EXCELENTÍSSIMO SENHOR DR. JUIZ FEDERAL DA VARA
DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO.
O Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado do Espírito Santo, por seus representantes infra-assinados, com fundamento nos artigos 109, I, 129, II e III, 194 e 227 § 3o, incisos II e VI da Constituição Federal; arts. 1o a 5o, 33 § 3o, 34, 87, I, 201, incisos V e VIII, 208, parágrafo único, 209, 210, inciso I e § 1o, 213 §§ 1o e 2o, todos da Lei n.º 8.069/90, bem como art. 5o da Lei n.º 7.347/85, vêm propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
(Com pedido de liminar)
em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, Autarquia Federal com sede na Av. Jerônimo Monteiro, n.º 1000, Edifício Trade Center, 3o andar, CEP 29.010-004, Vitória/ES, baseando-se, para tanto, nos fundamentos fáticos e jurídicos a seguir aduzidos:
DOS FATOS
A presente Ação Civil Pública tem como objetivo assegurar o direito das crianças e adolescentes que se encontrem sob guarda judicial de se inscreverem no Regime Geral da Previdência Social na condição de dependentes do segurado guardião.
Com isso, objetiva-se tutelar judicialmente os direitos de que são titulares aqueles que, embora vítimas de atos arbitrariamente praticados e de normas que afrontam seus direitos básicos, são credores de benefícios assegurados tanto pela Constituição Federal quanto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL
A legitimidade do Ministério Público, tanto Federal quanto Estadual, para a propositura da presente ação decorre do previsto no art. 129, inciso II da Constituição Federal, que trata das funções institucionais do Ministério Público, dentre elas a de "zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia".
E no inciso III do artigo supra, o legislador constitucional, ainda versando sobre as funções institucionais do Parquet, atribuiu-lhe a incumbência de "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos".
Em consonância com o texto constitucional, a Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) faz expressa menção, em seu art. 201, incisos V e VIII e § 2o à proteção dos interesses individuais, difusos e coletivos de crianças e adolescentes por parte do Ministério Público.
Ademais, a Lei Complementar n.º 75/93, que versa acerca das atribuições do Ministério Público Federal, confere ao Parquet Federal legitimidade para "exercer a defesa dos direitos constitucionais do cidadão, sempre que se cuidar de garantir-lhes o respeito pelos órgãos da administração pública federal direta ou indireta" (art. 39, II).
Deve-se ter em vista, ainda, o que dispõe o artigo 6º, VII, "a" e "c", da supracitada lei, que dispõe:
"Art. 6º – Compete ao Ministério Público da União:
VII – Promover o inquérito civil e a ação civil pública para:
a) a proteção dos direitos constitucionais;
c)a proteção dos interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos, relativos às comunidades indígenas, à família, à criança, ao adolescente, ao idoso, às minorias étnicas e ao consumidor" (grifamos).
O art. 5o da Lei Complementar n.º 75/93 prevê, ainda, que:
"Art. 5º – São funções institucionais do Ministério Público da União:
(...)
III – a defesa dos seguintes bens e interesses:
e) os direitos e interesses coletivos, especialmente das comunidades indígenas, da família, da criança, do adolescente e do idoso.
(...)".
Determinações análogas encontram-se presentes na Lei n.º 8.625/93, que instituiu a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, preconizando que:
"Art. 25 – Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe ainda ao Ministério Público:
(...)
IV – promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:
a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos" (grifo nosso).
Não é nem necessário ressaltar o caráter de indisponibilidade de que os direitos referentes à proteção à criança e ao adolescente se revestem. Decorre, daí, a inegável legitimação do Ministério Público para sua defesa, haja vista a natureza de tais direitos, que devem ser protegidos com a mais absoluta prioridade.
Tanto a lei n.º 7.347/85 como as posteriores, e a própria Constituição, ao tratarem da ação civil pública, não a restringiram à iniciativa do Ministério Público, mas a prática tem demonstrado que é este, em regra, que tem ajuizado as ações de que cuida o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Quando a lei confere legitimidade de agir ao Ministério Público, presume-se o interesse de agir: no caso presente, o interesse está na própria norma que chama o Ministério Público ao processo (Carnelutti, Mettere il Publico Ministerio al suo Posto, Rivista di Diritto Processuale, Pádua, CEDAM, 1953, pág. 258, Satta, Direito Processual Civil, V. I, n.º 45).
Quanto à defesa, por parte do Ministério Público, dos interesses difusos e coletivos, em geral, toma-se por base especialmente a citada Lei n.º 7347/85 (Lei da Ação Civil Pública), que tem aplicação nos casos em que são protegidos interesses difusos e coletivos, juntamente com o Estatuto da Criança e do Adolescente, tendo em vista a natureza dos direitos tutelados.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, fornece subsídios para a instituição do presente litisconsórcio entre o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado do Espírito Santo, por meio do disposto no art. 210, § 1o do referido Diploma Legal, que determina:
"Art. 210 – Para as ações cíveis fundadas em interesses coletivos ou difusos, consideram-se legitimados concorrentemente:
I – O Ministério Público;
(...)
§ 1o – Admitir-se-á litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta Lei"
Inegável, em conseqüência, a possibilidade do presente litisconsórcio ativo, tendo em vista, inclusive, que o Ministério Público é órgão incumbido constitucional e legalmente da defesa dos direitos e interesses da criança e do adolescente.
Ainda no que diz respeito à legitimidade do Ministério Público, faz-se mister observar que a natureza dos direitos que o Parquet visa defender com a presente Ação Civil Pública não pode ser enquadrado na esfera restrita dos direitos individuais homogêneos. Isso ocorre tendo em vista a dimensão e a relevância social que pode assumir a tutela dos direitos afetos às crianças e adolescentes. Tais direitos, por sua própria natureza, revestem-se de caráter muito mais amplo do que aquele característico de um grupo isolado de pessoas, já que dizem respeito à sociedade como um todo.
Conclui-se daí que eventual violação ao direito que as crianças e adolescentes sob guarda têm de se inscreverem na condição de dependentes junto ao Regime Geral de Previdência Social pode acarretar inúmeras conseqüências. Permitir tais violações significa dar ensejo a malefícios que podem afetar parcela da população que não se limita ao grupo de crianças que se encontrem sob guarda, tendo em vista os possíveis desdobramentos de medidas que venham a restringir o amparo dado aos menores que se encontrem nessa condição.
Apesar disso, ad argumentandum tantum, mesmo se considerarmos que os direitos em questão tratam-se de direitos e interesses individuais homogêneos, ainda assim o Ministério Público Federal será parte legítima para sua tutela.
Com efeito, não há dúvidas de que a ação civil pública é meio idôneo para a defesa do direito das crianças e adolescentes de inscreverem-se na condição de dependentes junto ao INSS, ainda que tais direitos venham a ser considerados individuais homogêneos. Nesse sentido deve ser trazida à baila recente decisão do Supremo Tribunal Federal, no RE nº 163.231/SP, que teve como relator o douto Maurício Correia:
"No entanto, ao
editar-se o Código de Defesa do Consumidor, pelo seu art. 81, inciso III, uma
outra subespécie de direitos coletivos fora instituída, desta feita, com a
denominação dos chamados interesses ou direitos individuais homogêneos assim
entendidos os decorrentes de origem comum.
Por tal disposição vê-se que se cuida de uma
nova conceituação no terreno dos interesses coletivos, sendo certo que esse é
apenas um "nomem iuris
atípico" da espécie de direitos coletivos. Donde se extrai que interesses
homogêneos, em verdade, não se constituem como um "tertium
genus", mas sim com uma mera modalidade
peculiar, que tanto pode ser encaixado na circunferência dos interesses difusos
quanto na dos coletivos".
(...)
Quer se afirme na espécie
interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos
"stricto sensu", ambos estão nitidamente cingidos a uma mesma relação
jurídica base e nascidos de uma mesma origem comum, sendo coletivos,
explicitamente dizendo, porque incluem grupos, que conquanto atinjam as pessoas
isoladamente, não se classificam como direito individuais, no sentido do
alcance da ação civil pública, posto que sua concepção finalística
destina-se à proteção do grupo. Não está, como visto, defendendo o Ministério
Público subjetivamente o indivíduo como tal, mas sim a pessoa enquanto
integrante desse grupo. Vejo dessa forma, que me permita o acórdão impugnado,
gritante equívoco ao recusar a legitimidade do postulante, porque estaria a
defender interesses fora da ação definidora de sua competência. No caso agir o
"Parquet" em defesa do grupo, tal como definido no Código Nacional do
Consumidor (art.81, incisos II e III)..."
No mesmo sentido vem-se manifestando o Superior Tribunal de Justiça
"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
DIREITOS E INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE.
RECURSO ESPECIAL.
1. Há certos direitos e interesses
individuais homogêneos que, quando visualizados em seu conjunto, de forma
coletiva e impessoal, passam a representar mais que a soma de interesses dos
respectivos titulares, mas verdadeiros interesses sociais, sendo cabível sua
proteção pela ação civil pública.
2. É o Ministério Público ente legitimado a
postular, via ação civil pública, a proteção do direito ao salário-mínimo dos
servidores municipais, tendo em vista sua relevância social, o número de
pessoas que envolvem a economia processual.
3. Recurso conhecido e provido" (Resp. 95347/SE, DJ 01.02.1999, pág. 221, Rel. Min. Edson Vidigal).
"Recurso Especial. Ação Civil Pública. Legitimidade ativa do Ministério Público. Danos causados aos trabalhadores nas minas de morro velho. Interesse social relevante. Direitos individuais homogêneos.
1. O Ministério Público tem legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública em defesa de direitos individuais homogêneos, desde que esteja configurado interesse social relevante.
2. A situação dos trabalhadores submetidos a condições insalubres, acarretando danos a saúde, configura direito individual homogêneo revestido de interesse social relevante a justificar o ajuizamento da ação civil pública pelo Ministério Público.
3. Recurso Especial conhecido e provido" (Resp. 58682/MG, DJ 16.12.1996, pág. 50864, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito) (grifos do Parquet)”.
Ainda no que se refere à adequação da via processual eleita, cabe frisar que a ação civil pública não está sendo usada como substituta inadequada da ação direta de inconstitucionalidade. Nesse sentido, com as devidas adaptações, esclarecedora é a lição de Nelson Nery Junior (in Código de Processo Civil Comentado, RT, 2ª Edição, 1996, pág. 1407), que assevera:
"ACP E ADIn. Pedido e causa de pedir. É cabível ACP objetivando condenação do poder público em obrigação de não fazer (abster-se de cobrar impostos), tendo como fundamento (causa de pedir) a inconstitucionalidade ou ilegalidade do imposto. Na ACP o pedido é obrigação de não fazer e a causa de pedir a inconstitucionalidade do imposto. Não se confunde com a ADIn, onde a declaração da inconstitucionalidade não é o fundamento da demanda, mas o próprio pedido. Incorreto o entendimento de que descabe ACP nesta hipótese, porque estaria sendo utilizada para substituir a ADIn (RT 694/85)".
Visto isso, impende frisar, ainda, que a jurisprudência tem evoluído substancialmente no que se refere à legitimidade do Ministério Público para propor Ação Civil Pública para a defesa de direitos individuais homogêneos, reconhecendo a titularidade do "Parquet" no caso de relevância social e no fato de os tutelados encontrarem-se dispersos na coletividade.
Além disso, deve-se ter em conta a relevância do bem jurídico que o Ministério Público Federal visa tutelar com a presente demanda, tendo em vista o teor do art. 227, § 2o, II da CF/88,que assegura à criança e ao adolescente o direito a proteção especial, inclusive no que diz respeito à garantia de direitos previdenciários.
Ademais, o número de pessoas lesadas faz com que seja necessário que a defesa de tais direitos se dê por intermédio de instrumento processual único, como é o caso da presente ação, até mesmo como meio de preservar os interesses daqueles que, por sua hipossuficiência, dificilmente teriam condições de ajuizar uma ação individual a fim de defender seus direitos, ficando em situação de verdadeiro desamparo. A abrangência dos direitos ora tutelados, como já foi ressaltado, chega mesmo a transcender a esfera meramente individual, fazendo com que assumam maior vulto, de modo a constituírem interesse da coletividade como um todo, o que torna ainda mais conveniente que sua defesa se dê por meio de um instrumento coletivo, como o é a Ação Civil Pública.
Por outro lado, o Ministério Público Federal tem como objetivo amparar as partes hipossuficientes, mesmo porque a ação, se julgada procedente, terá como conseqüência o estímulo ao acolhimento, sob a forma de guarda, de crianças ou adolescentes órfãos ou abandonados, de modo a cumprir o mister previsto no art. 227, VI, da CF/88.
DA COMPETÊNCIA DO JUÍZO
No que diz
respeito às atribuições do Ministério Público Federal para propor a presente
ação e à competência da Justiça Federal para julgá-la, há que se ter em conta o
estabelecido no art. 37, I da Lei Complementar n.º 75/93, in verbis:
"Art. 37 – O Ministério Público Federal exercerá suas funções:
I – Nas causas de competência do Supremo Tribunal Federal, do Superior
Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e dos Juízes Federais, e
dos Tribunais e Juízes Eleitorais".
Redunda,
portanto, forçoso reconhecer a competência da Justiça Federal para processar e
julgar a presente Ação Civil Pública (art. 109, I da CF/88), encontrando-se a
matéria ora discutida entre as atribuições do Ministério
Público Federal, constitucionalmente legitimado para propor a presente acitio.
Além disso, o art. 148, inciso IV da Lei n.º 8.069/90 estabelece que "a Justiça da Infância e Juventude é competente para conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209".
O art. 209 do Diploma Legal acima referido, por sua vez, preconiza que "as ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deve ocorrer a ação ou omissão, cujo Juízo terá competência absoluta para processar a causa, ressalvada a competência da Justiça Federal e a competência originária dos Tribunais Superiores" (grifamos).
Já a Constituição Federal, em seu art. 109, inciso I, é clara ao dispor que aos Juízes Federais compete processar e julgar as causas em que a União, empresas públicas ou entidades autárquicas federais forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.
Incontestável, portanto, a competência deste Juízo para processar e julgar a presente demanda.
DO DIREITO
A Constituição Federal de 1988, fiel aos princípios que nortearam sua elaboração, outorga ao povo brasileiro uma enorme gama de direitos e garantias, objetivando o quanto possível o acesso de todos aos programas, serviços e benefícios fornecidos pelo Poder Público, sempre tendo em mente que a finalidade primeira e maior de toda atividade governamental é o bem estar geral.
Ao versar acerca dos direitos sociais, o art. 6o, caput, da Constituição Federal de 1988 estabelece que "são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição" (grifamos).
A preocupação com os direitos previdenciários das crianças não é exclusiva do legislador brasileiro, uma vez que o tema já foi tratado pela Declaração Universal dos Direitos da Criança, que assegurou, em seu 4o Princípio, o seguinte direito:
"A criança gozará os benefícios da previdência social. Terá direito a crescer e criar-se com saúde, para isto, tanto à criança como à mãe, serão proporcionados cuidados e proteção especiais, inclusive adequados cuidados pré e pós-natais. A criança terá direito a alimentação, habitação, recreação e assistência médica adequada".
Demonstrando a importância que o legislador constituinte deu à proteção da família, da criança e do adolescente, o art. 227 da Constituição Federal/88, juntamente com os artigos. 1o e 4o da lei n.º 8.069/90, estabeleceu a chamada doutrina da proteção integral, que determina seja dado à criança e ao adolescente prioridade absoluta em todas as áreas, sempre tendo em vista sua peculiar condição de pessoa em desenvolvimento.
Reafirmando a garantia constitucional supra, o parágrafo 3o do citado art. 227 da Constituição Federal estabelece que o direito à proteção especial à criança e ao adolescente abrangerá:
"§ 3o – O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
(...)
II – Garantia de direitos previdenciários e
trabalhistas;
(...)
VI – estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento sob forma de guarda, de criança ou adolescente, órfão ou abandonado" (grifamos).
A doutrina da proteção integral, que como vimos foi adotada pela Constituição Federal e também pela Lei n.º 8.069/90, assegura à criança e ao adolescente a condição de sujeito de todos os direitos, notadamente os fundamentais, tendo o citado art. 227, § 3o da Constituição Federal previsto expressamente que, como forma de garantir sua plena efetivação, terá o jovem direito aos benefícios da previdência social. Ao Poder Público caberá estimular o acolhimento de crianças e adolescentes sob forma de guarda.
A determinação constitucional deve ser analisada à luz do Estatuto da Criança e do Adolescente, que se por um lado estabelece como princípio que a criança ou o adolescente deve ser preferencialmente criado e educado no seio de sua família natural (art. 19 do referido Diploma Legal), por outro não perde de vista que, quando necessário, deverá ser o jovem colocado em família substituta (art. 28 a 32 da Lei n.º 8.069/90), sendo a guarda uma de suas modalidades (art. 33 a 35 do mesmo Estatuto).
Idealizada como medida a ser deferida na forma preferencialmente transitória, destinada a regularizar a posse de fato enquanto estiver tramitando procedimento de tutela ou adoção (que são outras modalidades de colocação em família substituta), por sua simplicidade e alcance, a guarda acabou se transformando na mais corriqueira forma de colocação em família substituta. Isso fez com que o que deveria ser a exceção, ou seja, o deferimento da guarda fora dos casos de tutela e adoção (art. 33, § 2o do Estatuto da Criança e do Adolescente), se tornasse quase que uma regra.
Embora não seja a solução ideal, pois a tutela e especialmente a adoção dão muito mais garantias ao jovem, quando uma criança ou um adolescente são postos sob a guarda de outrem, está-se evitando que seja acomodada em abrigos. Isso não deixa de ser uma forma de tornar menos provável a ocorrência de um processo de "institucionalização" que a colocação de menores em abrigos pode acarretar, evitando-se, também, outros malefícios decorrentes de tal medida.
Por meio da guarda, as crianças e/ou os adolescentes que se encontram impossibilitados de conviver com seus pais biológicos passam a receber toda assistência material, moral e educacional da família substituta que os acolheu, numa situação que pode ser mais ou menos duradoura, mas que sem dúvida lhes é favorável, estando assim a merecer amparo jurídico.
Nesse contexto, a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente fizeram expressa referência ao instituto da guarda, por um lado estabelecendo a obrigação do Poder Público de estimular essa modalidade de colocação em família substituta (art. 227, § 3o, inciso VI da Constituição Federal), e por outro, reconhecendo a condição de dependente do guardado em relação aos guardiães (art. 33, § 3o do Estatuto da Criança e do Adolescente).
A relação de dependência entre o guardado e o guardião, ressalte-se, é decorrência natural dos direitos e deveres inerentes ao instituto da guarda, que como vimos inclui o dever do guardião de prestar assistência material ao menor sob guarda. Além disso, a guarda destina-se a regularizar a posse de fato, que de per se já é indicativa da condição de dependência juridicamente reconhecida pelo citado art. 33, § 3o da Lei n.º 8.069/90.
Vale também destacar que a dependência para fins previdenciários do guardado em relação ao guardião já estava consignada no antigo Código de Menores, na parte relativa à colocação em família substituta nesta modalidade (art. 24, § 2o).
Claro está que a dependência para todos os fins, inclusive previdenciários, é inerente a qualquer forma de colocação em família substituta, e tal entendimento há muito se encontra sedimentado.
Por
preocupar-se em dar o necessário respaldo jurídico à situação de fato resultante
da guarda judicial, a Lei n.º 8.069/90, em seu art. 33, § 3o, foi
bastante clara ao estabelecer que a
dependência por ela reconhecida tem o alcance mais amplo
possível, abrangendo "todos os fins e efeitos de direito" (verbis).
Ocorre que, não bastasse o contido na disposição supra, o mencionado art. 33, § 3o, do Estatuto da Criança e do Adolescente foi mais além, consignando expressamente que a guarda tem efeitos "inclusive previdenciários" (verbis).
Quando diz que a guarda terá "inclusive" efeitos previdenciários (art. 33, § 3o, in fine, da Lei 8.069/90), sendo que a primeira parte do dispositivo já permitia tal interpretação, temos que ter em vista regra básica de hermenêutica, segundo a qual a lei não contém palavras inúteis. Isso nos leva à inevitável conclusão de que, com tais cuidados, o legislador quis ressaltar esta característica que a guarda tem de garantir aos menores amparo previdenciário, evitando, assim, qualquer tentativa de distorção do comando legal. Com isso, vê-se que tais disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente estão em perfeita consonância com as demais determinações estatutárias e constitucionais referentes à proteção integral à criança e ao adolescente.
E nem poderia ser diferente, pois se um dos atributos da guarda é a prestação de assistência material, e se esta naturalmente leva à dependência econômica, nada mais correto que a situação produza efeitos junto à previdência social, sob pena de se deixar de dar amparo jurídico a uma situação de fato que reconhecidamente já existe, causando, assim, sérios e inaceitáveis prejuízos ao guardião e, em especial, ao menor sob guarda.
Em consonância com tal entendimento, a Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991, ao tratar dos Planos e Benefícios da Previdência Social, tinha a seguinte redação:
"Art. 16. - São BENEFICIÁRIOS do Regime Geral de Previdência
Social, na condição de DEPENDENTES do segurado:
I- o
cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer
condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;(Redação dada pela Lei nº
9.032, de 28.04.95)
§2O
– EQUIPARAM-SE A FILHO, nas condições do inciso I,
mediante declaração do segurado: o enteado; O MENOR QUE, POR DETERMINAÇÃO
JUDICIAL, ESTEJA SOB A SUA GUARDA; e o menor que esteja sob sua tutela e não
possua condições suficientes para o próprio sustento e educação".
Ocorre que, justificando a preocupação demonstrada pelo legislador estatutário, em flagrante afronta à Constituição Federal, ao Estatuto da Criança e do Adolescente, à lógica e ao bom-senso, o Poder Público Federal, por meio da Medida Provisória n.º 1.523, datada de 11.10.1996 e por diversas vezes reeditada, acabou por suprimir da Lei Previdenciária os direitos de crianças e adolescentes sob guarda judicial de se verem inscritos como dependentes do segurado no Regime Geral de Previdência Social.
Tal Medida Provisória, após diversas reedições, foi convertida na Lei n.º 9.528, de 10 de dezembro de 1997, que convalidou a Medida Provisória n.º 1.523/96, desde sua primeira edição até a 13a reedição (art. 13 da Lei n.º 9.528/97).
A Lei supracitada, em seu art. 2o, consolidando uma situação criada desde a 1a edição da Medida Provisória n.º1.523/96, deu a seguinte redação ao art. 16 da Lei 8.213/91:
"Art. 16
– São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de
dependentes do segurado:
(...)
§ 2o – O enteado e o
menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que
comprovada a dependência econômica na fora
estabelecida no Regulamento".
O Decreto n.º
3.048, de 06 de maio de 1999, que aprovou o Regulamento da Previdência Social,
não dá ao tema tratamento diferente, uma vez que dispõe, em seu art. 16, §§ 3o
e 4o, in verbis:
"Art. 16 – São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
(...)
§ 3o – Equiparam-se aos filhos, nas condições do inciso I, mediante declaração escrita do segurado e desde que comprovada a dependência econômica, na forma estabelecida no § 8o do art. 22, o enteado e o menor que esteja sob sua tutela e não possua bens suficientes para o próprio sustento e educação.
§ 4o – O menor sob tutela somente poderá ser equiparado aos filhos do segurado mediante apresentação de termo de tutela".
Também versando acerca do tema, a Ordem de Serviço n.º 623, de 19 de maio de 1999, republicada no Diário Oficial da União de 08.07.1999, ao tratar da pensão por morte e do auxílio-reclusão estabeleceu, em seu itens 15.7 e 15.8, que:
"15.7 - A partir de
14.10.96, o menor sob guarda deixa de integrar a relação de dependentes para os
fins previstos no RGPS, inclusive aquele já inscrito.
15.8 - Caso o óbito tenha ocorrido até
13.10.96, fica mantido o direito do menor sob guarda à pensão por morte, desde
que atendidos os requisitos da legislação em vigor à época".
Em conseqüência disso, a partir de tais modificações na legislação, somente o enteado e o menor tutelado vêm sendo inscritos no Regime Geral da Previdência Social na condição de dependentes do segurado, desde que comprovada a dependência econômica com relação a este.
Dessa forma, a criança ou adolescente colocados sob guarda de terceiros mediante decisão judicial deixou de integrar a relação de dependentes para fins previstos no Regime Geral da Previdência Social, o que acaba afetando, inclusive, aqueles já inscritos nos termos da antiga redação do dispositivo alterado.
Ao deixar de reconhecer a condição de dependente do guardado em relação ao guardião, a inovação legislativa provocada pelo advento da Lei n.º 9.528/97 não levou em conta o necessário respaldo jurídico que os menores sob guarda devem ter junto à Previdência Social. Esse amparo jurídico, que se consubstancia, entre outras formas, na possibilidade de o menor sob guarda inscrever-se junto ao RGPS, decorre dos textos constitucional e estatutário, que levaram em conta a relevância e as conseqüências da guarda. Por essa razão o instituto é cercado das garantias estabelecidas no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Constituição, até como meio de garantir a plena eficácia das decisões judiciais que conferem a guarda de menores a terceiros.
Poder-se-ia ponderar, por outro lado, que a exclusão dos menores sob guarda da condição de dependentes para fins previdenciários seria conseqüência de alguns casos em que a guarda é concedida irregularmente, apenas para que os guardiães usufruam de eventuais benefícios da Previdência Social. Não é razoável, entretanto, que se negue ao menor sob guarda a condição de dependente do guardião sob tal pretexto, até porque, na realidade, é a tutela que tem sido o meio mais freqüentemente usado para fins de obter a inscrição previdenciária do pupilo como dependente do tutor.
A ocorrência de irregularidades em alguns pedidos de guarda não justifica a adoção de uma medida de caráter geral e indiscriminado, que acaba por prejudicar a todos, ferindo direitos constitucionalmente garantidos daqueles que, de fato, estão sob a guarda e a dependência econômica de alguém.
Mister se faz lembrar que, nos termos do art. 35 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a guarda inicialmente deferida poderá ser revogada a qualquer tempo, mediante ato judicial fundamentado, ouvido o Ministério Público, e que qualquer pessoa que demonstre legítimo interesse poderá intervir nos procedimentos previstos na Lei n.º 8.069/90 (art. 206 do Estatuto da Criança e do Adolescente).
Destarte, em sendo constatado pelo INSS, a qualquer tempo, que a guarda requerida ou já deferida não atende aos requisitos do art. 33, caput, e § 1o, primeira parte, do Estatuto da Criança e do Adolescente, possível será a tomada de providências com vista a fazer cessar a irregularidade encontrada, evitando-se, assim, prejuízos aos cofres públicos.
Verifica-se, pois, que não existe justificativa plausível para a falta de respaldo jurídico dos menores sob guarda junto à Previdência Social, sendo inaceitável a retirada de direitos fundamentais a eles constitucionalmente assegurados. A dependência econômica, na imensa maioria dos casos, ocorre na prática, de modo que a exclusão de menores sob guarda do RGPS, além de não ser razoável, constitui uma inconcebível violação do previsto na Lei n.º 8.069/90 e na Constituição Federal no tocante à doutrina da proteção integral à criança e ao adolescente.
Mas o cerne da questão não diz respeito à razoabilidade da medida. Deve-se ter em conta que, quando não permite que o segurado inscreva o guardado como seu dependente, a Lei n.º 9.528/97, que alterou a redação da Lei n.º 8.213/91, teve como conseqüência o desestímulo da colocação de crianças e adolescentes sob guarda, violando, assim, o disposto nos já citados artigos 227, § 3º, inciso VI da Constituição Federal e art. 34 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Inegável, portanto, a inconstitucionalidade do referido dispositivo.
Deve-se levar em conta, ainda, que a criança e o adolescente colocados sob guarda judicial dependem de seus guardiães assim como o enteado e o tutelado dependem das pessoas por eles responsáveis. Isso ocorre tendo em vista que a relação de dependência é análoga tanto no caso da guarda (não obstante o caráter provisório de que se reveste o instituto), como no caso da tutela. Tal dependência decorre do estado de hipossuficiência em que se encontram os menores sujeitos a essas espécies colocação em família substituta, de modo que não é adequado que a lei confira tratamento diferenciado a menores sujeitos à guarda ou tutela já que, pelo menos sob o aspecto da dependência, encontram-se ambos em situação análoga.
Por outro lado, não bastasse a inconstitucionalidade material apontada, deve-se ressaltar que os menores que se inscreveram no Regime Geral de Previdência Social com base na redação anterior do art. 16 da Lei n.º 8.213/91 não poderiam, em hipótese alguma, ter suas inscrições (ou benefícios previdenciários) cassadas em virtude da modificação feita por lei posterior. Houve, em conseqüência, violação ao princípio constitucional que assegura o respeito ao direito adquirido, o que não foi devidamente observado pela Ordem de Serviço n.º 623/99.
Não poderia, em conseguinte, ter havido determinação no sentido de que os menores sob guarda deixassem de integrar a relação de dependentes do RGPS, não apenas pela inconstitucionalidade do dispositivo, mas também pelo fato de que a inscrição de alguns desses menores deu-se sob a égide da lei vigente à época. Não se pode, assim, permitir que as inscrições dos menores feitas com observância de todas as exigências da lei anterior sejam simplesmente canceladas ao sabor das circunstâncias, sob pena de hipotecarmos garantias tão caras ao Estado Democrático de Direito, como a garantia do respeito ao direito adquirido.
Deve-se reiterar que a norma apontada padece de vício insanável de inconstitucionalidade. A vedação de que as crianças e adolescentes que estão sob guarda inscrevam-se no Regime Geral de Previdência Social afronta toda a sistemática da Constituição Federal de proteção, com absoluta prioridade, dos direitos fundamentais dos menores. É certo que o direito à proteção integral à criança e ao adolescente abrange a garantia de direitos previdenciários, por força de expressa determinação do art. 227, § 3o, II da CF/88.
Nesse contexto, ao não permitir que o segurado inscreva o guardado como seu dependente, a Lei n.º 9.528/97 acaba por desestimular a colocação de crianças e adolescentes sob guarda, violando frontalmente o disposto nos supracitado art. 227, § 3o, incisos II e VI da CF/88.
As normas constitucionais em análise, ao estabelecerem linhas de ação que vinculam os poderes constituídos, restringem o campo das escolhas feitas na definição das políticas públicas. Se determinada política pública, veiculada em ato normativo ou concreto, for incompatível com tais linhas de ação, padecerá, necessariamente, de inconstitucionalidade.
Toda norma constitucional, independentemente da densidade da linguagem empregada pelo constituinte, possui a eficácia mínima de, pelo menos, obstaculizar posicionamentos dos poderes constituídos que lhe forem contrários.
Dessa forma, o art. 16, § 2o da Lei n.º 8.213/91, em sua redação anterior, reconhecendo a situação de dependência econômica existente entre a criança e adolescente e seu guardião, assegurava àqueles a inscrição como dependentes destes para fins previdenciários. Tratava-se de dispositivo legal em absoluta consonância com o que dispõem as normas constitucionais referentes ao tema, que impõem ao legislador (e ao próprio Estado) o dever de buscar a mais ampla proteção às crianças e aos adolescentes, inclusive no que se refere a direitos previdenciários.
Conclui-se, daí, que a inovação legislativa que eliminou direitos previdenciários dos menores que se encontrem sob guarda é absolutamente contrária ao dever imposto pelo legislador constituinte ao Poder Público de estimular o acolhimento de crianças sob a forma de guarda. Decorre, daí, a invalidade do art. 16, § 2o da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei n.º 9.528/97, uma vez que completamente incompatível com o previsto na Carta Magna vigente.
DA NECESSIDADE DE CONCESSÃO DA LIMINAR
Na hipótese dos autos, encontram-se presentes todos os requisitos necessários à concessão da medida liminar, independentemente de justificação prévia, na forma prevista no art. 12 da Lei n.º 7.347/85 e art. 213, § 1o do Estatuto da Criança e do Adolescente.
No que concerne ao fumus boni juris, o preenchimento de tal requisito faz-se evidenciar ao longo de toda a presente peça, já que, indubitavelmente, o direito desautoriza a exclusão dos menores sob guarda do Regime Geral de Previdência Social.
Com efeito, é manifesto o prejuízo das crianças e adolescentes capixabas que se encontram sob guarda ou venham a depender dessa modalidade de colocação em família substituta, lesadas em seus já mencionados direitos constitucionais e estatutários por ato da ré.
Eis aqui presente o fumus boni juris, inegavelmente qualificado.
Pelos fundamentos que aqui vêm sendo expostos, quer em conjunto quer isoladamente, merece ser acolhida a pretensão dos autores. Isso ocorre já que a exclusão dos menores sob guarda do RGPS tem conseqüências não apenas para os menores diretamente prejudicados, mas para toda a sociedade, tendo em vista os desdobramentos que podem advir dessa situação que acentua ainda mais a natural hipossuficiência dessas crianças e adolescentes.
Como se pode observar, a situação atual é insustentável, dado que diversas crianças e adolescentes encontram-se sem o amparo previdenciário ao qual fazem jus, sofrendo dessa forma em seu dia-a-dia inúmeras e gravosas conseqüências, com prejuízos que só tendem a aumentar com o passar do tempo, até se tornarem irreparáveis. Por essas razões, a medida liminar ora pleiteada se reveste de caráter urgente, fazendo-se mister seja concedida, como meio de evitar prejuízos ainda mais sérios às crianças e adolescentes deste Estado.
Eis aqui o periculum in mora, patentemente configurado.
Com relação à liminar, Wilson Donizetti Liberati afirma que "o juiz, quando concede liminar, apenas se preocupa com a relevância do pedido e com o fato de o direito do impetrante, quando reconhecido, possa cair no vazio" (in O Estatuto da Criança e do Adolescente, pág. 145).
Assim, imperativo que se conceda a medida liminar, visto que cabalmente configurados o periculum in mora e o fumus boni juris, e tendo em vista, ainda, a premência imposta pelas circunstâncias que permeiam o caso vertente, sob pena de danos irreparáveis ou de difícil reparação e graves prejuízos às crianças e adolescentes que se encontram ou venham a ser colocados sob guarda judicial.
DO PEDIDO
Ante o exposto, restando evidenciada a violação aos direitos e interesses da infância e adolescência do Estado do Espírito Santo, pelo fato de a requerida não permitir a inscrição de crianças e adolescentes sob guarda judicial como beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado, requer-se:
1 – A citação da ré, na pessoa de seu representante, no endereço supramencionado;
2 - A concessão de liminar inaudita altera pars, para;
A. determinar que a ré se obrigue a proceder à inscrição de crianças e adolescentes sob guarda judicial como dependentes do segurado guardião no Regime Geral de Previdência Social;
B. determinar o restabelecimento das inscrições e benefícios de menores sob guarda (que ainda se encontrem nessa condição) que tenham sido irregularmente canceladas após a alteração do texto original do art. 16, § 2o da Lei n.º 8.213/91 pela Medida Provisória n.º 1523/96 e alterações subseqüentes;
3 – A cominação, no caso de descumprimento da liminar deferida, de multa de R$ 3.000,00 (três mil reais) para cada caso de indeferimento de pedidos de inscrição de crianças e adolescentes sob guarda, tendo em vista o disposto no art. 213, § 2o, da Lei 8.069/90, devendo o montante do valor eventualmente arrecadado ser revertido ao Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do adolescente de Vitória/ES (art. 214 do Estatuto da Criança e do Adolescente);
4 – Seja, a final, confirmada a liminar deferida, com a declaração, incidenter tantum, da inconstitucionalidade do art. 16, § 2o da Lei n.º 8.213/91, com redação dada pela Lei n.º 9.528/97, a fim de condenar a autarquia ré a proceder a inscrição de menores sob guarda na condição de dependentes do segurado em todo o Estado do Espírito Santo;
5 – Requer, ainda, o pagamento retroativo dos valores referentes aos benefícios ilegalmente cancelados a partir da primeira edição da Medida Provisória n.º 1.523/96.
Protesta provar o alegado por todos os meios de prova admitidos, especialmente a documental.
Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais), para efeitos fiscais.
Nestes Termos,
Pede Deferimento.
Vitória, 31 de agosto de 1999.
ELISANDRA DE OLIVEIRA OLÍMPIO
Procuradora da República
ALEXANDRE ESPINOSA BRAVO BARBOSA
Procurador da República
SIDIA NARA OFRANT RONCHI
Promotora de Justiça