CRIANÇA E ADOLESCENTE: SUJEITOS DE DIREITOS, TITULARES DE DIREITOS FUNDAMENTAIS, CONSTITUCIONALMENTE RECONHECIDOS

 

 

Tânia da Silva Pereira[1]

Advogada e professora de direito da PUC/RJ e UERJ.

 

 

Resumo: O presente trabalho busca demonstrar os novos paradigmas que indicam crianças e adolescentes como "sujeitos de direitos", identificando os princípios e normas que orientam sua proteção. São titulares de direitos fundamentais duplamente garantidos em sede constitucional, seja de forma expressa no art. 227, caput e em outros artigos conexos, como de direitos fundamentais originários de tratados referentes à matéria de direitos humanos. Busca-se mapear a proteção da infanto-adolescência na sistemática constitucional, asseverando como corolário de tal status a impossibilidade de emenda por parte de maiorias parlamentares eventuais. Destaca o princípio do “melhor interesse da criança” consolidado a partir da ratificação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança ( Decreto 99.710/90 ).

 

I - Crianças e adolescentes como sujeitos de direitos e destinatários de proteção especial.

 

 A adoção definitiva da Doutrina Jurídica da Proteção Integral a partir da Constituição Federal de 1988 passou a representar um novo marco na proteção da infanto-adolescência. De acordo com esta Doutrina, crianças e jovens, em qualquer situação, devem ser protegidos e seus direitos garantidos, além de terem reconhecidas prerrogativas idênticas às dos adultos. Esta doutrina baseia-se na concepção de que “criança e adolescente são sujeitos de direitos universalmente reconhecidos, não apenas de direitos comuns aos adultos, mas, além desses, de direitos especiais provenientes de sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento que devem ser assegurados pela família, Estado e sociedade”[2].

Há que se assumir a nova Doutrina Jurídica como a substituição do subjetivismo pelo garantismo, considerando a cidadania infanto-juvenil como “integrante basilar do princípio da Proteção Integral”. O garantismo é o fim do subjetivismo, por prescindir do arbítrio subjetivo, ante a baliza forte e estável da lei.

 

Trata-se, sem dúvida, do primado dos direitos e do reconhecimento da criança e do adolescente como titulares destas obrigações do Estado, da sociedade e da família[3]. Ser “sujeitos de direitos” representa, hoje, condição especial que deve garantir-lhes direitos e deveres individuais e coletivos, bem como todas as oportunidades e facilidades a fim de lhes facultar um bom desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

 

Nos estudos de Philippe ARIÉS[4] (1981), a idéia de infância estava ligada à idéia de dependência. Só se saía da infância ao sair da dependência, ou, ao menos, dos graus mais baixos da dependência. Portanto, “assim que a criança tinha condições de viver sem a solicitude constante de sua mãe ou de sua ama, ela ingressava na sociedade dos adultos e não se distinguia mais destes”.

 

Ainda numa concepção histórica, Maria Helena NOVAES[5] ( 2000) lembra que a idéia predominante da infância era de “um ser incompleto, frágil, que precisa de cuidados físicos para sua sobrevivência e não a de um vir-a-ser; a visão tradicional da pedagogia definia a socialização da criança como algo que só viria mais tarde, ao contrário da visão moderna psicológica que enfatiza as modalidades subjetivas de se integrar ao meio, havendo uma socialização evolutiva e não um período com e outro sem socialização”.

 

Para Sônia KRAMER[6] ( 1982 ), “entende-se comumente ‘criança’ por oposição a ‘adulto’: oposição estabelecida pela falta de idade ou de maturidade e de adequada integração social. (...) Segundo a mesma Autora, “o sentimento de infância resulta numa dupla atitude com relação à criança: preservá-la da corrupção do meio, mantendo sua inocência, e fortalecê-la desenvolvendo seu caráter e sua razão”[7]. A identidade pessoal da criança e do adolescente tem vínculo direto com sua identidade no grupo familiar e social. Seu nome e seus apelidos os localizam em seu mundo. Sua expressão externa é a sua imagem, que irá compor a sua individualização como pessoa, fator primordial em seu desenvolvimento.

 

O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) indicou especialmente a primazia em considerá-los em suas características e prioridades, destacando sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento e sua titularidade de direitos fundamentais. Ao mesmo tempo, no sistema jurídico vigente seus direitos e deveres devem ser preservados ao considerar sua incapacidade jurídica para os atos da vida civil e a sua inimputabilidade perante a lei penal.

 

Antônio Carlos Gomes da COSTA (1992)[8] alerta que a condição peculiar de desenvolvimento “não pode ser definida apenas a partir do que a criança não sabe, não tem condições e não é capaz. Cada fase do desenvolvimento deve ser reconhecida como revestida de singularidade e de completude relativa, ou seja, a criança e o adolescente não são seres inacabados, a caminho de uma plenitude a ser consumada na idade adulta, enquanto portadora de responsabilidades pessoais, cívicas e produtivas plenas. Cada etapa é, à sua maneira, um período de plenitude que deve ser compreendido e acatado pelo mundo adulto, ou seja, pela família, pela sociedade e pelo Estado”.

 

Ao garantir com “prioridade absoluta” o exercício de Direitos Fundamentais da população infanto-juvenil, a Constituição e o Estatuto convocaram, além do Poder Público quanto à destinação dos recursos e sua efetiva aplicação, os operadores do direito para promoverem procedimentos e medidas judiciais que garantam esta preferência.

 

A proteção com prioridade absoluta é um dever social e, como norma constitucional, não é conselho ou sugestão, é determinação.

 

Para Paolo VERCELONE[9] ( 1992), “o termo ‘proteção’ pressupõe um ser humano protegido e um ou mais seres humanos que o protegem, isto é, basicamente um ser humano que tem necessidade de outro ser humano. Obviamente, este segundo ser humano deve ser mais forte que o primeiro, pois deve ter capacidade para protegê-lo. Como corolário lógico, a proteção pressupõe uma desigualdade (um é mais forte que o outro) e uma redução real da liberdade do ser humano protegido: ele deve ater-se às instruções que o protetor lhe dá e é defendido contra terceiros (outros adultos e autoridade pública) pelo protetor.”

 

Nos diversos âmbitos do sistema jurídico há que se compreender esta proteção, quase sempre vinculada à idade e à incapacidade para a prática dos atos da vida civil. O Código Civil em vigor fixou o limite de 21 anos e o Projeto de Código Civil de 1975, com as incontáveis alterações posteriores, reduziu-o aos 18 anos completos.

 

O art. 1521 do Código Civil nos seus incisos I e II determina a total responsabilidade dos pais tutores e curadores pela reparação civil pelos atos praticados pelos filhos menores ou pupilos que estiverem sob seu poder e em sua companhia. Alerte-se para o art. 458-CC que estende a autoridade do curador à pessoa e bens dos filhos do curatelado nascidos ou nascituros .Quanto aos maiores de 16 e menores de 21anos, adotou a doutrina a responsabilidade solidária entre pai, tutor ou curador e o filho ou pupilo, podendo responder pela reparação civil o patrimônio de qualquer deles pela totalidade da dívida.

 

Para ser funcionário público, estabelece a lei 8.112/90 no seu art.5o.-V , como requisito básico, ter a idade mínima de 18 anos.

 

Para o adolescente gozar do direito de receber pensão como dependente previdenciário na hipótese de morte do ascendente, a Lei 8.213/99 determina o pagamento de pensão até os 21anos e aos maiores incapazes. O Estatuto dos Funcionários Civis da União (lei 8.112/90) em seu art. 117 é expresso ao determinar que “podem ser beneficiários de pensão o filho, enteado, menor sob guarda e tutela, irmão órfão até 21 anos”.

 

Por determinação constitucional (Emenda 20/98), alterando o inciso XXXIII do art. 7º, “proibiu o trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos, e de qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 (quatorze) anos” . A Lei 10.097/2000, alterando a CLT, regulamentou a aprendizagem, admitindo, entre outros, que organizações não governamentais possam profissionalizar o adolescente, além das instituições do Sistema “S“ ( Senai, Senac, Senar, Senart ).

 

Crianças e jovens recebem benefícios de natureza processual a exemplo da assistência do Ministério Público nas causas em que há interesses de incapazes (art. 82-I-CPC) e conseqüente benefício da nulidade do processo (art.246-CPC). Aos menores de 21 anos é garantido o Curador especial na hipótese de colisão de interesses ou falta de representação (art.9º-CPC e 142 § único-ECA ). Além disso, é proibida a citação pelo correio quando for Ré pessoa incapaz (art. 222-I-CPC). Podem ser testemunhas os maiores de 16 anos (art. 405 § 1º-III-CPC) atendidas as restrições do § 2o. do mesmo artigo.

 

No universo do Direito Tributário, a Lei 5.172/66, ao declarar no art. 126 que “a capacidade tributária das pessoas naturais independe da capacidade civil”, determina a predominância do aspecto econômico. Desta maneira, a capacidade tributária é anterior à capacidade de fato para o exercício da vida civil e coexistente com a capacidade de direitos (personalidade).

 

A população infanto-juvenil é também atingida pela prescrição; não corre entre ascendentes e descendentes durante o pátrio poder (art. 168-II-CC) e entre 10 tutelados e curatelados e seus tutores e curadores, durante a tutela ou curatela (art. 168-III-CC). Determina ainda o art. 169-I-CC que a prescrição não corre contra os absolutamente incapazes (art. 5º-CC). O art. 440-CLT determina também que não corre prescrição contra menores de 18 anos.

 

Merece referência especial a inimputabilidade penal do menor de 18 anos prevista no art. 27-CP e 228-CF, obedecendo, segundo alguns penalistas, a critério puramente biológico, nele não interferindo o maior ou menor grau de discernimento. Filiamo-nos àqueles que consideram que a fixação da idade penal aos 18 anos obedece a critério de política criminal, pouco tendo a ver com o critério da maturidade. A criminologia evidenciou, mesmo para o adulto, a inadequação do sistema penitenciário no sentido da reeducação e ressocialização . Nele predomina a reprodução de delinqüência.

 

Há que se rever, com espírito de cidadania, os argumentos utilizados pelos defensores da redução da inimputabilidade do adolescente prevista na Constituição Federal e no art. 27 do Código Penal. Sem entrar no mérito da discussão dos fundamentos destas propostas (precocidade da consciência delitual, a contradição entre o direito ao voto e a prática do ato delitual, entre outros) e, diante de nossa lamentável realidade prisional, incluir os adolescentes infratores, a partir dos 16 anos, na população carcerária dos adultos imputáveis não representa uma solução a curto ou médio prazo para a delinqüência neste país.

 

Um ponto relevante é o dever de revisar e avaliar periodicamente as causas da delinqüência e criminalidade de jovens, sobretudo suas condições pessoais e necessidades peculiares quando estão sob a custódia do Sistema de Justiça.

 

Uma das grandes dificuldades na nova engrenagem legal implantada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) é a implementação de uma proposta pedagógica para o adolescente autor de ato infracional, onde predomine a possibilidade de trabalhar a comunidade para recebê-lo e aceitá-lo sem preconceitos, dando-lhe uma chance de ser reintegrado socialmente e à sua família, sem estigmatizá-lo. Enfim, o resgate da convivência familiar e comunitária, bem como o acesso à educação e à profissionalização, devem estar sempre presentes em qualquer iniciativa das instituições que aplicam as medidas sócio-educativas.

 

Outro desafio dos dias atuais se prende à identificação como “sujeitos” de crianças e jovens institucionalizados, seja em abrigos ou cumprindo medidas sócio-educativas.

 

Sônia ALTOÉ [10] (1999) destaca que “nos internatos a rotina cotidiana é regulada pela obediência absoluta de um chefe e a disciplina como meio de educação se mostra, na realidade, como um fim em si mesma; os adultos dizem saber tudo sobre o que é bom ou ruim para o interno, não lhe deixando nenhuma possibilidade de expressão própria, não só em relação a uma pequena vontade ou aos seus desejos mais caros, como vestir a camisa de casa debaixo do uniforme, na tentativa de guardar um pouco de sua singularidade, de seu laço com a família, mas até no suposto desejo de punição quando dizem: ´vocês estão agindo assim porque querem ser castigados´”.

 

Indica a dificuldade da prática no trabalho institucional nos estabelecimentos após 1990, após entrar em vigor o Estatuto, no qual a criança é considerada como “sujeito de direitos” . Segundo ela, “é comum que isto seja interpretado pelas pessoas que com elas trabalham como direito de fazerem o que querem, inclusive tomarem drogas ou andarem ´soltas pelas ruas´. Em todo estabelecimento para criança ou jovem tem que haver normas ou regras; a questão é como não transformar essas regras em definitivas e que elas possam ser questionadas e reformuladas”.[11]

 

É incontestável a influência dos Documentos Internacionais sobre os Estados nas modificações legislativas, seja como política criminal ou no atendimento às situações de delinqüência juvenil.

 

As Regras de Beijing (Resolução 40.33 da Assembléia Geral da ONU de 29 de novembro de 1985) estabeleceram normas mínimas para a administração da Justiça da Infância e da Juventude. Da mesma forma, as Diretrizes de Riad para a “prevenção da delinqüência juvenil” e as Regras mínimas das Nações Unidas para a proteção de jovens privados de liberdade foram aprovadas pela Assembléia Geral da ONU de 1990, as quais somaram-se aos demais documentos internacionais de proteção à infância deste século. Estes dois últimos, embora ainda não ratificados pelo Brasil, tiveram seus princípios incorporados ao Estatuto da Criança e do Adolescente.

 

Annina LAHALLE[12] ( 1999) distingue entre as novas orientações impulsionadas pelas recomendações internacionais a “responsabilidade societária do jovem“ (independente da responsabilidade penal ): “necessidade de fazer com que o delinqüente compreenda melhor a gravidade do ato cometido e do dano sofrido pela vítima, advindo daí, portanto, a idéia de reparação. Esta proposta deve ser considerada como parte inseparável da idéia do jovem sujeito de direitos. Tendo cometido um delito, o menor deve se conscientizar de sua responsabilidade, ao mesmo tempo que seus direitos devem ser protegidos; novas formas de atendimento devem ser instauradas, como novos parceiros, tendo por objetivo sua reinserção social”. Alerte-se ainda para a tendência em biologizar a delinqüência, ou seja, orientação recente da medicina em utilizar as drogas para dar conta das psicopatias (tudo que sai da normalidade). É um equívoco atribuir causa genética ou orgânica à delinqüência.

 

Ademais, o atendimento ao “infrator” não pode passar pelo moralismo. Lidando com o adolescente que pratica ato infracional, não se pode impor um “certo ou errado”. Não existe “colocar nos eixos”. Resultado de uma herança religiosa, jurídica ou psiquiátrica, existem modelos superados que não atingem os jovens delinqüentes.

É necessário que o profissional que trabalhe com este adolescente se dispa de preconceitos, assuma-o como pessoa em desenvolvimento e não o encare de forma meramente assistencialista.

 

Estes novos paradigmas impõem ao Sistema de Justiça e às esferas administrativas uma mudança na cultura do atendimento, o que tem representado um permanente desafio às instituições e aos operadores de Direito.

 

Há que se entender a cultura do atendimento como a implementação de ações de forma dinâmica e de uma nova mentalidade na sedimentação de direitos e deveres fundamentais da população, do Poder Público e da sociedade como um todo, permitindo trabalhar com eficiência a proteção de interesses comuns, expurgando práticas ultrapassadas de contemporizar conseqüências.

 

Exige, sobretudo, pessoal capacitado para servir de mediador ou de intermediário entre as instituições e os diversos setores da sociedade, que desejam se vincular a esta ação cultural globalizada.

 

No desenvolvimento desta cultura, há que se reconhecer à criança e ao adolescente, sobretudo, o direito ao respeito a partir dos valores propostos por Dalmo de Abreu DALLARI[13] ( 1986) :

 

Direito de ser : “A criança é um ser humano, é uma pessoa que dependeu de outra para se revelar, mas que possivelmente abrirá para outras o caminho da vida. É que já nasceu como pessoa. Toda criança nasce com o direito de ser [14].

O direito de pensar : “A criança é um ser racional dotado de inteligência podendo desenvolver extraordinariamente essa faculdade, desde que lhe seja assegurado o direito de pensar com sua própria cabeça. Impor a uma criança a aceitação de idéias, forçá-la a acompanhar por intuição ou por reação automática o pensamento dos adultos é negar-lhe o uso da inteligência, é reduzir a uma pobre e enfadonha repetição mecânica o que poderia ser a fascinante experiência da vida[15].

O direito de sentir: “Todo ser humano é dotado de sensibilidade, embora em muitos as condições de vida ou a educação acabem determinando comportamentos puramente racionais, sem emoção, ou um modo de agir puramente mecânico, vegetativo, como se fosse apenas matéria em movimento. A criança tem o direito de ser tratada como um ser capaz de sentir, que poderá experimentar grande sofrimento se esta característica não for respeitada, e que poderá, ao contrário, desenvolver de modo extraordinário sua condição humana se for favorecida a expansão de seus sentimentos” [16].

O direito de querer: “O direito de querer significa a possibilidade de ter uma vontade livre. Esse direito deve ser reconhecido e assegurado a todos os seres humanos, mas tem significado especial em relação à criança, porque esta é praticamente indefesa e não é raro que, sem nenhum disfarce ou então sob pretexto de educar a criança, se procure anular ou dirigir sua vontade”. A criança deve ter o direito de querer, de manifestar sua própria vontade, sem medo e sem constrangimento. E, como parte desse direito, a criança deve ter também a possibilidade de dizer o que quer[17].

O direito de sonhar: “A criança que não tiver o direito de sonhar ainda não começou a viver ou já está condenada a uma vida cinzenta, mais sobrevivência do que vida. A criança sem sonhos está limitada ao mundo da razão, a executar rotinas com maior ou menor dificuldade, a resolver os problemas do dia-a-dia de olhos no chão. ( ...) A criança sem sonhos é uma águia nascida sem asas”[18].

 

Quando o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Constituição Federal reconhecem à infanto-adolescência os direitos à liberdade, dignidade e respeito (art. 15), isso representa o passo decisivo para a cidadania e para uma nova estrutura jurídica e social para o país.

 

II- Crianças e adolescentes como titulares de direitos fundamentais

 

A Doutrina reconhece a existência de um Direito Fundamental à Infância, fixando não só o seu fundamento subjetivo “face à importância para o indivíduo, sua formação e desenvolvimento de sua personalidade”, bem como um fundamento objetivo “face ao interesse público, necessidade social e até a evolução da comunidade na compreensão de resguardar um período imprescindível ao ser humano e que, após ultrapassado, jamais poderá ser resgatado”[19].

 

Os direitos fundamentais constituem elemento basilar do constitucionalismo hodierno. Um breve apanhado histórico dos direitos fundamentais confunde-se com a própria construção do constitucionalismo. A Declaração francesa de 1789 eleva ao grau máximo seu caráter universal, já que baseada restritamente na racionalidade, da qual absolutamente todos os homens seriam dotados. Os mesmo ideais de liberdade, igualdade e fraternidade foram também garantidos na Constituição de 1791 – inspiração girondina – e de 1793 – de inspiração jacobina. Esta última chega a acrescentar direitos como ao trabalho, à proteção contra a pobreza e à educação.

 

O Séc. XIX foi marcado pela denúncia da insuficiência dos direitos individuais e conseqüente reivindicação dos direitos econômicos e sociais. As inspirações operárias foram consagradas pela Revolução Russa e celebradas na Declaração de Direitos do Povo Trabalhador e Explorado de 1918. Não apenas se inaugurava um novo sistema político como também uma nova forma de pensar os direitos fundamentais.

 

São de capital importância duas constituições do início do séc. XX: a mexicana de 1917 e a de Weimar de 1919. Estas primaram pelo intento de conjugar num único sistema direitos de cunho individual e econômico-social. Mais especialmente, a Constituição de Weimar serviu como modelo para as constituições européias do pós-guerra que implantaram o regime do Estado de bem-estar social, como a francesa de 1946, a italiana de 1947 e a própria Lei Fundamental de Bonn de 1949, as duas últimas ainda vigentes.

 

A mesma tendência foi reforçada nas constituições consagradas após regimes autoritários como a da Grécia (1975), da Espanha (1975) e de Portugal (1978). Há de se destacar que os estudos comparativos realizados após a promulgação da Constituição brasileira de 1988 indicam a aproximação aos ibéricos. Nosso texto possui, entre os direitos fundamentais, uma composição dos direitos individuais, políticos, sociais, econômicos, culturais, ambientais.

 

Nos valemos assim do auxilio da doutrina nacional e ibérica para melhor delimitar o campo dos direitos fundamentais em nosso ordenamento jurídico em que reza o princípio da primazia da Constituição Federal.

 

Na doutrina brasileira, o constitucionalista José Afonso da SILVA sugere as seguintes características dos direitos fundamentais: “Historicidade -  são históricos como qualquer direito. Nascem, modificam-se e desaparecem (...); Inalienabilidade  -  são direitos intransferíveis, inegociáveis, porque não são de conteúdo econômico-patrimonial (...); Imprescritibilidade  - (...) não se verificam requisitos que importem em sua prescrição. Vale dizer, nunca deixam de ser exigíveis (...); e Irrenunciabilidade -  não se renunciam direitos fundamentais. Alguns deles podem até não ser exercidos, pode-se deixar de exercê-los, mas não se admite sejam renunciados”[20].

 

Os direitos fundamentais constituem “direitos jurídico-positivamente vigentes numa ordem constitucional” [21]. A breve afirmativa de J. J. Gomes CANOTILHO, constitucionalista português, encerra duas considerações de extrema relevância.

 

Primeiramente, seu caráter positivo, enquanto incorporação no ordenamento escrito. Em segundo lugar, esta positivação deve ocorrer no bojo do mais importante diploma jurídico: a Constituição. Derivam assim 4 conseqüências de extrema relevância: “as normas consagradoras de direitos fundamentais, enquanto normas fundamentais, são normas colocadas no grau superior da ordem jurídica; como normas constitucionais encontram-se submetidas aos procedimentos agravados de revisão[22]; como normas incorporadoras de direitos fundamentais passam, muitas vezes, a constituir limites materiais da própria revisão; e, como normas dotadas de vinculatividade imediata dos poderes público, constituem parâmetros materiais de escolha, decisões, ações e controle, dos órgãos legislativos, administrativos e jurisdicionais.”[23]

 

Pretendemos sustentar aqui, realizando um paralelo ao Texto brasileiro, que os direitos fundamentais não são passíveis de reforma, como assinala a segunda conseqüência apontada por CANOTILHO, e sim constituem limites materiais ao poder de emenda.

 

Hoje as Constituições fixam princípios e linhas gerais para guiar o Estado e a vida em sociedade com a finalidade de promover o bem-estar individual e coletivo de seus integrantes. Os Direitos Fundamentais declarados nas Constituições não se confundem com outros direitos assegurados ou protegidos.

 

No tocante à Constituição brasileira de 1988, à primeira vista poderíamos afirmar que os direitos fundamentais eleitos pelo constituinte estariam restritos ao art. 5º em seus 77 incisos. No entanto, cabe atenta leitura de seu parágrafo 2º, in verbis: “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por elas adotados ou dos Tratados Internacionais em que a República Federativa do Brasil é parte”.

 

Outrossim, pode-se afirmar que o constituinte não teve a intenção de restringir os direitos fundamentais àqueles enumerados no artigo em tela. Não o teria redigido se não tivesse o nítido desejo de possibilitar a expansão e atualização destes direitos ao longo da ‘vida’ constitucional.

 

Considerado cláusula aberta, este parágrafo encerra o princípio da não tipicidade dos direitos fundamentais, de forma a confirmar o não congelamento destes direitos naqueles determinados no processo constituinte. E ainda, como leciona Ingo Wolfgang SARLET, os direitos fundamentais “podem ter acento em outras partes do texto constitucional ou residir em outros textos legais nacionais e internacionais”.[24]

 

Adicione-se ainda que, ao referir-se aos “direitos e garantias expressos nesta Constituição”, o legislador teve como preocupação não fazer qualquer menção à posição a ser ocupada pelo mesmo no Texto. Destarte, pode-se concluir que são considerados direitos e garantias fundamentais de mesma hierarquia aqueles que ocupam diversas posições na Constituição Federal de 1988. Consideramos que os direitos fundamentais da criança e do adolescente, inobstante não constando do rol do artigo 5º, tem a mesma hierarquia constitucional.

 

Sustentamos ainda que devem ser tidos como direitos fundamentais de duas formas. Primeiramente, o artigo 227, caput, e outros ao mesmo alinhados, enumeram com clareza quais os direitos fundamentais que devem ser assegurados a estes sujeitos de direito com absoluta prioridade.

 

Em segundo lugar, o Brasil é signatário da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança de 1989, em outras palavras, esta pode ser considerada parte dos “Tratados Internacionais em que a República Federativa do Brasil é parte”.

 

Sabe-se que as vigas-mestras da Convenção foram transpostas para o plano interno por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente. No entanto, pretendemos afirmar que os direitos fundamentais garantidos na Convenção, ao terem sido recebidos pelo parágrafo 2º do artigo 5º, galgaram ao status de direito fundamental em nosso sistema constitucional.

 

Passemos agora à análise de cada uma das duas hipóteses, para que possamos indicar a possibilidade ou não de emenda a tais direitos.

 

II-a) Direitos fundamentais dispersos

 

J.J.Gomes CANOTILHO[25] refere-se a “Direitos Fundamentais formalmente constitucionais mas fora do catálogo”, enumerados na Parte I da Constituição Portuguesa. É precisamente o que denomina de “Direitos Fundamentais dispersos”.

 

Analogamente, afirma-se que a Constituição brasileira também enumerou direitos fundamentais de forma dispersa.

 

Na doutrina nacional, Ingo Wolfgang SARLET[26] identifica os “Direitos Fundamentais fora do catálogo, mas com status constitucional formal”, os quais, segundo ele, “são idênticos no que tange à sua técnica de positivação e eficácia”. O referido Autor identifica, entre eles[27], o art. 227-CF relativo aos Direitos Fundamentais da Criança e do Adolescente. Este artigo é reconhecido como a Declaração de Direitos Fundamentais da população infanto-juvenil.

 

Se a história constitucional brasileira pode vangloriar-se da presença permanente da Declaração de Direitos e Garantias Individuais do Cidadão, a Constituição de 1988 introduz direitos fundamentais específicos da criança e do adolescente.

 

Apregoamos ainda que estes não se restringem ao artigo 227-C.F. Podemos citar, enumerativamente, outros direitos fundamentais diversos, entre eles: Proibição de trabalho noturno, perigoso e insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos, conforme redação dada ao art. 7, inc. XXXIII pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998. Observe-se que tal emenda ampliou o campo de proteção ao trabalho infanto-juvenil, já que a redação original proibia qualquer trabalho apenas aos menores de 14 anos; a equiparação de filhos e a vedação de designações discriminatórias relativas à filiação, consoante o art. 226, parágrafo 6º; a inimputabilidade dos menores de 18, sujeitos à legislação especial, conforme o artigo 228. Há de se ressaltar que diversa é a forma de se deparar com o adolescente infrator, a aplicação de medidas sócio-educativas; assistência e educação por parte dos pais, de acordo com o art. 229.

 

O fato de se encontrarem dispersos no texto constitucional - art. 227 e os outros citados – não lhes retira o status de direitos fundamentais, devendo ser tratados da mesma forma de que todos os demais.

 

II- b) Decorrentes de tratados

 

Para assegurar a posição proposta, indica-se o mesmo art. 5º, parágrafo 2º. C.F. ao referir-se aos “Tratados Internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”, como receptor em sede constitucional de todos os diplomas referentes aos direitos humanos.

 

Endossamos a posição de SARLET de que o conceito utilizado pelo constituinte engloba diversos instrumentos internacionais referindo-se a “Tratados” como gênero em cuja espécie encontram-se convenções, pactos e ainda os tratados propriamente ditos. Reporta-se à própria Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, a qual os considera como termo genérico determinante de um acordo internacional independentemente de sua designação particular. Apenas esta interpretação é capaz de evitar um considerável estreitamento da abertura constitucional referente ao direito internacional.[28]

 

Entendida a extensão do termo tratado, além dos Documentos acima citados, destaca-se a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aprovada pela ONU em 20 de novembro de 1989 e ratificada pelo Brasil através do Decreto 99.710, de 21 de novembro de 1990. Nascida de um árduo trabalho de dez anos por parte de representantes de 43 países-membros da Comissão de Direitos Humanos daquele organismo internacional, representou a comemoração dos 30 anos da Declaração Universal dos Direitos da Criança.

 

Segundo Michel BONNET (1988), na fase de elaboração da Convenção a principal questão debatida “era definir direitos universais para as crianças, considerando a diversidade de percepções religiosas, sócio-econômicas e culturais da infância nas diversas nações”.

 

Fruto de compromisso e negociação, tal Convenção representa o mínimo que toda a sociedade deve garantir às suas crianças, reconhecendo num único documento as normas que os países signatários devem adotar e incorporar à sua ordem interna. A Convenção exige, por parte de cada Estado que a subscreva e ratifique, uma tomada de decisão, incluindo-se os mecanismos necessários à fiscalização do cumprimento de suas disposições (e obrigações). Deve, inclusive, servir de instrumento básico para todos aqueles que direta ou indiretamente trabalham em prol da população infanto-juvenil.

 

No entanto, a preocupação no tocante à infância não tem origem nesta data.

 

Destacam-se ainda, neste século, outros documentos internacionais de proteção à infância e à juventude. A proteção especial já aparece na Declaração de Genebra de 1924, em que foi declarada a “necessidade de proclamar à criança uma proteção especial”. A Declaração Universal de Direitos Humanos aprovada no seio das Nações Unidas em 1948 reconheceu que a “infância tem direito a cuidados e assistência especiais e que todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozam da mesma proteção social” (art. XXV, 2).

 

Coube à já mencionada Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959 determinar no seu segundo princípio que “a criança gozará de proteção especial e disporá de oportunidade e serviços a serem estabelecidos em lei por outros meios, de modo que possa desenvolver-se física, mental, moral, espiritual e socialmente de forma saudável e normal, assim como em condições de liberdade e dignidade. Ao promulgar leis com este fim, a consideração fundamental a que se atenderá será o interesse superior da criança”.

 

Tomando como modelo a Convenção Européia de Direitos Humanos, destaque-se, em nosso continente, a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica de 1969), que estabelece no seu art. 19 que “toda criança tem direito às medidas de proteção que sua condição de menor requer por parte da família, da sociedade e do Estado”. O Brasil veio a ratificar esta Convenção mais de vinte anos depois, através do Decreto 678 de novembro de 1992.

 

Fazemos quorun à doutrina que afirma que os direitos fundamentais oriundos das regras internacionais aglutinam-se à Constituição por meio do parágrafo 2º do art. 5º. Adquirem, outrossim, junto ao sistema constitucional status igual ao concedido aos demais direitos fundamentais. No tocante à nossa proposta, os direitos fundamentais referentes à criança e ao adolescente celebrados nos diplomas internacionais dos quais o Brasil é parte pertencem à Constituição Federal de acordo com o princípio da não tipicidade dos direitos fundamentais.

 

Conclui-se por fim que, por constituírem direitos assinalados no texto constitucional, ou denominados direitos fundamentais dispersos por terem sido celebrados em acordos internacionais, os direitos da criança e do adolescente constituem direitos duplamente fundamentados no sistema constitucional oriundo de 1988.

 

II-c) Impossibilidade de emenda

 

O fato de haver o legislador constituinte garantido aos direitos fundamentais a impossibilidade de emenda (art. 60, parágrafo 4º, inciso IV) e ainda a aplicabilidade imediata dos mesmos (art. 5º parágrafo 1º C.F.) pode ser apontado como indicador da essencialidade dos mesmos.

 

Pretendemos dar maior destaque aqui à impossibilidade de emenda, já que presenciamos hodiernamente grande ímpeto reformador por parte do legislador ordinário. Sustentamos que qualquer emenda que pretenda ou tenda a abolir qualquer dos direitos fundamentais da criança e adolescente fere frontalmente a Constituição Federal.

 

O legislador constituinte reservou certa rigidez para o processo de emenda, já que formulada para ajustes de natureza restrita e específica. Estabeleceu assim limites denominados formais, temporais e materiais. Interessam-nos, especificamente, os limites materiais que visam assegurar a permanência de determinados conteúdos constitucionais tidos como fundamentais. O reconhecimento de limitações de cunho material significa um ponto de equilíbrio entre a necessidade de preservação de um conteúdo mínimo estabelecido pelo constituinte e a contínua imperiosidade de adequação da Constituição à realidade social.

 

As limitação materiais – não entraremos aqui na seara das limitações implícitas – encontram-se manifestas no parágrafo 4º do artigo 60 C.F. , entre elas, in verbis: I) a forma federativa de Estado; II) o voto direto, secreto, universal e periódico; III) a separação de poderes; e IV) os direitos e garantias individuais. Tais elementos foram assim considerados pelo legislador constituinte sem qualquer critério hierárquico, “cláusulas pétreas”, não passíveis de emenda, elemento caracterizador de força jurídica reforçada na ordem jurídica constitucional pátria.

 

No tocante à abrangência da restrição material de emenda, devemos estabelecer, mesmo com a brevidade necessária a um artigo, o alcance da imutabilidade apregoada pelo parágrafo 4º, especificamente no tocante aos direitos fundamentais.

 

Defendemos aqui uma interpretação extensiva da expressão “direitos e garantias individuais”, já que a restrição à sua literalidade ameaçaria o próprio conceito de direitos fundamentais, levaria à ilação de que apenas os direitos individuais seriam protegidos pela impossibilidade de emenda. Mesmo os direitos coletivos enumerados no próprio art. 5º não teriam guarida: por ironia, o mandado de segurança individual constituiria cláusula pétrea e o coletivo estaria disponível ao ímpeto reformador de maiorias eventuais.

 

Sustentamos que o legislador constituinte não propôs expressamente qualquer distinção significativa entre direitos individuais, políticos e sociais que possibilitasse diferença em sua fundamentalidade ou possibilidade de hierarquização. Lembra ainda Ingo Wolfgang SARLET que o próprio Preâmbulo da Constituição de 1988 elenca a necessidade de assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos (...) Ressalte-se ainda a consagração dos princípios estruturantes mapeados no art. 1º, inc. I a III, e art. 3º, inc. I, III e IV C.F.

 

A possibilidade de restrição ou abolição dos direitos políticos e sociais levaria ao comprometimento da estrutura e identidade da própria Constituição.

 

Afinal, a dignidade da pessoa humana, fundamento da República brasileira, foi densificada pelo constituinte por meio da garantia dos direitos fundamentais, sejam eles individuais, políticos, sociais, econômicos, culturais ou ambientais.

 

No que tange à nossa proposta de reconhecer os Direitos Fundamentais da criança e adolescente como cláusulas pétreas, sejam estes de cunho individual ou coletivo, cabe novamente lembrar que estes encontram-se no sistema constitucional de duas formas, como supra sustentado.

 

Portanto, os direitos fundamentais da criança e do adolescente, fundados dispersamente no Texto Constitucional, ou ainda os consagrados pela ratificação dos diplomas acima relacionados, constituem um limite mínimo a ser respeitado pelo legislador ordinário.

 

II-d) Princípios constitucionais

O ordenamento jurídico brasileiro emergente da Constituição de 1988 encerra um sistema normativo de regras e princípios. As normas de nosso sistema revelam-se tanto sob a forma de regra quanto de princípios. Note-se desde já que os princípios não possuem apenas função integrativa ou programática no ordenamento jurídico; contêm expresso grau de normatividade. Tanto as regras como os princípios carregam em si diretrizes deontológicas, impressas nas expressões de mandato, permissão e proibição.

 

A distinção entre regras e princípios constitui um dos principais pilares para a compreensão da ordem jurídica. Foi de capital relevância para a compreensão desta nova perspectiva normativa o trabalho de Ronald DWORKIN de 1967[30], no qual distingue as regras, os princípios e as políticas públicas (policies). No entanto, acredita-se mais proveitoso, para o âmbito deste trabalho, explorar a contribuição de Robert ALEXY, jusfilósofo e constitucionalista alemão, mesmo que realizada quase 20 anos depois, já que este descreve o denominado sistema civil ou continental, família à qual pertence a sistemática brasileira.

 

Desafia ALEXY o tradicional critério da generalidade para a distinção entre os dois tipos de norma: os princípios teriam caráter mais geral que as normas. Afirma que, na realidade, a distinção entre as regras e princípios seria qualitativa.

 

As regras são normas que, quando válidas, podem ser cumpridas ou não em sua totalidade. “(C)ontienen determinaciones en el ámbito de lo fáctica y jurídicamente posible”[31]. Por sua vez, os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na melhor/maior maneira possível; são “mandatos de optimización que están caracterizados por el hecho de que puedem ser cumplidos en diferente grado y que la medida debida de su cumplimiento no sólo depende de las posibilidades reales sino también de las jurídicas.”[32] Os princípios ordenam algo que deve ser cumprido em sua maior medida possível, consideradas as condições jurídicas e fáticas. São assim chamados mandatos prima facie, e não mandatos definitivos como as regras.

 

Não somente diferenciam-se regras e princípios por seu aspecto qualitativo, mas também pela forma através da qual solucionam seus conflitos e colisões, respectivamente.

 

O conflito entre regras pode ser solucionado por meio do estabelecimento de uma cláusula de exceção ou pela declaração de invalidade de uma das regras. A eliminação de uma das regras ocorre, no mais das vezes, por recursos tradicionais como lex posterior derogat legi priori e lex specialis derogat legi generali.

 

Enquanto o conflito de regras considera a questão da validade, a colisão de princípios, por sua vez, tem como foco central seu peso. Sob certas circunstâncias, um princípio tem precedência sobre o outro; alteradas as circunstâncias, a precedência pode apresentar resposta diversa. No caso concreto, cede o princípio que tiver menor peso, considerando ambos como dotados de validade. Os princípios “podem ser objeto de ponderação, de harmonização, pois eles contêm apenas ‘exigências’ ou ‘standards’ que, prima facie, devem ser realizados[33].

 

Elege ALEXY a máxima da proporcionalidade como a regedora da colisão dos princípios: critérios de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito decidirão a precedência do caso concreto. Note-se que o autor teve o cuidado de não caracterizar a proporcionalidade como princípio, o que o tornaria passível de ponderação.

 

A decisiva contribuição de ALEXY à discussão acerca das regras e princípios foi adicionar o importante elemento da Argumentação. Afirma o autor que “(e)l carácter prima facie de los princípios puede reforzar-se introduciendo una carga de argumentación en favor de determinados principios o determinados tipos de principios.” A argumentação é determinante para a aplicabilidade da máxima da proporcionalidade e a obtenção da precedência nos casos concretos de colisão de princípios.

 

II-e) Princípio do “melhor interesse da criança”

 

Procura-se afirmar, no bojo deste trabalho, que o melhor interesse da criança constitui um princípio consagrado por nossa sistemática constitucional. Com tal status, afirma-se novamente seu caráter normativo e a necessidade de sua ponderação frente a outros princípios constitucionais. Destarte, o mandato prima facie inerente ao princípio do melhor interesse deverá adequar seu peso aos demais princípios em colisão em um caso concreto.

 

Sua origem é encontrada no instituto inglês do parens patriae, como prerrogativa do Rei em proteger aqueles que não poderiam fazê-lo em causa própria.

 

É recepcionado pela jurisprudência norte-americana em 1813, no caso Commonwealth v. Addicks, no qual a Corte da Pensilvânia afirma a prioridade do interesse de uma criança em detrimento dos interesses de seus pais. No caso em exame, a guarda da criança foi concedida à mãe acusada de adultério, já que este resultado representava o melhor interesse para aquela criança mediante as circunstâncias dadas.

 

Em outra oportunidade[34], afirmamos que a proposta de se reconhecer, nos documentos internacionais, a proteção especial para a infância já aparece na Declaração de Genebra de 1924, onde foi declarada a “necessidade de proclamar à criança uma proteção especial”. Por sua vez, a Declaração Universal de Direitos Humanos das Nações Unidas de 1948 destaca, para a criança, “o direito a cuidados e assistência especiais”.

 

Coube à Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959 determinar que “a criança gozará de proteção especial e disporá de oportunidade e serviços, a serem estabelecidos em lei por outros meios, de modo que possa desenvolver-se física, mental, moral, espiritual e socialmente de forma saudável e normal, assim como em condições de liberdade e dignidade. Ao promulgar leis com este fim, a consideração fundamental a que se atenderá será o interesse superior da criança”.[35]

 

Por sua vez, a Convenção Internacional dos Direitos da Criança de 1989 teve papel fundamental na confirmação e alargamento deste princípio. Ratificada pelo Brasil através do Decreto 99.710/90, destaque-se, em sua tradução oficial, o que dispõe o art. 3.1: “todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança”.

 

O texto original em inglês declara: “In all actions concerning children, whether undertaken by public or private social welfare institutions, courts of law, administrative

authorities or legislative bodies, the best interests of the child shall be a primary consideration”.

 

Há de se ressaltar que a Convenção proclama como seus destinatários as “crianças”, identificadas no art. 1º. como “todo ser humano com menos de 18 anos”.

 

Entretanto, entendeu o legislador estatutário brasileiro, dentro de critérios puramente de política legislativa, dividir estes titulares de Direitos Fundamentais em duas faixas de idade, buscando, nas ciências humanas, sobretudo na psicologia e biologia, fundamentos para esta divisão legal. Outrossim, o art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente considera como criança “pessoa até 12 anos de idade incompletos” e adolescente “aquela entre 12 e 18 anos de idade”. Neste sentido, qualquer menção ao princípio do melhor interesse da criança deve ser necessariamente estendido aos adolescentes, já que uma inovação legislativa não pode excluir parte da população de seus direitos garantidos tanto em âmbito interno quanto internacional.

 

Cabe ressaltar ainda que a versão em inglês enfatiza o caráter qualitativo do interesse da criança – the best interest – enquanto a versão brasileira tem como foco o critério quantitativo – o maior interesse. Optamos pelo conceito qualitativo por acreditar que este aponta com mais precisão a orientação proveniente dos diplomas supra relacionados.

 

A aplicação de melhor interesse da criança foi bastante ampliada pela Convenção em destaque. Realizando um paralelo entre a extensão consagrada na Declaração (1959) e na Convenção, Daniel O’DONNELL esclarece que esta “amplia o alcance deste princípio, o qual, pelo teor do artigo 3.(1), deve inspirar não apenas a legislação, mas também todas as medidas concernentes às crianças, tomadas pelas instituições públicas ou privadas de bem-estar social, pelos tribunais, pelas autoridades administrativas...”[36]. Afirma assim a vinculatividade imediata dos poderes públicos, seja do Executivo, Legislativo ou Judiciário, ao princípio do melhor interesse da criança.

 

Passamos assim a examinar, a título de exemplo, oportunidades em que deve o princípio do melhor interesse da criança ser aplicado. Para tal tarefa, tomamos primeiramente o Legislativo e as ressalvas realizadas em nossa legislação no tocante à criança e ao adolescente. Em seguida, examinamos ocasiões em que o magistrado pode fazer uso do princípio em tela. Note-se que, em regra geral, as mesmas considerações tecidas quanto ao Judiciário podem ser aplicadas ao procedimento administrativo.

 

O Estatuto da Criança e do Adolescente, consolidador das normas já informadas pela Constituição Federal, representa a mais eficaz de nossos diplomas legais no sentido de especificar linhas de apreensão do melhor interesse da criança.

 

No entanto, não se pode deixar de lembrar que diversas normas constantes tanto no Código Civil[37], Código Penal[38] e demais diplomas foram recepcionadas pela nova ordem constitucional, mais especificamente no tocante à proteção da infância e adolescência.

 

No tocante ao Poder Judiciário, deve-se destacar a imperiosidade de um procedimento rápido e eficiente que respeite os parâmetros processuais autorizados pela Constituição. Há de se evitar um processo demorado, o que, em regra, representa grande prejuízo à criança e ao adolescente.

 

A oitiva do sujeito infanto-juvenil é identificada como importante orientação ao magistrado rumo à identificação do melhor interesse da criança.

 

O art. 12 da Convenção assegura àquela que estiver capacitada a formular seus próprios juízos o direito de expressar suas opiniões livremente sobre os assuntos relacionados com ela, considerando a sua idade e maturidade. Garante-lhe, inclusive, a oportunidade de ser ouvida em todo processo judicial ou administrativo que lhe afete diretamente, em conformidade com as regras processuais da legislação nacional. Da mesma forma, o Estatuto da Criança e do Adolescente, no § único do art. 28, indica que “sempre que possível será ouvida a criança”. Para tal fim, a criança deve ser informada sobre sua situação e os assuntos sobre os quais deverá emitir sua opinião, devendo ser facilitada a intervenção de profissionais especializados que possam interpretar, de maneira apropriada, a sua palavra.

 

Duas são as situações em que se faz mais especificamente relevante a oitiva da criança e adolescente: o abuso sexual e a guarda.

 

Explicar situações identificadas como abuso sexual contra crianças e adolescentes têm exigido dos profissionais e dos magistrados maior atenção em suas decisões. A “lei do silêncio”, por meio da qual tais formas criminais são mascaradas, cria uma relação de poder difícil de ser desafiada. Em geral, a vítima é a única testemunha e as evidências físicas de abuso sexual existem apenas em uma pequena porcentagem de casos.

 

Na hipótese de abuso sexual no âmbito familiar, os procedimentos do atual sistema criminal desencorajam e dificultam os cuidados especiais com a criança.

 

Não é rara a traumática experiência de uma acareação entre a criança e o acusado.

 

Nestes casos, a criança pode sentir uma culpa adicional, caso este seja condenado. Sentimentos conflitantes para com o acusado são, em geral, uma causa significante do trauma experimentado pela criança abusada sexualmente.

 

A oitiva da criança, nessas circunstâncias, merece especiais cuidados, devendo ser criadas condições que facilitem a expressão espontânea da criança, evitando situações de angústia e linguagens técnicas incompreensíveis, permitindo-lhe expressar seus interesses e conflitos com maior liberdade. Deve ser implantada uma efetiva mudança de cultura no atendimento de crianças vítimas de abuso sexual.

 

Deve o Instituto Médico Legal, por exemplo, proporcionar um atendimento especial à criança por técnicos capazes de ouvir e manifestar a sua compreensão à vítima; a possibilidade do exame do DNA por este órgão permite a identificação imediata e irrefutável do abusador.

 

A aplicação de medidas emergenciais em casos de abuso sexual apregoadas civilmente, como o afastamento do abusador do lar, busca e apreensão da criança, destituição do pátrio poder, deve necessariamente atender ao princípio do melhor interesse da criança. A permanência da criança no âmbito familiar deve ser priorizada, sendo afastado de imediato o agressor, já que existe o risco de que o agressor, permanecendo junto à família, perpetue sua conduta em relação à vítima ou a outros familiares. Uma assistência material à família é prioritária, considerando que, na maioria das vezes, o agressor é seu principal mantenedor.

 

Por sua vez, nos processos de guarda, é fundamental a oitiva da criança suficientemente madura. No entanto, esta manifestação volitiva da criança, por si só não é o suficiente. Há que se considerar, também, a estabilidade, continuidade e a permanência na relação familiar.

 

Tratando-se de criança de tenra idade, deve-se levar em conta qual a pessoa com quem a criança mantém laços mais fortes de afetividade e carinho e que possa lhe dar um atendimento diário às suas necessidades biofísicas e psicológicas. Daí a necessidade de um acompanhamento, pelo menos temporariamente, dos desdobramentos familiares das decisões referentes à guarda, dando ao Magistrado a certeza de uma decisão coerente.

 

Enfim, o fator determinante para se garantir a Guarda a um dos pais deve estar na habilidade de se colocar o interesse da criança acima dos próprios interesses.

 

Destaque-se, ainda, que a Lei de Divórcio (Lei 6.515/77), em seu art. 13, autoriza ao Juiz, “em qualquer caso e a bem dos filhos”, regular a situação dos mesmos em relação aos pais. Abre, portanto, espaço para se atribuir a Guarda até mesmo para terceiros (avós, tios ou estranhos na relação familiar) na hipótese de circunstâncias extremas de conflitos entre os pais.

 

De qualquer forma, as decisões judiciais nessas hipóteses não fazem coisa julgada definitiva, permitindo alterações por iniciativa daquele que se mostra insatisfeito com as condições do resultado. Procedimentos judiciais conhecidos como tutela de urgência, a exemplo das medidas cautelares e antecipações de tutela, permitem iniciativas imediatas nos casos de violações de direitos fundamentais.

 

É necessário que os operadores de Direito, sobretudo o Advogado, priorizem soluções amigáveis, desmotivando os pais contra disputas judiciais e ajudando-os a compreender que, quando ganha um dos genitores, quem acaba derrotado é a criança ou o adolescente.

 

Por fim, cabe ressaltar que a aplicação do princípio do melhor interesse da criança por parte do magistrado não encerra um poder discricionário ilimitado. A consolidação de uma proteção especial à infância e adolescência por parte da Constituição e a ratificação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente incorporaram ao ordenamento jurídico pátrio o princípio do melhor interesse da criança.

 

Inobstante as inúmeras dificuldades que podem ser encontradas no que diz respeito ao grau de aplicabilidade do principio em questão, enfatiza-se, mais uma vez, seu caráter normativo. É papel do magistrado prezar pelo máximo grau de otimização do princípio do melhor interesse da criança, fazendo uso das regras constitucionais e infra-constitucionais que o respaldem.

 

No entanto, não há receita mágica para a identificação do melhor interesse da criança. Podemos apontar aqui como indicativos para tal identificação a opção menos prejudicial ou a que cause menos dano à criança ou ao adolescente. Cabe lembrar que as regras, sejam constitucionais ou infraconstitucionais, constituem apenas o primeiro grau de adensamento dos princípios constitucionais. Cabe notadamente ao Poder Judiciário, por meio de sua atividade jurisdicional, consolidar em sua prática diária a aplicabilidade do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.

 

Conclusão

 

É indiscutível a atual confluência entre o público e o privado. Analisando estas mudanças, Maria Celina Bodin de MORAES esclarece que “diante de um Estado intervencionista e regulamentador, que dita as regras do jogo, o Direito Civil viu modificadas as funções e não pode mais ser estimado segundo os moldes de um direito individualista dos séculos anteriores.”[39] A publicização do direito privado pode ser vislumbrada no fato de que os Códigos Civis perderam “a posição central que disputavam no sistema”, ocupada hoje pela Constituição Federal.

 

Esboça assim a fundação de um Direito Civil Constitucional, "um Direito Civil efetivamente transformado pela normativa constitucional"[40], como propõe a autora.

Há nosso ordenamento de render-se perante a supremacia da Constituição como "coordenadora" de todo o sistema jurídico, não só do Direito Civil mas dos demais campos. Assim, ao se criarem novas áreas de especialização, fundadas em leis especiais, a exemplo das locações, da defesa do consumidor, da proteção ao meio ambiente, e mesmo da criança e do adolescente, não podemos nos abstrair dos princípios constitucionais que orientam todo o ordenamento jurídico. É nesta nova dimensão que colocamos o direito da criança e do adolescente, orientada por princípios constitucionais e entremeado de regras públicas e privadas.

 

Assim, tratando o direito da criança e do adolescente enquanto calcado em direitos fundamentais constitucionalmente consolidados, defende-se a impossibilidade de emenda que fira a estrutura especialmente dedicada a este sujeitos considerados pelo legislador em especial condição.

 

Postula-se ainda a definitiva consagração do melhor interesse da criança como regedor de toda forma de tratamento à criança e ao adolescente, seja este pautado pela conduta do Executivo, Legislativo ou Judiciário. Somente assim poderá o direito da criança e do adolescente almejar para o terceiro milênio a reconciliação do ser humano, com ele próprio e com a realidade do novo tempo.

 

Ao fim e ao cabo, a história da humanidade não é uma história de crianças.

 

Estas sempre foram vistas restritamente como sujeitos em potencial. Cabe ao aplicador do direito consolidar na prática uma nova forma, com a qual a criança e o adolescente são vislumbrados por meio da Constituição de 1988. Em meio ao naufrágio de todas as utopias, acreditamos que falar nos direitos infanto-juvenis é garantir simplesmente o direito de serem crianças e adolescentes, reconhecidas suas particularidades como pessoas humanas.

 

 

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NOTAS

 

[1] Advogada e Professora de Direito da Puc/Rio e UERJ. Parte do presente trabalho foi fundado em pesquisa desenvolvida com a Mestranda de Direito Constitucional da Puc/Rio CAROLINA DE CAMPOS MELO, publicado, em parte, como trabalho conjunto intitulado “Infância e Juventude: os direitos fundamentais e os princípios constitucionais consolidados na Constituição de 1988”, in Revista Trimestral de Direito Civil, III vol. Rio de Janeiro: PADMA, julho/setembro, 2000, pp. 89/109

 

[2] PONTES Jr., Felício, in Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente: uma modalidade de exercício do Direito de Participação Política- Fatores determinantes e modo de atuação, 1992, pp. 24/25

 

[3] MARQUES, Marcio Thadeu Silva, “Melhor Interesse da criança: do Subjetivismo ao Garantismo”, in O melhor interesse da criança: um debate interdisciplinar,  p. 468.

 

[4] ARIÉS, Philippe. História Social da Criança e da Família, Rio de Janeiro: Guanabara, 1981, p.156.

 

[5] NOVAES, Maria Helena, “O 'maior interesse' da criança e do adolescente face às suas necessidades biopsicossociais - uma questão psicológica”, in O melhor interesse da criança: um debate interdisciplinar, 2000, p. 527.

 

[6]  KRAMER, Sônia, in A Política do Pré-escolar no Brasil: A Arte do disfarce. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990, p. 15.

 

[7]  KRAMER, Sônia, op. cit. p. 21.

 

[8] COSTA, Antônio Carlos Gomes da, in Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, 1992 , p. 39.

 

[9]  VERCELONE, Paolo, in Estatuto da Criança e do Adolescente comentado, 1992, pp. 18/19.

 

[10] ALTOÉ, Sônia, “A psicanálise pode ser de algum interesse no trabalho institucional com crianças e adolescentes?”, in Sujeito do Direito, Sujeito do Desejo, 1999. p. 61.

 

[11]  ALTOÉ, Sônia, op. cit. p. 62.

 

[12]  LAHALLE, Annina, “O direito dos menores e sua e sua evolução face às regras internacionais”, in Sujeito do Direito, Sujeito do Desejo, 1999. pp. 98/99.

 

[13]  DALLARI, Dalmo de Abreu e KORCZAK, Janusz, in O direito da criança ao respeito. Coleção Novas buscas em Educação, 1986.

 

[14]  DALLARI, Dalmo de Abreu e KORCZAK, Janusz, op. cit. p.21.

[15]  DALLARI, Dalmo de Abreu e KORCZAK, Janusz, op. cit. p. 27.

 

[16]  DALLARI, Dalmo de Abreu e KORCZAK, Janusz, op. cit. p. 35.

 

[17]  DALLARI, Dalmo de Abreu e KORCZAK, Janusz, op. cit. p. 47.

 

[18]  DALLARI, Dalmo de Abreu e KORCZAK, Janusz, op. cit. p. 61.

 

[19] ARRUDA, Kátia Magalhães, “O trabalho de crianças no Brasil e o Direito Fundamental à Infância”, in Dos Direitos Humanos aos Direitos Fundamentais,

1997, p.105.

 

[20]  SILVA, José Afonso da, Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1996. p.  179-180.

 

[21] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Lisboa: Almedina, 1999, p. 353.

 

[22]  O poder de revisão estabelecido pela Constituição de 1976 deve ser entendido da seguinte forma:

1) estabeleceu-se, na versão originária, um período inicial de quatro anos durante o qual não seriam admissíveis quaisquer alterações (art. 284 /1, conjugado com o art 194 / 1, na redação primitiva);

2) fixou-se o espaço temporal de 5 anos como o lapso de tempo que deve mediar entre as revisões ordinárias da Constituição (art 284 / 1); e

3) aceitou-se a revisão extraordinária em qualquer momento (art. 284 / 2), desde que se satisfaçam os restantes requisitos exigidos (maioria qualificada de 4/5). In CANOTILHO, op. cit. p. 993.

Cabe ressaltar que se utilizam outros termos no constitucionalismo brasileiro. Deriva do poder constituinte o poder de reforma, entendido em sua natureza genérica; este pôde ter sido exercido por revisão constitucional, entendida como modificação relativamente ampla - o art. 3º do A.C.D.T. abriu a possibilidade de revisão no ano de 1993 - , ou por emenda, concebida como ajustes mais específicos, desde que seguidos os requisitos estabelecidos pelo art. 60 CF.

 

[23]  CANOTILHO, J.J., op. cit. p. 355.

 

[24]  SARLET, I., op. cit. p. 85.

 

[25]  CANOTILHO, J.J. op. cit. p. 380.

 

[26]  SARLET, I.  op. cit. p. 124.

 

[27] Com o intuito de valorizar a tarefa de fôlego realizada por parte de SARLET de enumerar os diversos direitos fundamentais situados fora do catálogo, passamos a expor seu resultado: Os direitos de igual acesso aos cargos públicos (art. 37, inc. I); os direitos de associação sindical e de greve dos servidores públicos (art. 37, inc. VI e VII), o direito dos servidores públicos à estabilidade no cargo (art. 41) – não mais existente devido à Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998; o direito à legitimação ativa para a iniciativa popular legislativa (art. 61, parágrafo 2º); a garantia de publicidade e fundamentação das decisões judiciais (art. 93, inc. IX); limitações constitucionais ao poder de tributar (art. 150, inc. I a IV) – confirmado pelo Supremo Tribunal Federal na A.D.In nº 939 – 7 de 1994; direito à manifestação do pensamento, criação, expressão e informação (art. 220); a igualdade de direitos e obrigações entre os cônjuges (art. 226, parágrafo 5º); o direito dos filhos a tratamento igualitário e não discriminatório (art. 227, parágrafo 6º). No tocante à ordem social, acrescenta ainda o direito à utilização gratuita dos transportes públicos coletivos para pessoas com mais de 65 anos de idade (art. 230, parágrafo 2º), o direito à proteção do meio ambiente (art. 225), os direitos à previdência social e à aposentadoria (arts. 201 e 202); bem como o

direito à assistência social. Por fim, adiciona o direito à saúde (art. 196), à educação (art. 205); ao ensino público fundamental obrigatório e gratuito (art. 208, inc. I); a garantia do exercício dos direitos culturais (art. 215); o direito ao planejamento familiar incentivado pelo Estado (art. 226, § 7º); à proteção da entidade familiar (art. 226), bem como o direito à proteção das crianças e dos adolescentes (art. 227). Op. cit. p. 122 a 124.

 

[28] Ressalta ainda o autor que outra interpretação levaria necessariamente à desconsideração dos direitos fundamentais previstos nos Pactos Internacionais da O.N.U. sobre direitos civis e políticos e sobre os direitos econômicos, sociais e culturais, ambos de 1966, bem como na Convenção Americana sobre Direitos Humanos da O.E.A. (1969), apenas para citar alguns dos mais relevantes nesta matéria. (p. 125).

 

[29] BONNET, Michel, “Convention on the Rights of the Child”, in Second Asian Regional Conference on child abuse and neglect, p. 71.

 

[30] O artigo “Is Law a system of rules?” foi primeiramente publicado em The Model of Rules, no ano de 1967. Reimpresso em 1977 para a coletânea “The Philosophy of Law”, editada pelo autor, foi revisitado e integrado a um de seus livros mais importantes: Taking Rights Seriously, de 1977/78.

Em contundente crítica ao Positivismo Jurídico, pretende o autor afirmar a existência de princípios na sistemática jurídica norte-americana, os quais acirram conteúdo de moralidade. Relembra assim o julgamento Riggs V. Palmers, ocorrido na Corte de Nova Iorque em 1889, no qual restou decidida a exclusão de um dos legatários contemplados no testamento, já que este teria sido responsável pelo assassinato do testador. Afinal, como considera DWORKIN, não seria permitido o benefício próprio por meio fraudulento.

 

[31] ALEXY, Robert, Teoria de los derechos fundamentales, Madrid: Centro de Estúdios Constitucionales. 1986. p. 87.

 

[32]  Idem, p. 86.

 

[33] CANOTILHO, J.J., op. cit. p. 1087 e 1088. O constitucionalista acompanha a discussão apresentada por Ronald DWORKIN e Robert ALEXY. Na doutrina brasileira, cabe destaque ao capítulo “Dos Princípios Gerais de Direito aos Princípios Constitucionais” de autoria de Paulo BONAVIDES em seu Curso de Direito Constitucional.

 

[34] SILVA PEREIRA, Tânia da, O melhor interesse da criança: um debate interdisciplinar, Rio de Janeiro: Renovar. 1999.

 

[35] O texto original da Declaração assim dispõe: “The child shall enjoy special protection, and shall be given opportunities and facilities, by law and by other means, to enable him to develop physically, mentally, morally, spiritually and socially in a healthy and normal manner and in conditions of freedom and dignity. In the enactment of laws for this purpose, the best interests of the child shall be the paramount consideration”.

 

[36] O’DONNELL, Daniel, A Convenção sobre os Direitos da Criança: Estrutura e Conteúdo. Infância, Boletin del IIN, nº 230, tomo 63, Montevideo, 1990. p. 11.

 

[37] O art. 225 CC reflete a nítida intenção do legislador em proteger os interesses patrimoniais dos menores sob o Pátrio Poder. O inventário dos bens do falecido identificará aqueles que compõem a meação do cônjuge sobrevivente e aqueles pertencentes aos filhos. É também flagrante a intenção em se proteger os interesses dos descendentes incapazes ao privar o progenitor do usufruto do Pátrio Poder, caso este não faça o inventário e promova a partilha. O art. 215 CC demonstra que as rígidas regras pertinentes à validade dos atos jurídicos foram amenizadas em nome da unidade familiar. Quis o legislador proteger a criança concebida no casamento, ainda que marcado pelo vício decorrente da idade. Assim, diz a lei que por defeito de idade não se anulará o casamento de que resultou gravidez. (SILVA PEREIRA. op. cit. p. 27 e 28).

 

[38]  Entre as várias formas de violência, deter-nos-emos nas situações especiais

carecedoras de tratamento jurídico e interdisciplinar e de qualificação adequada, as quais envolvem e transcendem os conceitos penais de Estupro (art. 213 do Código Penal), Atentado violento ao pudor (art. 214, CP) e crimes correlatos, a exemplo do Lenocínio (art. 227, CP), Favorecimento da prostituição (art. 228, CP), Manutenção de Casa de Prostituição (art.229, CP), Rufianismo (art. 230, CP), Tráfico de mulheres (art. 231, CP) e Abandono moral (art. 247, II, CP).

 

[39] MORAES, Maria Celina Bodin de, “A caminho de um direito civil constitucional”, in Revista de Direito Civil nº 65. p. 21/32. Julho/setembro. 1993, p. 22.

 

[40] Idem. p. 29.