ADOLESCENTES
- DIREITO PENAL JUVENIL - HOMICÍDIO - ATO INFRACIONAL -
CONCURSO DE AGENTES - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PRINCÍPIO DO LIVRE
CONVENCIMENTO - IMPOSIÇÃO DA MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE PRIVAÇÃO DA LIBERDADE -
RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. Não se confundem imputabilidade e
responsabilidade penal. Os adolescentes (ECA art. 2º) são penalmente
inimputáveis frente a legislação penal comum, mas respondem penalmente, sendo
imputáveis, frente a legislação especial (CF 228 e ECA 103). Comprovadas
autoria e materialidade do homicídio, que não encontra justificativa, correta a
privação da liberdade através do internamento. Hipótese em que já tendo sido
internados cautelarmente, e, inclusive, atingido 18 anos, com laudo favorável
do Centro Educacional Prisional, é conveniente e justa a progressão para a
semi-liberdade, pois se fossem adultos, condenados por homicídio, o regime
seria o semi-aberto. (Apelação criminal n. 97.009613-5, Primeira Câmara
Criminal do TJSC, Relator: Des. Amaral e Silva. Julgado em 22/04/1998).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação
Criminal n. 97.009613-5, da comarca de São Francisco do Sul, em que são
apelantes N. C. M. e J. A. de F. J., sendo apelada a Justiça, por seu
Promotor:
ACORDAM, em Primeira Câmara Criminal, por unanimidade,
prover parcialmente os recursos para impor a medida sócio-educativa da
semi-liberdade.
Custas na forma da lei.
I - RELATÓRIO:
O Dr. Promotor ofereceu representação contra os adolescentes
N. C. M. e J. A. F. J., ambos com 17 anos, por terem praticado a conduta
tipificada no artigo 121, caput c/c artigo 29 do Código Penal.
Segundo a vestibular:
"No dia 19.02.96, por volta das 6h da manhã, em frente
ao Clube Náutico Cruzeiro do Sul, situado na praça da Bandeira, nesta cidade e
comarca, após o término do baile de carnaval, os adolescentes N. C. M. e J. A.
de F. J., envolveram-se numa confusão, sendo que o adolescente N. passou a
discutir com Eron, ocasião em que adolescente J. A., entregou a arma para N..
Ato contínuo, o adolescente Gustavo Musse interveio na discussão e passou a
desferir socos pontapés em Eron Carlos Amorin, envolvendo-se em uma luta
corporal caindo ao solo. Neste momento, a vítima Andrei Carvalho Moreira,
interveio para separar Eron e Gustavo Musse que estavam engalfinhados no solo,
quando, N. C. M., sacou da cintura a pistola calibre 7.65-32, marca Brauling,
oxidada, cabo preto, que havia recebido momentos antes do adolescente J. A. F.
J., apontando-a no local onde se encontravam Eron, Gustavo e a vítima Andrei
Carvalho Moreira e desferiu um tiro, atingindo a vítima de frente, causando-lhe
os ferimentos graves que foram a causa de sua morte conforme faz prova laudo de
exame cadavérico de fl. 30.
"O adolescente J. A. F. J., encontrava-se armado com a
pistola no interior do Clube Cruzeiro do Sul, mostrando evidente disposição de
utilizá-la contra outro adolescente. Além de restar comprovado que o
adolescente J. é que passou a arma para N., ambos são amigos e fazem parte da
gang Juvenil, sendo que em todos os momentos do desenrolar dos fatos o
adolescente J. A. F. J. acompanhava N. C. M.."
Processados regularmente, foi imposta a ambos a medida
sócio-educativa da internação em estabelecimento educacional, sem prazo
determinado, nos termos dos artigos 112, VI c/c 121 e seguintes, da Lei
8.069/90.
Apelaram ambos os adolescentes.
N. C. M. alega, em resumo, preliminarmente, nulidade do
processo pelo indeferimento da defesa prévia e da inquirição das pessoas
arroladas nos documentos enviados pelo Delegado de Polícia; por não ter sido
intimado a se manifestar sobre laudo toxicológico e por terem sido
expedidas cartas precatórias sem a ciência do apelante. No mérito, pugna pela
absolvição, sustentando não ter sido o autor do disparo, não tendo concorrido
para a existência do ato
infracional.
J. A. F. J. diz, também em síntese, que deve ser absolvido
pois não há prova da participação no evento; que sendo amigo de N. apenas
estava no local, não se caracterizando a co-autoria.
Igualmente em suma, sustenta a Dra. Promotora, que a r. sentença
deve ser mantida pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.
A d. Procuradoria-Geral de Justiça opina pelo conhecimento e
desprovimento do apelo.
Os recursos seguiram os trâmites legais.
II - VOTO:
1 - Improcedem as preliminares.
A defesa prévia era mesmo, intempestiva.
A alegada ausência de intimação não restou comprovada,
porquanto conforme informação da Sra. Escrivã, "... os autos não foram
levados em carga pelo Dr. Defensor do representante de Nahum em 01/04/96, tendo
em vista os atos do termo de deliberação (fl. 133v.) a serem cumpridos com
urgência pelo cartório, ficando, entretanto, cientificada a douta defesa da
possibilidade de fotocopiar peças dos autos, bem como a disponibilidade dos
mesmo em 02/04/96 para a devida carga, com o que expressou concordância."
(fl. 177)
Assim, o prazo começou a fluir dia 03/04/96 (quarta-feira),
exaurindo dia 08/04/96 (segunda-feira).
A defesa prévia só foi protocolada a 22/04/96 (fl. 172),
portanto fora do tríduo legal.
O prazo do art. 186, § 3º, do ECA, é peremptório, não
comportando ampliação, nem redução, de modo que, vencido, o indeferimento
encontra amparo legal.
Tocante as demais preliminares, observou com acerto o digno
magistrado, Dr. Hélio David Vieira Figueira dos Santos:
"b) Quanto à nulidade de não permitir que documentos
juntados aos autos fossem utilizados como provas:
"Trata-se de inverdade flagrante. Basta ver que na
petição de fl. 183, onde o defensor falou sobre tais documentos, entendi que
aquela não era oportunidade para apresentar nova defesa prévia, mas determinei
de ofício a inquirição de uma testemunha.
"Mais uma vez, não houve interposição de qualquer
recurso da referida decisão (!), operando-se novamente a preclusão.
"c) Quanto à nulidade por não terem sido as partes
intimadas para falarem sobre o laudo de fl. 230:
"Esta alegação não tem qualquer repercussão processual,
pois as 2,9 gr. de maconha periciadas foram encontradas nas vestes da vítima
Andrei Carvalho Moreira, que está morto e não com algum dos acusados (!), de
forma que a defesa, se teve tempo para argüir essa 'nulidade', poderia também
ter feito as considerações a respeito que entendesse convenientes em favor de
seu constituinte. E, mais uma vez, nada alegou.
"d) Quanto à 'nulidade' de terem sido expedidas
cartas precatórias sem a intimação da defesa:
"(...).
"De fato, por um equívoco do cartório, na fl. 136,
foram expedidas cartas precatórias à Maringá e Curitiba, sem que a defesa
tivesse sido intimada de sua expedição. Entretanto, como se vê na fl. 238 e na
fl. 250, por outro engano do cartório, as cartas foram expedidas para intimar
as testemunhas a comparecerem nesta comarca e aqui prestarem depoimento! E a
defesa ficou intimada para todas as audiências a serem realizadas no processo!
"Tratava-se de inquirir duas testemunhas e uma delas,
Gustavo Suzuki foi ouvida na fl. 253.
"Depois, expedida precatória, desta vez para inquirição
da outra testemunha, embora não intimada a defesa, o Ministério Público,
desistiu de sua oitiva (fl. 283) e assim também a defesa de J., que o havia
arrolado na defesa prévia (fl. 287).
"Essa segunda testemunha, assim, não foi inquirida,
deixando claro toda a malícia dessa argüição." (fls. 336/337)
2 - Não houve testemunho pessoal do MM. Juiz. Apenas a
convicção do magistrado, que em contato com os adolescentes, fundamentou a
sentença, explicitando suas conclusões:
"Pela prova constante do processo e pelos episódios
havidos em audiências que presidi, posso afirmar dá má formação pessoal de
ambos os adolescentes, inobstante sejam eles oriundos de famílias respeitadas
da classe média." (fl. 334)
O Dr. Juiz apenas aludiu a conclusão que chegou no tocante
ao exame da personalidade dos acusados, tendo em vista a certeza moral dos
ilícitos e a necessidade da individualização da medida sócio-educativa.
JULIO FABBRINI MIRABETE leciona:
"Pelo sistema da livre convicção ou da
verdade real ou do livre convencimento, o juiz forma sua convicção
pela livre apreciação da prova. Não fica adstrito a critérios valorativos e
apriorísticos e é livre na sua escolha, aceitação e valoração. Foi este o
adotado pelo Código de Processo Penal, em substituição ao sistema da certeza
legal da legislação anterior, pois, de acordo com o artigo 157, 'o juiz formará
sua convicção pela livre apreciação da prova'. Acentua-se na Exposição de
Motivos: 'Todas as provas são relativas; nenhuma delas terá, ex vi legis,
valor decisivo, ou necessariamente maior prestígio que outra. Se é certo que o
juiz fica adstrito às provas constantes dos autos, não é menos certo que não
ficará subordinado a nenhum critério apriorístico no apurar, através delas, a
verdade material. O juiz criminal é, assim, restituído à sua própria
consciência' (item VII)."
E mais:
"Seus domínios são exclusivamente os das provas do
processo, porém, na eleição ou avaliação delas, ele é livre, guiando-se pela crítica
sã e racional: a lógica, o raciocínio, a experiência etc., o conduzirão nesse
exame e apreciação. Por isso se fala no princípio da persuasão racional
na apreciação da prova." ("Processo Penal", 5ª ed., São Paulo,
Atlas, 1996, p. 263/264)
3 - O elenco probatório demonstra que o adolescente J. A. de
F. J. passou a arma para N. C. M., que, por sua vez, atirou, causando a morte
da vítima, em claro homicídio, cometido em co-autoria.
N. C. M. atuou na qualidade de autor-executor e J. A. de F.
J. como co-autor.
A prova convence da autoria.
JULIANO CARVALHO, fl. 164:
"que de repente viu o representado N. apontar uma arma
para a pessoa de Eron; que essa arma era uma pistola de tamanho pequeno e de
cor escura; que quando N. fez este gesto saiu para o lado contrário; que em
seguida o depoente não conseguiu identificar as pessoas envolvidas neste
incidente além da pessoa de Eron; que logo em seguida N. saiu correndo e logo
em seguida J. passou correndo pelo depoente, colocou a mão na cintura e passou
a arma para N.; que tão logo N. empunhou a arma o declarante escutou a explosão
de um disparo; (...)".
No mesmo sentido os depoimentos de Gelson Dutra Gomes Júnior
(fl. 165), Humberto Gustavo Suzuki (fl. 254), Jurema dos Santos (fl. 256).
Como visto, as provas indicam, de forma segura, por indícios
e circunstâncias, apurados tanto na fase inquisitorial quanto na judicial, o homicídio
perpetrado dolosamente e em co-autoria, não havendo como falar em negativa de
autoria.
Conforme constou da r. sentença:
"De duas formas específicas tentaram N. e J. confundir
este Juízo, inicialmente pela confissão extrajudicial do delito por J. (fls.
30/31), depois negada na fase judicial (fl. 94v.), e depois, aproveitando-se da
semelhança física entre ambos, apresentavam-se nas audiências vestidos
com roupas idênticas, deliberadamente dificultando o reconhecimento deles
pelas testemunhas." (fls. 337/338)
Noutro trecho:
"A participação de J. A. F. J., entretanto, não foi de
menor importância, tanto que, para livrar heroicamente o amigo, tentou
engendrar a farsa de que teria sido ele o autor do tiro, em sua confissão
arrependida, na fase policial.
"Outrossim, a testemunha de fl. 163v. afirmou que viu
quando N. sacou a arma da cintura e a passou para J., mas que, após o disparo, J.
foi seguro e levado à polícia, mas não se encontrava armado. Ou seja,
naquele momento, J. já havia passado a arma de volta para N., tendo este
disparado contra a vítima.
"Da mesma forma, a testemunha de fl. 164 afirmou:
"'... e logo em seguida J. passou correndo pelo
depoente, colocou a mão na cintura e passou a arma para N.; que tão logo N.
empunhou a arma o declarante escutou a explosão de um disparo' (fl. 164).
"Foi J., assim, quem passou a arma para N. Foi ele que,
conscientemente, armou o seu companheiro, evidentemente para que o mesmo dela
fizesse uso. A sua participação, portanto, foi decisiva para o resultado
mortal. Tivesse ele se abstido de fazer o passe da arma, e tudo teria terminado
com uma briga comum de socos em fim de baile de carnaval.
"Por último, é bom lembrar que o desentendimento em que
N. estava metido envolvia uma briga de turmas, e N. pertencia a uma gangue
juvenil conhecida como 'DL', fato mencionado expressamente por 04 (quatro)
testemunhas (fls. 164/167), e que N. e J. eram amigos ao ponto deste assumir a
responsabilidade pelo fato praticado pelo outro, de forma que a atitude covarde
de ambos fica bem inserida nesse 'verdadeiro espírito de grupo'.
"A alegação de que N. agiu em legítima defesa não
encontra a menor ressonância na prova dos autos. Pelo contrário, tudo indica
que a vítima somente interveio na briga com o objetivo exclusivo de separar os
contendores e pôr fim à luta, recebendo, por isso, um tiro no peito, que lhe
ceifou a vida. Em nenhum momento do processo encontrei a menor prova, ou mesmo
o menor indício de prova que justificasse o ato de N. Apenas o absurdo de uma
agressão sem sentido e covarde." (fls. 340/341)
Que J. entregou a pistola a N. é fato incontestável. Também
que houve o disparo e que partiu da referida arma, portanto não há como negar a
co-autoria.
O fato certo, indiscutível, é que os apelantes, estando
armados, provocaram a morte da vítima.
Além disso, a perícia, fl. 157, comprovou que a cápsula
deflagrada pertencia a arma de idênticas características daquela descrita como
de propriedade de J.
Embora a prova convença de haver sido N. o autor direto no
homicídio, havendo concurso de agentes, respondem pela violência todos aqueles
que dolosamente contribuíram para a morte, pouco importando qual tenha sido a
atuação específica de cada um.
É da jurisprudência:
"CO-AUTORIA - HOMICÍDIO - IMPOSSIBILIDADE DE PRECISAR
DE QUEM PARTIU O DISPARO MORTAL - EXISTÊNCIA, CONTUDO, DE CONVERGÊNCIA DE
VONTADES PARA O FIM COMUM - CASO DE CONCURSO E NÃO DE AUTORIA COLATERAL."
(Rec. de Rev. 26.777, Porto Alegre, rel. Des. Ladslau Fernando Rohnelt, JB
Criminal 25/113)
"Réu que empresta arma ao companheiro que vem a
matar desafeto de ambos - Co-autoria reconhecida - Dolo direto em relação as
ameaças e provocações e dolo eventual no tocante à morte da vítima - Adesão ao
ânimo de vingança do co-réu - Recurso improvido - 'Importa em cooperação
positiva até mesmo a participação que, embora consistente em uma atitude
corporalmente inerte, redunda em forma moral cooperativa, como o daquele que,
com a só presença ao lado do executor, acoroçoa e encoraja, pela certeza de sua
solidariedade e esperança de sua eventual ajuda, ao mesmo tempo que intimida,
por intimação, o espírito de resistência da vítima'." (TJSP - AC - Rel. Mendes
Pereira - RJTJSP 40/317)
Esta Corte deixou assente:
"'No concurso delinqüencial não se faz mister que todos
os participantes consumem atos típicos de execução para ser alguém
co-responsabilizado; basta que se constate haja colaborado para o evento,
auxiliando (física ou moralmente), instigando, prestigiando ou encorajando (em
certas ocasiões a simples presença voluntária) a atuação dos executores
diretos.' (Rel. Des. Nilton Macedo Machado, JC 69/518)." (Ap. crim.
n. 34.376, de Caçador, rel. Des. Álvaro Wandelli)
MAGALHÃES NORONHA ensina:
"Existe co-delinqüência quando mais de uma pessoa,
ciente e voluntariamente, participa da mesma infração penal (crime ou
contravenção). Há convergência de vontades para um fim comum, aderindo uma à
ação de outra, sem que seja necessário prévio concerto entre elas".
("Direito Penal", v. 1, 19ª ed., São Paulo, Saraiva, p. 215)
4 - A excludente da legítima defesa, não restou comprovada.
O apelante estava armado de revólver (de propriedade do
adolescente J.), estando a vítima desarmada e separando briga entre terceiros,
o que demonstra encontrar-se totalmente desguarnecida. Ademais, não se
comprovou de maneira induvidosa houvesse a vítima provocado ou agredido a quem
quer que fosse.
"A legítima defesa para que possa ser acolhida, precisa
ser provada, e a prova é ônus do réu, sendo insuficiente a simples
alegação". (TACRIM-SP - AC - Rel. Hélio de Freitas - RT 671/346)
"A excludente de ilicitude da legítima defesa, para que
seja reconhecida, deve restar comprovada estreme de dúvidas, provando o acusado
que agiu de forma proporcional à agressão injusta." (Ap. Crim. n.
97.003216-1, de Maravilha, rel. Des. Genésio Nolli)
5 - Argumentou-se que sendo penalmente inimputáveis, pessoas
em peculiar situação de desenvolvimento, a circunstância justificaria a
imaturidade das contraditórias declarações de J.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, regulamentando os
artigos 227 e 228 da Carta Política, ao tempo em que conferiu direitos
fundamentais e sociais a crianças e jovens, estabeleceu para os adolescentes
responsabilidade penal juvenil, criando regime jurídico onde o adolescente
passou a ter a dignidade de responder pelos seus atos, principalmente quando
atentarem contra valores sociais tutelados penalmente: vida, integridade
física, patrimônio, etc...
Essa nova responsabilidade (penal juvenil) tem sólidas bases
doutrinárias na Carta Política e nas Regras Mínimas das Nações Unidas para a
Administração da Justiça Juvenil (Resolução 40/33/85 da Assembléia Geral),
incorporadas pelo Estatuto Brasileiro, que no artigo 103 conceituou o ato infracional como "a conduta descrita como crime ou contravenção
penal."
Vale dizer, remeteu o intérprete aos princípios garantistas
do Direito Penal Comum, tendo como normas específicas, as complementares do
Estatuto, que se referem apenas a natureza da resposta, ou seja, as medidas,
que por serem sócio-educativas, diferem das penas criminais tão somente no
aspecto predominantemente pedagógico e na duração, que deve ser breve, esta
face o caráter peculiar do adolescente como pessoa em desenvolvimento.
Bem por isso, o artigo 228 da Constituição, ao conferir
inimputabilidade penal até os dezoito anos, ressalvou sujeição "às normas
da legislação especial". Essas, por sua vez, estabeleceram, como dito, a
chamada responsabilidade penal juvenil.
Não se confundindo imputabilidade e responsabilidade, tem-se
que os adolescentes respondem frente ao Estatuto respectivo, porquanto são
imputáveis diante daquela lei especial.
Sendo imputabilidade (derivado de imputare) a possibilidade
de atribuir responsabilidade com base na violação de leis, sejam elas penais,
civis, comerciais, administrativas ou juvenis, não se confunde, com a
responsabilidade, da qual é pressuposto. (Ver De Plácido e Silva - VOCABULÁRIO
JURÍDICO, Rio, Forense, 1982, p. 435)
Aos adolescentes (12 a 18 anos) não se pode imputar
(atribuir) responsabilidade frente a legislação penal comum. Todavia, podendo
se lhes atribuir responsabilidade com base nas normas do Estatuto próprio,
respondem se submetendo a medidas sócio-educativas de inescondível caráter
penal especial.
Como as penas criminais, as medidas sócio-educativas podem
ser restritivas de direitos ou privativas de liberdade.
Como no Direito Penal Comum, no Estatuto predominam os
princípios da despenalização, da descriminalização, do Direito Penal Mínimo,
optando a lei juvenil pelas penas restritivas de direitos, como importantes
alternativas a privação da liberdade.
Em suma, embora inimputáveis frente ao Direito Penal Comum,
os apelantes são imputáveis diante das normas da lei especial, o Estatuto da
Criança e do Adolescente e, por isso, respondem penalmente, face o nítido
caráter retributivo e sócio-educativo das respectivas medidas, o que se
apresenta altamente pedagógico sob o ângulo dos direitos humanos de vítimas e
vitimizadores. Além disso, de boa política criminal, em que respostas justas e
adequadas servem como elemento indispensável a prevenção e repressão da
delinqüência juvenil.
O que não se admite no Direito Penal Juvenil são respostas
mais severas e duradouras do que em idênticas situações seriam impostas aos
condenados adultos.
Os princípios da legalidade estrita, da retributividade
(temperado pela possibilidade da remissão), do caráter predominantemente
pedagógico e excepcional das medidas sócio-educativas, constituem garantias de
natureza penal (Direito Ciência e Norma), que não podem ser negadas aos
infratores do Estatuto da Juventude.
6 - O ato, praticado com violência, repercutiu no meio
social. Não encontrando justificativa, só podia, mesmo, resultar na medida
privativa da liberdade.
Observo que ambos os apelantes já completaram 18 anos e que
os estabelecimentos prisionais juvenis, eufemisticamente denominados Centros
Educacionais, embora tenham propostas pedagógicas, normalmente não tem
programas específicos para jovens de mais de 18 anos.
Os adolescentes já foram privados de liberdade. Os laudos da
equipe técnica lhes foram favoráveis. São primários, não registrando
antecedentes; a conduta social nada registra de muito negativo, pois são
estudantes; os motivos e as circunstâncias são desfavoráveis, por isso que
envolvidos com maus elementos, praticaram o ato infracional durante briga de grupos rivais; a vítima não contribuiu
para o lamentável evento. Se fossem adultos, condenados por homicídio na
Justiça Penal Comum, o regime seria o semi-aberto, correspondente a
semi-liberdade do Estatuto da Juventude. Poderiam trabalhar durante o período
diurno, bem como freqüentar cursos, inclusive de nível superior.
Não podendo ser tratados com maior severidade na Justiça
Juvenil do que na comum, devido a particularidade de estarem estudando e
havendo a alternativa para a hipótese de que, se não adaptarem ao regime,
poderão ser novamente privados de liberdade (ECA art. 122, III), dou provimento
parcial aos recursos para impor a medida sócio-educativa da semi-liberdade (ECA
art. 120), sem determinação de prazo, atento o juiz da execução ao termo máximo
que coincide com a maioridade civil.
A medida deverá ser reavaliada para progressão de regime no
máximo a cada seis meses.
As atividades externas à cargo da equipe técnica.
III - DECISÃO:
Acompanharam o relator. Deram provimento parcial aos
recursos, impondo a medida sócio-educativa da semi-liberdade.
Participaram do julgamento com votos vencedores,
os Exmos. Srs. Des. Genésio Nolli e Paulo Gallotti, e lavrou parecer, pela
d. Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Dr. Demétrio Constantino Serratine.
Florianópolis, 22 de abril de 1998.
Amaral
e Silva
PRESIDENTE
E RELATOR
APR nº 97.009613-5 (12.779)