LEI Nº 6.001, DE 19 DE DEZEMBRO DE 1973
Dispõe sobre o Estatuto do Índio.
O
PRESIDENTE DA REPÚBLICA , faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
TÍTULO I
Dos
Princípios e Definições
Art. 1º Esta Lei regula a situação
jurídica dos índios ou silvícolas e das comunidades indígenas, com o propósito
de preservar a sua cultura e integrá-los, progressiva e harmoniosamente, à
comunhão nacional.
Parágrafo único. Aos índios e às comunidades
indígenas se estende a proteção das leis do País, nos mesmos termos em que se
aplicam aos demais brasileiros, resguardados os usos, costumes e tradições
indígenas, bem como as condições peculiares reconhecidas nesta Lei.
Art. 2° Cumpre à União, aos Estados e
aos Municípios, bem como aos órgãos das respectivas administrações indiretas,
nos limites de sua competência, para a proteção das comunidades indígenas e a
preservação dos seus direitos:
I - estender aos índios os benefícios da
legislação comum, sempre que possível a sua aplicação;
II - prestar assistência aos índios e
às comunidades indígenas ainda não integrados à comunhão nacional;
III - respeitar, ao proporcionar aos
índios meios para o seu desenvolvimento, as peculiaridades inerentes à sua
condição;
IV - assegurar aos índios a
possibilidade de livre escolha dos seus meios de vida e subsistência;
V - garantir aos índios a permanência
voluntária no seu habitat , proporcionando-lhes ali recursos para seu
desenvolvimento e progresso;
VI - respeitar, no processo de
integração do índio à comunhão nacional, a coesão das
comunidades indígenas, os seus valores culturais, tradições, usos e costumes;
VII - executar, sempre que possível
mediante a colaboração dos índios, os programas e projetos tendentes a
beneficiar as comunidades indígenas;
VIII - utilizar a cooperação, o
espírito de iniciativa e as qualidades pessoais do índio, tendo em vista a
melhoria de suas condições de vida e a sua integração no processo de
desenvolvimento;
IX - garantir aos índios e comunidades
indígenas, nos termos da Constituição, a posse permanente das terras que
habitam, reconhecendo-lhes o direito ao usufruto exclusivo das riquezas
naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes;
X - garantir aos índios o pleno
exercício dos direitos civis e políticos que em face da legislação lhes
couberem.
Parágrafo único. (Vetado).
Art. 3º Para os efeitos de lei, ficam
estabelecidas as definições a seguir discriminadas:
I - Índio ou Silvícola - É todo
indivíduo de origem e ascendência pré-colombiana que se identifica e é
identificado como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais
o distinguem da sociedade nacional;
II - Comunidade Indígena ou Grupo
Tribal - É um conjunto de famílias ou comunidades índias, quer vivendo em
estado de completo isolamento em relação aos outros setores da comunhão
nacional, quer em contatos intermitentes ou permanentes, sem contudo estarem
neles integrados.
Art 4º Os índios são considerados:
I - Isolados - Quando vivem em grupos
desconhecidos ou de que se possuem poucos e vagos informes através de contatos
eventuais com elementos da comunhão nacional;
II - Em vias de integração - Quando, em
contato intermitente ou permanente com grupos estranhos, conservam menor ou
maior parte das condições de sua vida nativa, mas aceitam algumas práticas e
modos de existência comuns aos demais setores da comunhão nacional, da qual vão
necessitando cada vez mais para o próprio sustento;
III - Integrados - Quando incorporados
à comunhão nacional e reconhecidos no pleno exercício dos direitos civis, ainda
que conservem usos, costumes e tradições característicos da sua cultura.
TÍTULO II
Dos
Direitos Civis e Políticos
CAPÍTULO I
Dos
Princípios
Art. 5º Aplicam-se aos índios ou
silvícolas as normas dos artigos 145 e 146, da Constituição Federal, relativas
à nacionalidade e à cidadania.
Parágrafo único. O
exercício dos direitos civis e políticos pelo índio depende da
verificação das condições especiais estabelecidas nesta Lei e na legislação pertinente.
Art. 6º Serão respeitados os usos,
costumes e tradições das comunidades indígenas e seus efeitos, nas relações de
família, na ordem de sucessão, no regime de propriedade e nos atos ou negócios
realizados entre índios, salvo se optarem pela aplicação do direito comum.
Parágrafo único. Aplicam-se as normas
de direito comum às relações entre índios não integrados e pessoas estranhas à
comunidade indígena, excetuados os que forem menos favoráveis a eles e
ressalvado o disposto nesta Lei.
CAPÍTULO II
Da
Assistência ou Tutela
Art. 7º Os índios e as comunidades
indígenas ainda não integrados à comunhão nacional ficam sujeito ao regime
tutelar estabelecido nesta Lei.
§ 1º Ao regime tutelar estabelecido
nesta Lei aplicam-se no que couber, os princípios e normas da
tutela de direito comum, independendo, todavia, o exercício da tutela da
especialização de bens imóveis em hipoteca legal, bem como da prestação de
caução real ou fidejussória.
§ 2º Incumbe a tutela à União, que a
exercerá através do competente órgão federal de assistência aos silvícolas.
Art. 8º São nulos os atos praticados
entre o índio não integrado e qualquer pessoa estranha à comunidade indígena
quando não tenha havido assistência do órgão tutelar competente.
Parágrafo único. Não se aplica a regra
deste artigo no caso em que o índio revele consciência e conhecimento do ato
praticado, desde que não lhe seja prejudicial, e da extensão dos seus efeitos.
Art. 9º Qualquer índio poderá requerer
ao Juiz competente a sua liberação do regime tutelar previsto nesta Lei,
investindo-se na plenitude da capacidade civil, desde que preencha os
requisitos seguintes:
I - idade mínima de 21 anos;
II - conhecimento da língua portuguesa;
III - habilitação para o exercício de
atividade útil, na comunhão nacional;
IV - razoável compreensão dos usos e
costumes da comunhão nacional.
Parágrafo único. O Juiz decidirá após
instrução sumária, ouvidos o órgão de assistência ao índio e o Ministério
Público, transcrita a sentença concessiva no registro civil.
Art. 10. Satisfeitos os requisitos do
artigo anterior e a pedido escrito do interessado, o órgão de assistência poderá
reconhecer ao índio, mediante declaração formal, a condição de integrado,
cessando toda restrição à capacidade, desde que, homologado judicialmente o
ato, seja inscrito no registro civil.
Art. 11. Mediante decreto do Presidente
da República, poderá ser declarada a emancipação da comunidade indígena e de
seus membros, quanto ao regime tutelar estabelecido em lei, desde que requerida
pela maioria dos membros do grupo e comprovada, em inquérito realizado pelo
órgão federal competente, a sua plena integração na comunhão nacional.
Parágrafo único. Para os efeitos do
disposto neste artigo, exigir-se-á o preenchimento, pelos requerentes, dos
requisitos estabelecidos no artigo 9º.
CAPÍTULO
III
Do Registro
Civil
Art. 12. Os nascimentos e óbitos, e os
casamentos civis dos índios não integrados, serão registrados de acordo com a
legislação comum, atendidas as peculiaridades de sua condição quanto à
qualificação do nome, prenome e filiação.
Parágrafo único. O registro civil será
feito a pedido do interessado ou da autoridade administrativa competente.
Art. 13. Haverá livros próprios, no
órgão competente de assistência, para o registro administrativo de nascimentos
e óbitos dos índios, da cessação de sua incapacidade e dos casamentos
contraídos segundo os costumes tribais.
Parágrafo único. O registro
administrativo constituirá, quando couber documento hábil para proceder ao
registro civil do ato correspondente, admitido, na falta deste, como meio
subsidiário de prova.
CAPÍTULO IV
Das
Condições de Trabalho
Art. 14. Não haverá discriminação entre
trabalhadores indígenas e os demais trabalhadores, aplicando-se-lhes
todos os direitos e garantias das leis trabalhistas e de previdência social.
Parágrafo único. É permitida a adaptação de
condições de trabalho aos usos e costumes da comunidade a que pertencer o
índio.
Art. 15. Será nulo o contrato de
trabalho ou de locação de serviços realizado com os índios de que trata o
artigo 4°, I.
Art. 16. Os contratos de trabalho ou de
locação de serviços realizados com indígenas em processo de integração ou
habitantes de parques ou colônias agrícolas dependerão de prévia aprovação do
órgão de proteção ao índio, obedecendo, quando necessário, a normas próprias.
§ 1º Será estimulada a realização de
contratos por equipe, ou a domicílio, sob a orientação do órgão competente, de
modo a favorecer a continuidade da via comunitária.
§ 2º Em qualquer caso de prestação de
serviços por indígenas não integrados, o órgão de proteção ao índio exercerá
permanente fiscalização das condições de trabalho, denunciando os abusos e
providenciando a aplicação das sanções cabíveis.
§ 3º O órgão de assistência ao indígena
propiciará o acesso, aos seus quadros, de índios integrados, estimulando a sua
especialização indigenista.
TÍTULO III
Das Terras
dos Índios
CAPÍTULO I
Das
Disposições Gerais
Art. 17. Reputam-se terras indígenas:
I - as terras ocupadas ou habitadas
pelos silvícolas, a que se referem os artigos 4º, IV, e 198, da Constituição;
II - as áreas reservadas de que trata o
Capítulo III deste Título;
III - as terras de domínio das
comunidades indígenas ou de silvícolas.
Art. 18. As terras indígenas não
poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que
restrinja o pleno exercício da posse direta pela comunidade indígena ou pelos
silvícolas.
§ 1º Nessas áreas, é vedada a qualquer
pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas a prática da caça,
pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa.
§ 2º (Vetado).
Art. 19. As terras indígenas, por
iniciativa e sob orientação do órgão federal de assistência ao índio, serão
administrativamente demarcadas, de acordo com o processo estabelecido em
decreto do Poder Executivo.
§ 1º A demarcação promovida nos termos
deste artigo, homologada pelo Presidente da República, será registrada em livro
próprio do Serviço do Patrimônio da União (SPU) e do registro imobiliário da
comarca da situação das terras.
§ 2º Contra a demarcação processada nos
termos deste artigo não caberá a concessão de interdito possessório, facultado
aos interessados contra ela recorrer à ação petitória ou à demarcatória.
Art. 20. Em caráter excepcional e por
qualquer dos motivos adiante enumerados, poderá a União intervir, se não houver
solução alternativa, em área indígena, determinada a providência por decreto do
Presidente da República.
1º A intervenção poderá ser decretada:
a) para pôr termo à luta entre grupos
tribais;
b) para combater graves surtos
epidêmicos, que possam acarretar o extermínio da comunidade indígena, ou
qualquer mal que ponha em risco a integridade do silvícola ou do grupo tribal;
c) por imposição da segurança nacional;
d) para a realização de obras públicas
que interessem ao desenvolvimento nacional;
e) para reprimir a turbação ou esbulho
em larga escala;
f) para a exploração de riquezas do
subsolo de relevante interesse para a segurança e o desenvolvimento nacional.
2º A intervenção executar-se-á nas
condições estipuladas no decreto e sempre por meios suasórios,
dela podendo resultar, segundo a gravidade do fato, uma ou algumas das medidas
seguintes:
a) contenção de hostilidades,
evitando-se o emprego de força contra os índios;
b) deslocamento temporário de grupos tribais
de uma para outra área;
c) remoção de grupos tribais de uma
para outra área.
3º Somente caberá a remoção de grupo
tribal quando de todo impossível ou desaconselhável a sua permanência na área
sob intervenção, destinando-se à comunidade indígena removida área equivalente
à anterior, inclusive quanto às condições ecológicas.
4º A comunidade indígena removida será
integralmente ressarcida dos prejuízos decorrentes da remoção.
5º O ato de intervenção terá a assistência
direta do órgão federal que exercita a tutela do índio.
Art. 21. As terras espontânea e
definitivamente abandonadas por comunidade indígena ou grupo tribal reverterão,
por proposta do órgão federal de assistência ao índio e mediante ato
declaratório do Poder Executivo, à posse e ao domínio pleno da União.
CAPÍTULO II
Das Terras
Ocupadas
Art. 22. Cabe aos índios ou silvícolas
a posse permanente das terras que habitam e o direito ao usufruto exclusivo das
riquezas naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes.
Parágrafo único. As terras ocupadas
pelos índios, nos termos deste artigo, serão bens inalienáveis da União (artigo 4º, IV, e 198, da Constituição Federal).
Art. 23. Considera-se posse do índio ou
silvícola a ocupação efetiva da terra que, de acordo com os usos, costumes e
tradições tribais, detém e onde habita ou exerce atividade indispensável à sua
subsistência ou economicamente útil.
Art. 24. O usufruto assegurado aos
índios ou silvícolas compreende o direito à posse, uso e percepção das riquezas
naturais e de todas as utilidades existentes nas terras ocupadas, bem assim ao
produto da exploração econômica de tais riquezas naturais e utilidades.
§ 1° Incluem-se,
no usufruto, que se estende aos acessórios e seus acrescidos, o uso dos
mananciais e das águas dos trechos das vias fluviais compreendidos nas terras
ocupadas.
§ 2° É
garantido ao índio o exclusivo exercício da caça e pesca nas áreas por ele
ocupadas, devendo ser executadas por forma suasória
as medidas de polícia que em relação a ele eventualmente tiverem de ser
aplicadas.
Art. 25. O reconhecimento do direito
dos índios e grupos tribais à posse permanente das terras por eles habitadas,
nos termos do artigo 198, da Constituição Federal, independerá de sua
demarcação, e será assegurado pelo órgão federal de assistência aos silvícolas,
atendendo à situação atual e ao consenso histórico sobre a antigüidade
da ocupação, sem prejuízo das medidas cabíveis que, na omissão ou erro do
referido órgão, tomar qualquer dos Poderes da República.
CAPÍTULO
III
Das Áreas
Reservadas
Art. 26. A União poderá estabelecer, em
qualquer parte do território nacional, áreas destinadas à posse e ocupação
pelos índios, onde possam viver e obter meios de subsistência, com direito ao
usufruto e utilização das riquezas naturais e dos bens nelas existentes,
respeitadas as restrições legais.
Parágrafo único. As áreas reservadas na
forma deste artigo não se confundem com as de posse imemorial das tribos
indígenas, podendo organizar-se sob uma das seguintes modalidades:
a) reserva indígena;
b) parque indígena;
c) colônia agrícola indígena.
Art. 27. Reserva indígena é uma área
destinada a servidor de habitat a grupo indígena, com os meios suficientes à
sua subsistência.
Art. 28. Parque indígena é a área
contida em terra na posse de índios, cujo grau de integração permita
assistência econômica, educacional e sanitária dos órgãos da União, em que se
preservem as reservas de flora e fauna e as belezas naturais da região.
§ 1º Na administração dos parques serão
respeitados a liberdade, usos, costumes e tradições dos índios.
§ 2° As medidas de polícia, necessárias
à ordem interna e à preservação das riquezas existentes na área do parque,
deverão ser tomadas por meios suasórios e de acordo
com o interesse dos índios que nela habitem.
§ 3º O loteamento das terras dos
parques indígenas obedecerá ao regime de propriedade, usos e costumes tribais,
bem como às normas administrativas nacionais, que deverão ajustar-se aos
interesses das comunidades indígenas.
Art. 29. Colônia agrícola indígena é a área
destinada à exploração agropecuária, administrada pelo órgão de assistência ao
índio, onde convivam tribos aculturadas e membros da comunidade nacional.
Art. 30. Território federal indígena é
a unidade administrativa subordinada à União, instituída em região na qual pelo
menos um terço da população seja formado por índios.
Art. 31. As disposições deste Capítulo
serão aplicadas, no que couber, às áreas em que a posse decorra da aplicação do
artigo 198, da Constituição Federal.
CAPÍTULO IV
Das Terras
de Domínio Indígena
Art. 32. São de propriedade plena do
índio ou da comunidade indígena, conforme o caso, as terras havidas por
qualquer das formas de aquisição do domínio, nos termos da legislação civil.
Art. 33. O índio, integrado ou não, que
ocupe como próprio, por dez anos consecutivos, trecho de terra inferior a
cinqüenta hectares, adquirir-lhe-á a propriedade plena.
Parágrafo único. O disposto neste
artigo não se aplica às terras do domínio da União, ocupadas por grupos
tribais, às áreas reservadas de que trata esta Lei, nem às terras de
propriedade coletiva de grupo tribal.
CAPÍTULO V
Da Defesa das Terras Indígenas
Art. 34. O órgão federal de assistência
ao índio poderá solicitar a colaboração das Forças Armadas e Auxiliares e da
Polícia Federal, para assegurar a proteção das terras ocupadas pelos índios e
pelas comunidades indígenas.
Art. 35. Cabe ao órgão federal de
assistência ao índio a defesa judicial ou extrajudicial dos direitos dos
silvícolas e das comunidades indígenas.
Art. 36. Sem prejuízo do disposto no
artigo anterior, compete à União adotar as medidas administrativas ou propor,
por intermédio do Ministério Público Federal, as medidas judiciais adequadas à
proteção da posse dos silvícolas sobre as terras que habitem.
Parágrafo único. Quando as medidas
judiciais previstas neste artigo forem propostas pelo órgão federal de assistência,
ou contra ele, a União será litisconsorte ativa ou passiva.
Art. 37. Os grupos tribais ou
comunidades indígenas são partes legítimas para a defesa dos seus direitos em
juízo, cabendo-lhes, no caso, a assistência do Ministério Público Federal ou do
órgão de proteção ao índio.
Art. 38. As terras indígenas são inusucapíveis e sobre elas não poderá recair
desapropriação, salvo o previsto no artigo 20.
TÍTULO IV
Dos Bens e
Renda do Patrimônio Indígena
Art 39. Constituem bens do Patrimônio
Indígena:
I - as terras pertencentes ao domínio
dos grupos tribais ou comunidades indígenas;
II - o usufruto exclusivo das riquezas
naturais e de todas as utilidades existentes nas terras ocupadas por grupos
tribais ou comunidades indígenas e nas áreas a eles reservadas;
III - os bens móveis ou imóveis,
adquiridos a qualquer título.
Art. 40. São titulares do Patrimônio
Indígena:
I - a população indígena do País, no
tocante a bens ou rendas pertencentes ou destinadas aos silvícolas, sem
discriminação de pessoas ou grupos tribais;
II - o grupo tribal ou comunidade
indígena determinada, quanto à posse e usufruto das terras por ele
exclusivamente ocupadas, ou a ele reservadas;
III - a comunidade indígena ou grupo tribal
nomeado no título aquisitivo da propriedade, em relação aos respectivos imóveis
ou móveis.
Art. 41. Não integram o Patrimônio
Indígena:
I - as terras de exclusiva posse ou
domínio do índio ou silvícola, individualmente considerado, e o usufruto das
respectivas riquezas naturais e utilidades;
II - a habitação, os móveis e
utensílios domésticos, os objetos de uso pessoal, os
instrumentos de trabalho e os produtos da lavoura, caça, pesca e coleta
ou do trabalho em geral dos silvícolas.
Art. 42. Cabe ao órgão de assistência a
gestão do Patrimônio Indígena, propiciando-se, porém, a participação dos
silvícolas e dos grupos tribais na administração dos próprios
bens, sendo-lhes totalmente confiado o encargo, quando demonstrem
capacidade efetiva para o seu exercício.
Parágrafo único. O arrolamento dos bens
do Patrimônio Indígena será permanentemente atualizado, procedendo-se à
fiscalização rigorosa de sua gestão, mediante controle interno e externo, a fim
de tornar efetiva a responsabilidade dos seus administradores.
Art. 43. A renda indígena é a
resultante da aplicação de bens e utilidades integrantes do Patrimônio
Indígena, sob a responsabilidade do órgão de assistência ao índio.
§ 1º A renda indígena será
preferencialmente reaplicada em atividades rentáveis ou utilizada em programas
de assistência ao índio.
§ 2° A reaplicação
prevista no parágrafo anterior reverterá principalmente em benefício da
comunidade que produziu os primeiros resultados econômicos.
Art. 44. As riquezas do solo, nas áreas
indígenas, somente pelos silvícolas podem ser exploradas, cabendo-lhes com
exclusividade o exercício da garimpagem, faiscação e cata das áreas referidas.
Art. 45. A exploração das riquezas do
subsolo nas áreas pertencentes aos índios, ou do domínio da União, mas na posse
de comunidades indígenas, far-se-á nos termos da legislação vigente, observado
o disposto nesta Lei.
§ 1º O Ministério do Interior, através
do órgão competente de assistência aos índios, representará os interesses da
União, como proprietária do solo, mas a participação no resultado da
exploração, as indenizações e a renda devida pela ocupação do terreno, reverterão
em benefício dos índios e constituirão fontes de renda indígena.
§ 2º Na salvaguarda dos interesses do
Patrimônio Indígena e do bem-estar dos silvícolas, a autorização de pesquisa ou
lavra, a terceiros, nas posses tribais, estará condicionada a prévio
entendimento com o órgão de assistência ao índio.
Art. 46. O corte de madeira nas
florestas indígenas, consideradas em regime de preservação permanente, de
acordo com a letra g e § 2º, do artigo 3°, do Código Florestal, está
condicionado à existência de programas ou projetos para o aproveitamento das
terras respectivas na exploração agropecuária, na indústria ou no
reflorestamento.
TÍTULO V
Da
Educação, Cultura e Saúde
Art. 47. É assegurado
o respeito ao patrimônio cultural das comunidades indígenas, seus valores
artísticos e meios de expressão.
Art. 48. Estende-se à população
indígena, com as necessárias adaptações, o sistema de ensino em vigor no País.
Art. 49. A alfabetização dos índios far-se-á
na língua do grupo a que pertençam, e em português, salvaguardado o uso da
primeira.
Art. 50. A educação do índio será
orientada para a integração na comunhão nacional mediante processo de gradativa
compreensão dos problemas gerais e valores da sociedade nacional, bem como do
aproveitamento das suas aptidões individuais.
Art. 51. A assistência aos menores,
para fins educacionais, será prestada, quanto possível, sem afastá-los do
convívio familiar ou tribal.
Art. 52. Será proporcionada ao índio a
formação profissional adequada, de acordo com o seu grau de aculturação.
Art. 53. O artesanato e as indústrias
rurais serão estimulados, no sentido de elevar o padrão de vida do índio com a
conveniente adaptação às condições técnicas modernas.
Art. 54. Os índios têm direito aos
meios de proteção à saúde facultados à comunhão nacional.
Parágrafo único. Na infância, na
maternidade, na doença e na velhice, deve ser assegurada ao silvícola, especial
assistência dos poderes públicos, em estabelecimentos a esse fim destinados.
Art. 55. O regime geral da previdência
social será extensivo aos índios, atendidas as condições sociais, econômicas e
culturais das comunidades beneficiadas.
TÍTULO VI
Das Normas
Penais
CAPÍTULO I
Dos
Princípios
Art. 56. No caso de condenação de índio por infração penal, a pena deverá ser atenuada e na
sua aplicação o Juiz atenderá também ao grau de integração do silvícola.
Parágrafo único. As penas de reclusão e
de detenção serão cumpridas, se possível, em regime especial de semiliberdade, no local de funcionamento do órgão federal
de assistência aos índios mais próximos da habitação do condenado.
Art. 57. Será tolerada a aplicação,
pelos grupos tribais, de acordo com as instituições próprias, de sanções penais
ou disciplinares contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel
ou infamante, proibida em qualquer caso a pena de morte.
CAPÍTULO II
Dos Crimes
Contra os Índios
Art. 58. Constituem crimes contra os
índios e a cultura indígena:
I - escarnecer de cerimônia, rito, uso,
costume ou tradição culturais indígenas, vilipendiá-los ou perturbar, de
qualquer modo, a sua prática. Pena - detenção de um a três meses;
II - utilizar o índio ou comunidade
indígena como objeto de propaganda turística ou de exibição para fins
lucrativos. Pena - detenção de dois a seis meses;
III - propiciar, por qualquer meio, a aquisição,
o uso e a disseminação de bebidas alcoólicas, nos grupos tribais ou entre
índios não integrados. Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Parágrafo único. As penas estatuídas
neste artigo são agravadas de um terço, quando o crime for praticado por
funcionário ou empregado do órgão de assistência ao índio.
Art. 59. No caso de crime contra a
pessoa, o patrimônio ou os costumes, em que o ofendido seja índio não integrado
ou comunidade indígena, a pena será agravada de um terço.
TÍTULO VII
Disposições
Gerais
Art. 60. Os bens e rendas do Patrimônio
Indígena gozam de plena isenção tributária.
Art. 61. São extensivos aos interesses
do Patrimônio Indígena os privilégios da Fazenda Pública, quanto à
impenhorabilidade de bens, rendas e serviços, ações especiais, prazos
processuais, juros e custas.
Art. 62. Ficam declaradas a nulidade e
a extinção dos efeitos jurídicos dos atos de qualquer natureza que tenham por
objeto o domínio, a posse ou a ocupação das terras habitadas pelos índios ou
comunidades indígenas.
§ 1° Aplica-se o disposto deste artigo
às terras que tenham sido desocupadas pelos índios ou comunidades indígenas em
virtude de ato ilegítimo de autoridade e particular.
§ 2º Ninguém terá direito
a ação ou indenização contra a União, o órgão de assistência ao índio ou
os silvícolas em virtude da nulidade e extinção de que trata este artigo, ou de
suas conseqüências econômicas.
§ 3º Em caráter excepcional e a juízo
exclusivo do dirigente do órgão de assistência ao índio, será permitida a
continuação, por prazo razoável dos efeitos dos contratos de arrendamento em
vigor na data desta Lei, desde que a sua extinção acarrete graves conseqüências
sociais.
Art. 63. Nenhuma medida judicial será
concedida liminarmente em causas que envolvam interesse de silvícolas ou do
Patrimônio Indígena, sem prévia audiência da União e do órgão de proteção ao
índio.
Art. 64 (Vetado).
Parágrafo único. (Vetado).
Art. 65. O Poder Executivo fará, no
prazo de cinco anos, a demarcação das terras indígenas, ainda não demarcadas.
Art. 66. O órgão de proteção ao
silvícola fará divulgar e respeitar as normas da Convenção 107, promulgada pelo
Decreto nº 58.824, de 14 julho de 1966.
Art. 67. É mantida a Lei nº 5.371, de 5
de dezembro de 1967.
Art. 68. Esta Lei entrará em vigor na
data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
EMÍLIO G.
MEDICI
Alfredo Buzaid
Antônio
Delfim Netto
José Costa Cavalcanti