História, Princípios e Procedimentos de Ações
Ao lado dos direitos fundamentais, o ACERVO introduziu o tema História, Princípios e Procedimentos de ações, que constitui a base teórica do Direito da Criança e do Adolescente.
Nessa área foi selecionado um vasto material que gravita em torno dos direitos fundamentais e que dão sustentabilidade às decisões judiciais, aos pareceres ministeriais e às manifestações de advogados e procuradores.
No ACERVO, os temas são dos mais variados, como a doutrina da proteção integral; a regra da absoluta prioridade no atendimento; o resgate da caminhada histórica do Direito da Criança e do Adolescente; os incidentes processuais; a exegese de artigos da Constituição Federal, do Estatuto e de outras leis transversais, que incidem sobre direitos infanto-juvenis etc.
A
Doutrina da Proteção Integral dos
Direitos da Criança e do Adolescente refere-se a um conjunto de
instrumentos jurídicos de caráter nacional e internacional,
que representam um salto qualitativo e fundamental na consideração social da
infância.
Essa
doutrina surgiu no cenário jurídico, inspirada nos movimentos
internacionais de proteção à infância, materializados em tratados e
convenções, especialmente: a) Convenção sobre os Direitos da Criança; b) Regras
Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil (Regras de Beijing); c) Regras Mínimas das Nações Unidas para a
Proteção dos Jovens Privados de Liberdade; e d) Diretrizes das Nações Unidas
para a Prevenção da Delinqüência Juvenil (Diretrizes de Riad).
A
doutrina da proteção integral, entre nós, foi consagrada no art. 227 da
Constituição Federal, rompendo, definitivamente, com a doutrina da “situação
irregular”, que se encontrava em vigor, por força da Lei nº 6.697/79 – Código
de Menores.
O
dispositivo constitucional acima citado dispõe que “é dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
Ao
regulamentar aquele dispositivo constitucional, o Estatuto da Criança e do
Adolescente – Lei nº 8.069/90, reproduziu o conceito da proteção integral em
seus artigos 1º ao 6º.
Pela
primeira vez na história das constituições brasileiras, o problema da criança é
tratado como uma questão pública e abordado de forma profunda, atingindo,
radicalmente, o sistema jurídico. Essa mudança é significativa, pois considera,
a partir de agora, que crianças e adolescentes são pessoas em desenvolvimento e
sujeitos de direitos, independente de sua condição social. E a lei deverá
respeitar essa condição peculiar, característica singular desse sujeito, que,
até então, tinha direitos, mas que não podia
exercê-los, por estar vinculado e submisso ao pátrio poder. Nessa perspectiva,
criança e adolescente são os protagonistas de seus próprios direitos.
A
modificação estrutural do Direito da Criança e do Adolescente ficou mais
evidente quando se busca, no sistema anterior, sustentado pelo Código de
Menores, a doutrina da situação
irregular, cujo princípio decorria do fato de que o menor estava numa
carente situação de desenvolvimento quer em sua natureza física, em decorrência
da idade, mental ou jurídica não reunindo capacidade para sua autodefesa de
fato ou de direito.
A
mudança de paradigma entre as duas doutrinas refletiu, mais intensamente, nos
aspectos relacionados à organização e gestão dos serviços de atendimento,
considerando, entretanto, que sua principal proposta de mudança outorgou o
status de sujeito de direitos às crianças e adolescentes.
Por
ordem constitucional, os direitos de todas as crianças e adolescentes devem ser
universalmente reconhecidos, por serem especiais e específicos, considerando-se
a peculiar condição da pessoa em desenvolvimento.
A
condição peculiar de pessoa em desenvolvimento sugere, primeiramente, que a
criança e o adolescente não conhecem inteiramente os seus direitos, não têm
condições de defendê-los e fazê-los valer de modo pleno, não sendo ainda
capazes, principalmente as crianças, de suprir, por si mesmas, as suas necessidades.
O
atendimento prioritário dos interesses infanto-juvenis foi mais bem traduzido
no art. 3º, da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, ao
estabelecer que “todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições
públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades
administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente (com
prevalência), o interesse maior da criança”. Sob essa denominação, a Convenção
definiu o objetivo de estender a proteção legal à criança, de forma completa,
integral e com absoluta prevalência.
A ordem de prioridade no atendimento daqueles direitos, inserida no texto da Convenção, é uma garantia vinculada à ordem jurídica mais expressiva na medida em que sua proposta foi recepcionada pela Constituição Federal, a fim de assegurar a efetividade aos direitos subjetivos. Trata-se de um princípio jurídico-garantista na formulação pragmática, por situar-se como um limite à discriminação das autoridades.
O texto da Convenção, constituindo um poderoso instrumento de incentivo à criação de condições políticas, jurídicas e culturais, propõe melhorar a condição de vida das crianças e adolescentes. Converter o tema da infância em prioridade absoluta constitui o pré-requisito político e cultural dessas transformações.
Com esse propósito, a Constituição Federal de 1988 inseriu uma regra - até então inédita - que previa o atendimento diferenciado e privilegiado de todos os direitos de crianças e adolescentes: o atendimento com absoluta prioridade.
O princípio da legalidade dos direitos infanto-juvenis acha-se contemplado na legislação brasileira, que é, diuturnamente, enriquecida pelo debate científico de pesquisadores, que transitam pelas diversas ciências correlatas ao Direito.
Tomando como referência, o corpo jurisprudencial catalogado, componente da área em questão, o Conselho Editorial do ACERVO distanciou-se da pretensão de adotar correntes doutrinárias, objetivando somente a divulgação de orientações e entendimentos, advindos dos tribunais.
Portanto, no tema História, Princípios e Procedimentos de ação pretendeu-se contribuir para a fundamentação teleológica do Direito da Criança e do Adolescente e, ao mesmo tempo, permitir uma saudável troca de conhecimentos e posicionamentos sobre os diversos enfoques aqui expostos.
Promotor de Justiça