INFLUÊNCIAS DE UM PROGRAMA DE ATIVIDADES DE LAZER NO COMPORTAMENTO AGRESSIVO DE CRIANÇAS INSTITUCIONALIZADAS
Monitor da
Casa de Passagem.
Como
monitor da Casa de Passagem, abrigo da Fundação de Assistência Social e
Cidadania de Porto Alegre (FASC), pude perceber que o comportamento agressivo
permeava, muitas vezes, as relações entre as próprias crianças abrigadas e
entre elas e os monitores.
A
instituição acima citada atende crianças vítimas de violência física e sexual,
e, excepcionalmente, atendeu crianças em situação de abandono, em regime de
tempo integral, ficando essas abrigadas, até que haja uma resolução do seu
caso.
Existe uma
concordância entre os profissionais da área de saúde e também da assistência
social, que a potencialização da agressividade é um
sintoma comum a meninos e meninas vitimados física e sexualmente. Com isso,
torna-se fundamental que se busquem alternativas que amenizem o comportamento
agressivo das crianças institucionalizadas.
Embasado,
teoricamente, em autores como Becker Jr., Samulsky,
Silva, Cratty, Marcellino,
Dias e outros, buscou-se o planejamento de um programa de atividades de lazer,
que teria como objetivo diminuir o potencial agressivo das crianças
institucionalizadas, fazendo com que as mesmas trabalhassem sua agressividade
em esportes com regras estruturadas, claras e definidas, e atividades como
passeios e leituras, que lhes proporcionassem uma melhora da auto-estima, da
cooperação, da consciência crítica e respeito pelo espaço do outro.
O estudo
sustenta a hipótese de que as crianças institucionalizadas, por serem vítimas
de violência física, sexual, têm uma maior propensão a
externar seu comportamento agressivo, e que um programa de atividades de lazer
canalizaria o aspecto nocivo desse comportamento, para que o mesmo não
trouxesse prejuízos à criança e aos outros.
Com base no
acima exposto, esse estudo objetiva trazer
contribuições à sociedade, na área da atividade física e do lazer relacionados
à agressividade em crianças institucionalizadas, em virtude de existirem poucos
trabalho com a população referida.
Segundo Shilling Apud Krug (1986): “A
agressividade é a disposição relativamente constante ao comportamento
agressivo. É a ação agressiva expressa, causando prejuízo de alguma forma a
outro, a alguma coisa ou a si mesmo”.
Para Lobo
(1973): “A agressividade é a tendência ao ataque ou à destruição, sendo que o
indivíduo é agressivo quando habitualmente humilha ou fere outro indivíduo”.
Já Gabler Apud Samulsky (1992)
considera uma conduta agressiva: “quando uma pessoa desrespeita as normas
sociais e pretende prejudicar outra no sentido de provocar um prejuízo ou dano
pessoal, no qual pode resultar alguma forma de lesão corporal ou dor psíquica”.
Teoria dos
instintos e impulsos: Segundo Becker Jr. (2000), Freud (1913-1930) explica a
agressão como ligada à natureza biológica do ser humano. Freud, inicialmente,
denominou agressão como um instinto de morte através do qual o homem tendia a
sua auto-destruição. Esse instinto de morte poderia
ser dirigido para o exterior (agressão extrapunitiva)
ou interior (agressão intrapunitiva). Se o sujeito
não dirige esta raiva para fora, pode ocorrer uma auto-agressão (suicídio,
doença psíquica).
Teoria da
frustração-agressão: Berkowitz Apud Becker Jr. (2000)
ao explicar essa teoria, afirma “que a frustração é um fator estimulante de um
estado emocional que pode ser de raiva, criando uma predisposição para um ato
agressivo”. Teoria da aprendizagem social ou aprendizagem através de modelos:
para Samulsky (1992) o processo de aprendizagem de
condutas agressivas acontece mais rápido quando se dá através da imitação de
modelos agressivos do que quando a aprendizagem se dá através do sucesso. Pais
que batem em filhos, representam modelos agressivos. Neste caso existe o perigo
de que as crianças transfiram estas condutas agressivas aprendidas a outros
momentos de suas vidas.
Teoria da
hostilidade e agressividade: segundo Zillman (1979)
um insulto físico direto ou ameaça causam reações automáticas no indivíduo,
levando a diversos graus de agressividade.
A agressão
é instrumental quando uma pessoa realiza uma conduta agressiva para alcançar
suas próprias metas. Desenvolve-se através de processos de aprendizagem social
(observação e imitação de modelos agressivos).
A agressão
é afetiva quando aparece em situações de grande carga emocional. Neste
contexto, os processos de controle cognitivo e consciente são bloqueados e a
pessoa reage de forma impulsiva, sem pensar nas conseqüências prejudiciais de
seu comportamento. A agressão afetiva pode ser dirigida a outras pessoas e
objetos, ou a si mesmo (auto-agressão), quando a pessoa tende a prejudicar-se
ou lesar-se como conseqüência de sensações de culpa e frustrações. As
principais expressões de agressão podem ser de forma gestual, física e verbal.
As
primeiras tendências agressivas do ser humano ocorrem na infância, e já na
parte final do primeiro ano de vida as crianças já demonstram tendências
agressivas, quando competem por objetos e principalmente quando ficam
frustradas. A tendência é que as crianças “lutem” em situações incertas e
permaneçam pacíficas em situações previsíveis, acolhedoras e seguras.
É,
sobretudo na infância e na adolescência que o grau de agressividade irá variar
imensamente de uma pessoa para outra, havendo profunda influência das condições
de vida do indivíduo. Por exemplo, quem é sistematicamente maltratado nos
jovens anos de vida, dificilmente mantém atitudes equilibradas em seus contatos
e quase sempre descamba para a agressividade.
Para Cratty (1984), um dos principais objetivos de muitos
esportes é o controle da agressividade, inclusive daqueles nos quais o contato
físico é premiado e também naqueles em que se pode ter uma válvula de escape,
como o arremesso de uma bola ou uma agressão do ambiente. Contudo, para que
esta agressividade seja trabalhada, sem perigo de tornar-se um comportamento
nocivo, o esporte deve ter suas regras bem claras, estruturadas e específicas.
O estatuto
da criança e do adolescente determina que: “Nenhuma criança ou adolescente será
objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão”. O código penal brasileiro considera agravante se a
vítima é menor de quatorze anos.
Segundo a
revista Retrato Social (FASC), os chamados abusos contra as crianças englobam
as seguintes situações: a violência física, que leva a lesões
físicas definidas; o abandono físico e emocional, onde irá preponderar o
não atendimento as necessidades bio-psicossociais da
criança; e a exploração sexual, na qual estão incluídos abusos por violação,
incesto ou outros de natureza sexual.
Como a Casa
de Passagem atende a crianças vítimas de violência física e sexual, e como
esses casos têm em comum o sintoma de potencializar a agressividade do
indivíduo, serão esses abordados no decorrer do estudo.
Os maus
tratos físicos são uma importante causa de deficiência e morte na infância. Na
família em que estão presentes os maus tratos físicos, a inaptação
social da mesma é patente. O adulto maltratante, geralmente, é um dos pais, na maioria das
vezes a mãe. Os pais agressores apresentam ausência de crítica e de consciência
da gravidade de seus atos. Bater nos filhos proporciona um duplo incentivo para
torná-los violentos: sem contar o sofrimento e a humilhação, as crianças vêem
um exemplo de adulto com que se identificam agindo agressivamente. Deve-se
suspeitar de maus tratos físicos quando a criança apresentar: queimaduras,
arranhões e feridas que reproduzam imagens de objetos (ex: fivela de cinturão).
O
comportamento de crianças que são cronicamente maltratadas varia de submissa,
hiper-ativa, hiper-vigilante e retraída, deprimida e hipoativa.
A vítima pode identificar-se com o agressor e tornar-se abusiva no que diz
respeito a agressões físicas, ou resignar-se a ser vítima passiva.
Sendo a
Casa de Passagem um abrigo que atende crianças que estão afastadas de sua
família, reporto-me ao texto de Winnicott (1956): “A
tendência anti-social”, onde o autor associa este tipo de tendência a uma
conseqüência da separação de um filho, principalmente em relação à mãe, em
períodos iniciais do desenvolvimento da criança, o que no caso pode ser
caracterizado como uma “privação”.
Uma criança
sofre privação, quando é privada de certas características essenciais da vida
familiar. Se o lar deixa de preencher uma função importante, a criança é
encaminhada a locais de “cuidado e proteção”, ou um lar adotivo. No caso das
crianças que participaram de atividades, as mesmas foram encaminhadas à Casa de
Passagem por serem vítimas de violência física e sexual, sendo assim separadas
de suas famílias.
Quando há
uma tendência anti-social, houve uma verdadeira privação, a perda de algo de
bom que havia sido positivo na experiência da criança até uma determinada data,
e que lhe foi retirado. A tendência anti-social implica uma reação, ao
contrário da apatia, o que significa que a criança tem uma esperança de
recuperar aquilo que perdeu. E nesse momento de esperança a criança:
• percebe
uma nova situação que contém elementos de confiabilidade;
•
experimenta um impulso, que poderia ser chamado de impulso de busca do
objetivo;
• reconhece
que a crueldade está a um passo de tornar-se uma característica e então:
– provoca o
meio ambiente em um esforço para torná-lo alerta ao perigo e fazer com que ele
se organize para tolerar a emoção;
– se a
situação se mantém, o meio ambiente deve ser repetidamente testado em termos de
sua capacidade de suportar agressão, de impedir ou reparar a destruição, de
tolerar a amolação, de reconhecer o elemento positivo da tendência anti-social,
de fornecer o objeto que deve ser buscado e encontrado.
A compreensão
de que o anti-social é uma expressão de esperança é vital para o tratamento de
crianças que mostram uma tendência anti-social.
A criança
com tendência anti-social precisa de um assessoramento, sempre lembrada de que
é querida por alguém que tenha o manejo e a tolerância para lhe mostrar o modo
correto de fazer as coisas, suprindo carências antigas, e não esperando
resultados imediatos.
A revista Retrato Social define o abuso sexual
como: “A participação de uma criança ou um adolescente menor em atividades
sexuais que não esteja apto a compreender, que sejam inapropriadas a sua idade
e ao seu desenvolvimento psicossexual, e que sofram o
mesmo por sedução ou força e que transgridam os tabus sociais”.
A vasta
maioria das crianças que sofrem abuso sexual não toma nenhum papel ativo para
iniciar o mesmo, mas todas as crianças são participantes na interação abusiva,
mesmo se são forçadas contra a sua vontade. O aspecto interacional
da participação relaciona-se ao conceito psicológico dos sentimentos como
avaliação da experiência. Eles formam a base da experiência emocional e
explicam o fato de que as crianças podem sentir-se responsáveis pelo abuso,
embora de fato, jamais possam ser responsabilizadas.
Os abusos
sexuais podem ser divididos em:
• abusos
sensoriais: pornografia, exibicionismo, linguagem sexualizada;
•
estimulação sexual: consiste em carícias inapropriadas, ou em partes
consideradas íntimas, masturbação e contatos genitais incompletos;
• ato sexual propriamente dito: onde há a realização ou a
tentativa de penetração anal ou vaginal.
A maioria
dos abusos é perpetrada por pessoa conhecida da criança, e predominam os intrafamiliares, dos quais os mais freqüentes são a relação
incestuosa pai-filha e pai-enteada.
Uma das
formas de identificar o abuso sexual é observar a presença dos seguintes sinais
físicos: hematomas, marcas de mordidas, irritação nos órgãos sexuais,
assaduras, presença de secreções, DST, aumento do orifício anal, e no caso de
meninas pode haver o rompimento do hímen. Distúrbios de comportamento como:
sonolência, perda ou excesso de apetite, enurese
noturna, pesadelos, agressividade ou apatias constantes, brincadeiras sexuais
agressivas, relutância em voltar para casa, não confiar em adultos, não
participar de atividades escolares e ter poucos amigos também podem indicar que
algo errado está acontecendo.
A criança
que foi abusada sexualmente, quando institucionalizada, tende a importunar as
outras que convivem com ela, com atitudes sexualizadas
e agressivas.
A Educação
Física por meio de suas atividades, desempenha um papel de grande importância,
procurando canalizar a agressividade perniciosa e orientar a primária (que é a
afirmação de cada um), trazendo benefícios ao próprio indivíduo. Assim,
enquanto processo individual vai proporcionar de forma construtiva o
desenvolvimento das potencialidades humanas ajudando o indivíduo a estabelecer
relações com o grupo a que pertence.
Quanto ao
esporte Lorenz Apud Krug
(1986) interpreta que: “o mesmo possibilita libertar um instinto biológico de
agressão, e que a sua função essencial é a descarga das funções agressivas,
agindo assim de uma forma catártica, aliviando a tensão de um modo social
aceitável, devendo ocorrer uma situação adequada entre a pessoa e o meio
ambiente em que esta atua”.
Sob o ponto
de vista de Manuel Sérgio Apud Dias (1996), as funções básicas da Educação
Física seriam desenvolver as atividades físicas, a ginástica, o esporte, a
recreação e as atividades complementares dentro de critérios de continuidade e
crescimento da ação educativa, preocupada em
desenvolver as potencialidades humanas e de ajudar o homem a estabelecer
relações com grupo a que pertence de forma consciente e não agressiva.
Lapierre e Auconturier
Apud Dias (1996) consideram que: “é através do domínio da agressividade que
começa a adaptação do outro, encontrando os limites dele. É também fazê-lo
encontrar seus próprios limites”.
Para que
fosse criado um programa de atividades de lazer compatível às necessidades do
grupo de crianças que delas participasse atendendo assim as exigências do
objetivo do estudo, a obra de Marcellino, “Introdução
ao estudo do lazer” (1996), foi a que mais veio ao encontro das necessidades
teórico-práticas do estudo.
Para Marcellino (1996) o descanso e o divertimento são os
valores que geralmente mais se associam ao lazer. A importância do lazer
significa considerá-lo como um tempo privilegiado para a vivência de valores
que contribuam para mudanças de ordem moral e cultural. Assim, na proposta do
referido programa, procuramos trabalhar o lazer como um instrumento que
transformasse a cultura da agressividade, através de atividades em grupo que
serão mencionadas a seguir. Além do descanso e do divertimento, outra
possibilidade que ocorre no lazer, e que normalmente não é tão perceptível, é o
desenvolvimento pessoal e social que o lazer enseja. No teatro, no turismo, na
festa, no desporto, etc., estão presentes oportunidades privilegiadas, por que
espontâneas, de tomada de contato, percepção e reflexão sobre as pessoas e as
realidades nas quais estão inseridas.
A
possibilidade de escolha das atividades e o caráter “desinteressado” de sua
prática são características básicas do lazer, assim como a satisfação e a aspiração
dos seus praticantes.
As
atividades de lazer envolvendo crianças partiram da observação dos desejos das
mesmas, sendo realizadas em diversos ambientes e diferentes formas, onde os
vários interesses que a prática do lazer envolve, formam um todo ligado e não
constituído por partes estanques.
Por esse
motivo é importante a distinção das áreas abrangidas pelos conteúdos do lazer.
A classificação mais aceita é a que distingue seis áreas fundamentais: os
interesses artísticos, os intelectuais, os físicos, os manuais, os turísticos e
os sociais. E através do conhecimento dessas áreas, foram enquadradas as
atividades que seriam realizadas conforme a preferência das crianças.
O campo do
domínio dos interesses artísticos é o imaginário das imagens, emoções e sentimentos;
seu conteúdo é estético e configura a busca da beleza e do encantamento.
Abrangem todas as manifestações artísticas.
Já nos
interesses intelectuais, o que se busca é o contato com o real, as informações
objetivas e explicações racionais. A participação em cursos ou leituras são
exemplos. Aproveitando os dias de chuva, em que os espaços para as atividades
ficavam restritos à sala de recreação do abrigo, realizava-se leitura de livros
e gibis, além de atividades como a resolução de palavras cruzadas e desenhos.
Constituem
o campo dos interesses físicos as práticas esportivas, todas as atividades onde
prevalece o movimento, ou o exercício físico, incluindo as diversas modalidades
esportivas. Nesse campo, foram trabalhadas atividades como: futebol, voleibol,
handebol, atletismo (corridas de 30m).
O que
delimita os interesses manuais é a capacidade de manipulação, quer para
transformar objetos ou materiais, quer para lidar com a natureza como a
jardinagem e o cuidado com animais.
A quebra da
rotina temporal e especial, pela busca de novas paisagens, de novas pessoas e
costumes, é a aspiração mais presente nos passeios turísticos. Os passeios e as
viagens constituem exemplos dessa atividade. Em relação a esses interesses
foram realizados passeios ao Zoológico de Sapucaia do Sul, à praia do Lami, ao Jardim Botânico de Porto Alegre, à orla do Guaíba,
a ESEF (UFRGS), ao Shopping Center Iguatemi e ao
Parque Marinha do Brasil.
O turismo,
aqui associado aos passeios realizados pelas crianças, pode der uma ocasião de
desenvolvimento pessoal, social, crítico e criativo. Baseando-se em trabalhos
do sociólogo Paulo Salles Oliveira, Marcellino cita
que: “o turismo enquanto atividade de lazer envolve três dimensões: imaginação,
ação e recordação”.
Os
interesses sociais do lazer estão relacionados com o convívio social e com o
relacionamento. Tendo em vista os conteúdos do lazer, o ideal seria que cada
pessoa praticasse atividades que abrangessem vários grupos de interesses,
procurando dessa forma, exercitar o corpo, o raciocínio, a imaginação, o
relacionamento social.
Por fim, o
primeiro e fundamental aspecto sobre a necessidade do brincar e do lazer da
criança, é a importância de uma atividade gostosa que dará prazer e felicidade.
Através do prazer, o brincar possibilita à criança a vivência de sua faixa
etária e ainda contribui, de modo significativo, para sua formação como ser
realmente humano.
Marcellino coloca os valores do lazer em
termos de esperança. Não um projeto irrealizável ou mera ilusão, mas contendo a
idéia do devir humano, projetando possibilidades de mudanças embasadas em dados
reais.
Instrumentos
de trabalho
O programa
de atividades de lazer teve duração de cinco meses (julho a dezembro de 2001),
com encontros semanais nas quintas-feiras no horário das 8h30min às 11h30min e
sextas-feiras das 15h às 18h. Participaram dezoito crianças com idades entre
sete e doze anos. As atividades foram enquadradas em uma classificação por
interesses, como citado anteriormente nesse estudo, tendo como referência Marcellino (1996).
Entre as
várias atividades escolhidas, foram realizadas as seguintes:
Passeios:
• Zoológico
de Sapucaia do Sul.
• Jardim
Botânico de Porto Alegre.
• Lami (
• ESEF/UFRGS.
• Shopping Center Iguatemi.
• Orla do
Rio Guaíba, próximo a Usina do Gasômetro.
Atividades
físicas e desportivas:
• Futebol
(fundamentos, regras, jogo).
• Handebol
(fundamentos, regras, jogo).
• Voleibol
(fundamentos).
• Atletismo
(corridas curtas).
Atividades
realizadas em dia de chuva:
• Leitura
(livros infantis e histórias em quadrinhos).
• Desenhos
(lápis de cor, giz de cera, têmpera).
• Palavras
cruzadas infantis.
Na
realização do programa houve uma predominância de atividades desportivas,
principalmente o futebol, que contava com um maior interesse dos participantes.
Durante os
jogos foi enfatizada a importância do cumprimento das regras e o respeito por
parte de cada um ao espaço do outro. Quando da manifestação de uma agressão
física ou verbal durante a atividade, a criança ganhava um cartão amarelo,
ficando fora do jogo por dez minutos, para um a reflexão sobre o ocorrido. Na
grande maioria das vezes, as agressões eram conseqüências de: frustração por
errar uma jogada, sofrer um gol durante o jogo, por reclamação de um
companheiro de equipe ou adversário, ou também por não concordância com um
pontapé ou empurrão recebido, e também em caso de choque, muitas vezes
acidentais, com um outro participante.
No
handebol, que foi menos praticado, tanto as sanções como os tipos de agressão
foram idênticos ao futebol. Já no voleibol, foram trabalhados apenas os
fundamentos do passe e recepção (com os gestos técnicos do toque e manchete), o
que não foi do agrado de alguns meninos, que diziam ser o voleibol “esporte de
mulher”. No atletismo, foi trabalhado principalmente corridas
curtas, de aproximadamente 30m, onde apesar de competição, não ficou
evidenciada nenhuma reação agressiva.
Todas as
atividades acima citadas foram realizadas na própria instituição, pois a mesma
conta com pátio gramado, com duas goleiras de futsal,
além de material esportivo: bolas de futebol, de voleibol e bolas plásticas.
Os passeios
realizados ao Zoológico de Sapucaia do Sul, Lami e
Jardim Botânico, contaram com a presença de um monitor do abrigo para auxiliar
no cuidado das crianças. Os mesmos foram realizados sem nenhum incidente
relativo à atitudes agressivas, em um clima de
euforia, pela novidade que representava o passeio, e de socialização, com as
crianças comentando o que viam de diferente e fazendo vários questionamentos em
relação ao que lhes era novo.
As
atividades de leitura, desenhos e palavras cruzadas ficaram como opções para os
dias de chuva, onde apenas a sala de recreação da instituição era disponível.
Nesse tipo de atividade algumas crianças mostravam-se dispersas e precisavam de
um acompanhamento mais individualizado do responsável pela mesma.
As
atividades foram realizadas quinta-feira pela manhã e sexta-feira à tarde, pois
esses eram os dias que as crianças tinham suas aulas terminadas mais cedo em
suas escolas, podendo assim participar nos dois turnos em que era realizado o
programa de atividades de lazer.
Após o
término de cada dia de atividades todas crianças reuniam-se com o responsável
pela atividade e conversavam sobre o que representou a mesma para eles,
salientando aspectos positivos e negativos nas relações com as outras crianças
e com o responsável pela sua aplicação.
Para
avaliar se foi atingido o objetivo do programa de atividades de lazer, foram
utilizados os seguintes instrumentos de avaliação:
• parecer
da equipe técnica da instituição (composta por uma psicóloga, duas assistentes
sociais, uma enfermeira e uma terapeuta ocupacional), que por terem um contato
diário com as crianças e conhecerem suas necessidades e dificuldades, relatam
como as crianças demonstram ou não, um comportamento agressivo com o
transcorrer das atividades de lazer.
•
conclusões relativas aos comentários das crianças feitas ao final das
atividades, quando relatavam o que consideravam proveitoso ou não, no que se
referia ao que foi realizado.
•
observações do responsável pela realização das atividades, quanto ao
comportamento agressivo das crianças durante a aplicação das mesmas.
Os
instrumentos de avaliação baseiam-se no que sugere Cratty
(1984), de que os índices mais válidos para avaliar a agressividade são aqueles
que provém da observação do professor sobre as necessidades do aluno em agredir
durante o jogo. Outras medidas, como testes, são para o autor acima citados,
úteis somente nas mãos daqueles que com eles estão familiarizados.
Sendo
assim, por não haver uma familiaridade do responsável pela execução de testes e
sua respectiva avaliação de resultados, houve uma preferência pela observação,
tanto de quem aplicou as atividades, como da equipe técnica, para que essa
servisse de instrumento avaliativo.
Tendo como
referência os instrumentos de avaliação anteriormente citados, constatou-se se
houve ou não melhora no comportamento agressivo das crianças, concluindo-se
através deste que:
• na ótica
das crianças, não somente os mais aptos e os mais fortes poderiam participar
das atividades, sendo essas um direito de todos, onde cada participante tinha
sua importância na realização das mesmas, através da cooperação e evitando
qualquer forma de exclusão;
• houve uma
melhora gradual na aceitação da grande maioria das crianças, quanto à repreensões e afastamentos por parte do responsável pelas
atividades, quando de uma conduta inadequada do participante em relação aos
companheiros durante as atividades propostas. Também se pôde constatar uma
melhoria na tolerância a frustrações (derrotas e erros durante os jogos, sendo
que uma minoria até o final do programa de atividades de lazer, ainda tinha
dificuldade em assimilar algo que não estivesse de acordo com suas
expectativas, exteriorizando seu descontentamento com agressões verbais, ou
isolando-se, não querendo mais participar das atividades);
• as regras
e a disciplina incutidas no jogo tiveram sua importância na imposição de limites
à criança, em uma amostra de que “a liberdade de uma pessoa cessa, quando
começa a de outra”, e que toda conduta agressiva traz prejuízos tanto ao
agressor (que é punido no jogo), quanto à vítima de agressão. Estas normas
serviram, assim, de suporte para a mediação quando eram necessárias
intervenções relativas ao comportamento no dia a dia da criança, auxiliando
assim, para uma posterior diminuição do mesmo;
• durante
os passeios, as crianças mostraram-se bastante integradas entre si, e na
relação com os adultos (profissionais que as acompanhavam), gerando um clima
satisfatório de socialização, sem necessidade de intervenções relativas a
comportamentos inadequados;
• as
atividades de leitura e desenho (principalmente a primeira), favoreceram uma
maior troca de conhecimento e experiência por parte das crianças, tanto entre
elas, como nos momentos de questionamento ao professor, sobre o que leram ou
quanto a como desenhar algo que não sabiam. Essas atividades contribuíram
assim, para que fosse trabalhada a consciência crítica, fossem adquiridos novos
conhecimentos, e possibilitassem uma visão mais clara da inserção da criança em
relação ao mundo;
• para a
criança, a oportunidade de participar conjuntamente no processo de escolha das
atividades que seriam realizadas foi gratificante, melhorando sua auto-estima,
tornando-a sujeito idealizador das mesmas, e conseqüentemente criando nela um
comportamento responsável, para que a realização do que foi elaborado,
satisfizesse suas expectativas e pudesse ser realizada integralmente;
• as
crianças perceberam uma mudança positiva no seu comportamento após o início das
atividades, com a diminuição de brigas entre elas, e uma melhora nas suas
relações com os funcionários.
Tendo em
vista que o programa de atividades de lazer, realizado com crianças de 07-12
anos, institucionalizadas, atingiu o objetivo a que se propunha, a diminuição
do comportamento agressivo das acima citadas, torna importante ser ressaltada a
necessidade do trabalho do recreacionista em abrigos
que atendam a esse tipo de população, vítima de violência física e sexual, na qual a tendência à agressividade é
freqüente.
Com a
diminuição de forma considerável de atitudes agressivas (que eram expressas
principalmente de maneira física e verbal) após o início das atividades
propostas, concluiu-se que as mesmas, ao valorizarem a auto-estima, a
consciência crítica, o respeito aos limites do outro, a socialização e a
cooperação, drenaram gradualmente a agressividade latente na manifestação das
crianças; contribuindo de maneira sólida para que fossem incutidos valores que
contrapusessem a um comportamento nocivo em relação à criança consigo mesma,
com as outras crianças ou em relação aos funcionários.
Trabalhando
com base nesses valores, e respeitando os anseios da criança na escolha das
atividades a serem desenvolvidas, a tarefa do profissional responsável pela
criação e execução do programa (recreacionista) terá sua importância reconhecida, tornando imprescindível sua presença
em qualquer instituição que se mostrar preocupada com a saúde e o bem-estar da
população que atende.
BECKER JR.,
Benno. Manual de Psicologia do Esporte e Exercício.
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WINNICOTT,
D.H. Privação e Delinqüência. Martins Fontes. SP/ SP, 1999.
*Monitor/Casa
de Passagem