EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ____ VARA CÍVEL DA COMARCA DE SANTO ANDRÉ

 

 

 

 

 

 

  C.C., assistida pela mãe S. M. C., e pelo representante do Ministério Público, ao final assinado, respeitosamente, vem à presença de Vossa Excelência, com fundamento na Constituição Federal (CF): arts. 129, incisos II e II, 205, 206, incisos I, VI e VII, 208, inciso III; Constituição Estadual (CE), artigos: 239, § 2§, 277, caput e 278, inciso III; Lei 7.853/89, c.c. a Lei n° 7.347/85 (LACP), arts. 3° e 4°, respeitosamente, vêm à presença de Vossa Excelência, propor a presente ação com preceito cominatório de obrigação de fazer para a proteção do direito individual de atendimento educacional especializado, observando‑se o rito ordinário 273, 282 e seguintes do Código de Processo Civil, c.c. o art. 3° da Lei Federal 7.347/85 em face da FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, representada em Juízo, por força do art. 12, I, do Código de Processo Civil, por seu Procurador Geral do Estado, com sede no Pátio do Colégio, n° 184, Centro, prédio da Procuradoria Geral do Estado, na Capital, e da SECRETARIA DE EDUCAÇÃO, com sede na Capital, na Praça da República, n° 53, centro, pelas seguintes razões:

 

  DOS FATOS

 

  1.  A autora procurou essa Promotoria no dia 18 de fevereiro do presente ano, com O intuito de conseguir uma resposta do conselho de escola da E.E.P.S.G. Professor João Galeão Carvalhal, uma vez que o Conselho dessa Escola não permitia o acesso de C. à decisão que teriam tomado sobre a aprovação, ou não, da aluna. Com isso, impaciente em voltar às aulas, resolveu procurar a Vara da Infância e Juventude. A jovem, então, esclareceu, em companhia de sua mãe, que havia cursado o primeiro grau em escola especializada, todavia, por problema financeiro acabou indo para a rede estadual e, desde então, cursa há quatro anos a primeira série do 2º grau no ''Galeão; a genitora preocupa‑se com o emocional da filha, pois a mesma já teve crises de depressão.

 

  2. Essa Promotoria encaminhou a jovem e sua mãe à Delegacia de Ensino, para possível encaminhamento para "atendimento educacional especializado" (art. 54, inciso II do ECA) e, se houvesse necessidade, para a realização de uma avaliação médica. Em resposta, foi encaminhado um relatório sobre C., esclarecendo sobre as suas dificuldades de aprendizagem, bem como de relacionamento com os colegas de classe, professores e funcionários da escola; além disso foram encaminhadas avaliações da matéria de Biologia da aluna, a fim de demonstrar seu grau de dificuldade.

 

  3. Logo após, C. compareceu nesta Promotoria para apresentar atestado psicológico, demonstrando que esteve em acompanhamento psicológico na Casa da Esperança de Santo André, bem como através do SUS foi pedida uma avaliação psicológica para analisar o nível intelectual da jovem.

 

  4. Foi, com isso, apresentado relatório psicológico, enquadrando a jovem no nível intelectual entre limítrofe e DM leve; razão pela qual C. apresenta dificuldades de compreensão e elaboração em algumas áreas básicas necessárias para a conclusão do 2° grau, sugerindo, assim, um curso profissionalizante que seja adequado ao seu potencial de aprendizado, bem como que a jovem seja orientada sobre o seu nível de aproveitamento (dificuldades e facilidades).

 

  5. O próximo passo foi a expedição de oficio à Delegada de Ensino da 1° DESA, a fim de que encaminhasse informações sobre a situação da aluna C. Como resposta, a Delegada informou que a aluna não queria voltar a cursar a primeira série do 2° grau, pois desejava aguardar uma decisão dessa Promotoria sobre o caso; no entanto, a jovem manifestou o desejo de freqüentar um curso profissionalizante e, com isso, a supervisora de ensino ficou aguardando uma resposta da aluna. No tocante, a retenção de C. na primeira série do 2° grau, ficou esclarecido que a aluna não apresentou um quadro evolutivo em relação aos anos anteriores.


 

  6. A diretoria da escola esclareceu que é compatível o resultado da avaliação médica de C. com o que a escola havia percebido, ou seja, dificuldade da aluna em compreender matérias básicas para a conclusão do 2° grau. A decisão da Supervisora de Ensino foi a opção por cursos profissionalizantes alternativos que levem a jovem a descobrir o caminho para se integrar na sociedade.

 

  7. A Delegada de Ensino encaminhou por oficio a possibilidade de C. ser atendida pela Instituição Casas Fraternais "O Nazareno"; no entanto, a jovem e sua mãe esclareceram, nessa Promotoria, que o local é de difícil acesso; e a genitora estava tentando conseguir para sua filha um curso profissionalizante, de computação na AVAP; todavia, o curso é pago e ela não tem condições de pagá-lo, nem mesmo de pagar as despesas iniciais (declaração inclusa).

 

Da Assistência desta Promotoria da Infância e Juventude e Cidadania:

 

  No início do mês de fevereiro não havia assistência judiciária nesta comarca, uma vez que a OAB local suspendera o convênio e Santo André não está entre as "23 das principais cidades do Estado" que são servidas diretamente pela PGE1. Ademais, o artigo 11 do "Ato das Disposições Constitucionais Transitórias" da Constituição Estadual não teve ainda o seu termo inicial, e a "Defensoria Pública" prevista no artigo 103, por ora, inexiste.            Por fim, o serviço municipal de assistência judiciária encaminhou os pais à Promotoria. Há notícia, outrossim, de que o convênio foi reestabelecido no início de agosto de 1997.

 

  Dessa forma, não restou outra opção à Promotoria senão assistir2 a jovem C., à época, com 20 anos. A análise da reparação do dano, pelo tempo em que a jovem ficou em sistema de ensino inadequado foi encaminhado para a OAB, uma vez que trata de assunto pretérito, com reflexos patrimoniais. Todavia, a inserção em sistema de ensino adequado e visando a integração rápida e eficaz no mercado de trabalho é assunto presente e futuro, portanto sua urgência é notória.

 


DA LEGlTlMAÇÃO PASSIVA DA SECRETARIA DE ESTADO

 

  O E. Tribunal de Justiça já assentou que Por outro lado, o artigo 216 do Estatuto da Criança e do Adolescente, complementando esta disposição, determina a remessa de peças à autoridade competente, para apuração da responsabilidade civil e administrativa do agente a que se atribua a ação ou omissão, sempre que a sentença impuser uma condenação ao Poder Público. Por isso, entendeu que a Secretaria de Governo, apesar de ser ente despersonalizado pode figurar no polo passivo. Nesse sentido, a Lei 7.853/89 fixou inclusive a responsabilidade penal ( art. 8°), do acórdão referido, merece destaque:

 

"Mas, a atuação do Poder Público, na realidade, se faz por intermédio de seus órgãos, os quais "têm ampla autonomia administrativa, financeira e técnica, caracterizando‑se como órgãos diretivos com funções precípuas de planejamento, supervisão, coordenação e controle das atividades que constituem sua área de competência", como observa HELY LOPES MEIRELLES (“Direito Administrativo Brasileiro", pág. 67, 20ª ed., Malheiros Editores, São Paulo, 3ª tir., 1994).

 

  DO DIREITO

 

  Enfim, diante deste quadro de omissão, os direitos de C. foram desrespeitados, desde, a sua adolescência, uma vez que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA ‑ Lei 8.069/90) em seus artigos 53, incisos I, II e V, 54, inciso III e § 2°, 148, inciso IV, 201, inciso V, 208 regulavam, especificamente o direito à educação da criança e do adolescente deficiente, destacando‑se:

 

Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente:

(...) III ‑ atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.

§ 2º. O não oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente.

 

Todos eles, sem exceção, guardam inteira simetria com o estabelecido na (Constituição Federal e ampliam seu significado, sem, no entanto, ferir ou ultrapassar a intenção do legislador constituinte (ou o que dispõe a Lei Maior).

 

 

(...) Aos portadores de deficiência é assegurado o atendimento educacional especializado, que deve ser - preferencial e acertadamente - feito através da rede regular de ensino, com o quê se procura evitar toda e qualquer discriminação que erradamente se queira fazer com relação aos deficientes. É o que se depreende da leitura do inc. III " 4.

 

  Atualmente, C. já com 21 anos completos e portanto o diploma legal que Ihe garante o direito ao ensino especializado e a colocação no mercado de trabalho está regulado na Lei nº 7 853, de 24 de outubro de 1989, no artigo 2° e seus incisos 1, Ill e IV. Dessa forma, apesar de não se aplicar o ECA, ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem‑estar pessoal, social e econômico. Para esse fim, os órgãos e entidades da Administração Direta e Indireta devem dispensar, no âmbito de sua competência e finalidade, aos assuntos objeto desta lei, tratamento prioritário e adequado, tendente a viabilizar, sem prejuízo de outras, as seguintes medidas na área da educação, na área da formação profissional e do trabalho, na área de recursos humanos.

 

  Na área da educação as medidas são a inclusão, no sistema educacional, da Educação Especial como modalidade educativa que abranja a educação de 1º e 2° Graus, a supletiva, a habilitação e a reabilitação profissionais, com currículos, etapas e exigências de diplomação próprios; a inserção, no referido sistema educacional, das escolas especiais, privadas e públicas, a oferta, obrigatória e gratuita, da Educação Especial em estabelecimentos públicos e de ensino.

 

  Na área da formação profissional e do trabalho as medidas devem convergir para o apoio governamental à formação profissional, à orientação profissional e a garantia de acesso aos serviços concernentes, inclusive aos cursos regulares voltados à formação profissional.

 

  E na área de recursos humanos, a formação de professores de nível médio para a Educação Especial, de técnicos de nível médio especializados na habilitação e reabilitação, e de instrutores para formação profissional.

 

  No final o ano de 1996 a "nova LDB", Lei 9.394/96, nos artigos 58 a 60 contemplou o tema sobre o capítulo de "Educação Especial". Destacando‑se o inciso IV do artigo 59, que determina: "educação especial para o trabalho, visando sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para OS que não revelaram capacidade de inserção no mercado competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como com aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora"

 

  Enfim, a jovem foi colocada e mantida na rede oficial pública de ensino médio normal, sem condições e experimentou retenções seguidas e o exame que classificou‑a como "limítrofe" somente foi efetuado depois de inúmeras cobranças deste órgão.

 

  DOS PEDIDOS

 

  Posto isso, ante a ameaça e violação, em tese, dos direitos reconhecidos nos diplomas legais acima referidos, em razão da falta de atenção e de estrutura dos órgãos de ensino em Santo André, requer se digne Vossa Excelência determinar sejam os réus citados (com a faculdade do artigo 172 do CPC) para, oportunamente, apresentarem resposta e cumprir a obrigação de fazer, consistente em oferecer atendimento educacional especializado, julgando‑se, ao final, procedente esta ação, confirmando‑se a vigência de dispositivos da C.F. e de Lei Federal, acima citados, aplicando‑se multa diária, a ser fixada por Vossa Excelência, no caso de descumprimento. Protesto por todos os meios de prova em direito admitidas (inclusive pericial), apresentando‑se rol de testemunhas oportunamente.

 

  Requer‑se, outrossim, caso Vossa Excelência entenda que C. não pode ser assistida por este órgão, a nomeação de advogado para prosseguir no feito em seus ulteriores termos, intimando‑se o órgão do Ministério Público que atua perante esta Vara para acompanhar o feito.

 

  Dá‑se à causa de cunho inestimável o valor de R$ 100, 00 ( cem reais).

 

___________

1 Atualmente, apenas 23 das principais cidades do Estado são servidas diretamente pela PGE... ( in, DOE ‑ P. Legisl. 06/02/97 ‑ pág. 23).

2... "A legitimação concorrente do Ministério Público para patrocinar as causas dos que fazem jus a assistência judiciária, onde não houver serviço organizado para presta‑la ou ninguém queira fazê‑lo, se justificapela defesa do valor fundamental consistente no acesso ao Judiciário... (In, Manual do Promotor de Justiça, de Hugo Nigro Mazzilli, ed. Saraiva, 2ª ed. 1991 ‑ pág. 380)

3 Ação Civil Pública ‑ Menor deficiente fisico ‑ Carente ‑ Legitimidade das Secretarias de Estado para figurarem no pólo passivo ‑ Responsabilidade do Poder Público, representado pelo Estado ‑ Omissão caracterizada ‑ Multa que deve ser fixada em valor elevado, a fim de compelir a execução do julgado e desencorajar o descumprimento do dever de ministrar o tratamento adequado ao menor ‑ Honorários do Perito fixados com moderação. (JTJ - Volume 186 ‑ Página 9).


4 Estatuto da Criança e do adolescente comentado, comentários jurídicos e sociais, Malheiros Editores, São Paulo, 1992, Coordenadores: Munir Cury, Antônio Fernando do Amaral e Silva e Emíio Garcia Mendes ‑ págs. 169

 

 

 

 

  Termos em que,

  p. deferimento.

 

  Santo André, 02 de setembro de 1997.

 

  Eduardo Dias de Souza Ferreira

  Promotor de Justiça

 

  Letícia Sparapani

  Estagiária do Ministério Público

 

 

 

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da Vara da ____ Cível da Comarca de Santo André.

 

 

  C.C., assistida pela mãe S. M. C., e pelo representante do Ministério Público, ao final assinado, respeitosamente, vem à presença de Vossa Excelência, com fundamento na Constituição Federal (CF): arts. 129, incisos II e II, 205, 206, incisos I, VI e VII, 208, inciso III; Constituição Estadual (CE), artigos: 239, § 2§, 277, caput e 278, inciso III; Lei 7.853/89, c.c. a Lei n° 7.347/85 (LACP), arts. 3° e 4°, respeitosamente, vêm à presença de Vossa Excelência, propor a presente ação com preceito cominatório de obrigação de fazer para a proteção do direito individual de atendimento educacional especializado, observando‑se o rito ordinário 273, 282 e seguintes do Código de Processo Civil, c.c. o art. 3° da Lei Federal 7.347/85 em face da FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, representada em Juízo, por força do art. 12, I, do Código de Processo Civil, por seu Procurador Geral do Estado, com sede no Pátio do Colégio, n° 184, Centro, prédio da Procuradoria Geral do Estado, na Capital, e da SECRETARIA DE EDUCAÇÃO, com sede na Capital, na Praça da República, n° 53, centro, pelas seguintes razões:

 

  DOS FATOS

 

  1.  A autora procurou essa Promotoria no dia 18 de fevereiro do presente ano, com O intuito de conseguir uma resposta do conselho de escola da E.E.P.S.G. Professor João Galeão Carvalhal, uma vez que o Conselho dessa Escola não permitia o acesso De C. à decisão que teriam tomado sobre a aprovação, ou não, da aluna. Com isso, impaciente em voltar às aulas, resolveu procurar a Vara da Infância e Juventude. A jovem, então, esclareceu, em companhia de sua mãe, que havia cursado o primeiro grau em escola especializada, todavia, por problema financeiro acabou indo para a rede estadual e, desde então, cursa há quatro anos a primeira série do 2º grau no ''Galeão; a genitora preocupa‑se com o emocional da filha, pois a mesma já teve crises de depressão.

 

  2. Essa Promotoria encaminhou a jovem e sua mãe à Delegacia de Ensino, para possível encaminhamento para "atendimento educacional especializado" ( art. 54, inciso II do ECA) e, se houvesse necessidade, a realização de uma avaliação médica. Em resposta, foi encaminhado um relatório sobre C., esclarecendo sobre as suas dificuldades de aprendizagem, bem como de relacionamento com os colegas de classe, professores e funcionários da escola; além disso foram encaminhadas avaliações da matéria de Biologia da aluna, a fim de demonstrar seu grau de dificuldade.

 

  3. Logo após, C. compareceu nesta Promotoria para apresentar atestado psicológico, demostrando que esteve em acompanhamento psicológico na Casa da Esperança de Santo André, bem como através do SUS foi pedida uma avaliação psicológica para analisar o nível intelectual da jovem.

 

  4. Foi, com isso, apresentado relatório psicológico, enquadrando a jovem no nível intelectual entre limítrofe e DM leve; razão pela qual C. apresenta dificuldades de compreensão e elaboração em algumas áreas básicas necessárias para a conclusão do 2° grau, sugerindo, assim, um curso profissionalizante que seja adequado ao seu potencial de aprendizado, bem como que a jovem seja orientada sobre o seu nível de aproveitamento ( dificuldades e facilidades).

 

  5. O próximo passo foi a expedição de oficio à Delegada de Ensino da 1° DESA, a fim de que encaminhasse informações sobre a situação da aluna C. Como resposta, a Delegada informou que a aluna não queria voltar a cursar a primeira série do 2° grau, pois desejava aguardar uma decisão dessa Promotoria sobre o caso; no entanto, a jovem manifestou o desejo de freqüentar um curso profissionalizante e, com isso, a supervisora de ensino ficou aguardando uma resposta da aluna. No tocante, a retenção de C. na primeira série do 2° grau, ficou esclarecido que a aluna não apresentou um quadro evolutivo em relação aos anos anteriores.


 

  6. A diretoria da escola esclareceu que é compatível o resultado da avaliação médica de C. com o que a escola havia percebido, ou seja, dificuldade da aluna em compreender matérias básicas para a conclusão do 2° grau. A decisão da Supervisora de Ensino foi a opção por cursos profissionalizantes alternativos que levem a jovem a descobrir o caminho para se integrar na sociedade.

 

  7. A Delegada de Ensino encaminhou por oficio a possibilidade de C. ser atendida pela Instituição Casas Fraternais " O Nazareno"; no entanto, a jovem e sua mãe esclareceram, nessa Promotoria, que o local é de difícil acesso; e a genitora estava tentando conseguir para sua filha um curso profissionalizante, de computação na AVAP; todavia, o curso é pago e ela não tem condições de pagá‑lo, nem mesmo de pagar as despesas iniciais (declaração inclusa).

 

Da Assistência desta Promotoria da Infância e Juventude e Cidadania

 

  No início do mês de fevereiro não havia assistência judiciária nesta comarca, uma vez que a OAB local suspendera o convênio e Santo André não está entre as "23 das principais cidades do Estado" que são servidas diretamente pela PGE [1]. Ademais, o artigo 11 do "Ato das Disposições Constitucionais Transitórias" da Constituição Estadual não teve ainda o seu termo inicial, e a "Defensoria Pública" prevista no artigo 103, por ora, inexiste.

 

  Por fim, o serviço municipal de assistência judiciária encaminhou os pais à Promotoria. Há notícia, outrossim, de que o convênio foi restabelecido no início de agosto de 1997.

 

  Dessa forma, não restou outra opção à Promotoria senão assistir [2] a jovem C., à época, com 20 anos. A análise da reparação do dano, pelo tempo em que a jovem ficou em sistema de ensino inadequado foi encaminhado para a OAB, uma vez que trata de assunto pretérito, com reflexos patrimoniais. Todavia, a inserção em sistema de ensino adequado e visando a integração rápida e eficaz no mercado de trabalho é assunto presente e futuro, portanto sua urgência é notória.

 


DA LEGlTlMAÇÃO PASSIVA DA SECRETARIA DE ESTADO

 

  O E. Tribunal de Justiça já assentou que, por outro lado, o artigo 216 do Estatuto da Criança e do Adolescente, complementando esta disposição, determina a remessa de peças à autoridade competente, para apuração da responsabilidade civil e administrativa do agente a que se atribua a ação ou omissão, sempre que a sentença impuser uma condenação ao Poder Público. Por isso, entendeu que a Secretaria de Governo, apesar de ser ente despersonalizado pode figurar no pólo passivo. Nesse sentido, a Lei 7.853/89 fixou inclusive a responsabilidade penal (art. 8°), do acórdão referido, merece destaque:

 

"Mas, a atuação do Poder Público, na realidade, se faz por intermédio de seus órgãos, os quais "têm ampla autonomia administrativa, financeira e técnica, caracterizando‑se como órgãos diretivos com funções precípuas de planejamento, supervisão, coordenação e controle das atividades que constituem sua área de competência", como observa HELY LOPES MEIRELLES (“Direito Administrativo Brasileiro", pág. 67, 20ª ed., Malheiros Editores, São Paulo, 3ª tir., 1994).

 

  DO DIREITO

 

  Enfim, diante deste quadro de omissão, os direitos de C. foram desrespeitados desde a sua adolescência, uma vez que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA ‑ Lei 8.069/90) em seus artigos 53, incisos I, II e V, 54, inciso III e § 2°, 148, inciso IV, 201, inciso V, 208 regulavam, especificamente o direito à educação da criança e do adolescente deficiente, destacando-se:

 

Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente:

(...) III ‑ atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.

§ 2º. O não oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente.

 

Todos eles, sem exceção, guardam inteira simetria com o estabelecido na Constituição Federal e ampliam seu significado, sem, no entanto, ferir ou ultrapassar a intenção do legislador constituinte (ou o que dispõe a Lei Maior).

  

(...) Aos portadores de deficiência é assegurado o atendimento educacional especializado, que deve ser - preferencial e acertadamente - feito através da rede regular de ensino, com o quê se procura evitar toda e qualquer discriminação que erradamente se queira fazer com relação aos deficientes. É o que se depreende da leitura do inc. III" [4]

 

  Atualmente, C. já com 21 anos completos e portando o diploma legal que lhe garante o direito ao ensino especializado e a colocação no mercado de trabalho, que está regulado na Lei nº 7 853, de 24 de outubro de 1989, no artigo 2° e seus incisos I, III e IV. Dessa forma, apesar de não se aplicar o ECA, ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico. Para esse fim, os órgãos e entidades da Administração Direta e Indireta devem dispensar, no âmbito de sua competência e finalidade, aos assuntos objeto desta lei, tratamento prioritário e adequado, tendente a viabilizar, sem prejuízo de outras, as seguintes medidas na área da educação, na área da formação profissional e do trabalho, na área de recursos humanos.

 

  Na área da educação as medidas são a inclusão, no sistema educacional, da Educação Especial como modalidade educativa que abranja a educação de 1º e 2° Graus, a supletiva, a habilitação e a reabilitação profissionais, com currículos, etapas e exigências de diplomação próprios; a inserção, no referido sistema educacional, das escolas especiais, privadas e públicas, a oferta, obrigatória e gratuita, da Educação Especial em estabelecimentos públicos e de ensino.

 

  Na área da formação profissional e do trabalho as medidas devem convergir para o apoio governamental à formação profissional, à orientação profissional e à garantia de acesso aos serviços concernentes, inclusive aos cursos regulares voltados à formação profissional.

 

  E na área de recursos humanos, a formação de professores de nível médio para a Educação Especial, de técnicos de nível médio especializados na habilitação e reabilitação, e de instrutores para formação profissional.

 

  No final o ano de 1996 a "nova LDB", Lei 9.394/96, nos artigos 58 a 60 contemplou o tema sobre o capítulo de "Educação Especial". Destacando‑se o inciso IV do artigo 59, que determina:

"educação especial para o trabalho, visando sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para OS que não revelaram capacidade de inserção no mercado competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como com aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora".

 

  Enfim, a jovem foi colocada e mantida na rede oficial pública de ensino médio normal, sem condições e experimentou retenções seguidas e o exame que a classificou como "limítrofe" somente foi efetuado depois de inúmeras cobranças deste órgão.

 

  DOS PEDIDOS

 

  Posto isso, ante a ameaça e violação, em tese, dos direitos reconhecidos nos diplomas legais acima referidos, em razão da falta de atenção e de estrutura dos órgãos de ensino em Santo André, requer se digne Vossa Excelência determinar sejam os réus citados (com a faculdade do artigo 172 do CPC) para, oportunamente, apresentarem resposta e cumprir a obrigação de fazer, consistente em oferecer atendimento educacional especializado, julgando-se, ao final, procedente esta ação, confirmando-se a vigência de dispositivos da C.F. e de Lei Federal, acima citados, aplicando-se multa diária, a ser fixada por Vossa Excelência, no caso de descumprimento. Protesto por todos os meios de prova em direito admitidas (inclusive pericial), apresentando-se rol de testemunhas oportunamente.

 

  Requer-se, outrossim, caso Vossa Excelência entenda que C. não pode ser assistida por este órgão, a nomeação de advogado para prosseguir no feito em seus ulteriores termos, intimando-se o órgão do Ministério Público que atua perante esta Vara para acompanhar o feito.

 

  Dá-se à causa de cunho inestimável o valor de R$ 100, 00 (cem reais).

 

  Termos em que

  pede deferimento.

 

  Santo André, 02 de setembro de 1997.

 

 

   Eduardo Dias de Souza Ferreira

   Promotor de Justiça

 

   Letícia Sparapani

   Estagiária do Ministério Público

 

 

NOTAS:

 

1.Atualmente, apenas 23 das principais cidades do Estado são servidas diretamente pela PGE... ( in, DOE ‑ P. Legisl. 06/02/97 ‑ pág. 23).

 

2. ... "A legitimação concorrente do Ministério Público para patrocinar as causas dos que fazem jus à assistência judiciária, onde não houver serviço organizado para prestá-la ou ninguém queira fazê-lo, se justifica pela defesa do valor fundamental consistente no acesso ao Judiciário... (In, Manual do Promotor de Justiça, de Hugo Nigro Mazzilli, ed. Saraiva, 2ª ed. 1991 ‑ pág. 380)

 

3. Ação Civil Pública ‑ Menor deficiente fisico ‑ Carente ‑ Legitimidade das Secretarias de Estado para figurarem no pólo passivo ‑ Responsabilidade do Poder Público, representado pelo Estado ‑ Omissão caracterizada ‑ Multa que deve ser fixada em valor elevado, a fim de compelir a execução do julgado e desencorajar o descumprimento do dever de ministrar o tratamento adequado ao menor ‑ Honorários do Perito fixados com moderação.(JTJ – Volume 186 – Página 9).

 

4. Estatuto da Criança e do adolescente comentado, comentários jurídicos e sociais, Malheiros Editores, São Paulo, 1992, Coordenadores: Munir Cury, Antônio Fernando do Amaral e Silva e Emíio Garcia Mendes ‑ págs. 169