DA ENTRADA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SALAS DE CINEMA

 

 

                                                                       Roberto Barbosa Alves

                           

 

Com alguma freqüência são postos em questão os limites eventualmente existentes à entrada de crianças e adolescentes em salas de cinema.

 

Esse acesso está, a meu ver, disciplinado por regras indicativas e regras proibitivas. A primeira das regras meramente referenciais está registrada no texto constitucional. É que o artigo 21, XVI, da Constituição Federal, atribuiu à União a regulamentação das diversões públicas, mas apenas para efeito indicativo. Com idêntica natureza sobreveio a Portaria nº 796, de 8 de setembro de 2000, do Ministério da Justiça, que classificou os espetáculos públicos em livres ou inadequados para menores de 12 (doze), 14 (catorze), 16 (dezesseis) ou 18 (dezoito) anos. Também é simplesmente indicativo o artigo 74 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que determina ao Poder Público que regulamente as diversões e os espetáculos públicos, com a finalidade de informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada.

 

Como se vê, tais dispositivos não contêm qualquer espécie de proibição. Cuida-se de normas de mera recomendação: limitando-se a estabelecer a necessidade de alguma classificação, pretendem que se observem algumas balizas que sirvam de orientação aos estabelecimentos e aos pais ou responsáveis. Tal natureza também se extrai da idéia de inadequação, explicitamente reproduzida nos dispositivos em análise. O termo conduz somente à falta de ajuste entre a idade do assistente e o conteúdo da programação; mas dele também não se extrai a noção de proibição. Tampouco se refere o caput do artigo 75 do Estatuto da Criança e do Adolescente a alguma proibição. Antes, trata-se de norma que garante o acesso de crianças e adolescentes aos espetáculos adequados, sem restringir o acesso àqueles que se considerem inadequados.

A norma proibitiva mais explícita aparece no parágrafo único do artigo 75 do  ECA: crianças menores de 10 (dez) anos só acedem aos locais de apresentação ou exibição quando acompanhadas dos pais ou responsáveis. O acesso de pessoas desacompanhadas, que tenham entre 10 (dez) e 18 (dezoito) anos, aos mesmos espetáculos depende da regulamentação prevista no artigo 149 do Estatuto da Criança e do Adolescente. É que a lei se refere ao acesso de crianças e adolescentes a estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão, atribuindo ao Juiz da Infância e da Juventude a tarefa de disciplinar a questão, de acordo com as peculiaridades de cada caso. A propósito, a única interpretação razoável do texto legal é aquela que entende o termo “estúdios” como referente àqueles locais de apresentação de filmes, peças teatrais ou programas de rádio e televisão, e não à participação de criança e adolescente em tais programas, que vem regulada pelo inciso II do mesmo artigo 149. Partindo-se da idéia de que a lei não deve conter termos inúteis ou supérfluos, parece evidente que o inciso I, e, do mesmo artigo, não faz referência à mesma situação. Note-se que o dispositivo permite ao juiz a exclusiva regulamentação do acesso de crianças e adolescentes desacompanhados dos pais ou responsável. Contrario sensu, sempre será possível o acesso de criança e adolescente, acompanhado dos pais ou responsável, a qualquer espetáculo público.

 

As várias situações que aparentemente possíveis podem, portanto, ser assim resolvidas: a) o acesso de criança e adolescente, desacompanhado, a exibição de película cinematográfica depende, antes de mais nada, de disciplina através de portaria judicial ou de autorização por alvará, caso a caso; b) a classificação etária é mera recomendação, que não constitui proibição de acesso; onde não houver regulamentação judicial, qualquer pessoa maior de 10 (dez) anos de idade terá liberdade de acesso, ainda que desacompanhada dos pais ou responsável, às salas de cinema; c) é sempre vedado o ingresso de criança de menos de 10 (dez) anos, desacompanhada dos pais ou responsáveis, nos locais de exibição, independentemente de qualquer regulamentação adotada nas hipóteses concretas; d) crianças a partir dos 10 (dez) anos e adolescentes, desde que não haja regulamentação em sentido contrário pelo Juízo mediante portaria ou alvará, terão acesso livre aos locais de exibição; e) em qualquer caso, as casas de espetáculo estarão sujeitas às penalidades dos artigos 252, 253, 255 e 258, do Estatuto da Criança e do Adolescente; f) os pais ou responsáveis deverão velar pelo adequado desempenho das obrigações inerentes ao pátrio poder, sob as penas da lei, observados em especial os artigos 3º, 4º e 70, do Estatuto da Criança e do Adolescente.