LEI Nº 8.974, DE 5 DE JANEIRO DE 1995
Regulamenta os incisos II e V do §
1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas para o uso das
técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de organismos
geneticamente modificados, autoriza o Poder Executivo a criar, no âmbito da
Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança,
e dá outras providências.
O
PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que
o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Esta Lei estabelece normas de
segurança e mecanismos de fiscalização no uso das técnicas de engenharia
genética na construção, cultivo, manipulação, transporte, comercialização,
consumo, liberação e descarte de organismo geneticamente modificado (OGM),
visando a proteger a vida e a saúde do homem, dos animais e das plantas, bem
como o meio ambiente.
Art 1º A - (Vide Medida Provisória nº
2.191-9, de 23.8.2001)
Art 1º B - (Vide Medida Provisória nº
2.191-9, de 23.8.2001)
Art 1º C - (Vide Medida Provisória nº
2.191-9, de 23.8.2001)
Art 1º D - (Vide Medida Provisória nº
2.191-9, de 23.8.2001)
Art. 2º As atividades e projetos,
inclusive os de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico e de
produção industrial que envolvam OGM no território
brasileiro, ficam restritos ao âmbito de entidades de direito público ou
privado, que serão tidas como responsáveis pela obediência aos preceitos desta
Lei e de sua regulamentação, bem como pelos eventuais efeitos ou conseqüências
advindas de seu descumprimento.
§ 1º Para os fins desta Lei
consideram-se atividades e projetos no âmbito de entidades como sendo aqueles
conduzidos em instalações próprias ou os desenvolvidos alhures sob a sua
responsabilidade técnica ou científica.
§ 2º As atividades e projetos de que
trata este artigo são vedados a pessoas físicas enquanto agentes autônomos
independentes, mesmo que mantenham vínculo empregatício ou qualquer outro com
pessoas jurídicas.
§
3º As organizações públicas e privadas, nacionais, estrangeiras ou
internacionais, financiadoras ou patrocinadoras de atividades ou de projetos
referidos neste artigo, deverão certificar-se da idoneidade técnico-científica
e da plena adesão dos entes financiados, patrocinados, conveniados ou
contratados às normas e mecanismos de salvaguarda previstos nesta Lei, para o
que deverão exigir a apresentação do Certificado de Qualidade em Biossegurança de que trata o art. 6º,
inciso XIX, sob pena de se tornarem co-responsáveis pelos eventuais
efeitos advindos de seu descumprimento.
Art. 3º Para os efeitos desta Lei,
define-se:
I - organismo - toda entidade biológica
capaz de reproduzir e/ou de transferir material
genético, incluindo vírus, prions e outras classes
que venham a ser conhecidas;
II - ácido desoxirribonucléico (ADN),
ácido ribonucléico (ARN) - material genético que contém informações
determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência;
III - moléculas de ADN/ARN
recombinante - aquelas manipuladas fora das células
vivas, mediante a modificação de segmentos de ADN/ARN
natural ou sintético que possam multiplicar-se em uma
célula viva, ou ainda, as moléculas de ADN/ARN
resultantes dessa multiplicação. Consideram-se, ainda, os segmentos de ADN/ARN sintéticos equivalentes aos de ADN/ARN
natural;
IV - organismo geneticamente modificado
(OGM) - organismo cujo material genético (ADN/ARN)
tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética;
V - engenharia genética - atividade de
manipulação de moléculas ADN/ARN recombinante.
Parágrafo único. Não são considerados
como OGM aqueles resultantes de técnicas que impliquem a introdução direta, num
organismo, de material hereditário, desde que não envolvam a utilização de
moléculas de ADN/ARN recombinante
ou OGM, tais como: fecundação in vitro, conjugação, transdução, transformação, indução poliplóide e qualquer
outro processo natural.
Art. 4º Esta Lei não se aplica quando a
modificação genética for obtida através das seguintes técnicas, desde que não
impliquem a utilização de OGM como receptor ou doador:
I - mutagênese;
II - formação e utilização de células
somáticas de hibridoma animal;
III - fusão celular, inclusive a de
protoplasma, de células vegetais, que possa ser produzida mediante métodos
tradicionais de cultivo;
IV - autoclonagem
de organismos não-patogênicos que se processe de maneira natural.
Art. 5º (VETADO)
Art. 6º (VETADO)
Art. 7º Caberá, dentre outras
atribuições, aos órgãos de fiscalização do Ministério da Saúde, do Ministério
da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária e do Ministério do Meio
Ambiente e da Amazônia Legal, dentro do campo de suas competências, observado o
parecer técnico conclusivo da CTNBio e os mecanismos
estabelecidos na regulamentação desta Lei: (Vide Medida Provisória nº 2.191-9,
de 23.8.2001)
I - (VETADO)
II - a fiscalização e a monitorização de todas as atividades e projetos
relacionados a OGM do Grupo II; (Vide Medida Provisória nº 2.191-9, de
23.8.2001)
III - a emissão do registro de produtos
contendo OGM ou derivados de OGM a serem comercializados para
uso humano, animal ou em plantas, ou para a liberação no meio ambiente;
IV - a expedição de autorização para o
funcionamento de laboratório, instituição ou empresa que desenvolverá
atividades relacionadas a OGM;
V - a emissão de autorização para a
entrada no País de qualquer produto contendo OGM ou derivado de OGM;
VI - manter cadastro de todas as
instituições e profissionais que realizem atividades e projetos relacionados a
OGM no território nacional;
VII - encaminhar à
CTNBio, para emissão de parecer técnico, todos os
processos relativos a projetos e atividades que envolvam OGM;
VIII - encaminhar para publicação no
Diário Oficial da União resultado dos processos que lhe forem submetidos a
julgamento, bem como a conclusão do parecer técnico;
IX - aplicar as penalidades de que
trata esta Lei nos arts. 11 e 12.
X - (Vide Medida Provisória nº 2.191-9,
de 23.8.2001)
Art. 8º É vedado, nas atividades
relacionadas a OGM:
I - qualquer manipulação genética de
organismos vivos ou o manejo in vitro de ADN/ARN natural ou recombinante,
realizados em desacordo com as normas previstas nesta Lei;
II - a manipulação genética de células
germinais humanas;
III - a intervenção em material
genético humano in vivo, exceto para o tratamento de defeitos genéticos,
respeitando-se princípios éticos, tais como o princípio de autonomia e o
princípio de beneficência, e com a aprovação prévia da CTNBio;
IV - a produção, armazenamento ou
manipulação de embriões humanos destinados a servir como material biológico
disponível;
V - a intervenção in vivo em material
genético de animais, excetuados os casos em que tais intervenções se constituam
em avanços significativos na pesquisa científica e no desenvolvimento
tecnológico, respeitando-se princípios éticos, tais como o princípio da
responsabilidade e o princípio da prudência, e com aprovação prévia da CTNBio;
VI - a liberação ou o descarte no meio
ambiente de OGM em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e constantes na regulamentação desta Lei.
§ 1º Os produtos contendo OGM,
destinados à comercialização ou industrialização, provenientes de outros
países, só poderão ser introduzidos no Brasil após o parecer prévio conclusivo
da CTNBio e a autorização do órgão de fiscalização
competente, levando-se em consideração pareceres técnicos de outros países,
quando disponíveis.
§ 2º Os produtos
contendo OGM, pertencentes ao Grupo II conforme definido no Anexo I
desta Lei, só poderão ser introduzidos no Brasil após o parecer prévio
conclusivo da CTNBio e a autorização do órgão de
fiscalização competente.
§ 3º (VETADO)
Art. 9º Toda entidade que utilizar
técnicas e métodos de engenharia genética deverá criar uma Comissão Interna de Biossegurança (CIBio), além de
indicar um técnico principal responsável por cada projeto específico.
Art. 10. Compete à Comissão Interna de Biossegurança (CIBio) no âmbito
de sua Instituição:
I - manter informados os trabalhadores,
qualquer pessoa e a coletividade, quando suscetíveis de serem afetados pela
atividade, sobre todas as questões relacionadas com a saúde e a segurança, bem
como sobre os procedimentos em caso de acidentes;
II - estabelecer programas preventivos
e de inspeção para garantir o funcionamento das instalações sob sua
responsabilidade, dentro dos padrões e normas de biossegurança,
definidos pela CTNBio na regulamentação desta Lei;
III - encaminhar à
CTNBio os documentos cuja relação será estabelecida
na regulamentação desta Lei, visando a sua análise e a autorização do órgão
competente quando for o caso;
IV - manter registro do acompanhamento
individual de cada atividade ou projeto em desenvolvimento envolvendo OGM;
V - notificar à
CTNBio, às autoridades de Saúde Pública e às
entidades de trabalhadores, o resultado de avaliações de risco a que estão
submetidas as pessoas expostas, bem como qualquer acidente ou incidente que
possa provocar a disseminação de agente biológico;
VI - investigar a ocorrência de
acidentes e as enfermidades possivelmente relacionados a OGM, notificando suas
conclusões e providências à CTNBio.
Art. 11. Constitui infração, para os
efeitos desta Lei, toda ação ou omissão que importe na inobservância de
preceitos nela estabelecidos, com exceção dos §§ 1º e 2º e dos incisos de II a
VI do art. 8º, ou na desobediência às determinações de caráter normativo dos
órgãos ou das autoridades administrativas competentes.
Art. 12. Fica a CTNBio
autorizada a definir valores de multas a partir de 16.110,80 UFIR, a serem
aplicadas pelos órgãos de fiscalização referidos no art. 7º,
proporcionalmente ao dano direto ou indireto, nas seguintes infrações:
I - não obedecer às normas e aos
padrões de biossegurança vigentes;
II - implementar projeto sem
providenciar o prévio cadastramento da entidade dedicada à pesquisa e
manipulação de OGM, e de seu responsável técnico, bem como da CTNBio;
III - liberar no meio ambiente qualquer
OGM sem aguardar sua prévia aprovação, mediante publicação no Diário Oficial da
União;
IV - operar os laboratórios que
manipulam OGM sem observar as normas de biossegurança
estabelecidas na regulamentação desta Lei;
V - não investigar, ou fazê-lo de forma
incompleta, os acidentes ocorridos no curso de pesquisas e projetos na área de
engenharia genética, ou não enviar relatório respectivo à autoridade competente
no prazo máximo de 5 (cinco) dias a contar da data de transcorrido o evento;
VI - implementar projeto sem manter
registro de seu acompanhamento individual;
VII - deixar de notificar, ou fazê-lo
de forma não imediata, à CTNBio
e às autoridades da Saúde Pública, sobre acidente que possa provocar a
disseminação de OGM;
VIII - não adotar os meios necessários
à plena informação da CTNBio, das autoridades da
Saúde Pública, da coletividade, e dos demais empregados da instituição ou
empresa, sobre os riscos a que estão submetidos, bem como os procedimentos a
serem tomados, no caso de acidentes;
IX - qualquer manipulação genética de
organismo vivo ou manejo in vitro de ADN/ARN natural ou recombinante,
realizados em desacordo com as normas previstas nesta Lei e na sua
regulamentação.
§ 1º No caso de reincidência, a multa
será aplicada em dobro.
§ 2º No caso de infração continuada,
caracterizada pela permanência da ação ou omissão inicialmente punida, será a
respectiva penalidade aplicada diariamente até cessar sua causa, sem prejuízo
da autoridade competente, podendo paralisar a atividade imediatamente e/ou interditar o laboratório ou a instituição ou empresa
responsável.
Art. 13. Constituem crimes:
I - a manipulação genética de células
germinais humanas;
II - a intervenção em material genético
humano in vivo, exceto para o tratamento de defeitos genéticos, respeitando-se
princípios éticos tais como o princípio de autonomia e o princípio de beneficência,
e com a aprovação prévia da CTNBio;
Pena - detenção de três meses a um ano.
§ 1º Se resultar em:
a) incapacidade para as ocupações
habituais por mais de trinta dias;
b) perigo de vida;
c) debilidade permanente de membro,
sentido ou função;
d) aceleração de parto;
Pena - reclusão de um a cinco anos.
§ 2º Se resultar em:
a) incapacidade permanente para o
trabalho;
b) enfermidade incurável;
c) perda ou inutilização
de membro, sentido ou função;
d) deformidade permanente;
e) aborto;
Pena - reclusão de dois a oito anos.
§ 3º Se resultar em morte;
Pena - reclusão de seis a vinte anos.
III - a produção, armazenamento ou
manipulação de embriões humanos destinados a servirem como material biológico
disponível;
Pena - reclusão de seis a vinte anos.
IV - a intervenção in vivo em material
genético de animais, excetuados os casos em que tais intervenções se constituam
em avanços significativos na pesquisa científica e no desenvolvimento
tecnológico, respeitando-se princípios éticos, tais como o princípio da
responsabilidade e o princípio da prudência, e com aprovação prévia da CTNBio;
Pena - detenção de três meses a um ano;
V - a liberação ou o descarte no meio
ambiente de OGM em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e constantes na regulamentação desta Lei.
Pena - reclusão de um a três anos;
§
1º Se resultar em:
a) lesões corporais leves;
b) perigo de vida;
c) debilidade permanente de membro,
sentido ou função;
d) aceleração de parto;
e) dano à propriedade alheia;
f) dano ao meio ambiente;
Pena - reclusão de dois a cinco anos.
§ 2º Se resultar em:
a) incapacidade permanente para o
trabalho;
b) enfermidade incurável;
c) perda ou inutilização
de membro, sentido ou função;
d) deformidade permanente;
e) aborto;
f) inutilização
da propriedade alheia;
g) dano grave ao meio ambiente;
Pena - reclusão de dois a oito anos;
§ 3º Se resultar em morte;
Pena - reclusão de seis a vinte anos.
§ 4º Se a liberação, o descarte no meio
ambiente ou a introdução no meio de OGM for culposo:
Pena - reclusão de um a dois anos.
§ 5º Se a liberação, o descarte no meio
ambiente ou a introdução no País de OGM for culposa, a pena será aumentada de
um terço se o crime resultar de inobservância de regra técnica de profissão.
§ 6º O Ministério Público da União e
dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal
por danos causados ao homem, aos animais, às plantas e ao meio ambiente, em
face do descumprimento desta Lei.
Art. 14. Sem obstar a aplicação das
penas previstas nesta Lei, é o autor obrigado, independente
da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio
ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.
Disposições
Gerais e Transitórias
Art. 15. Esta Lei será regulamentada no
prazo de 90 (noventa) dias a contar da data de sua publicação.
Art. 16. As entidades que estiverem
desenvolvendo atividades reguladas por esta Lei na data de sua publicação,
deverão adequar-se às suas disposições no prazo de cento e vinte dias, contados
da publicação do decreto que a regulamentar, bem como apresentar relatório circunstanciado
dos produtos existentes, pesquisas ou projetos em andamento envolvendo OGM.
Parágrafo único. Verificada a
existência de riscos graves para a saúde do homem ou dos animais, para as
plantas ou para o meio ambiente, a CTNBio determinará
a paralisação imediata da atividade.
Art. 17. Esta Lei entra em vigor na
data de sua publicação.
Art. 18. Revogam-se as disposições em
contrário.
Brasília, 5
de janeiro de 1995; 174º da Independência e 107º da República.
FERNANDO
HENRIQUE CARDOSO
Nelson
Jobim
José
Eduardo De Andrade Vieira
Paulo
Renato Souza
Adib Jatene
José Israel Vargas
Gustavo Krause
Este texto
não substitui o publicado no D.O.U. de 6.1.1995
ANEXO I
Para
efeitos desta Lei, os organismos geneticamente modificados classificam-se da
seguinte maneira:
Grupo I:
compreende os organismos que preenchem os seguintes critérios:
A.
Organismo receptor ou parental:
-
não-patogênico;
- isento de
agentes adventícios;
- com amplo
histórico documentado de utilização segura, ou a incorporação de barreiras
biológicas que, sem interferir no crescimento ótimo em reator ou fermentador, permita uma sobrevivência e multiplicação
limitadas, sem efeitos negativos para o meio ambiente.
B. Vetor/inserto:
- deve ser
adequadamente caracterizado e desprovido de seqüências nocivas conhecidas;
- deve ser
de tamanho limitado, no que for possível, às seqüências genéticas necessárias
para realizar a função projetada;
- não deve
incrementar a estabilidade do organismo modificado no meio ambiente;
- deve ser
escassamente mobilizável;
- não deve
transmitir nenhum marcador de resistência a organismos que, de acordo com os
conhecimentos disponíveis, não o adquira de forma natural.
C.
Organismos geneticamente modificados:
-
não-patogênicos;
- que
ofereçam a mesma segurança que o organismo receptor ou parental no reator ou fermentador, mas com sobrevivência e/ou
multiplicação limitadas, sem efeitos negativos para o meio ambiente.
D. Outros organismos geneticamente modificados que poderiam
incluir-se no Grupo I, desde que reúnam as condições estipuladas no item C
anterior:
-
microorganismos construídos inteiramente a partir de um único receptor
procariótico (incluindo plasmídeos e vírus endógenos)
ou de um único receptor eucariótico (incluindo seus cloroplastos, mitocôndrias
e plasmídeos, mas excluindo os vírus) e organismos
compostos inteiramente por seqüências genéticas de diferentes espécies que
troquem tais seqüências mediante processos fisiológicos conhecidos.
Grupo II: todos aqueles não incluídos no Grupo I.