ESTUDO DAS
OPINIÕES DO PAI SOBRE O ALEITAMENTO MATERNO E SUA PARTICIPAÇÃO NESTE
PROCESSO[1]
Palavras-chave: saúde mateno-infantil; aleitamento
materno; paternidade.
A amamentação, que em tempos atrás, era uma prática
simples e natural, tornou-se um ato complexo e dependente de múltiplos fatores
e providências para que seja realizado de forma satisfatória.
Profissionais da Organização Mundial da Saúde - OMS -
que atuam na área materno-infantil, afirmam que nas comunidades onde o aleitamento
materno é procedimento comum entre as mulheres, o preparo da futura nutriz para
esta prática ocorre através da observação da amamentação no peito realizada por
outras mulheres da família ou da coletividade. Dessa maneira, a mulher passa a
considerar este ato como parte natural dos cuidados que se presta à criança.
Além disso, adquire confiança na capacidade de amamentar seus filhos,
propiciando a estes e a elas próprias melhores condições de saúde. Esses
profissionais afirmam, ainda, que nas comunidades onde a observação direta de
mulheres que amamentam é menos freqüente, as mães necessitam de maior
assistência e apoio para obterem êxito na amamentação, pois a confiança em sua
capacidade de amamentar e produzir leite suficiente para alimentar a criança
estará ameaçada. Esta falta de confiança, salientam os estudiosos da OMS, pode
prejudicar o reflexo da descida do leite e/ou sua produção em quantidade
adequada às necessidades da criança. (OMS,1981; OMS,1989)
Apesar de profissionais da OMS (1981) considerarem a
amamentação como um processo natural, reconhecem que é um período delicado para
a mãe e o filho e que a estabilização da lactância depende do incentivo e apoio
dos que os cercam.
De acordo com KTNG (1991), “... a mãe necessita de uma
pessoa experiente e delicada para dar apoio e transmitir confiança”, sendo a
mãe da nutriz ou outra parente próxima, elementos importantes para exercer esse
papel. Outro apoio importante à nutriz, citado por esta autora, é o de mulheres
da comunidade que amamentaram e que podem transmitir suas experiências
positivas em relação ao aleitamento materno, além do apoio de pessoas da
família e amigos que complementam a ajuda e o estímulo oferecidos pelo pessoal
de saúde que são essenciais, especialmente no início do aleitamento materno e,
também, em situações de dificuldades precoces.
Os “amigos do aleitamento materno”, como denomina VARELA
(1989), são as amigas, vizinhas, os parentes e profissionais que compartilham
da iniciativa da mãe que amamenta o filho. Este autor descreve que é muito
reconfortante para a mãe receber a colaboração dessas pessoas e que, em casos
de algumas dificuldades, a mãe necessitará de apoio e, mesmo que seja apenas
afetivo, será de grande ajuda.
Diante dessas considerações, acredita-se que o apoio e
incentivo da equipe de saúde, dos familiares e pessoas da convivência da mãe
são de grande importância para aumentar a sua confiança na capacidade de
produzir quantidade adequada de leite para a criança e resolver problemas que
podem surgir no período da amamentação.
Considerando que, entre as medidas necessárias para o
sucesso da amamentação encontram-se as informações adequadas e uniformes sobre
o assunto à população em geral e, principalmente, às mulheres que amamentam ou
que pretendem amamentar e que estas, muitas vezes, mesmo orientadas, desmamam
precocemente os seus filhos, evidenciou-se a necessidade de conscientizar maior
número de pessoas sobre a importância da amamentação, na tentativa de torná-la,
novamente, uma prática natural e parte essencial dos cuidados oferecidos à
criança no primeiro ano de vida.
A revisão bibliográfica sobre aleitamento materno
mostra, claramente, que a mãe necessita de aliados em seu empreendimento de
amamentar o filho no peito, nos primeiros meses de vida. E necessário,
portanto, sensibilizar pessoas que estejam intimamente ligadas à nutriz e que
exerçam certa influência em suas decisões e comportamento. Acredita-se que,
geralmente, quem compartilha em maior grau dessa intimidade é o esposo. Este
pode exercer certa influência nas atitudes da esposa que nele deposita
expectativas de apoio, incentivo e ajuda. Por essas razões, o marido seria uma
das pessoas indicadas para somar esforços em prol do aleitamento materno e
contribuir com o sucesso desta prática, nos primeiros meses de vida da criança.
Tão importante quanto à orientação e assistência à mulher sobre o assunto,
seria o preparo do marido para tomá-lo um efetivo elemento de incentivo e ajuda
à esposa, durante o processo de aleitamento materno.
Na prática profissional de assistência à saúde de
gestantes, puérperas e recém-nascidos, teve-se a oportunidade de se observar
que, de modo geral, o marido ou o pai da criança não participa diretamente das
orientações que suas esposas recebem sobre aleitamento materno, durante as
consultas de assistência pré-natal ou grupo de gestantes e, também, durante a
internação para o parto e puerpério, consultas de revisão após o parto e de
puericultura. Na realidade, o foco de atenção para essas orientações, quando
oferecidas pela equipe de saúde, é apenas a mulher, sendo o homem excluído
dessas situações e, portanto, privado da oportunidade de adquirir ou aprofundar
conhecimentos sobre o aleitamento materno.
De modo geral, a influência e a participação do pai da
criança no processo de aleitamento materno de seu filho não é muito
determinante. O comportamento comum, nos primeiros meses que sucedem o
nascimento do filho, é o de se manter mais como observador passivo do que como
agente ativo de ajuda ou apoio à esposa para efetivar o ato de amamentar. Esta
atitude pode ser decorrente, entre outros fatores, da falta de estímulo dos
profissionais de saúde, de familiares e, até mesmo, da própria esposa que
desconsideram o seu conhecimento sobre o assunto ou iniciativas de apoio referentes
a essa prática. Como reflexo dessa situação, o marido acredita que não deve se
envolver no processo e que sua participação é irrelevante nesta fase, tanto
para a esposo como para o filho.
BADINTER (1985) em seus estudos sobre a função paterna,
explica que a sociedade conferiu ao homem uma função essencialmente econômica
distanciando-o, progressivamente, de seu filho. Essa autora menciona, ainda,
que o discurso psicanalítico da necessidade de distinção dos papéis materno e
paterno contribui muito para a concretização desse comportamento. Lembra que,
“aos olhos de Freud e de seus sucessores, a mãe simboliza antes de tudo o amor
e a ternura, e o pai, a lei e a autoridade”. Com a exaltação do devotamento
materno, pouco se falava do papel cotidiano do pai.
Outro aspecto que explica o maior ou menor envolvimento
paterno com o filho é delineado por MALDONADO, NAHOUM & DICKSTEIN (1987) ao
afirmarem que o desenvolvimento do vínculo pai-filho, desde a gestação, é mais
lento do que entre mãe-filho, sendo que o primeiro torna-se estável somente
após o nascimento.
Segundo estes autores, o homem pode apresentar
comportamentos diversos em relação ao filho que está sendo gerado e, também,
após o nascimento da criança. Como não pode ter contato direto com o filho da
mesma maneira que a mulher o tem durante a gravidez, o homem freqüentemente se
sente excluído da experiência de uma ligação mais profunda e imediata com o
filho. Essa situação pode provocar sentimentos de ciúme e de inveja da
capacidade da esposa de gestar e nutrir o filho e, em conseqüência disso, o
envolvimento do marido no período gravídico-puerperal é variável, podendo
mostrar-se muito participativo ou até indiferente ao processo. Os homens pouco
participativos justificam este comportamento dizendo que a gestação, o parto e
os cuidados com o bebê são acontecimentos e tarefas exclusivamente femininas
aos quais eles não podem ou não devem ter acesso.
No entanto, acredita-se que o pai pode ser um membro da
família atuante e contribuir efetivamente com a esposa para prolongar o período
de aleitamento materno de seu filho.
Alguns autores como CLARK (1984), CARVALHO (1985),
MARTINS FILHO (1984), SILVA (1990) e CAMPESTRINI (1992) são unânimes em
afirmarem a importância da participação do pai no processo de amamentação do
seu filho. Porém, enfatizam que, para isso ocorrer de fato, é necessário
prepará-los para os acontecimentos da gestação, parto e lactação desde o
pré-natal.
MARTINS FILHO (1984) ressalta que o preparo do parceiro
para a nova situação de pai é essencial para que o mesmo compreenda as
modificações que ocorrem na dinâmica familiar com a vinda do bebê e, a partir
disso, possa melhorar a participação e ajuda à esposa no período de
amamentação, tão importantes para o sucesso dessa prática e, conseqüentemente,
para o adequado desenvolvimento da criança.
Todos os sentimentos vividos pela nutriz nas primeiras
semanas após o parto, o despreparo para enfrentar as dificuldades comuns à
prática da amamentação, a responsabilidade com o desempenho de outros papéis
como os de dona de casa, esposa ou cuidado com outros filhos, entre outros
aspectos, colocam a mulher na condição de dependência de ajuda dos familiares
e, principalmente do marido, que pode desempenhar um papel essencial de
estímulo ao aleitamento materno favorecendo as condições necessárias a essa
prática junto a sua esposa e seu filho.
Diante dos problemas que envolvem a prática da
amamentação e, acreditando-se no desenvolvimento do pai como elemento de
incentivo e ajuda à esposa neste período, com vistas à prevenção do desmame
precoce de seu filho, evidenciou-se a necessidade de estudos sobre o papel do
pai no processo de aleitamento materno.
Este trabalho teve como objetivo obter informações sobre
o conhecimento e a participação do pai no processo de amamentação de seu filho,
para melhor conduzir a assistência educativa sobre o assunto dirigida não só à
mulher, mas, também, ao marido.
Fizeram parte deste estudo 100 pais de criança com idade
entre um e doze meses, que estava sendo amamentada ou que tinha sido amamentada
no peito. Estes estavam em companhia ou não da esposa e traziam o filho para
ser atendido no programa de puericultura do Ambulatório de Pediatria do
Hospital São Paulo.
Foram excluídos da amostra os pais adotivos.
As variáveis estudadas foram agrupadas em:
características pessoais, profissionais e sócio-econômicas dos pais;
planejamento da gravidez, assistência pré-natal e participação do marido nas
consultas pré-natais; fontes de informação sobre o aleitamento materno;
dificuldades da esposa na prática da amamentação; participação do pai no
processo de aleitamento materno de seu filho e conhecimento e opiniões do pai
sobre o aleitamento materno.
Os dados foram coletados através de entrevistas
semi-estruturadas com os pais, que permaneciam junto à esposa ou não e
participavam da conversa no mesmo local em que aguardava a chamada do filho
para a consulta e sempre antes da mesma.
As entrevistas foram feitas no período de 20 de janeiro
a 30 de março de 1992.
Os pais entrevistados, em sua maioria (64,0%), eram
jovens com menos de 30 anos. Entre os pais entrevistados, encontrou-se apenas
um pai adolescente.
No que se refere à escolaridade, a amostra revelou que
os pais das crianças pesquisados, em sua maior parte (73,0%), possuíam baixa
escolaridade, não tendo concluído o primeiro grau e destes, 4,0% nunca haviam
freqüentado a escola.
Quanto à situação conjugal, pouco mais da metade dos
pais (5 8,0%), estavam unidos legalmente. Os demais viviam maritalmente
com a esposa, porém não tinham a união oficializada em cartório. Entre os pais
estudados, 61,0% viviam em companhia da esposa há 3 anos ou mais. Observou-se
que os entrevistados que não eram casados consideravam-se como tal e, portanto,
a companheira passou a ser referida como esposa destes entrevistados.
Cerca de um quinto dos pais entrevistados (21,0%)
estavam desempregados. Quando os mesmos foram indagados sobre como estava sendo
o sustento da família, explicavam que estavam fazendo alguns “bicos”, “a esposa
fazia alguma limpeza para fora”, “recebiam ajuda de amigos ou familiares” ou,
ainda, “estavam vivendo do salário recebido do último emprego”. Esta condição
de desempregado pode ter favorecido a presença do pai na consulta de
puericultura, pois, entre os pais que estavam empregados, 70,9% trabalhavam
durante o dia e os demais (29,1%) desenvolviam suas atividades em horários
diversos. A ocupação de trabalho referida pelos entrevistados variou entre
atividades de segurança, pintura, mecânica, eletricidade, comércio, vendas,
metalurgia, construção civil, portaria de edifícios, serviço de bar e
restaurante e outras menos freqüentes.
Apesar da maioria dos pais entrevistados (58,0%), que
estavam acompanhando a esposa e o filho até o ambulatório de pediatria
trabalharem durante o dia, em período integral, constatou-se que somente alguns
estavam faltando ao serviço. Os demais estavam em dia de folga ou eram
trabalhadores autônomos. Essa constatação levou a pensar que maior número de
pais acompanharia a esposa e o filho nas consultas médicas, se o agendamento
das mesmas não coincidisse com o horário de trabalho do marido. Considerando os
horários variados de trabalho dos maridos e que a maioria deles trabalhavam no
período diurno, uma alternativa para viabilizar a sua participação nas
consultas seria a maior oferta de horários de atendimento médico nos serviços
de saúde.
A renda per capita na família da maioria dos pais
entrevistados (76,0%) não atingia 1,5 salário mínimo, mostrando a baixa
condição sócio-econômica da amostra estudada.
Planejamento da
gravidez, assistência pré-natal e participação do marido nas consultas
pré-natais.
De acordo com os dados levantados sobre o planejamento
da última gravidez, verificou-se uma incidência relativamente elevada (52,0%)
de gravidez não planejada entre os entrevistados. Resultados de pesquisa
realizada por RODRIGUES (1983) mostram que 60,0 a 70,0% das gestações que
ocorrem em São Paulo e no Paraná são planejadas. Porém, a incidência encontrada
em outros estados foi de 50,0%. Considerando-se que muitos entrevistados eram
oriundos de outros estados, pode-se notar que os índices de gravidez não
planejada dos pais estudados foram equivalentes àqueles encontrados em pesquisa
realizada em nível nacional.
No que se refere à assistência pré-natal, os dados
analisados mostraram que apenas uma das esposas dos cem entrevistados não teve
esta assistência. Essa informação sugere que as mulheres estão valorizando a
assistência pré-natal para prevenção, detecção precoce e controle de doenças no
período gestacional, bem como a possibilidade de acesso das gestantes aos
serviços de saúde, no município de São Paulo.
Quanto à presença do pai nas consultas de assistência
pré-natal, apenas 25,0% dos maridos entrevistados estiveram presentes em
consultas de atendimento pré-natal da esposa. Acredita-se que a assistência
pré-natal adequada é aquela oferecida ao casal, possibilitando e estimulando a
participação ativa do marido, desde o início da gravidez, o que contribui sem
dúvida para a construção do vínculo afetivo com o filho o mais precocemente
possível.
O comprometimento do marido com o filho desde a sua
concepção é enfatizado por estudiosos do assunto, como MALDONADQ, NAHOUM,
DICKSTEIN (1987), que denominam os pais da futura criança como o “casal
grávido”. Para estes autores, a gravidez “é o momento em que a mulher e o homem
assumem o compromisso de serem responsáveis pela vida e pelo bem-estar de uma
nova pessoa que vai nascer” e o ideal é que a assistência pré-natal seja
oferecida não só às mulheres grávidas, mas, também, aos homens grávidos. Como
afirmou um dos entrevistados:... “a barriga é da mãe, mas o filho é dos dois”.
Entretanto, devido à estrutura física inadequada e à dinâmica precária de
atendimento à saúde da população, na maioria dos serviços públicos de saúde do
país, o casal grávido brasileiro ainda encontra-se limitado apenas à gestante.
Os profissionais de saúde que atuam na assistência
pré-natal deveriam procurar contornar as dificuldades dos serviços e os
entraves burocráticos no sentido de não apenas permitir como, também,
incentivar a presença do pai nas consultas de assistência pré-natal. Entre os
motivos alegados pelos entrevistados que não estiveram presentes nas consultas
pré-natais da esposa estão a impossibilidade de acompanhá-la até o serviço e a
não solicitação pelos profissionais de saúde de sua participação no momento da
consulta, embora estivessem presentes no serviço. Outros motivos citados pelos
entrevistados foram: “não achou necessário”, “achou que o médico podia não
gostaria” e “é uma coisa de mulher”...
As razões indicadas pelos pais para explicar a sua
ausência nas consultas pré-natais parecem demonstrar um comportamento passivo
às rotinas estabelecidas para este atendimento onde, de modo geral, somente a
grávida é participante; aceitação da supremacia do médico que determina a sua
participação ou não no momento da consulta ou, ainda, uma atitude machista do
marido que se recusa a entrar na sala de consulta afirmando que é desnecessária
a sua presença ou que é uma coisa de mulher.
Indagados sobre a necessidade de aprenderem sobre
aleitamento materno, 89,0% dos pais responderam que era importante e
justificaram que estariam mais bem informados sobre o tema, ajudariam a esposa
no cuidado com a criança e discutiriam sobre o assunto, alertando-a e
incentivando-a para a amamentação.
De acordo com GREEN (1986),
“educação em saúde é um processo que liga a lacuna entre a informação de saúde e a prática de saúde. A educação em saúde motiva a pessoa a tomar a informação e fazer alguma coisa com ela, manter-se ele próprio mais saudável, evitando ações que sejam nocivas e formando hábitos que sejam benéficos”.
Diante desta consideração, acredita-se que o marido bem
informado sobre prática da amamentação poderá ser um elemento ativo no combate
ao desmame precoce de seu filho, modificando omissões ou atitudes negativas por
parte de certos pais como, por exemplo, parte dos entrevistados que
justificaram esta postura com afirmativas do tipo: “e a esposa que deve saber
sobre isso, ‘‘não é uma coisa tão complexa e no dia-a-dia o marido já aprende”,
“ é uma coisa entre mãe e filho” ou “porque a gente não tem tempo de fazer
nada”. Estes depoimentos fazem lembrar a observação feita durante as
entrevistas de que muitos maridos ainda acreditam ser o aleitamento materno um
assunto que diz respeito somente às mulheres e parecem desconhecer a importante
função de co-participantes junto à esposa no período de amamentação do(s)
filho(s).
Dos maridos entrevistados, 94,0% responderam que o
conhecimento sobre o assunto leva o marido a exercer maior influência sobre a
vontade da esposa em amamentar. Esse resultado demonstra que a grande maioria
dos pais estudados reconheciam a importância do aprendizado sobre o tema para
colaborar com a esposa.
Segundo depoimentos dos maridos do estudo, um pouco
menos da metade das esposas (48,5%) receberam alguma orientação sobre
aleitamento materno durante o atendimento pré-natal e 29,3% não receberam. O
restante (22,2%) representam os maridos que não sabiam se as esposas haviam
recebido ou não esse tipo de orientação no período pré-natal. A ênfase das
orientações oferecidas pelos profissionais de saúde foi sobre a importância do
leite materno para a saúde da criança e o número de meses recomendado para a
mãe amamentar. Porém, cerca da metade dos maridos entrevistados, cuja esposa
havia sido informada sobre amamentação, durante o pré-natal, não sabia referir
o conteúdo da orientação recebida. Este resultado demonstra a necessidade da
gestante ser incentivada a transmitir o conteúdo das informações obtidas
durante o pré-natal ao esposo que não participa da consulta.
Outra indagação feita aos pais que confirma esta
consideração se referiu a existência de conversas com a esposa, anteriores ao
nascimento do filho, sobre a alimentação a ser oferecida à criança nos
primeiros seis meses de vida. Um percentual de 52,0% dos entrevistados
planejaram a alimentação do bebê e, nesta parcela de pais, o leite materno
exclusivo foi o alimento preponderante de escolha. A necessidade de
complementação do aleitamento materno com outros tipos de alimento, nos primeiros
seis meses de vida da criança, foi mencionado por pouco mais de um décimo dos
pais que planejaram a alimentação do filho. Na prática, entretanto, observa-se
que a introdução de outros tipos de alimentos já nos primeiros meses de vida da
criança, ocorre com muita freqüência.
Considerando que quase a metade dos pais (48,0%) não
conversaram com as esposas durante a gravidez, sobre a alimentação da criança
nos primeiros seis meses devida, a idéia errônea de muitos maridos de que o
aleitamento materno é assunto reservado às mulheres e, ainda, os problemas
peculiares à amamentação que o casal pode se deparar ressalta-se, mais uma vez,
a importância do preparo adequado do casal pelo profissional de saúde, bem como
o acompanhamento técnico nas primeiras semanas de vida da criança para o
sucesso da amamentação, pois acredita-se que a participação do marido em todas
as etapas da assistência é essencial para a obtenção desse resultado.
O conhecimento apresentado por muitos pais sobre as
vantagens do leite materno parece estar relacionado, entre outros fatores, com
a própria experiência de terem sido amamentados no peito pela mãe. Quando se
investigou o tipo de aleitamento que o entrevistado recebeu nos primeiros meses
de vida, 7 3,0% responderam, com convicção, que haviam sido amamentados no
peito por sua mãe após o nascimento. Dos pais que se lembravam do período de
tempo de amamentação, 27,0% afirmaram que haviam sido por 12 meses ou mais.
É importante destacar que os pais comentavam ser comum a
lembrança de suas mães amamentando no peito seus irmãos menores ou de outras
mulheres amamentando seus filhos nos primeiros meses de vida e que essa prática
era considerada natural.
A experiência de observar outras mulheres amamentando é
fator importante para a adoção de atitudes positivas em relação à amamentação.
Quando a população é privada desse tipo de experiência e a prática do
aleitamento artificial pela mamadeira prevalece sobre o aleitamento materno, é
de se esperar que as futuras mães saibam pouco ou mesmo desconheçam a respeito
da prática da amamentação no peito, tenham pouca confiança em sua capacidade de
lactar e, ainda, sejam impedidas de contar com o apoio de familiares ou amigos.
(OMS, 1989).
Além da observação direta de mulheres amamentando,
procurou-se conhecer outras formas pelas quais os pais entrevistados adquiriram
conhecimento sobre aleitamento materno. Estas foram, principalmente, a própria
esposa, os profissionais de saúde e a televisão. Verificou-se que a esposa
representou ao entrevistado a fonte mais importante de conhecimento sobre
amamentação. Sendo assim, deve-se reconhecer que, na impossibilidade do pai ser
orientado sobre o aleitamento materno, é imprescindível que a esposa seja
informada sobre o assunto e motivada a transmitir e discutir o aprendizado ao
marido.
Analisando-se a freqüência das respostas relacionadas à
esposa, mãe, outros parentes, “pessoas do cotidiano”, professores, amigos,
pessoas mais velhas, mães que amamentaram e a experiência de ver os filhos
saudáveis porque foram amamentados no peito, pôde-se comprovar a importância de
se disseminar informações sobre amamentação em toda a comunidade para maior
conscientização da população em geral, e por conseqüência o pai, sobre os
benefícios proporcionados por essa prática natural.
Constatou-se que o profissional de saúde desempenhou
papel fundamental na transmissão de informações sobre o assunto ao pai e,
veículos de comunicação como a televisão e publicações com artigos específicos
sobre a questão, foram essenciais para a multiplicação dos resultados positivos
da assistência educativa sobre amamentação. As demais fontes mencionadas pelos
pais foram através da leitura de rótulos de produtos, que informam sobre a
importância do aleitamento materno, em discussões sobre o tema com indigenistas
e, até mesmo através da natureza que se constituiu de um meio de aprendizado
para um pai, ao observar “os bichos amamentando”.
Com esses resultados, pode-se reafirmar a importância da
assistência educativa oferecida ao marido pelo profissional da saúde, de
maneira direta ou indireta através da esposa e, também, da divulgação do
assunto através de campanhas pela televisão, jornais, revistas, folhetos e
cartazes.
As ocasiões em que os pais aprenderam sobre o
aleitamento materno com os profissionais de saúde foram as mais diversas sendo
que a oportunidade mais freqüente para obter conhecimento foi durante a
consulta pré-natal, por meio de palestras ou cursos nos serviços de saúde,
durante a consulta com o pediatra e, ainda, durante a internação da esposa para
o parto e puerpério.
Um percentual elevado (51,0%) das esposas dos
entrevistados apresentaram dificuldades na amamentação no primeiro mês de vida
da criança. Estas dificuldades estavam relacionadas, principalmente, aos
problemas mamários como a inadequação da forma dos mamilos, traumas mamilares,
ingurgitamento mamário e dor ao amamentar.
Outras dificuldades, algumas vezes decorrentes destes
problemas, também foram indicadas pelos pais, como a idéia de que o leite
materno é fraco e não sustenta a criança ou que está sendo produzido em pequena
quantidade. A criança que acostuma com a mamadeira e passa a rejeitar o peito
da mãe ou não tem força para sugar também foram indicações de dificuldades enfrentadas
pelas esposas na prática da amamentação.
O profissional de saúde se depara, freqüentemente, com
todas estas dificuldades na assistência à puérpera e à nutriz. Constata-se que,
muitas vezes, essas dificuldades acabam por determinar a introdução precoce da
mamadeira, seguida pelo desmame da criança, o que já foi comprovado por estudos
de vários autores como: MARTINS FILHO, FACCHINI, OLIVEIRA, 1983; CARVALHO,
1985; REGO, 1986; REA & CUCKIER,1988.
O preparo das mamas para a amamentação se mostra, portanto,
medida fundamental para o sucesso dessa prática. Sendo assim, os profissionais
de saúde devem estar preparados para a orientação adequada às gestantes sobre o
preparo das mamas para a amamentação desde o período pré-natal e, também, o
preparo do casal para os cuidados no período de aleitamento materno. Com
medidas simples, obter-se-á a redução de intercorrências mamárias e mamilares
durante a fase da amamentação evitando-se, desse modo, a introdução precoce da
mamadeira ou o desmame devido a estes fatores.
De acordo com REA & CUCKIER (1988), o sistema de
saúde, através da equipe multidisciplinar, não possui todas as soluções para
evitar o desmame, pois se deve considerar todos os determinantes para que o
aleitamento materno aconteça, porém, acredita-se que, com orientações básicas
ao casal sobre amamentação, este poderá enfrentar melhor os períodos críticos
desta prática.
No que se refere à ajuda fornecida pelo marido quando a
esposa apresentou alguma dificuldade em amamentar o filho, no primeiro mês de
vida da criança, verificou-se que as providências mais freqüentes foram a
compra de medicamentos ou outro produto para tentar solucionar o problema e a
atitude de incentivo, apoio, atenção e carinho à esposa com o objetivo de
ajudá-la a superar os obstáculos à amamentação. As demais iniciativas dos
maridos incluem desde a ajuda direta no sentido de esvaziar a mama ingurgitada
ou a colaboração indireta através do cuidado com a criança, busca de ajuda de
terceiros ou a realização de afazeres domésticos. Uma parcela dos pais,
possivelmente por desconhecerem a melhor forma de solucionar os problemas
relacionados à amamentação, sugeriram à esposa a introdução de outros tipos de
leite.
Estes resultados parecem demonstrar que, diante de
empecilhos à prática da amamentação, os maridos apresentam interesse e
disposição em ajudar a esposa a enfrentar essa fase inicial crítica do
aleitamento materno, procurando fazer o que está ao seu alcance, mesmo que seja
somente buscando ajuda de outras pessoas para resolver o problema. No entanto,
a opção por mamadeira, às vezes, aparece como a melhor e mais fácil solução
para a dificuldade e, apesar do pai conhecer as vantagens do leite materno e
demonstrar disposição em cooperar com as esposa, rende-se facilmente a outros
tipos de leite. Em geral, essa atitude é decorrente do desconhecimento do pai
sobre aspectos práticos da amamentação tornando mais reduzida a sua influência
na manutenção do aleitamento materno nos primeiros seis meses de vida do filho.
O conhecimento indicado pelos pais entrevistados sobre o
aleitamento materno se referia, principalmente, à importância do leite materno
para a saúde e o desenvolvimento da criança e/ou, no mesmo sentido, este
alimento como fator de proteção contra alguns tipos de doenças da infância.
A maioria dos pais justificou muito bem os benefícios do
leite materno para a criança, demonstrando que, de alguma maneira, já haviam
aprendido e podiam afirmar com segurança a superioridade do leite materno em
relação a outros tipos de leite. Era freqüente a comparação feita pelos
entrevistados de que as crianças que recebiam o leite materno se tornavam mais
fortes e sadias do que as de hoje e citavam que “como as mulheres não estão
conseguindo amamentar os filhos por muito tempo, as crianças acabam ficando
mais fracas e até menos alegres”.
O conhecimento de ter sido amamentado no peito, a
experiência de amamentação materna dos filhos ou a observação do
desenvolvimento adequado de outras crianças que foram amamentadas pela mãe
parecem ter subsidiado o conhecimento das vantagens do leite materno para o
adequado desenvolvimento da criança e influenciado os entrevistados para uma
posição favorável a respeito da amamentação.
Como a maioria dos entrevistados eram de baixa renda,
esperava-se que o aspecto econômico seria citado com maior freqüência entre as
razões do aleitamento materno. Porém, apenas dois entrevistados se lembraram
dessa vantagem. Supõe-se que esse resultado decorra, entre outros fatores, da
cultura já incorporada na população brasileira da prática usual do aleitamento
artificial oferecido às crianças menores de um ano.
A observação de resultados positivos da prática da
amamentação parece ter influenciado, de maneira decisivamente positiva os
entrevistados a esse respeito, pois, grande parte dos pais (41,0%) colocam como
tempo adequado de aleitamento materno um período maior de 12 meses, 18,0%
admitem que a mãe deve amamentar o filho entre 6 e 9 meses e apenas 4,0% citam
que a criança deve ser amamentada menos de 6 meses. Salienta-se que grande
parte dos pais incluídos na pesquisa (30,0%) mostrou-se convicta de que a
amamentação deve perdurar “enquanto a mãe tiver leite” ou “até quando a criança
quiser".
Verificou-se que os pais, às vezes, entravam em
contradição em seus depoimentos quando se indagava conhecimentos específicos em
relação ao leite materno. Apesar dos mesmos reconhecerem a importância do
aleitamento materno, a maioria (60,0%) considera necessária a complementação
desse leite com outros alimentos nos primeiros seis meses de vida da criança.
Os alimentos referidos como necessários ao longo dos seis primeiros meses de
vida da criança foram, principalmente, sopinha de legumes, suco de frutas,
leite em pó, água e chá.
Além da orientação pediátrica nas décadas de 50 a 70
recomendar a oferta de alimentos para complementar a amamentação, acredita-se
que o pai, em geral, está desinformado sobre questões básicas e atuais do
aleitamento materno, está sendo tolhido da experiência de observar mulheres
amamentando os filhos e, também, sofreu a influência de propaganda exaustiva
sobre as vantagens do leite em pó para a saúde da criança em relação ao leite
materno. Provavelmente por ter incorporado esses conhecimentos é que o pai
acredita ser necessária a complementação do leite materno com outros alimentos,
nos primeiros seis meses de vida da criança e, também, se convenceu de que a
mãe pode produzir leite fraco ou em quantidade insuficiente às necessidades da
criança. Grande parte dos pais entrevistados (86,0%) acreditam na existência de
leite materno fraco ou em quantidade reduzida às necessidades da criança.
As referências estudadas sobre a qualidade do leite materno
são unânimes na determinação de que “não existe leite materno fraco”. Na
tentativa de desmistificar esse conceito freqüentemente manifestado na
sociedade brasileira, diversos autores (MARTINS FILHO, 1984; VINHA, 1986;
PINOTTI, 1991; CAMPESTRINI, 1992) reforçam que o leite materno é adequado às
necessidades nutricionais da criança nos primeiros meses de vida e explicam que
a idéia do leite materno fraco é apenas uma crença infundada.
A opinião dos pais sobre a interferência da amamentação
no relacionamento conjugal mostrou que apenas 3,0% do total dos entrevistados
acreditam que possa haver alguma dificuldade. Revelam que “a esposa fica
empatada, fica menos à vontade”, ”a mulher estando amamentando, se o homem
mantiver relação sexual, a mulher pode engravidar” e “o leite fica vazando e
tem homem que não gosta”.
Por estes depoimentos, verifica-se que, dependendo da
posição do marido em relação à prática da amamentação, é necessário um
planejamento do casal para se adaptar à situação especial no período da
amamentação sem prejuízo do relacionamento conjugal e acompanhamento do filho.
Além disso, observa-se, mais uma vez, que o marido deve ser esclarecido sobre
fatores relacionados ao aleitamento materno, para que conceitos errôneos não
provoquem contrariedades sobre o assunto entre o casal. Lembra-se, por exemplo,
que a amamentação exclusiva no peito, nos primeiros seis meses de vida da
criança diminui a chance de gravidez e não a favorece como afirmou um dos pais
entrevistados.
O estudo evidenciou a importância do pai também ser
orientado sobre questões básicas do aleitamento materno para poder prestar
ajuda mais concreta à esposa no período da amamentação e, também, reconhecer a
necessidade e a influência positiva de sua colaboração na fase em que o filho
está sendo amamentado. Foi constatado que o pai reconhece a importância do
leite materno para a saúde da criança, planeja com a esposa propiciar esse
beneficio ao filho, mas, muitas vezes, não concretiza esse plano.
Na maioria das vezes, quando o pai presta algum auxilio
à esposa, parece não valorizar as atividades como meio de contribuição efetiva
para a manutenção do aleitamento materno do filho. Apesar de se mostrarem
interessados no assunto, muitos pais mostraram acreditar que a amamentação e os
cuidados com o bebê são responsabilidades apenas das mulheres.
De modo geral, os entrevistados demonstraram grande
expectativa de aprendizagem do tema com os profissionais de saúde.
Ressalta-se, portanto, a importância da assistência
educativa sobre o aleitamento materno ao pai da criança por estes profissionais
que devem, inclusive, motivá-lo a participar mais ativamente do processo.
BADINTER, E. Um amor conquistado: o mito do amor materno. 6.ed. Rio de
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Notas:
[1] SERAFIM, D. Estudo das opiniões do pai sobre o
aleitamento materno e sua participação neste processo. Texto extraído da Revista
Brasileira Crescimento Desenvolvimento Humano, São Paulo, 9(1), 1999.