiar não se extingue com a ruptura da relação conjugal.
Assim, dispõe o citado dispositivo: "Decretada a separação judicial ou o divórcio, sem que haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la".
A nova regra opôs-se, frontalmente, ao comando do artigo 10 da Lei nº 6.515/77, que outorgava a guarda dos filhos menores ao cônjuge que não houvesse dado causa à separação ou divórcio. Se ambos os pais fossem responsáveis pela separação, os filhos menores ficariam em poder da mãe, salvo se o juiz verificasse que de tal solução pudesse advir prejuízo moral para eles. Se os filhos não pudessem ficar com a mãe, o juiz resolveria questão deferindo a guarda dos filhos à pessoa idônea da família de qualquer dos cônjuges.
A modificação legislativa, trazida pelo novo Código Civil, integrou-se aos princípios da doutrina da proteção integral dos direitos da criança e do adolescente, previstos pela Lei nº 8.069/90, que compreende a tutela jurídica de todos os direitos infanto-juvenis.
Dessa forma, a nova ordem jurídica da guarda consagra que os filhos menores ficarão com aqueles que tiverem as melhores condições para exercê-la. Em outras palavras, os filhos são confiados a quem lhes merece a guarda.
A antiga norma penalizava os filhos pelo erro dos pais; a culpa dos pais no processo de separação determinava com quem iriam ficar os filhos. "A atribuição da guarda a um dos pais não deve ser justificada como uma sanção àquele que, por exemplo, deu causa a uma separação", como diz Lotufo (2002, p. 270).
Na moderna concepção de responsabilidade parental, interessa o compromisso de garantir o melhor para os filhos. Essa prática obedece aos anseios dos documentos internacionais, principalmente da Declaração Universal dos Direitos da Criança e da Convenção sobre os Direitos da Criança, que estabelecem a tutela integral dos direitos infanto-juvenis, visando o superior interesse da criança.
Em vista disso, o direito dos filhos de terem uma família, mesmo que seja formada somente por um dos pais, prevalece sobre o motivo da separação, principalmente, aquele representado pela atribuição da culpa dos cônjuges.
Embora já constasse do artigo 27 da Lei do Divórcio, o artigo 1.579 do novo Código Civil reforçou a posição de que o "divórcio não modificará os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos", de modo que o poder familiar mantém-se preservado com todos os seus atributos.
Acresce-se ao fato, que o Estatuto da Criança e do Adolescente frisou no artigo 29, que a guarda não será deferida à pessoa que revele incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado.
Posto dessa maneira, a autoridade judiciária encarregada de conferir a guarda deverá perquirir qual dos pais oferecerá melhores condições que atendam os interesses do filho. Numa separação, em caso de igualdade de condições entre o pai e a mãe, a preferência recairá no cônjuge que não deu causa à separação, principalmente se a criança for de tenra idade.
Enfim, a culpa pela separação do casal não será mais o motivo determinante no deferimento da guarda dos filhos. Valerão as condições daquele que puder cumprir melhor os deveres parentais, sempre respeitando o melhor interesse da criança.
2. 3. A guarda compartilhada ou conjunta
Tendo como certa a unidade e solidariedade da responsabilidade parental entre os cônjuges, em relação aos filhos menores, salienta-se que os pais, em conjunto, devem suportar o ônus da guarda.
A igualdade dos deveres parentais, introduzida pelo § 5º do artigo 226 da Constituição Federal permite acolher juridicamente a guarda compartilhada ou conjunta.
Aliado à ordem constitucional, o artigo 1.583 do novo Código Civil, a exemplo do disposto no artigo 9º da Lei nº 6.515/77, autoriza a concessão da guarda dos filhos menores segundo o que ficar acordado entre os cônjuges.
Pela regra, os cônjuges poderão – e já podiam – eleger a guarda conjunta como forma de manter as relações parentais com os filhos.
Com efeito, a responsabilidade paterna não se extingue pelo deferimento da guarda a um dos cônjuges ou companheiros, no momento da separação.
A guarda constitui verdadeiro encargo aos pais, que, conjuntamente, devem contribuir para sua execução. Tem-se presente, porém, a dificuldade do exercício desse múnus em face da separação do casal.
Todavia, a atividade conjunta dos pais nada mais é do que a continuação da relação filhos/pais após a ruptura da sociedade conjugal, ou seja, embora não exista mais a sociedade conjugal permanece a "sociedade parental".
Esse liame parental não poderá ser prejudicado ou rompido em virtude da vontade dos pais, que, premidos pela separação, mormente acompanhada pelo desgaste emocional, não deve influir na relação com os filhos. Mas, inevitavelmente isso ocorre. Nessas hipóteses, o julgador deverá, sempre, decidir em favor do melhor interesse da criança.
Com efeito, essa modalidade de guarda objetiva manter e/ou reorganizar as relações entre os pais e os filhos na ocorrência da separação, quando momentos difíceis são vivenciados entre todos.
Existem, entretanto, dificuldades operacionais no exercício da guarda conjunta. A timidez de nossos Tribunais tem impedido uma maior divulgação e operação da guarda conjunta em face das dificuldades operacionais que ela apresenta. É fato que após a ruptura da convivência marital, um clima hostil paira sobre as relações familiares.
Mesmo havendo uma situação de stress entre o casal é possível a concessão da guarda conjunta, pois, a vida dos filhos, na verdade, é independente da dos pais e requer continuidade, seja nas atividades escolares, no clube, entre os amigos, na manutenção da saúde etc.
Antigamente, as decisões sobre a vida e as atividades dos filhos eram tomadas pelo pai ou pela mãe, individualmente, e sugeriam uma ruptura familiar, incluindo os filhos como protagonistas da ruptura conjugal. Essa situação causava – e ainda causa – profunda e evidente violação dos direitos da criança e do adolescente na medida em que priva a criança do direito ao convívio familiar, assegurado pelo artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Na guarda compartilhada, recomenda-se que as decisões sejam tomadas por ambos os pais.
A situação fática, na execução da guarda compartilhada pode parecer demasiada estóica na medida que pais separados devem decidir qual o melhor colégio para o filho, qual o plano de saúde mais adequado, qual a igreja que freqüentará, enfim, em qual dos "lares" o filho habitará.
A residência onde habitará o filho deve ser escolhida de modo a permitir sua melhor integração com o ambiente, os amigos, a escola etc. Na lição de Lagrasta Neto (2000, p. 123), "o direito de residência única e imediatamente definida – essencial ao desenvolvimento psíquico do menor – tem sua contrapartida no regular direito-dever de visita. A residência, desde logo definida, impede que a criança, em geral instável e desprotegida, sinta-se desconectada de qualquer eixo referencial para desenvolver atividades escolares, de aperfeiçoamento e de lazer: ela deve apresentar-se aos professores e amigos, além dos parentes, obviamente, com endereço certo; saber quem são seus vizinhos; estabelecer padrões de convivência, de honestidade e honradez, a partir das atitudes que, ao longo do tempo, formarão seu juízo crítico, fortalecendo a própria personalidade".
A indicação da residência do filho não pressupõe que ela será definitiva. Lotufo (2002, p. 275) considera que "mesmo na hipótese de morarem com um deles, como, alternadamente, os filhos podem se transferir para a casa de um ou de outro". Completa, a ilustre Professora, que "Podem também os ex-cônjuges fixar residências bem próximas a fim de facilitar esse deslocamento, permitindo que os filhos circulem livremente de uma residência para a outra".
Não se pode esquecer, todavia, que o objetivo da guarda conjunta é o compartilhamento da responsabilidade parental no que diz respeito às decisões sobre a vida dos filhos.
É preciso, porém, diferenciar a guarda compartilhada ou conjunta da guarda alternada. Esta permite, apenas o revezamento de "lares" ou domicílios alternados, como se refere Lotufo (2000, p. 274), "identificada pela situação em que pai e mãe alternam a guarda dos filhos em espaços de tempo que tanto podem ser semanais, mensais, ou anuais e, em regra, decidindo, no período em que com eles estiver, como se fosse guardião único".
A guarda alternada não tem encontrado guarida em nossos Tribunais. Grisard Filho (1999, p. 220-221) comenta que "ao regularem a guarda, distribuem entre elas a posse, o cargo ou a custódia dos filhos, revezando-a entre si, semanalmente, quinzenalmente, mensalmente, porém com o desaplauso da jurisprudência, ao fundamento da inconveniência à consolidação dos hábitos, valores, padrões e idéias na mente do menor e à formação de sua personalidade". Nessa oportunidade, o autor cita o seguinte acórdão:
"TJMG. Ap. Civ. 48.974-0 (5ª Câm., rel. Des. Campos Oliveira – MENOR – Guarda – Pais separados – Custódia alternada semanalmente – Inconveniência – Permanência sob a guarda da mãe – Direito de visita do pai. Ementa oficial: É inconveniente à boa formação da personalidade do filho ficar submetido à guarda dos pais separados, durante a semana, alternadamente; se estes não sofrem restrições de ordem moral, os filhos, principalmente durante a infância, devem permanecer com a mãe, por razões óbvias, garantindo ao pai, que concorrerá para as despesas dentro do princípio necessidade-possibilidade, o direito de visita".
Enfim, a guarda compartilhada ou conjunta visa, tão somente, manter vivos os laços parentais, proporcionando amor aos filhos e deferindo aos pais, conjuntamente, resolver os problemas advindos das relações com os filhos e desses com a sociedade.
3. O Direito de Visita
O direito de visita decorre da concessão da guarda. O instituto vem gravado no artigo 1.589 do novo Código Civil, que dispõe: "O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação". Idêntica regra já estava consagrada no artigo 15 da Lei nº 6.515/77.
O instituto foi definido por Leite (1997, p. 221-223): "o direito de visita não é um "direito" dos pais em relação aos filhos, mas é, sobretudo, um direito da criança. Direito de ter a companhia de seus genitores, direito de ter amor de um pai ausente, direito de gozar da presença decisiva do pai, direito de minorar os efeitos nefastos de uma ruptura incontornável. Logo, é um dever que a lei impõe àquele genitor que se vê privado da presença contínua do filho".
É por isso que o novo Código não evoluiu ao tratar do tema. Manteve-o como um dever do pai "ir visitar o filho" e não de ser visitado, certamente, como assevera Grisard Filho (2000, p. 152), "porque a lei só mencione, pelo artigo 15 da LDv, como sujeito ativo ‘os pais, em cuja guarda não estejam os filhos’. Porém, é de toda evidência que o filho que não conviva com o pai é titular do direito a manter uma adequada comunicação com ambos os pais, já que a consolidação dos sentimentos paterno ou materno-filiais favorece uma estruturação mais sólida e equilibrada do psiquismo do menor".
Assim, tanto na separação judicial, no divórcio, na convivência ou até mesmo no concubinato, o direito de visita constitui mais um direito dos filhos que, propriamente, dos pais, pois, como completa Grisard Filho (2000, p. 154), "o direito de visita constitui um direito-dever, tendo por finalidade não satisfazer direitos, desejos ou interesses dos genitores, senão amparar, em toda a sua extensão, as necessidades afetivas e educativas dos filhos".
É interessante anotar que no sistema de compartilhamento da guarda entre os pais separados, a visita aos filhos se resolve de maneira mais tranqüila, pois o exercício da co-parentalidade, fincado na co-responsabilidade, assegura a continuidade do relacionamento entre pais e filhos, permitindo que esses se desenvolvam sadia e equilibradamente.
Há, todavia, limites ao direito de visita. O artigo 1.637 do novo Código Civil impôs a suspensão do exercício do poder familiar ao pai ou à mãe que não cumprirem os deveres parentais ou condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a 2 anos de prisão. Nesses casos, lembra Guimarães (2000, p. 21) "se os pais estiverem suspensos ou destituídos do pátrio poder não poderão pleitear o direito de visitas".
A penalidade justifica-se em face da necessidade de preservar os direitos dos filhos que foram ameaçados pelas atitudes parentais. É claro, porém, que desaparecendo os motivos que ensejaram a proibição da visita dos pais ou de um deles, a convivência poderá ser restabelecida em consonância dos princípios que sustentam e dão estabilidade à relação familiar.
O novo Código Civil perdeu a oportunidade de regulamentar o direito de visita a terceiros. Assim é o caso dos avós, tios, primos que convivem com a criança e o adolescente, no grande contexto familiar. A separação brusca dos pais promove, nos filhos, o desligamento quase que instantâneo das relações com seus parentes.
De fato, já assinalava Elias (1999, p. 68) que "o direito dos avós encontra sua base, primordialmente, na solidariedade que deve imperar no grupo familiar".
Existe perfeita harmonia em dizer que a qualidade de avô é um título suficiente para limitar o exercício do pátrio poder no que concerne ao direito de comunicar-se com a criança. Os autores costumam encontrar a origem desse direito na própria organização da família, tendo por base a solidariedade de seus componentes, cuja convivência é intensa oriunda dos laços afetivos.
Os impedimentos ao direito de visita a terceiros são os mesmos observados aos pais, devendo estar condicionados à garantia do melhor interesse da criança.
4. Modalidades de Guarda – A Guarda no Estatuto da Criança e do
Adolescente
O novo Código Civil não se preocupou em distinguir tipos ou modalidades diferentes de guarda. Tratou o instituto como conseqüência da ruptura da vida em comum do casal, como atributo derivado do poder parental, eivado de encargos e obrigações.
Entretanto, o Estatuto da Criança e do Adolescente, instituiu a guarda para aquelas crianças e adolescentes em situação de risco pessoal, descrita no artigo 98. Geralmente essas crianças são de famílias hipossuficientes, que carregam, hodiernamente, em seu destino, as mazelas e dificuldades da vida. Não foi essa a clientela nem a preocupação do novo Código Civil.
O comando legal, previsto no caput do artigo 28 do Estatuto dispõe: "a colocação de criança e adolescente em família substituta far-se-á pela guarda, tutela ou pela adoção..."
No sistema anterior, sob a vigência da Lei nº 6.697/79 – Código de Menores, inscrevia-se no artigo 17 e seguintes as cinco modalidades de colocação em família substituta: delegação do pátrio poder, guarda, tutela, adoção simples e adoção plena. Como visto acima, o Estatuto restringiu as modalidades de colocação em família substituta a três formas apenas.
Este estudo, em particular, terá a preocupação de se ocupar somente da guarda, em seus múltiplos aspectos e formas, focalizando, principalmente, a guarda desenvolvida com o auxílio da comunidade, através de casais e/ou famílias que se dispõem, voluntariamente, e em parceria com o Poder Judiciário, garantir o direito à convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social.
O artigo 33 do Estatuto definiu a guarda como aquela atividade que "obriga à prestação material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais".
O § 1º, do citado artigo, dispõe
sobre a finalidade da guarda: "regularizar a posse de fato da criança e do
adolescente, podendo ser deferida liminar ou incidentalmente, nos procedimentos
de tutela e adoção, exceto nos de adoção por estrangeiros".
Mônaco da Silva (1995, p. 35) acrescenta que a guarda "é o instituto pelo qual alguém, parente ou não, assume a responsabilidade sobre um menor de 21 anos, passando a dispensar-lhe todos os cuidados próprios da idade, além de ministrar-lhe assistência espiritual, material, educacional e moral".
A guarda, para Cahali (1992, p. 128), "obriga à prestação de
assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente (art. 33,
primeira parte): a guarda transfere ao guardião, a título precário, o atributo
constante do art. 384, I, do Código Civil no sentido de que lhe compete dirigir
a criação e a educação do menor; como também lhe compete exigir que o menor lhe
preste obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição (CC,
art. 384, VII); no dever de assistência material do menor sob sua guarda,
entende-se que o guardião sujeita-se à obrigação legal
de alimentos em favor daquele, sem prejuízo da obrigação de prestá-los o
titular do Pátrio Poder".
Em verdade, a guarda manifesta-se de múltiplas formas e para necessidades diversas. Somente a título de ilustração, tendo em vista que este assunto já foi deveras discutido, o Estatuto da Criança e do Adolescente apresenta quatro formas de concessão da guarda:
Figueirêdo (1999, p.19), buscando simplificar a questão para melhor concretizar o atendimento, consignou somente três tipos de guarda: "a) para regularizar a posse de fato; b) excepcionalmente para atender situações peculiares; c) supressão de falta eventual dos pais".
Nessa oportunidade o citado
autor aproveitou para definir a guarda como: "uma situação jurídica
suplementar do pátrio-dever, estabelecida por decisão judicial em procedimento
regular perante o Juiz da Infância e da Juventude ou de Família, conforme o
caso. A guarda define os poderes do guardião, desautoriza interferência
malévola até mesmo dos pais, já que limita o Pátrio Poder".
Deve-se recordar, ainda, que a guarda pode ser "objeto de modificação ou revogação mediante ato judicial" (ECA, art. 35) e poderá ser deferida ao dirigente de abrigo, que foi equiparado ao guardião para todos os efeitos legais (ECA, art. 92, parágrafo único).
Deve-se registrar uma modalidade de guarda que vem ganhando espaço nos municípios, principalmente naqueles onde há uma forte presença do serviço voluntário, ou mesmo através de organizações civis não governamentais. É a guarda familiar, também conhecida por famílias de apoio, família acolhedora, creche domiciliar, casais hospedeiros, creche-lar, mãe crecheira, lar vicinal, que destinam-se ao atendimento diurno de crianças em lar da comunidade, durante o período de trabalho dos pais ou responsáveis.
A guarda familiar é a designação dada àquele instituto, de natureza substitutiva da família natural, outorgada a casal ou família, que recebe uma criança ou adolescente em seu seio, provisoriamente, por ordem da autoridade judiciária, para dela cuidar, assistir e prestar todo o tipo de assistência material, moral, espiritual e emocional, sem a finalidade de se tornar definitiva.
A guarda familiar é, portanto, aquela oriunda de programas de atendimento, que pode atender às necessidades peculiares de abrigamento, de caráter excepcional e não-jurisdicional, previstas no art. 33, § 2º do Estatuto.
Em verdade, a comunidade pode e deve colaborar para a manutenção dos vínculos familiares. Esse foi o objetivo do artigo 227 da Constituição Federal ao enunciar que "é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade o direito... à convivência familiar e comunitária..."
Em nossa ordem jurídica, o chamamento da sociedade como co-responsável pela garantia dos direitos da pessoa – no caso, crianças e adolescentes – é salutar novidade, demonstrando amadurecimento político de um povo, consolidação das regras de convivência e, pelo menos, um sinal de vanguarda no mundo jurídico.
Enfim, a guarda de crianças e adolescentes, filhos ou não de pais separados, pobres e ricos, de diferentes classes sociais, raças e credos é dever de toda a sociedade. O futuro de nosso povo está preso ao tratamento que ora damos as nossas crianças. É a nossa vez: mãos à obra!
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Notas:
[1] Trabalho monográfico apresentado no curso de pós-graduação em Direito, na disciplina Direito de Família I. Área de concentração: Direito das Relações Sociais.
Professor Doutor Nelson Luiz Pinto