O PAPEL ARTICULADOR DOS
CONSELHOS DE DIREITOS E DOS CONSELHOS DE EDUCAÇÃO
Públio Caio Bessa Cyrino
Promotor de
Justiça, AM.
1.
A ORIGEM DOS CONSELHOS DOS DIREITOS
2.
ORIGEM FORMAL DOS CONSELHOS DOS DIREITOS
3.
CARACTERÍSTICAS DOS CONSELHOS
4.
AS INTERFACES DOS CONSELHOS COM OUTROS ÓRGÃOS – A
COMPREENSÃO DO SISTEMA DE REDES DE SERVIÇOS
4.1 Conceito de
Rede
4.2 Espécies de
Redes
4.3 A interface
com os Conselhos Tutelares
4.4 A interface
com o Ministério Público
5.
OS CONSELHOS DOS DIREITOS E SUA ARTICULAÇÃO COM OS CONSELHOS
DE EDUCAÇÃO
6.
FAZENDO CUMPRIR A LEI DE DIRETRIZES E BASES E O
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
7.
CONCLUSÃO
1.
A ORIGEM
DOS CONSELHOS DOS DIREITOS
A experiência com Conselhos,
como prática social de intervenção de grupos sociais organizados na gestão
política do poder, não é criação do legislador brasileiro, como pode parecer.
Nem é novidade, no Brasil, pelo menos enquanto idéia, visto que o Código de
Melo Matos de 1927 já previa a existência de Conselhos de Assistência e
Proteção aos Menores, embora, na prática, muito poucos tenham sido os que se
instalaram, além do que não possuíam a mesma conotação dos Conselhos dos
Direitos atuais.
Historicamente várias
sociedades experimentaram tais práticas, ora em Conselhos Operários, ora em Conselhos
de Cidadãos. A experiência com Conselhos Operários se revela a partir da
prática de trabalhadores organizados, originado diretamente
do sistema de produção. Segundo Gohn (1990)
são agentes e atores centrais da política econômico-social do país.
Quanto
aos Conselhos de cidadãos, são eles compostos por cidadãos não necessariamente
trabalhadores (ou exclusivamente) e se constituem a partir de um processo de
consumo e distribuição de bens, serviços e equipamentos, principalmente
públicos. São atores de políticas sociais determinadas ou elaboradas por
agentes governamentais.
Ilustram-se como
experiências internacionais : a Comuna de
Paris, vista como primeira experiência de autogestão operária através de
Conselhos Populares. Ocorreu em 1871, em França, onde os trabalhadores
conseguiram exercer o governo; os Sovietes
Russos, surgidos em São Petersburgo, em 1905, caracterizado como organismo
político de luta pelo poder estatal num momento de crise aguda da sociedade; A experiência Alemã, através de Conselhos
de Fábricas, por volta de 1918. Cuidavam das questões salariais, preços de
aluguéis; a experiência Italiana, começando por Comissões de
Fábricas, evoluíram para a formação de Conselhos, com características
políticas. Outras tantas experiências internacionais ocorreram.
No Brasil, constatamos
inicialmente a experiência com Conselhos Comunitários. Tratava-se de uma
participação “outorgada” da população nos referidos Conselhos, pois sua criação
e estruturação e todas as regras participativas eram de iniciativas do Poder
Público, restando à população a simples adesão. Eram órgãos consultivos de
Governo, legitimando a atuação estatal.
Algumas poucas experiências,
a partir da década de 80, surgem com os Conselhos Populares, sobretudo no
chamado orçamento participativo, adotado por algumas poucas cidades.
Somente a partir da década de 90 se pode
falar de experiência de Conselhos deliberativos, com participação popular
efetiva, sem mera adesão, quando surgem os Conselhos de Saúde e depois os
Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e os da Assistência social.
2.
ORIGEM
FORMAL DOS CONSELHOS DOS DIREITOS
A fonte inspiradora dos
Conselhos é a Constituição Federal de 1988; ao enunciar que o Brasil é uma
República Federativa, um Estado Democrático de Direito, onde o poder emana do
povo que o exerce por seus representantes legais ou diretamente, nos casos
previstos na Constituição, estabeleceu a democracia participativa.
Como forma de materializar a
federação, estabeleceu a Constituição que a formulação de políticas de
atendimento relacionadas à criança e ao adolescente, deveria seguir as regras
da descentralização política e administrativa. Assim, a
formulação, execução e controle de políticas de atendimento em tais áreas
deveriam ser realizadas através de ações municipalizadas
(descentralização política), além de serem desenvolvidas por órgãos que não
pertencessem à administração direta (secretarias, gabinetes de governo etc...)
Exigiu, também, a
Constituição, que as políticas de atendimento, além de descentralizadas –
municipalizadas – deveriam contar com a participação popular. Surgiu, então,
através da Lei Federal 8069/90 um tipo de órgão público, especial, diferente
dos que se conhecia na técnica da administração púbica, pois apesar de
descentralizado, com independência, não seria dotado de personalidade jurídica
própria, tal como as autarquias, e ainda teriam em sua composição, de forma
paritária, a participação popular em relação aos representastes do Governo.
Criaram-se os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente. Estava criado
um canal de participação popular na gestão do Poder Político.
3.
CARACTERÍSTICAS
DOS CONSELHOS
A Constituição Federal exigiu que se criasse, no âmbito de
cada esfera da federação, um órgão que definitivamente acabasse com a prática verticalista das ações, até então impregnadas pela antiga
Política Nacional do Bem Estar do Menor.
Como foi visto em outro
momento desse texto, exigiu-se, por via da CF/88, um órgão formulador de políticas,
em cada esfera de governo. Por isso, o Estatuto da Criança e do Adolescente,
regulamentando a Carta Maior, estabeleceu que seriam criados conselhos de
direitos, tanto como opção política da constituição material, quanto estratégia de gestão, ou simplesmente, diretriz de política
de atendimento.
Por obra da lei, esses
Conselhos serão “órgãos deliberativos e controladores das
ações em todos os níveis, assegurada a participação popular paritária por meio
de organizações representativas”. A lei foi de uma extrema objetividade: o
órgão deve ser deliberativo das
políticas públicas, e não mais, tão somente, consultivo, como tantos organismos da administração pública.
A CF não admitiu, nesse caso, qualquer disfarce a respeito
da participação popular. Trata-se de efetiva participação e não mera
“integração” em programas já previamente decididos e colocados em pauta apenas
para legitimar futuras ações.
Deliberar, segundo definição significa “decidir; resolver
depois de exame e discussão”; essa tarefa é típica do Conselho dos Direitos.
Caberá a ele decidir, após discussão
entre seus pares, toda política, programas e ações referentes às crianças e aos
adolescentes, sejam de iniciativa própria, do Poder Executivo ou de
organizações não governamentais. Essa deliberação
será conteúdo de resoluções dos Conselhos e terá como destinatários todas as
pessoas e órgãos responsáveis pela execução de políticas de atendimento.
Num
certo modo, pelo estágio em que se encontra a democracia no Brasil, podemos
afirmar que demos um salto das “bandeiras de luta” – momento de estratégico da
fase reivindicatória e de denúncias, para uma outra fase de “planos de ação” –
onde se exige muito mais uma capacidade propositiva, para aproveitamento dos
espaços políticos, na busca da hegemonia da sociedade civil, e consequentemente,
a mudança da “cara do Estado”.
Isso é importante: o poder não admite
vazios; ou a sociedade civil o ocupa ou o Governo o fará na totalidade.
Se os representantes da sociedade civil não forem capazes de realizar propostas
efetivas para as políticas públicas, os representantes de Governo o farão, tudo
dentro do espírito democrático, legitimando-se, ao final, as propostas
aprovadas no Conselho.
Saliente-se que as deliberações dos Conselhos, uma vez
publicadas, se tornam uma vontade Estatal, desaparecendo a paternidade e
impondo ao Executivo sua concretização.
É conseqüência natural da
característica anteriormente comentada. O órgão deliberativo,
cuja decisão será uma manifestação do próprio Estado, impondo-se a todos
– destinatários naturais da obrigação de prover os direitos fundamentais das
crianças e adolescentes – exigiria, certamente, o caráter de órgão autônomo. Autonomia, entendida como “independência
administrativa, faculdade de se governar”.
O Conselho, criado por lei, terá seu regimento próprio. Suas
atribuições são vinculadas à lei e não tarefas discricionárias impostas pelo
Estado.
Uma vez constituído, com
seus membros devidamente empossados na forma da lei, o Conselho terá total
liberdade para tomar suas decisões, não se sujeitando ou subordinando
administrativamente a nenhum outro órgão. Importa esclarecer que não se deve
confundir “vinculação administrativa” com “subordinação administrativa”.
Os Conselhos se “vinculam”
administrativamente ao Poder Executivo, encontrando um “locus” na administração pública
inclusive para os fins de dotação orçamentária para seu funcionamento. Porém
não se tornam subordinados,
o que significa dizer que não se admite ingerência política em suas
decisões nem controle administrativo de seus atos – ressalvado o controle
finalístico ou de legalidade; não existe poder de avocar as atribuições do
Conselho para nenhum outro órgão, em face da inexistência do poder hierárquico.
Suas decisões, a exemplo do que ocorre com o Conselho Tutelar,
só podem ser revistas por seu colegiado ou por decisão judicial, jamais por
outras autoridades administrativas.
Atendendo ao princípio
constitucional da participação direta na gestão do poder político, estabeleceu
o Estatuto da Criança e do Adolescente o princípio da paridade ou igualdade entre os membros que compõem o Conselho.
Para sua composição exigiu a constituição, como visto, a presença representantes da população. Por óbvio, a
participação sem isonomia ou paridade, entre sociedade civil e governo, seria
um engodo e estaria maquiando a possibilidade de intervenção do povo em atos de
governo, deixando de atender à vontade expressa o legislador
constituinte, prevista no Parágrafo único, do artigo 1°, da CF/88.
Dessa forma, cada localidade manifestará, em lei, de
iniciativa do Executivo, sua vontade quanto à quantidade de membros que irão
compor o Conselho. Para atender ao preceito legal da paridade, será exigido um
número igual de representantes do governo e da sociedade civil.
Sem embargos, essa fórmula se apresenta bem próxima da
concepção de Estado proposta por Antônio Gramsci, quando afirmara que o Estado
é igual ao governo mais a sociedade civil (Estado =
governo + sociedade civil).
Assim constituído, ressaltamos mais uma vez a importância da
capacidade “propositiva” dos conselheiros, sobretudo os que venham representar
a sociedade civil, pois, embora a ciência política não se desenvolva como
matemática, não resta dúvida que o resultado dessa operação estará
estreitamente ligado ao potencial de intervenção, capacidade de mobilização,
competência e resolutividade das propostas, de cada
“elemento” da fórmula, delineando, ao final, a “cara do Estado”.
Embora, talvez, se pudesse colocar essa característica como
“atribuição” do Conselho, não resta dúvida que essa atribuição lhe dá uma nota
característica. Além de órgão deliberador e
formulador de políticas, o Conselho exerce uma tarefa de controle social das
mesmas ações e políticas públicas.
Esse controle se deve dar através de avaliações das
políticas, gerenciamento e fiscalização do Fundo; inscrição de programas e
cadastramento de entidades. Dessa forma poderá apresentar e deliberar propostas
retificadoras dos desvios em todos os níveis – inclusive e principalmente político
- por ventura detectados.
4. AS INTERFACES DOS CONSELHOS COM OUTROS ÓRGÃOS – A
COMPREENSÃO DO SISTEMA DE REDES DE SERVIÇOS
Até aqui percebemos que os Conselhos dos Direitos também
podem ser considerados como estratégia de gestão política e administrativa,
estabelecida pelo legislador constitucional, quando enfatizou princípios como a
descentralização, municipalização e participação popular.
Enquanto estratégia de gestão, não se pode olvidar da
necessidade de buscar uma perfeita harmonia desse órgão com outros órgãos da
administração, entidades não-governamentais e espaços políticos, como foros de
defesa, organizados na sociedade civil.
Esperar que as respostas às necessidades básicas
e direitos fundamentais decorram única e exclusivamente do Estado – embora
seja sua tarefa típica - é postura suicida. O Estado não existe sem sociedade
civil e é nela que está a riqueza das iniciativas.
O Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceu um “ponto
de chegada” em relação às políticas de atendimento:
A política de atendimento dos direitos da
criança e do adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações
governamentais e não governamentais, da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios (artigo 86, ECA).
Para a garantia, defesa, prevenção e promoção dos diferentes
direitos (fundamentais e especiais) de crianças e adolescentes, por certo
exigirá sempre, em face dessa diversidade e complexidade, uma multiplicidade de
ações também específicas, nas áreas de políticas básicas ou suplementares.
Nessa tarefa vamos encontrar múltiplas formas de
organizações e intervenções e de agentes que necessitam serem identificados,
fazendo-se uma verdadeira taxinomia, para que os resultados
das políticas de atendimento sejam dotadas de eficiência e resolutividade,
sem desperdício nem pulverização de idéias e ações.
Na tentativa de racionalizar
as diferentes tarefas e papéis, se apresenta, como alternativa estratégica, a
noção de “rede”, para garantir a
efetividade das políticas de atenção integral à criança e ao adolescente.
O Instituto de Estudos
Especiais da PUC/SP desenvolveu pesquisa sobre o tema, e a publicou no trabalho
intitulado Gestão Municipal dos Serviços
de Atenção à Criança e ao Adolescente, coordenada pela professora Maria do Carmo
Brant de Carvalho. Ali encontramos uma riqueza de indicadores para uma efetiva
articulação de serviços existentes em bases territoriais (municípios) capazes
de dar uma nova roupagem à gestão social das políticas públicas de atenção integral às crianças e adolescentes. Seguiremos o esquema do
texto, em apertada síntese, colocando o problema do papel articulador dos
Conselhos, no seu referido lugar.
O texto refere-se sobretudo à uma
nova forma de gestão social, flexível e participativa, com maior autonomia para
o gerenciamento dos serviços, apagando a rigidez e centralismo da tradicional
forma de gestão, tão bem explicitada na conhecida e malfadada Política Nacional
do Bem Estar do Menor.
Estabelece a idéia de negociação e participação de usuários e demais interlocutores nas decisões e
ações envolvidas nas diversas políticas públicas: “Uma nova relação de partilha
entre Estado e sociedade é necessária – isso exige mudanças na cultura das
instituições públicas e seus agentes, e capacidade propositiva da sociedade
civil” ( Carvalho, 1995).
Enfim, reforça a idéia
contida no citado artigo 86, do ECA, esmiuçando as
estratégias de articulação e organização, desenvolvendo o conceito de rede
e as identificando dentro de um micro território .
4.1.
Conceito de
Rede
O texto provoca a análise do
conceito de rede tradicionalmente
desenvolvido tanto na esfera da administração pública quanto privada.
Entendia-se “rede” como “resultado de um processo de desconcentração de meios de ação de
uma organização por meio de unidades(...) É
pressuposto (para existência de rede) que haja uniformidade de procedimentos
operacionais ao longo da rede formada pela desconcentração operacional”(Carvalho, 1995).Nesse sentido
tradicional, o termo “rede” é utilizado para designar “cadeia de serviços similares, subordinados em geral a uma
organização-mãe que exercia a gestão de forma centralizada e hierarquizada”.
Dá como exemplo do velho
modelo de “rede” a chamada rede de ensino
básico: as escolas são as unidades operacionais que prestam um serviço padronizado
em todo o Brasil. A política, as normas e o comando estão centralizados nas
Secretarias de Educação dos Estados e Ministério da Educação (
o texto ainda não dava conta da Lei n° 9394/96 que trouxe profundas
alterações nas diretrizes e bases da educação).
A
desconcentração, presente no
conceito tradicional de rede, pode ser definida como técnica de organização que
consiste em transferir importantes poderes de decisão a agentes do poder central, colocados à testa de diversas
circunscrições administrativas ou de diversos serviços.
Nesses
termos, a “transferência de poderes” se dá entre agentes do mesmo “poder
central”, ou seja, simples distribuição interna, sem que tais poderes saiam do
controle da administração central, o qual continuará definindo regras e
padrões. “Não há, com a desconcentração, transferência de titularidade. Os
órgãos, que recebem os poderes, devem exercê-los não em nome próprio, com
independência, mas em nome do poder outorgante, sempre a ele subordinado
hierarquicamente” ( Cyrino, 1997).
Essa
“desconcentração do poder” não o descentraliza. Permanece central. Cada órgão que irá exercer as diferentes tarefas ditadas pelo Poder
Central estão agrupados em “redes”,
para prestar os serviços típicos da autoridade central. Essa é a velha e
tradicional noção de “rede” .
Em
oposição ao velho conceito de “rede”, onde os vínculos se traduziam em relação
hierárquica e de dependência, surge um novo conceito, onde interconectam-se
agentes, serviços, mercadorias, organizações governamentais e não-governamentais,
movimentos sociais, comunidades locais, regionais, nacionais, mundiais, todos
conectados em várias redes e não apenas a uma única rede.
Citando
Marilson Gonçalves, Carvalho afirma que:
uma
rede pode ser o resultado do processo de agregação de várias organizações afins
em torno de um interesse comum, seja na prestação de serviços, seja na produção
de bens. Neste caso, dizemos que as unidades operacionais são credenciadas e
interdependentes com relação aos processos operacionais que compartilham.
O
termo “rede” sugere a imagem de um tecido de vínculos e relações, num processo
contínuo de busca de legitimação através de fluxos ativos de informação e
interação. Apresenta, então, como exemplo dessa nova forma de gestão, os
“processos de flexibilização, desregulamentação, terceirização, franchisings
(serviços franqueados) ou mesmo os processos de descentralização operados pelo
Estado”.
4.2.
ESPÉCIES DE REDES
Partindo-se
da idéia de que em sociedade é necessário, para a sobrevivência material, espiritual,
moral, social e afetiva, que sejam criados uma série de diferentes laços,
vínculos e relações, surgem, então, “ diferentes redes sociais, que se articulam
entre si e se entrecruzam na satisfação das necessidades humanas”.
Dependendo da cada situação concreta (os modos e os estágios de produção da
riqueza; a cultura; as características do Estado provedor e gestor de políticas
públicas) surgirão diferentes redes, garantidoras dessa sobrevivência. Vejamos
algumas redes existentes em uma base local, que se tornam responsáveis pela
política de proteção integral de crianças e adolescentes.
A)
REDES
SOCIAIS ESPONTÂNEAS
Nascem
no espaço doméstico, ampliando-se, mais tarde, para outros grupos sociais, como
igreja, clubes, associações. São suas características:
¨
Têm
fundamento nas relações primárias, ou seja, face a face, interpessoais e
espontâneas;
¨
Identificam-se
por ações de reciprocidade, cooperação, solidariedade, afetividade e
interdependência;
¨
Desempenham
papel de apoio psicossocial e material, principalmente quando se trata de rede
primária de consangüinidade; de igual modo prestam a mesma solidariedade para
agregados e conterrâneos;
¨
Atuam
como processo que retarda ou mesmo impede que crianças e jovens ingressem no
sistema jurídico-institucional (nem sempre benéfico) de proteção, como abrigos.
Experiências
colhidas dessas “redes sociais espontâneas”, levaram os Estados do Pará e
Amazonas – até onde conheço – a estimular essas práticas de solidariedade e
cooperação. Programas estimulados, como “Família solidária”, “Padrinhos
solidários” e outros, fazem com que muitas famílias acolham crianças
abandonadas ou órfãs, evitando sua inserção em abrigos públicos ou privados, e
fazem-no gratuitamente.
B) REDES DE SERVIÇOS SOCIOCOMUNITÁRIOS
Diferenciam-se
das redes sociais espontâneas no que se refere ao grau de organização para
atender demandas coletivas no espaço comunitário. São elas responsáveis por:
¨
Produzir serviços assistenciais de caráter
mutualista para os segmentos pauperizados (serviços ambulatoriais, creches,
abrigos, albergues);
¨
Desenvolver mutirões para construção de moradia,
manutenção de equipamento e limpeza urbana;
¨
Organizar clube de mães, festas comunitárias,
cooperativas de compra, produção e geração de renda;
¨
Implementar serviços de desenvolvimento de cidadania
e melhoria ambiental da qualidade de vida.
C) REDES SOCIAIS MOVIMENTALISTAS
Nascem
no espaço comunitário e social e o desenvolvem. São definidas por:
¨
Defesa
de direitos, de vigilância e luta por melhores índices de qualidade de vida;
¨
Instituintes
de novas demandas de justiça ( coletivas e difusas);
¨
Organizam-se
horizontalmente, com poder de decisão partilhado democraticamente;
¨
Constituem-se
a partir da articulação de grupos sociais de natureza e funções diversas, ligados através de relações interpessoais que se criam na
esfera dos movimentos populares. Como se trata de “movimentos” e não
organizações, essa rede tem a presença de pessoas que atuam concomitantemente
em outras frentes, como pastorais, sindicatos, associações, igrejas etc..
Devemos
destacar que o Estatuto da Criança e do Adolescente se deve em grande parte, a
esse tipo de “redes sociais movimentalistas”,
aglutinando, historicamente, dezenas de diferentes grupos e lideranças,
inclusive institucionais (Ministério Público e segmentos da Magistratura).
Mesmo
depois do advento do Estatuto e da criação e implantação dos Conselhos dos
Direitos, ainda é visível a atuação dessa rede, através dos foros permanentes.
A continuidade da existência de tais foros significa “a rearticulação ou
articulação de redes sociais movimentalistas instituintes, nos moldes das que viabilizaram as primeiras
conquistas”.
D)
REDES PRIVADAS
Seu
protagonista é o mercado. Oferece serviços especializados e amplos, sendo certo
que somente restrita parcela da sociedade tem acesso a esses serviços. Se apresentam em todas as áreas: educação, saúde, esporte e
lazer, cultura, profissionalização e outras.
Às
vezes, via convênios, essa rede pode ser estendida e chegar até aos
trabalhadores, possibilitando – lhes o acesso a outras opções de atendimento.
Como
muito bem diz a pesquisadora, “O Estado fica para quem não tem chance no
mercado”. Por isso, se a família tem condições de buscar os serviços no
mercado, dispensa a intervenção estatal.
A
política de “terceirização” de serviços, como prática da administração pública,
tem encontrado, muita vez, na rede de serviços privados, a resposta eficiente
para algumas graves deficiências do serviço público, tornando acessível tais
serviços às camadas populares.
O
Estado tem deveres e obrigações para com seus cidadãos. Deve realizar os
direitos fundamentais através de políticas públicas setoriais, viabilizadas por
meios de instituições, como regra. As políticas públicas setoriais, presentes
nas redes, apresentam-se sempre com uma organização rígida, fechada, pesada,
demasiadamente burocrática, pouco eficaz para responder às necessidades
específicas. Tem-se criado o mito de que o Estado só oferece política pobre
para pessoas pobres. E num certo sentido é verdade.
Enfatizando
a rede
setorial de educação, diríamos, com a pesquisadora, que “a rede escolar
se comporta como uma rede para si e não para seus usuários, o que produz
perversamente um processo de exclusão de sua clientela”. É notório que o
ingresso, regresso, permanência e sucesso na escola, depende, em grande parte,
da oferta de outras políticas públicas, que complementam o processo
educacional. A falta dessa articulação e de oferta de outras políticas sociais,
tem trazido prejuízos inclusive ao próprio Poder Público, no que concerne ao
seu papel de provedor dos direitos fundamentais.
Alguns
Estados estão enfrentando um grande problema migratório, nos grandes centros,
resultado de grave crise econômica que assola o país. A ausência de uma
política pública agrária – reforma agrária – não assegura o homem no campo,
gerando o fluxo migratório; a ausência de plano diretor nas grandes cidades,
acompanhadas da falta de uma política habitacional, tem levado às grandes
invasões de áreas urbanas; a falta de política ambiental e de saneamento
básico, somadas aos fatores já descritos, leva a graves problemas de saúde; à
concentração de renda e ao desemprego, acompanhados da falta de políticas
sociais de apoio à família, para amenizar o impacto, leva a população à
situação de mendicância.
As
redes sociais movimentalistas se articulam (os
“sem-teto”; os “sem- terra” (agora os “sem-rios”, conforme conflito no Alto
Solimões, Estado do Amazonas, fronteira com a Colômbia, onde os povos da
floresta, entre si – caboclos e índios – brigam pelas águas dos rios, onde uns
buscam a preservação para a sobrevivência e outros apenas e logo a
sobrevivência) e reclamam providências de um Estado
não-provedor. E o Estado, infelizmente, não oferece essas políticas nem
articula essas diferentes redes.
No
campo da educação é patente essa falta de articulação, gerando problemas graves
para o planejamento. Como pode a Secretaria de Estado ou do Município, por
exemplo, planejar a oferta de vagas, ainda que baseada em censo escolar, se em
apenas algumas horas, surgem invasões
em áreas urbanas, acompanhadas, de logo, por reivindicações no sentido de
garantir vaga escolar, de preferência, próximo de sua “residência”?
Como
pode garantir a normalidade do funcionamento das escolas, quando, por exemplo,
em Manaus/AM, em menos de (06) seis meses de período letivo, os pedidos de
transferência escolar, para outras escolas – próximo, é claro, da residência do
aluno – ultrapassam a casa dos milhares? Ou cujas transferências são pedidas em
face da mudança contínua de emprego ou desemprego, buscando-se economizar o
dinheiro do transporte?
A
falta de outras políticas públicas ou sua oferta irregular ou, simplesmente, a
falta de articulação entre essas políticas setoriais públicas, remetem para
diversos e graves problemas.
Como
veremos em tópico oportuno, o cumprimento do disposto no Estatuto da Criança e no ECA (porque não dizer, na Constituição Federal) ainda não
é realidade. A prioridade absoluta ainda não ocupou a cabeça dos governantes e
governados.
Na
falta ou insuficiência dessas políticas públicas, a despeito de se utilizar
todos os instrumentos de garantia de direitos, seria inteligente buscar-se,
também e ao mesmo tempo, as alternativas presentes em diversas formas de
manifestação da sociedade civil, espalhadas, difusas, à espera de um braço
hábil para “amarrar” essa verdadeira rede de serviços.
A
despeito do potencial existente em cada região, disperso nos movimentos
espontâneos (redes sociais espontâneas); nos movimentos organizados (redes
sociais movimentalistas); nas intervenções
subsidiárias (redes sociais comunitárias); na oferta privada de serviços (redes
privadas) e de pouco e frágil serviço público, especialmente em cidades
pequenas (redes setoriais públicas), essa visão de “rede”, enquanto estratégia
de gestão, ainda não se tornou uma realidade, embora seja uma expectativa e uma
reflexão de muitas lideranças.
Carvalho,
no estudo a respeito das redes, enquanto estratégia de gestão, observou sua
dinâmica, vislumbrando duas formas de “amarração” dessas redes: a) redes com
“baixa institucionalidade; b) redes com “alta
institucionalidade”.
As
do tipo um, se comportam movendo-se espacialmente; conectam-se mais facilmente
com todo um conjunto de sujeitos, agentes, cidadãos e serviços existentes em
seu território; é o exemplo das redes de serviços socio-comunitários.
As
do tipo dois, suas “conexões tendem a cristalização e as estruturas se amarram
de modo desigual, criando uma malha rígida, burocratizada e pouco eficiente em
termos de serviços”. São exemplos as instituições
públicas oficiais e os sistemas de educação e saúde.
Diante
desse quadro, vê-se que o processo de descentralização – de gestão social com
participação das sociedades locais, é processo
de transição que além de necessitar respeitar as condições específicas de
cada localidade, deverá, sem escapatória, saber utilizar as diferentes redes
sociais, articulando-as de modo a
gerir o Estado com maior flexibilidade e eficiência, aproveitando todo o potencial
existente em uma base territorial. Não podemos pensar no Estado como o único e
legítimo provedor. Pensar assim, é “apenas cumprir a tarefa (necessária e
fundamental) de garantir o reino dos
direitos. No entanto, se pensarmos no reino da ética e do valor, a família, a
comunidade e a sociedade são também partícipes essenciais da proteção à
criança e ao adolescente.”
Os Conselhos devem desempenhar papel significativo nessa
articulação de redes locais, sobretudo e desde logo, promovendo debates, aproximação
dos diferentes segmentos e movimentos sociais, buscando um reordenamento
institucional que promova essa nova gestão social.
4.3.
INTERFACE COM OS CONSELHOS TUTELARES
Criados
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente com a finalidade de velar pelos
direitos dessa população infanto-juvenil, estabelecidos em lei e, por via de
conseqüência, desjurisdicizar a justiça da infância e
juventude, para onde irão apenas os conflitos de interesses e pretensões
resistidas, o Conselho Tutelar representa uma manifestação de responsabilidade da
comunidade, no papel que lhe reserva a lei, quando distribui deveres entre
Poder Público, Família, Sociedade e Comunidade ( artigo
4°, ECA).
Suas
atribuições estão elencadas no artigo 136, do ECA, com denotada conotação administrativa, buscando
atender e resolver os casos que lhes forem encaminhados. Nos termos da lei
criadora, o Conselho Tutelar é órgão
autônomo (artigo 131, ECA), portanto, não subordinado hierarquicamente a
nenhum outro órgão, sujeitando-se, tão somente, ao controle finalístico,
exercido na forma da lei.
Ausência
de subordinação implica sempre na inexistência de poder hierárquico. Desse modo, o Conselho Tutelar age com
independência funcional, decidindo e executando suas decisões livremente, as
quais só poderão sofrer revisão de ofício ou por decisão judicial.
O
Conselho Tutelar é exemplo de órgão descentralizado, que embora sem
personalidade jurídica, como já dissemos anteriormente, age com total
independência funcional em relação ao poder instituidor. O fato de haver
estabelecido a lei que o processo de escolha dos Conselheiros Tutelares será
feito pelo Conselho Municipal dos Direitos, tem levado alguns ao equívoco, no
que se refere a um possível vínculo de subordinação por este exercido sobre
aquele. Engano! Como se disse, não haverá subordinação.
Após
escolha dos Conselheiros Tutelares, nenhuma ingerência política pode ser
exercida sobre seus membros, seja pelo Prefeito, Secretários, ou membros do
Conselho Municipal dos Direitos. Por outro lado, não significa que nenhuma
forma de monitoramento ou controle dos atos e condutas dos Conselheiros
Tutelares não possa ou deva ser feito.
Por
exemplo, o controle finalístico, ou seja, controle da legalidade dos atos que
devem atender à finalidade pública, para que foram criados, devem ser
monitorados e corrigidos quando necessários. De igual modo, a conduta dos
conselheiros, que exercem atividade de relevância pública. Em relação a esse
controle nem o próprio Estado – em seus diferentes Poderes - está imune. O que
se deve respeitar é o mérito de suas
decisões, o qual somente poderá sofrer modificações externas vindas de decisão
judicial, assegurado o devido processo legal.
Importa,
agora, realçar os pontos de contato que ligam o Conselho Tutelar ao Conselho
dos Direitos, amarrando-os na mesma rede de serviços municipais.
Vejamos
algumas situações concretas:
1) O Conselho dos Direitos delibera
políticas públicas; essas políticas vão se efetivar em forma de retaguardas
para o Conselho Tutelar.
¨
Em
face dessa tarefa do Conselho dos Direitos, numa caminhada de “mão dupla”,
caberá ao Conselho Tutelar encaminhar sugestões ao Conselho dos Direitos, a
respeito da inexistência ou insuficiência de serviços básicos, necessários para
garantir o atendimento integral de crianças e adolescentes;
2) O Conselho dos Direitos inscreve
programas e registra entidades que atuam na área atendimento de crianças e
jovens.
¨
O
Conselho Tutelar ao fiscalizar entidades deve encaminhar ao Conselho dos
Direitos relatórios que apontem irregularidades.
3) O Conselho dos Direitos formula e
delibera políticas públicas, com base na realidade
de sua cidade.
¨
O
Conselho Tutelar tem condições de fornecer importantes dados relacionados à
população infantil e juvenil e dos serviços deficientes. De igual modo, sendo o
Conselho Tutelar chamado, por lei, para participar da vida do município,
assessorando o Poder Executivo na elaboração de propostas orçamentárias para
planos e programas de atendimento dos direitos das crianças e adolescentes
(artigo 136, IX, ECA), necessária e estratégica sua articulação com o Conselho
Municipal dos Direitos, uma vez que a aprovação dos planos e programas, que
irão se traduzir monetariamente no orçamento público,
dependem de aprovação do Conselho dos Direitos.
4.4.
INTERFACE COM O MINISTÉRIO PÚBLICO
A
Constituição Federal definiu o Ministério Público como Instituição permanente,
essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis (artigo 127, CF).
Vimos
em seções anteriores que o Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente
deriva diretamente da Constituição Federal, quando esta afirmou que o Poder
emana do povo que o exerce inclusive diretamente nos casos previstos na
mesma Constituição, sendo certo que um desses casos se refere à formulação e ao
controle de políticas públicas relacionadas ao atendimento de crianças e jovens
(artigo 204,I e II, c/c artigo 227 § 7°).
Não
existe democracia sem participação. Se o Conselho dos
Direitos da Criança e do Adolescente é forma de participação na gestão do poder político, com aval constitucional,
é certo, então, que caberá ao Ministério Público, como guardião da Constituição
e das leis e, sobretudo, como encarregado pela defesa do regime democrático, velar pelo regular funcionamento dos referidos
Conselheiros.
Ao
garantir o funcionamento regular e eficiente dos Conselhos estará o Ministério
Público garantindo o sistema democrático em uma de suas manifestações.
Garantindo-se participação e democracia, por conseqüência, constrói-se o
verdadeiro alicerce para a cidadania, que
se apresenta no texto constitucional como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.
Participação
é sem dúvida elemento constitutivo da democracia e da cidadania. Bobbio já dissera:
Quando
no século passado se manifestou o contraste entre liberais e democratas, a
corrente democrática levou a melhor obtendo gradual mas inexoravelmente a
eliminação das discriminações políticas à concessão do sufrágio universal.
Hoje, a reação democrática diante dos neoliberais consiste em exigir a extensão
de participar nas tomadas de decisões coletivas para lugares diversos daqueles
em que se tomam as decisões políticas; consiste em procurar conquistar novos
espaços para a participação popular e, portanto, em provar a passagem (...) da
fase da democracia de equilíbrio para a fase da democracia de participação.
Quando
se pensava que o voto, enquanto conquista democrática, era a maior forma de
defesa e expressão da liberdade do povo, Rousseau afirmava:
O povo
inglês pensa ser livre mas está completamente iludido; apenas o é durante a
eleição dos membros do Parlamento; tão logo estejam estes eleitos, é de novo
escravo, não é nada. Pelo uso que faz da liberdade, nos curtos momentos em que
lhe é dado desfrutá-la, bem merece perdê-la.
Vivemos,
hoje, a maior conquista dos últimos tempos: o direito de participação. Não se
trata de abordar o tema apenas como instituto de disciplina sociológica e
política, mas sim de verdadeiro instituto de DIREITO, inserido como DIREITO
POLÍTICO.
No
Direito Comparado é visível desde tempos atrás esse estreitamento entre poder
político e participação popular. É o exemplo da Constituição portuguesa de 1976
(artigo 48, n° 1 e 112); a Carta Espanhola de 1978 (artigo 23, n° 1) ; e agora
a Constituição Federal do Brasil.
Sem
participação, sobretudo na produção, no usufruto e na gestão política, não
existe cidadania. Nesse caminho se insere o Conselho dos Direitos e o
Ministério Público, como guardião e Promotor das medidas assecuratórias.
Diríamos
sem medo que os Conselhos dos Direitos, como canal de participação popular em
atos de governo, são cláusulas pétreas implícitas, na medida em que à luz do
artigo 204, inciso I, da Constituição Federal, realizam em concreto o ideal
constitucional do princípio federativo e democrático estatuído no artigo
primeiro da Carta Maior.
Daí
a importância do acompanhamento do Ministério Público em relação aos Conselhos
dos Direitos. A inexistência de Conselhos Municipais coloca o Município em
situação de inconstitucionalidade por omissão. Cabível ação competente
manuseada pelo Ministério Público, perante o Judiciário local.
As
políticas públicas formuladas para atendimento de crianças e jovens, sem a
deliberação pelos Conselhos, por igual, torna tais políticas
inconstitucionais, portanto, sujeitas, conforme o caso, às providências do
Ministério Público.
A
inexistência de políticas públicas, a despeito de existirem Conselhos
Municipais, é também situação de inconstitucionalidade por omissão, na medida em
que a Constituição Federal determina que sejam criados órgãos descentralizados,
com participação popular, para formular políticas públicas de
atendimento aos direitos das crianças e adolescentes.
Conselhos
do Direitos inoperantes, omissos, impedem que crianças
e adolescentes tenham acesso à serviços básicos, necessários para o exercício
de sua cidadania plena. Essa inoperância e/ou omissão praticada em co-autoria
com o Poder Público deve ser corrigida por ação do Ministério Público, toda vez
que a própria sociedade esgotar seus meios de controle
ou também deixar de agir na fiscalização dessa tarefa constitucional, pois cabe
ao Ministério Público, por dever institucional e constitucional zelar pelo
efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos
direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua
garantia.
Em
síntese, deve agir o Ministério Público se:
¨
Não
existir Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente, visando compelir o
Executivo a criar, instalar e fazer funcionar tais canais de participação
política;
¨
As
políticas públicas relacionadas com os direitos da criança e adolescente não
forem deliberadas pelo Conselho respectivo; hipóteses em que o Chefe do
Executivo não respeita o Conselho e decide por conta e risco;
¨
Os
Conselhos forem inoperantes ou omissos, deixando de exercer seu
papel constitucional e legal, fazendo com que não existam políticas e programas
públicos ou privados, pois estarão impedindo o acesso de crianças e jovens
à cidadania.
Para
fazer valer esses direitos pode o Ministério Público se utilizar
de toda e qualquer espécie de ação pertinente (artigo 212, ECA), v.g, ação mandamental, ação civil
pública, ação direta de inconstitucionalidade, etc.
4.4.1. A natureza jurídica das decisões
dos Conselhos
Dissemos,
em outra oportunidade, que as decisões contidas em resoluções dos Conselhos dos
Direitos se tornam, enquanto mérito administrativo, manifestação estatal,
desaparecendo sua “paternidade” e impondo sua concretização pelo executivo.
Reafirmamos esse posicionamento. São verdadeiras manifestações estatais,
“mérito”, “opções políticas criativas” adotadas por um órgão público, visando o
interesse público.
A
Constituição Federal reservou certas matérias próprias do Executivo, para serem
formuladas diferentemente do lugar comum. Assim, matérias relacionadas ao atendimentos de crianças e jovens, em vez de serem
tratadas por seus órgãos da administração direta, com exclusividade, por força
de norma de extensão contida no artigo 227, § 7°, da CF, devem, necessariamente,
passar por uma instância diferenciada de poder, a saber, os Conselhos. Não
ocorrendo dessa forma, haverá inconstitucionalidade.
Dessa
forma, ocorre uma transferência do locus onde se
dará a escolha ou opção política - a discricionariedade administrativa – que
deixa de ser atividade exclusiva do Chefe do Executivo, passando para uma
instância colegiada, fazendo com que o ato administrativo se torne um ato
complexo, sujeito a múltiplas vontades, as quais serão, depois, sintetizadas em
um único ato (resolução ) exteriorizado como vontade
da Administração ou vontade estatal.
Portanto,
a decisão dos Conselhos, enquanto opção política de condutas
que visam uma finalidade pública, estão dentro da mesma vertente ético-política e ético-jurídica das escolhas anteriormente
feitas exclusivamente pelos Chefes do Executivo, sob o pálio da legitimidade,
esta dada diretamente pela Constituição.
A
Lei n° 8.142/90, dispondo sobre a participação da comunidade na gestão do
Sistema Único de Saúde, deixou expresso que as decisões do Conselho de Saúde “serão
homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera de
governo” (§ 2°, do artigo 1°).
Como
se vê, ao tratar dos Conselhos de Saúde, que têm a mesma
origem e fonte formal que os Conselhos dos Direitos da Criança e do
Adolescente, o legislador obrigou o Chefe do Executivo a proceder à homologação
das decisões do referido Conselho.
Em
relação aos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente seria
desnecessária essa previsão, uma vez que a Constituição Federal impôs, através
do §7°, do artigo 227, a submissão ao Conselho, para deliberação de seus
integrantes, de toda política pública referente ao direito de crianças e
jovens.
Portanto,
salvo as políticas básicas de caráter universal, as demais políticas públicas
dessa área, serão necessariamente deliberadas nessa instância de poder chamada
Conselho dos Direitos, que, como visto, constitui órgão do poder público,
descentralizado, com participação popular paritária aos representantes do
Governo, e logo, suas decisões, agora incindíveis, serão decisões do próprio
Poder Público, não se podendo mais falar a respeito de discricionariedade do
Chefe do Executivo em torná-la exeqüível ou não, como veremos mais adiante.
4.4.2.
A participação do Poder Judiciário na garantia dos direitos fundamentais
A
atividade jurisdicional, enquanto função do Estado, é tarefa a ser exercida
pelo Poder Judiciário, no sentido de resolver conflitos e pretensões
resistidas, sendo essa atividade exercida em regime de monopólio. Daí o
princípio do acesso à jurisdição insculpido na Constituição Federal: a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito (artigo
5°, XXXV, CF).
O
papel do Poder Judiciário no equilíbrio entre os poderes, é sem sombra de
dúvida de vital importância; sem um judiciário forte, livre,
comprometido com a Constituição, não haverá democracia nem esperanças de
cidadania e dignidade.
O
juiz, por isso, tem que ter consciência de que é um instrumento do poder e
saber que papel está cumprindo dentro de toda engrenagem: se
está atrelado à clássica ideologia da neutralidade (asséptica), será um
funcional instrumento do Poder Político; se deseja, não obstante, superar tal
ideologia, deve ter consciência critica de sua tarefa, constitucionalizando-se
e transformando-se, assim, em instrumento de realização do valor justiça (
GOMES, 1997).
Nos
ensina o Doutor em direito, magistrado Luiz Flávio Gomes:
O
exercício dos direitos fundamentais, do qual deriva a verdadeira cidadania e
uma forte sociedade civil, tem como pressuposto básico o império do ordenamento
jurídico. Em um Estado Constitucional e Democrático de Direito, como o nosso (CF, art.1°) todos devem estar submetidos a este
ordenamento, principalmente o Estado, porém só quem pode assegurá-lo em sua
plenitude é o Poder Judiciário, por meio da tutela judicial efetiva.
E
conclui:
Se para
existência de um regime democrático uma das exigências mínimas é o controle dos
poderes e se para a construção das liberdades o requisito primeiro é o império
do direito, parece muito evidente, como estamos assinalando, a necessidade de
um Poder que se encarregue de tais tarefas. Esse Poder é exatamente o
judiciário que no entanto, para garantir a liberdade alheia, deve antes
conquistar plenamente a própria, tornando-se totalmente independente e
autônomo.
Questão
que se coloca como desafio para a quebra do ortodoxismo
de muitos juristas e que merece atenção de nossos juízes, pois a eles caberá a
última palavra, diz respeito ao problema da discricionariedade e do mérito
administrativo, colocados fartamente na jurisprudência como óbice ao
judiciário, o que tem permitido verdadeiros desvios de finalidade e de poder,
por parte de muitos governos.
Muitos
são os juristas que se fecharam até hoje numa redoma e junto a ela colocaram o
que se denomina discricionariedade
administrativa, afirmando sem qualquer outra reflexão ou fundamento, que
essa matéria é sempre imune ao judiciário ou a qualquer outra forma de
ingerência, por que traduz a legitimidade
do governante. Com o respeito acadêmico necessário, mas com a ousadia dos
que defendem a dinâmica do direito, discordo frontalmente dessa posição.
A DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA E SEU
CONTROLE.
Neto
já definira discricionariedade como sendo “qualidade de competência cometida
por lei à administração pública para definir, abstrata ou concretamente, o
resíduo de legitimidade necessário para integrar a definição de elementos
essenciais à prática de atos de execução, necessário para atender a um
interesse público específico” (1991).
No
entendimento do referido professor, o Estado de Direito pressupõe duas ordens
de referências: a ético-política e a ético-jurídica.
A primeira corresponde ao conceito de legitimidade (captação política imediata
dos interesses da sociedade) e a segunda, entendida como a cristalização
jurídica desses interesses (Lei ) e que se opera de
forma mediata.
Assim,
a discricionariedade implica em:
Vista
a discricionariedade por esses aspectos, correta a definição oferecida por
Neto: “ Técnica jurídica utilizada pela administração
para uma ação política que precise um conteúdo de oportunidade e de
conveniência, capaz de produzir algum resultado que satisfaça o interesse
público”.
Desde
os bancos escolares firmamos a certeza de que os atos administrativos que
refletem as escolhas políticas para atendimento de uma finalidade pública,
exatamente por terem uma finalidade pública, se tornam passíveis de controle: o
controle finalístico, de legalidade, ou seja, se o ato praticado (ou não
praticado quando deveria ser praticado) atende à essa
finalidade pública.
Vários
critérios, doutrinariamente, foram propostos para realizar desse controle
finalístico. Impressiona a mim, o critério desenvolvido por Diogo Moreira Neto.
Estabelece o administrativista regras simples mas eficazes. Prende-se,
sobretudo, à análise do motivo e objeto do ato administrativo.
O
motivo, que se constitui em um dos pressupostos de fato e de direito do ato
administrativo e o objeto que se constitui no resultado jurídico pretendido,
ambos elementos da discricionariedade, vão encontrar limites nos chamados princípios
da realidade e da razoabilidade.
Pelo
princípio da realidade, é possível o controle do motivo do ato quanto à sua existência
e suficiência, e o controle do objeto do ato quanto à sua possibilidade. Assim,
existência, suficiência e possibilidade
dos motivos e dos objetos são limites da discricionariedade; suas ausências
significarão vício de ilegalidade : a inoportunidade e inconveniência para suas
práticas. E se praticados dessa forma, desviam-se da finalidade pública.
Pelo
princípio da razoabilidade é possível o controle do motivo e do objeto, respectivamente, quanto à adequabilidade, compatibilidade, proporcionalidade,
conformidade e eficiência do ato administrativo ou da escolha política. E
do mesmo modo, não sendo observado esse princípio, ou seja, sendo a escolha inadequada,
incompatível, desproporcional,
desconforme, e ineficiente, haverá vício de ilegalidade, porque afastada a
finalidade pública do ato, seja ele comissivo ou omissivo.
Aparentemente,
poder-se-ia afirmar que estamos diante de uma colisão de direitos fundamentais.
O primeiro, o direito do Chefe do Executivo Municipal poder fazer suas escolhas
quanto à conveniência e oportunidade, livremente, por conta do poder
constitucional de autogoverno . Por outro, o direito da população participar
dessa escolha, na forma apontada pela constituição, como direito constitucional
de participação política, na qualidade de titular do poder, que dele emana, na
forma do artigo 1° e seu Parágrafo único, da Constituição Federal, c/c os
artigos 204, I e II e 227, “caput” e § 7°, todos da mesma Constituição.
Ensina
Canotilho, que havendo colisão de direitos
fundamentais, os quais ocorrem quando “o exercício de um direito fundamental
por parte de seu titular colide com o exercício do direito fundamental por
parte de outro titular”(1993), deve ser solucionado
através da “ponderação e/ou harmonização concreta”, estabelecendo-se uma “relação
de prevalência” entre os direitos.
Ainda
que na hipótese não haja colisão de direitos, pois restou claro que em matéria
de criança e adolescente, transferiu-se o “locus” do
poder de escolha para os Conselhos dos Direitos, apenas para argumentar, diríamos que na harmonização concreta, caso
a caso, sem qualquer empecilho haveria a prevalência do direito de
participação, conteúdo essencial do Estado Democrático e da cidadania, sobre a discricionariedade, esta
mero resíduo da legitimidade, simples técnica administrativa de escolha
de oportunidade e conveniência.
Do
exposto, fazemos algumas conclusões:
¨
A
discricionariedade é uma técnica de escolha política da oportunidade e da
conveniência para a prática de um ato; se for oportuno e conveniente o ato deve ser praticado, sob pena de desvio
de finalidade;
¨
O mérito administrativo é o resultado da
escolha do motivo e do objeto (oportunidade e conveniência); se o resultado
respeitou os limites impostos ao motivo e objeto, o ato será perfeito e válido,
não podendo ser questionado pelo judiciário;
¨
A
oportunidade e conveniência, enquanto dimensões do mérito encontram limites nos
princípios da realidade e razoabilidade, onde se constata se o motivo e objeto
têm existência, suficiência e
possibilidade para serem
efetivamente praticados; se são adequados, compatíveis, conformes, proporcionais e eficientes para
atenderem à finalidade pública;
¨
O
desrespeito a esses limites caracteriza a ilegalidade – desvio de finalidade do
ato, comissivo ou omissivo – ensejando a via judicial;
¨
O
controle pelo judiciário não diz respeito ao mérito, ou seja, ao resultado da
escolha, mas aos seus elementos do mérito, que o antecedem lógica e
cronologicamente (motivo e objeto), os quais não podem se afastar desses
limites.
¨
A
Constituição Federal de 1988, em matéria relacionada ao direito da criança e do
adolescente, transferiu o locus do poder discricionário, antes concentrado
exclusivamente nas mãos do Chefe do Poder Executivo, agora repartido com outras
vontades, como ato complexo, cuja opção política criativa, com legitimidade
constitucional, está ao encargo dos Conselhos dos Direitos.
SOBRE O MÉRITO ADMINISTRATIVO
Foi
também a Constituição Federal quem criou um princípio que deve ser observado
pelo legislador, pelo julgador e pelo administrador público: Prioridade
Absoluta .
Segue
assim, que a margem de discricionariedade do Governo – Chefe do Executivo –
fica reduzida diante de dois imperativos constitucionais: a prioridade absoluta
e a necessidade de formulação e deliberação de certas matérias por outra
instância mais democrática, onde conjugarão forças e vontades da sociedade
civil com o Governo, resultando em manifestação de caráter administrativo
público estatal.
Repetindo
o que dissemos anteriormente, trata-se de atos complexos, que não terão
validade senão se observadas as vontades distintas, postas em debate e
deliberadas pelo órgão competente. Portanto, além da discricionariedade sofrer
a restrição constitucional quanto ao seu apreciador, pois compele o Chefe do
Executivo a repartir essa tarefa, antes exclusivamente sua, com o Conselho, ou
melhor, transfere o locus do poder de escolha para esses
Conselhos, o mérito administrativo, antes intangível, é agora, também,
resultado de manifestação complexa, e que, por conta do princípio
constitucional da prioridade absoluta, deve ser levado em conta quando das
escolhas ou opções políticas, bem como obrigam o Administrador Público,
conforme o caso, a torná-la realizável.
Tenho
claro que o juízo de discricionariedade (análise dos motivos, ou seja,
situações de fato e de direito que deverão dizer que conduta deve tomar o
administrador, e do objeto, que será o resultado jurídico pretendido), é uma
operação que acontece lógica e cronologicamente antes do mérito, visto que este
exsurge do juízo discricionário,
consistindo, ele sim, na opção ou escolha política do ato a ser adotado ou não
adotado diante daquela situação analisada.
Nesse
raciocínio, tratando-se de matéria relacionada à criança e ao adolescente
sempre que a apreciação dos motivos (juízo de discricionariedade) concluir pela
necessidade do ato, deverá este obrigatoriamente ser realizado porque o
conceito de necessidade do ato, nessas condições, traz implícito o conceito de prioridade
absoluta; portanto, o que for necessário será prioritário.
Deste
modo, é verdade que a Constituição Federal agregou ao conceito de mérito
administrativo, o princípio da prioridade absoluta, razão pela qual se o
administrador público – incluindo aqui o próprio Conselho dos Direitos – deixar
de observar este princípio constitucional, sujeitará o ato à apreciação pelo
Poder Judiciário, o qual, embora não aprecie o mérito – a escolha da medida e a
conduta de agir ou não agir – estará julgando a possível quebra do ordenamento
jurídico, a saber, a desobediência ao princípio da prioridade absoluta, agora,
também uma das “dimensões dos elementos do mérito”, a qual não sendo
devidamente observada, refletirá no mérito maculando-o com vício de
inconstitucionalidade, e, portanto, sujeito à apreciação pelo Poder Judiciário.
A JUDICIALIZAÇÃO DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS
A
doutrina mais comprometida com o desiderato constitucional de assegurar a todo cidadão
a dignidade, o fim das desigualdades sociais, a solidariedade, como valores
superiores e previstos na Carta maior, tende a aceitar a tese de que todos os
direitos sociais-fundamentais são judicializáveis,
sobretudo porque se constituem em direitos originários a prestações, que devem
ser providas pelo Estado e, portanto, exigíveis por qualquer cidadão.
Por conseqüência, todos os direitos e
interesses difusos e coletivos (não pode existir maior difusidade
do que a que se apresenta em direitos sociais-fundamentais ), como educação,
saúde, democracia, cidadania, enfim, políticas públicas, são direitos ou
interesses que possuem essa subjetivação que lhe assegura ser disputado no
Poder Judiciário.
Imaginemos a hipótese de omissão
deliberativa dos Conselhos ou havendo deliberação, o Chefe do Executivo resolva
descumprir a decisão. Em tais casos, seria possível judicializar
a questão, ou seja, promover ação judicial para garantir o cumprimento do
comando constitucional? Sem nenhuma dúvida respondemos afirmativamente.
Se as políticas públicas são necessárias
para realização dos direitos fundamentais, sua inexistência, seja por falta de
formulação, seja por falta de execução, leva a impedir o acesso a tais
direitos. Logo, milita sempre a presunção da subjetivação dos diretos
fundamentais, que se tornam exigíveis pelo simples fato de que são
fundamentais.
Comparato (1994) afirmara que :
o
Estado social não se legitima simplesmente pela produção do direito, mas antes
de tudo pela realização de políticas (policies),
isto é, programas de ação. O government by policies em substituição ao government by law supõe o exercício combinado de várias tarefas, que o Estado liberal
desconhece por completo.
Canotilho
tratou do tema da seguinte forma:
A defesa dos direitos e o acesso aos
tribunais não podem divorciar-se das várias dimensões reconhecidas pela
Constituição ao catálogo dos direitos fundamentais. O sentido global resultante
da combinação das dimensões objetivas e subjetivas dos direitos fundamentais é
o de que o cidadão, em princípio, tem assegurada
posição jurídica subjetiva, cuja violação lhe permite exigir a proteção
jurídica. Isto pressupões que, ao lado da criação de
processos legais aptos para garantir essa defesa, se abandonou a clássica
ligação de judiciabilidade ao direito subjetivo e se
passe a incluir no espaço subjetivo do cidadão todo o círculo de situações
juridicamente protegidas.
Os direitos fundamentais ou sociais – que
se traduzem através de políticas públicas - , estão contidos, sem dúvida, em
todos os princípios constitucionais que refletem a concepção do Estado Brasileiro.
A Constituição Federal estabeleceu já no Artigo Primeiro, princípios que
expressam a denominada Constituição Material ou Ideológica.
O Ministro Celso de Mello, em julgamento
de Medida Cautelar, fez judicioso pronunciamento:
Uma Constituição escrita não configura mera
peça jurídica nem, é simples escritura de normatividade
nem pode caracterizar um irrelevante acidente histórico na vida dos povos e das
nações. Todos os atos estatais que repugnem a Constituição expõem-se à censura
jurídica(...).
A Constituição não pode submeter - se à
vontade dos Poderes constituídos nem ao império dos fatos e das circunstâncias.
A supremacia de que ela se reveste - enquanto for respeitada - constituirá a
garantia mais efetiva de que os direitos e as liberdades não serão jamais
ofendidos.
(STF,ADIMC 293/DF, MINISTRO CELSO DE MELLO.
TRIBUNAL PLENO.DJ 1 de 16.04.93)
Essa concepção de Estado – Estado
Democrático e Participativo - contida já em seu Primeiro artigo da Constituição
Federal, que constitui a chamada "constituição ideológica" ou
material, não pode ser transgredida sob pena de inconstitucionalidade. Toda
Lei, toda Norma, todo Ato de Poder, deve ir ao encontro da realização dessas
mais altas aspirações constitucionais, que em síntese, é construir um Estado
que garanta a "dignidade da pessoa".
Na análise de
tipologias de princípios e regras constitucionais Canotilho
diz que:
Designam-se por princípios politicamente conformadores os princípios constitucionais que explicitam
as valorações políticas fundamentais do legislador constituinte. Nestes
princípios se condensam as opções políticas nucleares e se reflecte
a ideologia inspiradora da constituição.
De igual modo,
os princípios constitucionais impositivos "designam os preceitos
definidores dos fins do Estado apontando para as "tarefas
do Estado", são princípios que vinculam legisladores, sobretudo, na
feitura dos atos próprios.
Está
expresso como valoração política fundamental do legislador constituinte
brasileiro, como “opção política nuclear”, refletindo a ideologia que inspirou
o constituinte – portanto um princípio político conformador
– a participação direta do povo na gestão política do poder, ou simplesmente, democracia
participativa, com participação direta do povo, na forma do artigo 204, II e
227, § 7°, c/c o artigo 1° e seu Parágrafo único, todos da Constituição
Federal. Está expresso, portanto, que o Estado deve formular (e tem o dever de
formular) políticas públicas em favor de crianças e jovens, dentro dos chamados
Conselhos dos Direitos.
Também
estão expressas, como opção política nuclear, desde seu preâmbulo, a formação
de um Estado que assegure a redução das desigualdades sociais e regionais; a
erradicação da pobreza e marginalização; uma sociedade livre,
justa e solidária; o bem de todos, sem preconceitos; a prevalência dos
direitos humanos; a cidadania; a dignidade da pessoa humana e, o exercício dos
direitos sociais e individuais, para não citar outros valores indicados no
texto constitucional.
Todo
esse ideário constitucional só poderá ser realidade se o Estado, por seus
governos, implantar políticas públicas que traduzam, como síntese de todos
esses valores, os direitos fundamentais da pessoa.
O
princípio da prioridade absoluta contido no artigo 227
da Constituição Federal – que se diga, único local e única vez que a
Constituição se refere a tal princípio, evidenciando que se trata efetivamente
de prioridade das prioridades – é
princípio constitucional impositivo, na expressão de Canotilho,
pois somente através da atenção prioritária de nossas crianças e jovens, frente
a qualquer outro interesse de Governo, é que construiremos esse Estado
Democrático de Direito desenhado na Constituição Federal.
A
finalidade pública dos atos administrativos (a discricionariedade, a escolha, a
opção criativa do Executivo não pode se afastar da finalidade pública) é um dever inerente ao Estado, gerando em favor do cidadão um
“direito originário às prestações” (CANOTILHO),
ou seja, impõem ao Estado o dever de praticar atos viabilizadores
de tais direitos, bem como assegura o direito de se “cobrar em juízo” essas
prestações.
CANOTILHO
afirma que ocorre a existência de direitos originários às prestações quando (1)
a partir da garantia constitucional de certos direitos (2) se reconhece,
simultaneamente, o dever do Estado na criação dos pressupostos materiais
indispensáveis ao exercício efetivo desses direitos; (3) e a faculdade de o
cidadão exigir, de forma imediata, as prestações constitutivas desse direito.
Arremata
o constitucionalista português:
Por
outro lado, não se trata de reconhecer apenas o direito a um standart mínimo
de vida ou de afirmar tão somente uma dimensão subjetiva quanto a direitos a
prestações de natureza derivativa (derivative teilhaberechte), isto é, os direitos sociais que radicam em
garantias já existentes. Trata-se de sublinhar que o status social do cidadão
pressupõe, de forma inequívoca, o direito a prestações sociais originárias como
saúde, habitação, ensino – originare leistungsanspruchen - ... a efetivação dos direitos
sociais, culturais e econômicos não se reduz a um simples apelo ao legislador. Existe uma verdadeira imposição constitucional, legitimadora,
entre outras coisas, de transformações econômicas e sociais, na medida
em que estas forem necessárias para efetivação desses direitos.
Disso
tudo deriva a afirmativa de que nenhum ato comisso ou omissivo do Estado –
Executivo, no que se refere, sobretudo, ao atendimento dos direitos de crianças
e adolescentes, pode deixar de ser apreciado pelo Poder Judiciário, se tal ato
violar ou ameaçar a violação de direitos.
Ora,
a ausência de políticas públicas ou sua insuficiência – por falta de formulação
ou de execução daquelas devidamente deliberadas pelo Conselho respectivo – é
violação efetiva de direitos fundamentais, passíveis de serem conhecidos pelo
Poder Judiciário.
Contudo,
como bem advertiu GOMES, é preciso que o juiz tenha consciência de que precisa
ser um juiz constitucionalista, que busque antes de tudo
o ideal de justiça, fazendo valer a carta Maior, sob pena de se tornar um mero
e funcional agente do Poder Político dominante.
A
atuação do judiciário em tais questões, longe de se tornar interferência entre
Poderes, significará controle omissivo de um outro Poder, que devia agir e não
agiu, portanto, sendo necessário ser devidamente corrigido.
Maior
exemplo do que os Estados Unidos, como pioneiros na adoção do regime de
separação entre os poderes, nem por isso, também pioneiramente, deixou de
instituir o controle da constiticionalidade das leis
emanadas do Congresso, a serem feitas pelo Suprema
Corte.
Ressalte-se,
ainda que o controle de atos comissivos ou omissivos do Poder Executivo, em
relação à oferta de políticas de atenção à criança e ao adolescente, feitos
pelo Poder Judiciário, significam, como já explicado, controle da legalidade, na medida em que
se a ausência ou insuficiência de políticas públicas impede o acesso à
cidadania e dignidade (princípios constitucionais impositivos) estaremos diante
de um flagrante desvio de poder, pois o papel do Estado é voltado sempre para finalidade
pública, que, no caso, não estaria sendo atendida.
De
tudo que se expôs fica evidente que os Conselhos dos Direitos devem se
articular com o Ministério Público, visando, dentre tantas outras coisas,
mantê-lo informado a respeito dos desvios de finalidades praticados pelo
Governo; assim como caberá ao Ministério Público acompanhar as ações dos ditos
Conselhos, a fim de que estes cumpram o seu papel social determinado pela
Constituição, sob pena de serem objeto de ações judiciais.
Por
outro lado, deve o Poder Judiciário se abrir mais para uma concepção
constitucionalista do direito, buscando realizar os ideais de justiça
estabelecidos na Constituição, livrando-se de dogmas conservadores que só
interessam à manutenção da injustiça social; precisam firmar a convicção de que
não existe neutralidade e que, pela sentença justa, se modifica o mundo fático
além do jurídico.
5. OS CONSELHOS DOS DIREITOS E SUA
ARTICULAÇÃO COM OS CONSELHOS DE EDUCAÇÃO
5.1 A ESCOLA, UM ESPAÇO NECESSÁRIO.
A
educação é um bem essencial à vida e passa por todas as formas de relação do
ser humano, com seu cotidiano.
A
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no primeiro de seus artigos,
expressou esse processo de interação de todos os mecanismos de formação do ser
humano: a família, a convivência social, o trabalho, nas instituições de ensino
e pesquisa, nos movimentos sociais, organizações da sociedade civil e
manifestações culturais.
O
homem se educa vivendo e se relacionando. Vive se educando e se educa para
viver melhor.Por isso, mesmo a educação escolar, que se
desenvolve por meio do ensino em instituições próprias, não deve perder
o vínculo com o mundo do trabalho e das práticas sociais.
A
educação como função espontânea da sociedade, “onde a educação não estava
confiada a ninguém em especial, e sim à vigilância difusa do ambiente”
(Ponce,1981), onde a criança pela
convivência diária que mantinha com os adultos era introduzida nas crenças e
nas práticas de tudo que seu grupo social tinha de melhor, desapareceu.
Em
comunidades primitivas onde ainda não se experimentava a divisão de classes
sociais, “o ensino era para a vida e por meio da vida; para aprender a manejar
o arco, a criança caçava; para aprender a guiar um barco, navegava”. Claro,
porque usava o arco, aprendia a manuseá-lo; porque navegava, aprendia a dirigir
um barco.
O
nosso senso comum nos leva muita vez a associar educação à escola e escola à educação.
Daí a pergunta clássica: se em tempos remotos não existia escola, como se
explica o comportamento social uniforme, ou na expressão de Ponce,
como a anarquia da infância se
transformava na disciplina da maturidade?
O
mesmo autor nos responde: “(...)do mesmo modo , que é
óbvio, a criança não precisava recorrer a qualquer instituição para aprender a
falar, também devemos reconhecer como não menos evidente que, numa sociedade em
que a totalidade dos bens está à disposição de todos, a silenciosa imitação das
gerações anteriores pode ser suficiente para ir levando a uma meta comum a inevitável
desigualdade dos temperamentos individuais”.
Naquele
tipo de sociedade, onde a consciência de cada um era, na verdade, “um fragmento
da consciência coletiva”, onde a noção de indivíduo ainda não estava formada,
tomada que sim pela noção do coletivo, surgia desde muito cedo um verdadeiro ideal pedagógico, qual seja, “adquirir,
a ponto de torná-lo imperativo como uma tendência orgânica, o sentimento
profundo de que não havia nada, mas absolutamente nada, superior aos interesses
e às necessidades da tribo”.
Numa
sociedade em que não há a apropriação de bens de consumo, onde as práticas
sociais inculcam nos jovens a importância do coletivo, não haverá, também,
apropriação do conhecimento, pois este é visivelmente socializado na
convivência natural dos povos. Logo, não haveria necessidade de professores,
pois todos o eram, assim como qualquer um poderia ser juiz e chefe.
Contudo,
a história mudou. Transformando-se essa sociedade primitiva, sem classes, em
sociedade com relações de dominação e submissão, exploradores e explorados,
surgindo a desigualdade social, imediatamente a
educação como função espontânea desaparece, dando lugar a uma desigualdade das educações.
As
famílias dirigentes que organizavam a produção social e retinham em suas mãos a
distribuição e defesa, organizaram e distribuíram, também, de acordo com os
seus interesses, não apenas os produtos, mas também os rituais, as crenças e as
técnicas que os membros da tribo deviam receber.
Surge
a apropriação do conhecimento e a consciência de que ele pode ser fonte de
dominação. Não é nosso objetivo estudar a história da educação. Mas sem dúvida,
é importante lembrar que em outros tempos, por força do modo de produção e
organização social, a escola foi desnecessária. Mas e nos dias atuais?
Questiona-se
muito a respeito da “qualidade de ensino”; imputa-se à própria escola parcela
de responsabilidade pela expulsão do aluno e seu verdadeiro “pavor” da escola;
afirma-se que a escola não prepara para a vida; reconheceu-se a escola, em dado
momento, apenas como um grande restaurante; enfim, critica-se a escola, mas não
se abre mão dela, como meio para oferecer a educação formal. Eliminar a escola
ou construir uma nova escola ?
Há
um desafio para todos nós, pais educadores, alunos, trabalhadores do ensino:
construir esse “novo espaço” necessário para o
desenvolvimento integral das crianças e jovens.
Se
não se pode mais confiar a educação à difusidade do meio ambiente e social, a escola se apresenta
necessária, ainda que se não possa desprezar outros espaços onde certamente a
educação se manifesta: a família, a convivência social, o trabalho, os
movimentos sociais, organizações da sociedade civil, a rua, e manifestações
culturais de qualquer gênero.
5.2 EDUCAÇÃO COMO DIREITO DE TODOS.
A
Constituição Federal, o Estatuto da Criança e a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação nacional, asseguram o ensino fundamental como direito subjetivo, garantindo o direito de qualquer cidadão exigir
essa prestação estatal. Tem direito de acesso, mas também de permanência,
regresso e sucesso na vida escolar. Para tanto, será necessária uma grande
articulação de diversas políticas públicas, como vimos em capítulo anterior.
Do
mesmo modo, vejo a necessidade de articulação com outros agentes e atores
sociais. Garantir que a criança ou o adolescente possa ter acesso à escola
implicará não apenas em assegurar “vaga” na rede de ensino público ou privado.
Sabendo-se
que muitos jovens se obrigam muito cedo ao trabalho, formal ou informal, não
raro sendo o arrimo de família, impõe-se a formulação de programas de apoio e
renda, com a denominação que se quiser dar, a fim de desestimular o trabalho
precoce, grande empecilho à escola e terrível destruidor da infância.
O
Poder Público tem a obrigação de organizar, manter, e desenvolver os órgãos e
instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e
aos planos educacionais da União, dos Estados e dos Municípios. Isto é o que
estabelece a LDB, art. 11, I.
Para
que esses órgãos e instituições sejam adequados às políticas educacionais,
impõe-se que essas mesmas políticas estejam em sintonia com outras políticas
públicas, sob risco de fracassar por completo o projeto educacional. Não existe
projeto educacional sem uma visão sistêmica; sem uma visão interistitucional;
sem a percepção de todas as dimensões do homem.
Surge
daí a necessidade de uma grande articulação dos Conselhos de Educação – nos
níveis dos Municípios ou Estados – com outros conselhos deliberativos –
assistência social, saúde, dos direitos da criança – bem como com a sociedade
civil.
6. FAZENDO CUMPRIR A LEI DE DIRETRIZES E
BASES E O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Ao
Poder Público compete organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições
oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e aos planos
educacionais da União, Estados e Municípios. Essa diretriz prevista na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação, dá o verdadeiro contorno do objetivo do
legislador: os órgãos e instituições devem se adequar às políticas e programas
educacionais e não o contrário.
Com
isso, se deve enfatizar o papel dos Conselhos de Educação enquanto órgãos de
formulação de políticas educacionais, além de suas outras atribuições, como a
de baixar normas complementares para o sistema de ensino do seu nível federado.
Definir as normas da gestão democrática do ensino público na rede básica, de
acordo com a realidade local, é também tarefa desses Conselhos.
Um
passo importante para garantir essa gestão
democrática do ensino está na articulação da escola com a família e a
comunidade local, donde deverão surgir todos os mecanismos criativos de
integração da sociedade com a escola. De igual importância para garantia dessa gestão democrática do ensino é a
garantia da autonomia das escolas:
autonomia pedagógica, de gestão financeira e administrativa.
Havendo
perfeita integração da sociedade com a escola, estarão edificadas as bases para
que essa autonomia possa dar certo, sem desvios, sem
abusos, sem omissões, onde o controle e a participação da sociedade (pais, alunos,
professores e demais atores sociais) serão os pilares.
Um
Regimento Escolar adequado ao Estatuto da Criança e do Adolescente, à LDB e à Constituição, é fundamental, sendo atribuição do
Conselho de Educação zelar por esse instrumento.
Através
de um Regimento democrático, poderemos assegurar a participação de alunos, pais
de alunos, professores, técnicos, na discussão e formulação de uma proposta
pedagógica que satisfaça a realidade local.
Tudo
isso dependerá, em grande parte, de uma atuação efetiva dos Conselhos de
Educação.
Com
tudo, demasiadamente enfatizado, importa lembrar que as políticas públicas
deverão atuar de maneira harmônica. Daí que não se pode negar a zona de
intercessão, o ponto de encontro, o “nó da rede” de serviços públicos,
obrigando a uma prática e estratégia de articulação permanente entre os
Conselhos diversos e a sociedade.
7. CONCLUSÃO
O
Brasil a partir da Constituição Federal de 1988 estabeleceu um sistema
participativo na gestão do Poder Político: esta se dá tanto por meio de representantes
eleitos para as Câmaras como diretamente pelo povo, na forma da Constituição e
leis.
¨
Os
Conselhos, embora não sendo criação do legislador brasileiro, pois conheceu
outras experiências anteriores, são hoje canais de participação da população na
gestão do Poder Político;
¨
Enquanto
órgãos públicos independentes, com caráter deliberativo e paritário,
os Conselhos dos direitos da Criança e do Adolescente deliberam políticas
públicas para a área da infância e juventude, cuja natureza jurídica é de ato administrativo
estatal;
¨
Sendo
a decisão dos Conselhos ato estatal, não há o que se discutir quanto à
discricionariedade administrativa, pois esta foi devidamente exercida na forma
da lei, quando da discussão e deliberação da matéria no Conselho.
¨
O Princípio
da Prioridade Absoluta, presente na Constituição Federal e no
ECA, por força da Constituição, se agregou ao conceito de mérito
administrativo, na mesma medida em que a análise do motivo e
objeto/oportunidade e conveniência o são, pois são todos “dimensões do mérito”;
¨
Havendo
conclusão a respeito da necessidade da prática do ato administrativo, em
matéria relacionada à proteção da criança e do adolescente, haverá
obrigatoriedade da execução desse ato, pois sendo necessário será prioritário.
¨
É
preciso organizar um sistema de atendimento à criança e ao adolescente com base
na gestão estratégica de “rede” (redes sociais espontâneas; redes sociais movimentalistas; redes sociais comunitárias; redes
privadas; redes setoriais públicas).
¨
Os
Conselhos existentes nos municípios, (assistência social, educação, saúde e
direitos das crianças e adolescentes) necessitam de uma atuação articulada,
pois entre as diferentes políticas públicas existem necessariamente situações
de encontros, de interfaces, que se não forem devidamente observados, colocam
em risco a eficiência das políticas públicas.
¨
Os
Conselhos exercem um reconhecido papel de articulador dessas políticas, na
medida em que são órgãos paritários.
¨
O
Ministério Público e o Judiciário devem atuar para garantir a existência e o
funcionamento dos referidos Conselhos, pois somente com a eficiente atuação
desses órgãos, se pode ter a garantia da participação popular na gestão
política do poder; os conselhos são canais de expressão da democracia
participativa.
¨
A articulação
desses conselhos com o Ministério Público e com o Judiciário, pode significar
efetividade das deliberações de políticas e programas;
¨
Os
direitos fundamentais, objeto de muitas ações e programas deliberados pelos
conselhos, são direitos subjetivos (e não normas meramente programáticas, como
querem os ortodoxos) que podem ser exigidos perante o Poder Judiciário: são
direitos às prestações originárias.
¨
Todo
ato omissivo ou comissivo do Poder Público que viole ou ameace de violação
direitos fundamentais de crianças e jovens fica
sujeito ao controle do judiciário, que perseguirá o chamado controle
finalístico, ou controle da legalidade, visando garantir a finalidade pública.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Ed. Campus, 1992.
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criança e ao adolescente. São Paulo: Instituto de Estudos Especiais da PUC,
1995. Série Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, n.4.
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Sociedade. São Paulo: Cortez, 1990.
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direito. São Paulo: RT, 1997.
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ROUSSEAU, Jean-Jacques.O contrato social e outros escritos. .Trad. Rolando Roque da Silva.
São Paulo: Cultrix, 1978.