Direito à Convivência Familiar e Comunitária

 

 

A legislação brasileira contempla a normativa internacional relativa aos direitos e à proteção da família, da criança e do adolescente, enfatizando a ação do Estado quanto aos cuidados com as famílias.

 

A Constituição Federal de 1988 estabelece que a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado, bem como assegura à criança e ao adolescente, assim como o Estatuto da Criança e do Adolescente, o direito à convivência familiar. Novo paradigma. Trata-se de direito subjetivo que mereceu reforço expresso quando da definição da lei segundo a qual a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou suspensão do poder familiar.

 

Todavia, apesar do cenário legal, as crianças e os adolescentes privados de convivência familiar ainda constituem um desafio para a sociedade e para os governos.

 

 No último século, a sociedade brasileira passou por profundas transformações demográficas, sociais e econômicas, que repercutiram intensamente nas diferentes esferas da vida familiar.

 

O modelo de família vem sofrendo um rápido processo de transformação. Novas representações sociais de família se revelam. Os costumes mudaram e continuarão mudando. É incontestável, outrossim, que as influências do meio familiar, entrecruzando-se com os fatores sociais, são decisivas no desenvolvimento de uma criança ou de um adolescente. Sabe-se que a desorganização familiar e a ausência de afetos, conjugadas com fatores socioeconômicos, levaram uma parcela da população infanto-juvenil a fazer da rua seu espaço de sobrevivência, ficando exposta a toda forma de exploração e indignidade. Outras tantas causas geradoras poderiam ser, com propriedade, apontadas como violadoras do direito fundamental à convivência familiar.

 

também, no Brasil, um número elevado de crianças e adolescentes institucionalizados em abrigos. Indiscutivelmente, os cuidados coletivos, sobretudo a ainda insuficiente observância aos princípios decorrentes da lei - tais como a preservação dos vínculos familiares, o atendimento em pequenos grupos, o não-desmembramento do grupo de irmãos e a participação na vida da comunidade local - provocam sofrimentos e sérios prejuízos psicossociais e afetivos que podem atingir a capacidade de relacionamento afetivo e o desenvolvimento integral de nossas crianças e adolescentes. Convém lembrar que os laços de família, mesmo os decorrentes da relação de parentesco, afinidade e afetividade, que geram sentimentos de pertencimento, não podem ser desprezados.

 

Nesse enfoque, a colocação em família substituta é uma das alternativas legais para garantir o direito a uma vinculação afetiva. Defender o direito de a criança crescer no seio da família natural deve ser prioridade absoluta.

 

Por outro lado, a fragilidade dos vínculos familiares se revela também como reflexo das dificuldades vivenciadas no dia-a-dia da ainda grande parcela da população infanto-juvenil excluída socialmente. Em termos de promoção da inclusão social, caberia inquirir onde estão os locais ou centros de convivência na comunidade nos quais nossas crianças e adolescentes teriam oportunidade de realizar atividades esportivas, recreativas ou artísticas.

 

Assim, ao abordar a temática Direito à Convivência Familiar e Comunitária, não se pretendeu esgotar o enfrentamento das questões relativas à matéria. A par da dificuldade no garimpo de textos jurídicos da área, principalmente frente ao Novo Código Civil, e ao natural reflexo na abordagem da adequação às mudanças sociais e estruturais que afetam a realidade da família, dispusemo-nos a constituir um instrumento útil de consulta, composto de material doutrinário, jurisprudencial e mesmo prático que possa conferir enfoque objetivo e interdisciplinar, visando subsidiar reflexões e discussões, sempre necessárias, para multiplicar e recriar conhecimentos no intuito de  alcançar e difundir informações que contribuam para o permanente estudo, a aplicação e a divulgação do novo Direito da Criança e do Adolescente.

 

Enfim, o Acervo Operacional dos Direitos da Criança e do Adolescente constitui-se uma valiosa ferramenta de apoio ao desempenho dedicado e firme de assegurar proteção integral a crianças e adolescentes, para que se formem, no futuro, cidadãos com melhores perspectivas e com condições de, ao se desenvolverem em um ambiente mais sadio, propiciar a seus filhos um mundo melhor.

 

Simone Mariano da Rocha

Procuradora de Justiça/RS