CRIANÇAS E ADOLESCENTES, DIREITOS SEGUNDO O CICLO DE VIDA

 

 

Nossa visão “adultocêntrica” do mundo nos leva a pensar que as crianças são um “vir a ser”, um “futuro” ser humano. A Convenção sobre os Direitos da Criança, aprovada pela Assembléia das Nações Unidas, porém, é muito clara: meninas e meninos são seres humanos em condição especial de desenvolvimento e são portadores de direitos desde o seu nascimento. Têm, assim, direito à saúde, à educação, à proteção, à participação.

 

Esses direitos precisam ser respeitados e devem levar em conta as fases do  desenvolvimento das crianças, suas necessidades e capacidades. Nesse sentido, melhor do que olhar a criança a partir de uma área de sua vida – como saúde ou educação – é olhá-la a partir de seu ciclo de vida.  Dessa maneira, a criança é vista como um ser completo, em sua dignidade e em seus direitos.

 

Na chamada primeira infância, ou seja, do primeiro ao sexto ano de vida, as crianças precisam de cuidados muito especiais de nutrição, precisam de especiais estímulos dos sentidos. No segundo ciclo da infância (7-12 anos), a escola assume um papel central na vida da criança. É a fase da educação fundamental, onde as crianças consolidam sua capacidade de expressão, tornam-se um pouco mais independentes da família, criam seus próprios laços sociais. A terceira fase é a adolescência, da autonomia, das relações afetivas para além do núcleo familiar.

 

Além da proteção e dos estímulos nos espaços privilegiados da infância e adolescência, como a família, a escola, as ruas dos bairros, o ciclo de vida apresenta-se como uma estratégia analítica mais cuidadosa para a formulação de políticas públicas centradas na criança e no adolescente.

 

As faixas etárias apresentadas neste Acervo devem ser consideradas com flexibilidade. De um lado, a individualidade de cada criança deve ser respeitada em seus distintos momentos e ritmos de crescimento e desenvolvimento. Por outro lado, existe a necessidade de programas segmentados para diferentes faixas etárias.

 

Assim, a abordagem por ciclo de vida não deve ser exclusiva, mas vista como instrumento para planejamento das ações. Além disso, outros recortes como raça, etnia e gênero, análises por renda, diferenças regionais, situação de domicílio, urbano e rural, religião e outros fatores devem ser utilizados para a abordagem da situação da criança e do adolescente. Em uma sociedade profundamente desigual como a brasileira, a conquista da universalidade dos direitos mostra-se insuficiente para assegurar a eqüidade. Ao subestimar as necessidades de grupos populacionais específicos em determinadas fases da vida, pode-se contribuir para o agravamento das condições de determinados grupos mais excluídos.

 

A estratégia de considerar o ciclo de vida representa mais uma maneira de aperfeiçoar as análises e as propostas. Pode ajudar a dar mais concretude aos direitos. Por exemplo, no caso do direito à educação como estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Utilizando-se o ciclo de vida, em vez da generalidade do direito ao acesso e à aprendizagem, poder-se-á diagnosticar e promover políticas para atender às necessidades de uma educação infantil essencial para dar um bom começo de vida para todas as crianças, respeitando as dinâmicas das famílias, nas áreas rurais e urbanas, por exemplo. Na fase da adolescência, a educação e as oportunidades de profissionalização podem ser desenhadas conjuntamente.

 

Sob esse ponto de vista, quando um gestor planeja políticas de esporte, cultura e lazer, tem mais chance de oferecer parques, brinquedotecas, oficinas, teatros, quadras de esporte e outras oportunidades, a partir de pessoas reais, atendendo demandas específicas.

 

O mesmo acontece quando considera-se o direito à participação de crianças e adolescentes nas decisões que lhes afetam. Essa participação deve tomar formas distintas, segundo o nível de desenvolvimento das crianças e dos adolescentes. Demanda dos adultos compreensões, estratégias e competências distintas. Promover a participação de crianças pequenas envolve, por exemplo, estímulo à comunicação,  à troca, à fala e à voz, principalmente dentro da família. Já o estímulo para a participação de adolescentes significa abrir espaços e mecanismos de participação na família e na sociedade, a partir do conjunto de imagens e símbolos da própria cultura política.

 

Outra grande vantagem do enfoque por ciclo de vida é o fortalecimento de uma visão integral e intersetorial dirigida às crianças e aos adolescentes. Essa é uma demanda fundamental das políticas públicas de proteção integral. Ações complementares que assegurem conjuntos de serviços, políticas e programas, de maneira simultânea, a fim de apoiar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social de crianças e adolescentes.

 

Garantir a promoção, defesa e garantia igual e universal dos direitos das crianças e dos adolescentes, como definido na Convenção sobre os Direitos da Criança e no Estatuto da Criança e do Adolescente, constitui o principal objetivo da ABMP e do UNICEF.