EXCELENTÍSSIMO SR. DR. JOÃO FRANCISCO BEZERRA DE
CARVALHO, DD. PROCURADOR DA REPÚBLICA, INTEGRANTE DO NÚCLEO DE INVESTIGAÇÃO
CRIMINAL DA PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
no Estado do Paraná (Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região), por seu
Procurador Regional do Trabalho abaixo assinado, vem, respeitosamente,
oferecer:
REPRESENTAÇÃO
contra a Sra. SOLANGE MARA
NOGUEIRA, Diretora do Centro de Educação Infantil Espaço Livre, com sede à
Rua Mato Grosso, n. 1.300 (esq. Rua Raposo Tavares), Londrina (PR), CEP
86010-180, pelos fundamentos de fato e de direito a seguir elencados:
I. DOS FATOS
Em data de 26 de
abril de 2.001, a Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região recebeu
denúncia, via internet, contra a ora representada, nos seguintes termos:
"Escola infantil Espaço Livre em Londrina
trabalha com meninas que não possuem registro em carteira e sem horário de
almoço, também não têm férias e ainda recebem ameaças de sua chefe de que se
denunciarem alguma coisa nunca mais conseguirão emprego, porque elas ligam lá e
estragam tudo, dizendo que a pessoa entrou no sindicato para reclamar seus
direitos. Por isso, acho injusto que isto ainda esteja acontecendo em nosso
país, gostaria muito que fosse tomada as providências
urgentíssimas” (fls. 03 do Procedimento Investigatório em anexo).
A denúncia supra
foi autuada (Procedimento Investigatório n. 330/01), sendo que os autos
foram distribuídos ao Procurador Regional do Trabalho Dr.
ALVACIR CORREA DOS SANTOS (fls. 05), ora representante.
Informe-se que o
sigilo da fonte foi preservado, conforme pedido do próprio denunciante.
Iniciando a
investigação, o Procurador oficiante requisitou à Subdelegacia Regional do Trabalho em Londrina fiscalização,
com urgência, na Escola dirigida pela representada, com a finalidade de
proceder à apuração dos fatos denunciados (fls. 06).
A fiscalização do
trabalho, nos limites de sua competência, pôde constatar as irregularidades
constantes das fls. 8/16 dos autos, destacando-se:
"Em fiscalização à empresa Escola Espaço
Livre S/C Ltda, CNPJ n. 73.219.677/0001-99, foi constatado que a empresa possui
duas empregadas, as quais foram encontradas trabalhando sem registro. Foi
lavrado o Auto de Infração n°. 001959883, capitulado no artigo 41, caput, da
CLT" (fls. 8).
Cópia do Auto de
Infração em referência foi juntada às fls. 16.
O Procurador
oficiante determinou fosse a empresa investigada intimada a comparecer em
audiência na Procuradoria, conforme notificação de fls. 18, nos seguintes
termos:
"Nos termos do art. 8º, VII, e 84, II, da
Lei Complementar n. 75/93, fica a empresa ESCOLA INFANTIL ESPAÇO LIVRE,
intimada a comparecer através de seu representante legal ou de preposto com
poderes para firmar eventual Termo de Compromisso, conforme a previsão do p. 6º
do art. 5º da Lei 7.347/85, com redação dada pela Lei n. 8.078/90, em AUDIÊNCIA
DESIGNADA PARA O DIA 10 DE AGOSTO DE 2.001, ÀS 10:00 HORAS, a realizar-se na
sede desta Procuradoria, situada na Av. Jaime Reis, n.
331, São Francisco, Curitiba (PR), fone 322-6313, conforme deliberado pelo
Procurador Regional do Trabalho, Dr. Alvacir Correa
dos Santos. A presente audiência tem por finalidade tratar sobre a
irregularidade na contratação de menores, devendo o representante da empresa
comparecer munido de poderes expressos para firmar eventual Termo de
Compromisso".
Na data designada
para a audiência (10.08.01, às 10:00 horas), a empresa investigada não
compareceu, conforme certidão de fls. 19. Apenas, foi protocolizado na Procuradoria,
no mesmo dia, 10.08.01, porém às 16:45
horas, o expediente da investigada, nos seguintes termos (fls. 20):
"Em resposta à notificação supra citada, recebida no dia 04.07.01,
informamos que a Escola Infantil Espaço Livre não tem em seu quadro de funcionários
menores de idade. Outrossim, informamos que não poderemos comparecer à
audiência".
O Procurador
oficiante expediu requisição, sob as penas da lei, diretamente à Diretora da
escola investigada, Sra. SOLANGE MARA NOGUEIRA, nos seguintes termos:
"REQUISITO que nos envie informação, por
escrito, sobre o porquê do não comparecimento à audiência, com a devida
justificativa, pois o expediente anteriormente enviado não contém justificativa
válida" (fls. 22).
A resposta da
investigada veio às fls. 24, sendo-se conveniente destacar os seguintes trechos
da missiva:
"Entendo que deixei de comparecer à
audiência designada pelo Ministério Público do Trabalho no dia 10.08.01, mas me
justifico novamente (...) não compareci por ser em Curitiba e não disponho de
recursos financeiros para esta finalidade (...)"
"Sugiro à Vossa
Senhoria, com o devido respeito, que se possível for designe a audiência para
esta Cidade, onde estou domiciliada e o da Escola que dirijo".
"Por derradeiro, saliento que esta
Escola tem como alunos filhos de Juízes do Trabalho e de Advogados, com os
quais manteve contato informal, tanto antes como agora para efeito de se
saber como proceder quanto à Notificação para comparecimento em Curitiba e
agora quanto à sua requisição" (grifamos)
Mais uma vez, o
Procurador oficiante designou audiência (17.09.01, às 09:00 horas), na sede da
Procuradoria (fls. 27), requisitando-se a presença da Sra. SOLANGE MARA
NOGUEIRA, sob as penas da lei, fazendo-se constar da intimação, dentre outras,
as seguintes informações (fls. 28):
"A alegação de não disponibilidade de
recursos financeiros para comparecimento à audiência não é justificativa
válida";
"Quanto ao pedido de designação de
audiência na sede da requerida, informe-se que quem deve prestar contas sobre a
existência de possíveis irregularidades trabalhistas, além das já mencionadas e
documentadas nestes autos de Procedimento Investigatório, é a própria
requerida. Portanto, compete a esta atender as requisições do Ministério
Público, caso contrário terá que arcar com as penalidades impostas pela
lei";
"Quanto à alegação de que a escola tem
como alunos filhos de Juízes do Trabalho e de Advogados, com os quais manteve
contato informal, isso em nada obsta ou obstará a atuação do MPT, pelo
contrário, serve de prova de que a representante da requerida tem conhecimento
e possibilidades de atender às requisições do MPT";
"Ademais, mesmo que não tivesse esses
conhecimentos e possibilidades, é seu dever vir, pessoalmente, ou por preposto
devidamente autorizado, prestar contas sobre os fatos denunciados e que lhe
dizem respeito”.
A resposta da
investigada, Sra. SOLANGE MARA NOGUEIRA, veio às fls. 32/34, destacando-se
aqui, mais uma vez, alguns trechos da mesma:
"Com o devido respeito, dirijo-se mais
uma vez à elevada presença de Vossa Senhoria (...) para reiterar
integralmente as duas correspondências anteriores, de minha lavra"
"Não me nego a comparecer a quaisquer
audiências que forem designadas, desde que em Londrina, meu domicílio, foro
competente para eventual ação civil pública (art. 2º da Lei 7.347/85). Mais uma
vez encareço à Vossa Senhoria que informe o
fundamento legal (número da lei e do seu dispositivo) que me obriga a
comparecer à audiência fora do meu domicílio, e ainda mais, ÀS MINHAS EXPENSAS
(...)"
"Ao contrário do que aduz Vossa Senhoria,
não tenho o dever legal de ir a Curitiba prestar contas sobre fatos
supostamente denunciados, a cujo respeito não fui, até a presente data,
informada. Não os conheço" (...)
"Até esta data, nas três correspondências
que recebe da CODIN, ainda não fui informada em quais dispositivos se baseia
Vossa Senhoria para respaldar suas ameaças, as quais, com a devida vênia,
reputo descabidas, mesmo porque, conforme já notificado, não pratiquei nenhum
dos atos dos quais fui injustamente acusada. Gostaria, também, de ser informada
qual A LEI E SEU ARTIGO que qualifica justificativas,
para ausência em audiências em procedimento investigatório do Ministério
Público do Trabalho, em válidas e inválidas, ou se a recusa daquelas apresentadas
anteriormente é fruto de sua 'vontade'"
"Requeiro a Vossa Senhoria (...) a disponibilização – por este órgão – de recursos
financeiros para o custeio das despesas que se fizerem necessárias"
"Por derradeiro, informo-lhe, conforme
cópia anexa, que estou comunicando sua conduta à Corregedoria do Ministério
Público do Trabalho, mediante ofício acompanhado de cópias dos expedientes
anteriores, remetidos pela CODIN" (grifamos)
Conforme acusa a
certidão de fls. 36, a audiência designada para o dia 17.09.01, às 09:00 horas,
não se realizou em virtude da ausência da investigada.
II. DO DIREITO
Não obstante a ira, o desrespeito, a tentativa de
intimidação, as palavras ofensivas à Instituição Ministerial assacadas pela Sra. SOLANGE
MARA NOGUEIRA, cabe destacar que a atitude do Ministério Público do
Trabalho, no presente caso, esteve baseada (como não poderia deixar de ser) em
vários dispositivos de lei, sendo pertinente registrar os abaixo elencados:
A Lei
Complementar n 75/93, em seu art. 8º, estatui:
"Para o exercício de suas atribuições, o
Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência: IV – requisitar
informações e documentos a entidades privadas; VII – expedir
notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que
instaurar" (grifamos).
O p. 3º do art.
8º supra estabelece:
"A falta injustificada e o retardamento
indevido do cumprimento das requisições do Ministério Público implicarão a
responsabilidade de quem lhe der causa" (grifamos).
Por sua vez,
rezam os arts. 83, inciso III,
e 84, inciso II, da mesma Lei Complementar:
Art. 83. "Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das
seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho: III – promover
ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses
coletivos, quando desrepeitados os direitos sociais
constitucionalmente garantidos".
Art. 84. "Incumbe ao Ministério Público do Trabalho, no âmbito das
suas atribuições, exercer as funções institucionais previstas nos Capítulos I,
II, III e IV do Título I, especialmente: II – instaurar inquérito civil e
outros procedimentos administrativos, sempre que cabíveis, para assegurar a
observância dos direitos sociais dos trabalhadores”.
Observe-se que a
denúncia imputa à investigada irregularidades
referentes ao trabalho de menores (fls. 3), sendo que a fiscalização competente
pôde comprovar a existência de algumas delas, conforme os documentos de fls.
8/16, os quais informam a falta de registro de duas menores de 16 anos que
prestam (ou prestavam) serviços à Escola investigada.
A Constituição
Federal, em inúmeros dispositivos, fala sobre a proteção ao trabalho do
adolescente, registrando-se aqui apenas os seguintes:
Art. 227 – "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar
à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão"
(grifamos).
Parágrafo 3º - "O direito a proteção especial abrangerá os
seguintes aspectos: II – garantia de direitos previdenciários e trabalhistas"
(grifamos).
Dessa forma, não
é por acaso que a Lei Complementar n. 75/93, além dos artigos já mencionados,
estatuiu em seu
Art. 5º - "São funções institucionais do Ministério Público da
União: III – a defesa dos seguintes bens e interesses: e) os direitos e
interesses coletivos, especialmente das comunidades indígenas, da família,
da criança, do adolescente e do idoso" (grifamos)
E também no
inciso V do art. 83 da mesma Lei, como atribuição do Ministério Público do
Trabalho:
"propor as ações necessárias à defesa dos
direitos e interesses dos menores, incapazes e índios, decorrentes
das relações de trabalho" (grifamos).
Existiriam,
ainda, muitos outros dispositivos de lei (a exemplo dos relativos
à Lei da Ação Civil Pública – Lei 7.347/85, e ao Estatuto da Criança e
do Adolescente) passíveis se serem arrolados, como forma de balizar a atuação
deste Órgão Ministerial, todavia isso se mostra ora desnecessário.
As
correspondências dirigidas ao Ministério Público do Trabalho pela representada
caracterizam-se pelo desrespeito à
Instituição e às finalidades que a esta compete curar, contendo palavras acintosas e "frases intimidativas" ("que a Escola tem como alunos filhos e Juízes do Trabalho e
advogados..." – fls. 24; comunicação
de conduta do Procurador oficiante à Corregedoria do Ministério Público do
Trabalho – fls. 34), tudo no intuito de intimidar o Procurador oficiante e
obstar a atuação ministerial em seu DEVER de dar cabo às suas funções
institucionais explicitadas pelos arts. 127 e 129 da
Constituição Federal.
Observar que a
simples alegação da investigada, no sentido de que "não dispõe de recursos financeiros para vir à Procuradoria em
Curitiba", mostra-se absurda e despropositada, pois, a se caminhar
nessa linha de alegação, todos os investigados pelo Ministério Público
(Federal, do Trabalho, do Estado), que não têm domicílio em municípios sedes de
Procuradorias, Promotorias etc., estariam isentos de atender ao chamamento do
Órgão, bastando fazerem alegação similar.
Registre-se, por
fim, que enquanto vem ocorrendo uma mobilização social intensa, seja através de
entidades governamentais e não-governamentais, seja através de Instituições
nacionais e internacionais (UNICEF, OIT, etc), tudo com vistas a dar
atendimento prioritário e urgente à
questão da criança e do adolescente no País, ainda se encontram pessoas
oferecendo resistência infundada, e o pior, desrespeitosa
e acintosa aos órgãos encarregados de zelar pelo respeito aos direitos e
interesses maiorais da sociedade brasileira.
III. DO PEDIDO
Em face do
exposto, pede o Ministério Público do
Trabalho, pelo Procurador ora representante, seja a Sra. SOLANGE MARA NOGUEIRA, Diretora do
Centro de Educação Infantil Espaço Livre, com sede em Londrina (PR), responsabilizada, por essa Ilustrada
Procuradoria da República no Estado do Paraná, não somente pelo desatendimento
às requisições e intimações do Órgão Ministerial, como também pelo desrespeito
e à forma acintosa com que se dirigiu à Instituição.
Nesses Termos
Pede Deferimento.
Curitiba (PR), 19
de setembro de 2.001.
ALVACIR CORREA
DOS SANTOS
Procurador Regional do Trabalho