A AMAMENTAÇÃO DE BEBÊS PRÉ-TERMO: UM CAMINHO POSSÍVEL
PARA A CONSTRUÇÃO DA COMUNICAÇÃO
Susana E. Delgado[1]
Fonoaudióloga.
Marileuza Zorzetto[2]
Fonoaudióloga.
Resumo: O
objetivo do presente trabalho foi verificar o conhecimento que as mães de
filhos pré-termo têm à respeito do aleitamento materno e da importância deste
como forma de comunicação, descrevendo os sinais de vínculo e comportamentos
comunicativos da díade mãe-bebê durante a amamentação. Foram realizadas
entrevistas com as mães e observação da amamentação. A amostra foi composta de
15 mães, com idades entre 20/25 anos, e seus bebês pré-termo, internados na UTI
Neonatal. Os resultados quanto ao conhecimento das mães em relação ao
aleitamento mostraram que a maioria tinha informações adequadas sobre o mesmo,
sendo que as formas de comunicação mais observadas foram a
expressão facial, o contato visual e o contato físico. Concluiu-se que a
maioria das díades, apesar das dificuldades iniciais, consegue, por meio da
amamentação, desencadear a experiência da comunicação e da vinculação mãe-bebê.
Palavras-chave
Interação
mãe-bebê; aleitamento materno; fonoaudiologia; bebês
pré-termo.
Introdução
A
partir do momento em que uma mãe leva, pela primeira vez, o recém-nascido (RN)
ao peito, ela passa a saber que as mensagens amorosas que acompanha a
amamentação são tão importantes para o bem-estar do bebê quanto o próprio
leite.
Desta
forma, cada vez mais são criados programas de incentivo ao aleitamento materno
exclusivo buscando-se, com isto, melhorar a qualidade de vida e a redução da
morbidade e mortalidade infantil, principalmente quando se trata de prematuros
de baixo peso. Tais programas possibilitam melhorar a evolução clínica dos
bebês, quando hospitalizados por um período de tempo prolongado, muitas vezes
antecipando a alta (PEREIRA, 1996).
De
acordo com LOPES (1999), ainda dentro da UTI Neonatal, as mães são estimuladas
a manter a lactação por intermédio de ordenhas, de modo a facilitar o
aleitamento materno logo que a criança adquire condições clínicas. Importante
enfatizar que manter a lactação é uma tarefa difícil, Quanto menor é o
recém-nascido, mais tempo será necessário para ele atingir uma estabilidade
clínica, e os inúmeros períodos de piora e melhora clínica são causadores de
estresse para a mãe, dificultando ainda mais a manutenção da lactação.
Conforme
afirmam MARTINEZ e CAMELO (2001), pela presença constante das mães nas UTI's, especialmente pelo estímulo dado à ordenha de seu
leite para a alimentação do seu pequeno pré-termo, tem sido possível estreitar
os laços de união entre mãe e filho, sendo utilizada a técnica do Método
Canguru como um recurso para se estimular o contato pele a pele.
A
amamentação é a melhor forma de alimentação sob o aspecto nutricional. Além
disso, favorece as necessidades afetivas pelo contato íntimo entre a díade,
onde a troca de olhares, o choro, os toques e fala com o bebê estimulam o
desenvolvimento da linguagem e o estabelecimento do vínculo.
O
contato face a face é essencial para as interações harmoniosas entre a dupla
mãe bebê. Comportamentos do bebê como olhar, emitir sons, sorrir e chorar são
sinais que indicam quando eles estão disponíveis para interagir e quando devem
alterar ou terminar a interação (BARCELLOS e col.,
1996).
Faz
parte da avaliação fonoaudiológica do recém-nascido
verificar a qualidade do contato inicial entre a mãe e seu bebê. A formação de
um vínculo adequado nos dias que se seguem
ao nascimento é a primeira garantia de uma resolução favorável de
futuras crises no desenvolvimento. Para o recém-nascido
prematuro, enfermo ou envolvido em condições sócio-econômicas
adversas, a interação pode representar a diferença entre a negligência e
maus tratos, e a possibilidade de uma infância saudável (GIACOMINI, 1991).
A
mesma autora ressaltou que a prematuridade é uma
experiência traumática para mãe e cerca o recém-nascido de déficit interacionais. Este pode ser pouco reativo ao rosto humano,
aos estímulos visuais e auditivos; pode ser difícil de ser consolado, possuindo
dificuldades na área motora e pouca tolerância à estimulação excessiva que via
de regra lhe é oferecida. Durante o aleitamento, deve-se observar se ocorre o
contato olho a olho, que pode indicar dois sinais significativos de problemas
na interação mãe-bebê: a ausência de estimulação tátil e da auditiva. Uma
situação de dificuldade no vínculo pode envolver medidas como um adiamento da
alta hospitalar, entre outras.
A comunicação da mãe com seu filho passa
a ser um intercâmbio: enquanto ela o alimenta ou responde a suas outras
necessidades, como troca de fraldas, banho ou aconchego, o bebê responde com os
seus próprios recursos, através de mímicas, vocalizações, sorrisos, choro,
dormir ou mamar. Com isso, a relação entre mãe e filho torna-se um "verdadeiro diálogo (MORIZOT, 1999; FINNIE, 2000).
As
mesmas autoras relatam que, no momento da alimentação, quando a mãe conversa
com alguém, o bebê pára de sugar ou altera seu ritmo de sucção, prestando
atenção na mãe. A criança age tanto sobre a sua mãe por meio de seus olhares,
sorrisos, mímicas, quanto a mãe sobre o seu bebê por
meio de palavras, gestos e toques que possuem um efeito tranqüilizador. Um
sistema de comunicação equilibrado entre a mãe e o bebê irá orientar e
facilitar a intervenção da mãe com relação à criança e a conseqüente formação
do vínculo, que vai se solidificando no desenrolar da interação.
Dentro
deste marco, a atuação da Fonoaudiologia nas unidades
de tratamento intensivo neonatal tem, cada vez mais, um papel fundamental em avaliar e incentivar o
aleitamento materno visando o desenvolvimento dos órgãos fonoarticulatórios,
favorecendo o estabelecimento da relação mãe-filho, fundamental ao
desenvolvimento da linguagem (HERNANDEZ, 1996; XAVIER, 1996).
A
presente pesquisa teve como objetivo verificar o conhecimento que as mães acima
de 20 anos de filhos prematuros têm sobre aleitamento materno e comunicação;
descrever as características sócio-demográficas de idade, escolaridade, renda e
estado civil, que constituem fatores de risco para o vínculo; e descrever os
comportamentos comunicativos da díade mãe-bebê no momento da amamentação, com a
finalidade de auxiliar os profissionais de saúde a conhecer estes
comportamentos para melhor promover e incentivar o desenvolvimento harmonioso
do bebê, nos seus aspectos emocionais e comunicativos.
Material e método
A
pesquisa realizada foi do tipo observacional;
descritiva; transversal; de grupo; prospectiva e contemporânea (GOLDIN, 1997).
A
amostra foi composta por 15 mães, com mais de 20 anos de idade e bebês
pré-termos de ambos os sexos, internados na UTI neonatal do Hospital de
Clínicas de Porto Alegre, nascidos no período de Setembro a outubro de 2002.
Foram estabelecidos como critérios de exclusão: bebês pré-termos com
malformações de cabeça e pescoço, mães adolescentes, mães portadoras do vírus HIV
positivo e mães que não pudessem ou não desejassem amamentar por qualquer
motivo.
Os
instrumentos de avaliação e/ou coleta foram compostos
por: uma ficha de coleta de dados do prontuário do paciente; informações sobre
condições do bebê ao nascer e as atuais; ficha de entrevista com as mães, com
questões fechadas e abertas (gravada e posteriormente transcrita) referente aos
dados sócio-demográficos e sobre o conhecimento do aleitamento; e ficha de
protocolo de observação dos sinais de vínculo mãe/bebê
e da comunicação durante a amamentação (Anexo A).
A
análise dos dados foi feita de forma estatística descritiva (quantitativa),
utilizando-se medidas de tendência central como média e limites máximos e
mínimos, e qualitativa, por categorização das respostas às questões abertas, de
forma a relacionar os dados coletados com a teoria consultada.
O
projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética do Grupo de Pesquisa e
Pós Graduação do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Resultados e discussão
Caracterização da amostra
No
período de setembro a outubro 2002, nasceram 24 bebês pré-termo de mães com
mais de 20 anos, na UTI neonatal do HCPA. Porém, a presente pesquisa foi
realizada com a participação de 15 díades dado que 9 díades foram excluídas da
pesquisa com base nos critérios de
exclusão anteriormente citados.
Caracterização dos bebês
A
maioria dos bebês da pesquisa 10 (67%) era do sexo masculino e 5 (33%) eram do
sexo feminino. Para o peso ao nascer, a média encontrada foi de 1996g; para o
peso atual, a média encontrada de 2096g, e para a idade gestacional, a média
encontrada foi de 35 semanas e 4 dias. A tabela 1 mostra estes dados.
Dos
15 bebês observados, 9 (60%) fizeram uso de sonda como forma de alimentação,
antes da via oral ser liberada. XAVIER (1996) e HERNANDEZ (1996) referem que os
bebês prematuros precisam se alimentar por sonda, uma vez que se encontram em
situações de gravidade, quando a utilização plena da via digestiva no momento
em que o RN precisa ser mais bem nutrido, torna-se difícil. Devem, então, ser
alimentados por vias alternativas, como a via parenteral ou via enteral, a fim de garantir sua sobrevivência. As mesmas
autoras afirmam que o uso prolongado das
vias alternativas de alimentação pode levar à inibição e/ou
alterações dos reflexos orais, das estruturas do sistema sensório motor oral e
de suas funções, prejudicando a amamentação. Portanto, este achado coincide com
a literatura consultada.
Tabela
1. Dados de peso e idade gestacional dos bebês.
Com
respeito à alimentação no momento da observação, dos 15 bebês da pesquisa, 6
(40%) faziam a alimentação exclusiva ao seio materno, 5
(33%) faziam alimentação mista (pelo seio materno e mamadeira), 4 (27%) faziam
pelo seio materno e sonda. Este achado coincide
com o de FOGO (2000) que, em seu estudo sobre orientação e incentivo ao
aleitamento materno do recém-nascido prematuro, constatou que o uso de fórmulas
lácteas oferecidas por mamadeira era freqüente. Embora PEREIRA (1996) reina
que, devido à sua composição inigualável, o leite humano é considerado a fonte
nutricional preferida para os prematuros, principalmente pelas suas vantagens
imunológicas e nutricionais, o uso complementar de alimentação com mamadeira é
uma rotina ainda bastante difundida nos hospitais.
Caracterização das mães
Com
referência à idade das mães entrevistadas, os dados da tabela 2 mostram que a
maioria das mães, ou seja 9 (60%), possuíam de 20 a 25 anos de idade.
Tabela 2. Idade da mãe.
Das
mães entrevistadas, 5 tinham primeiro grau incompleto (33%), 4 primeiro grau
completo (26%), 3 segundo grau completo (20%), 1
segundo grau incompleto (7%), 1 das mães teve terceiro grau incompleto (7%), e
1 mãe teve terceiro grau completo(7%).
Referente
aos dados do estado civil, das 15 mães entrevistadas, l0
eram casadas ou "ajuntadas", conforme referiram na entrevista.
Com
respeito à renda familiar das mães entrevistadas, a tabela 3 mostrou que a
renda familiar de 33,3 % das entrevistadas estava entre R$ 601,00 e R$
1.200,00, e 26,7% ganhavam mais de R$ 1
.200,00. A população de baixa renda, pela sua dificuldade de ter acesso aos
serviços de saúde, apresenta um maior número de partos prematuros (PREDOMÔNICO,
1998). Porém, os achados desta pesquisa apresentaram mães de renda familiar
mais elevada do que 3 salários mínimos (R$ 600,00), considerado como baixa
renda, portanto, discordante da literatura. Os dados referentes a fatores
demográficos, como baixa renda, idade, baixa escolaridade e estado civil são
apontados, na literatura, como potenciais riscos para a prematuridade
e o baixo peso ao nascer. Portanto, sua inclusão, neste estudo, justifica-se
para verificar o perfil das mães pesquisadas.
Resultados principais
Foi
constatado que 93%, ou seja, 14 das mães entrevistadas receberam orientação
sobre amamentação e que apenas 1 mãe não tinha recebido orientação. Em relação
ao local em que a mãe recebeu esta orientação sobre amamentação, 5 (33%) mães
referiram o pré-natal, 5 (33%) mães referiram UTI neonatal, e 4 (27%) das 15
mães responderam receber estas orientações após o parto, no quarto, sendo que 1
mãe não recebeu orientação sobre a amamentação, em nenhum momento.
Tabela 3. Renda Familiar.
KING
(1991) e SILVESTRE (2002) afirmam que, ainda no pré-natal, a mãe deve ser
esclarecida que, durante a amamentação, ela produz um hormônio (ocitocina )
que ajuda na rápida contração do útero, evitando hemorragias pós-parto,
anemias, bem como tornando a mulher menos vulnerável ao câncer de mama e útero,
em função dos baixos índices de estrógeno neste período. Deve ser informada
igualmente de que o início do aleitamento materno precoce facilita o
aprendizado da sucção.
De
acordo com LAWRENCE (1996), é melhor preparar a amamentação muito antes do
parto. As futuras mães deveriam refletir sobre a alimentação do filho durante o
período pré-natal, quando a gravidez está bem estabelecida. Deveriam realizar
uma ou mais consultas pré-natais para comentar sobre a amamentação e sobre
outros aspectos da puericultura a respeito dos quais podem ter dúvidas. As
consultas pré-natais também devem tratar de qualquer dúvida que as mães podem
ter sobre o processo de produção do leite e sobre a capacidade de ter leite
suficiente. Nestas consultas pré-natais, a gestante já pode iniciar leituras
sobre a amamentação. No presente estudo, verificou-se que das 15 mães
entrevistadas, apenas 5 delas foram orientadas no pré-natal.
A
maioria das mães, ou seja, 14 das 15 mães entrevistadas (93,3%) realizavam
visitas aos seus bebês todos os dias da semana. Como todas as mães estavam
amamentando, a maioria delas comparecia todos os dias da
semana para oferecer o seio materno, em algum horário do dia. De acordo com BARCELLOS e col.(1996), a atividade da mãe com seu bebê prematuro na
UTI Neonatal pode ser um bom indicador de sua adaptação social ao bebê, assim
como seu ajustamento emocional. Conforme as mesmas autoras, este dado contribui
para a criação do vínculo mãe/bebê, pois quanto mais
a mãe visita seu bebê prematuro, mais o conhece e identifica as suas
necessidades, sendo que a separação precoce, freqüentemente vivida pelos bebês
prematuros e por suas mães, é um fator de risco para a interação mãe-bebê.
Foi
verificado que 7 (47% ) das mães entrevistadas
utilizaram o método Canguru e 8 mães preferiram não o realizar. A metodologia
Canguru foi implantada em 2000 em todas as UTI’s Neonatais por iniciativa do
Ministério da Saúde como um programa nacional que promove um atendimento
humanizado ao recém-nascido de baixo peso. Esta preconiza o contato pele a pele
precoce entre a mãe e seu o prematuro. Desta forma, a amamentação, que é um
componente importante na atenção mãe-bebê, recebe enfoque especial, com uma
abordagem direcionada às necessidades desse grupo específico (OLIVEIRA, 2001).
Porém, no presente estudo, apenas 47% das mães fizeram uso deste método
sugerindo que ainda não se está conseguindo atingir toda a população que
necessitaria deste cuidado.
Perguntou-se
às mães a sua opinião à respeito de o bebê tentar se
comunicar: 10 mães (67%) responderam que o bebê tenta se comunicar. AIMRAD
(1998) afirma que todo ser humano atento pode constatar a capacidade do bebê se
comunicar, em maior ou menor grau, desde que possa ver no bebê um interlocutor
e um ser cheio de múltiplas capacidades, à espera de progredir. OLIVEIRA e
BUSSAB (1996) referem que o bebê, desde o nascimento, apresenta predisposição
para estabelecer formas elementares de interação social. Uma mãe sensível aos
sinais de bebê, que responde de forma contingente, estará promovendo o
desenvolvimento harmonioso da criança. Essas autoras afiariam que, dentro de um
nível de organização próprio, o bebê está equipado para interagir com os
adultos cuidadores. Esta visão de prestação de
cuidados como forma de interação torna-se fundamental. Assim, cuidar do bebê
deixa de ser um ato mecânico e técnico, tornando-se uma forma
de comunicação.
Na
tabela 4, verifica-se o conhecimento que as mães com mais de 20 anos têm a
respeito do aleitamento materno e das orientações recebidas sobre o mesmo. A
maioria das entrevistadas respondeu que a forma de posicionar o bebê no seio
materno e a pegar no seio são as orientações mais lembradas.
XAVIER
(1996) e ARONIS e FIORINI (2002) referem que o posicionamento dos bebês durante
a amamentação é muito importante. O posicionamento do recém-nascido em supino,
com a cabeça elevada num ângulo menor que 45° graus, além de facilitar a pega
do seio, evita que o leite desça para a tuba auditiva causando otites, o que
pode prejudicar o desenvolvimento da percepção auditiva e, conseqüentemente, da
linguagem.
A
pega do seio também foi lembrada pelas entrevistadas e, de acordo com FOGO
(2000) e CUNHA (2001), a dificuldade na pega do seio gera fissura ou rachaduras
no mamilo. Devido a isto, é necessário que o bebê abocanhe todo o mamilo e
parte da auréola porque, desta forma, o bico do peito toca o céu da boca e
estimula a ação de sugar, evitando assim a fissura do mamilo que pode influir
no desmame precoce.
Tabela 4. Orientações sobre
amamentação mais lembradas.
A
orientação quanto à estimulação do seio materno foi citada por 6 das 15 mães
entrevistadas. Segundo SOUZA (200l), a ordenha da mama está indicada em vários
casos. Em especial, quando o bebê é prematuro ou doente, é indicado realizar a
ordenha para manter a lactação enquanto o bebê não mama. Este procedimento pode
ser mantido como ordenha parcial antes das mamadas com o objetivo de instalar o
fluxo de leite e facilitar a amamentação para o bebê.
As
mães foram questionadas quanto a como elas percebiam a comunicação do bebê. A
tabela 5 mostra as suas respostas.
Conforme
a tabela 5, os sinais de comunicação mais percebidos foram o
contato visual, seguido de gestos faciais e corporais, reação à voz
materna e ao choro. Duas mães referiram não perceber comunicação, uma das mães
referiu que o bebê era muito pequeno, portanto, não havia comunicação ainda
entre eles, e uma das mães referiu não saber se existia comunicação.
O
contato visual foi a resposta mais citada por 8 mães
como forma de comunicação. Para MONTORO (1982) e BOLWBY (1990), o estímulo
visual a que o recém-nascido mais reage é ao rosto humano, sendo que a atenção
visual parece implicar em uma relação interpessoal,
servindo como base para que o bebê possa acreditar em sua própria capacidade de
olhar e ser olhado. O rosto da mãe coincide tão perfeitamente com o campo
visual imediato que se tornam indissociáveis ver e ser visto.
Tabela 5. Percepção materna da
comunicação do bebê,
Em
relação aos gestos corporais e faciais, 7 mães responderam que percebem a
comunicação do bebê através dos gestos. CRAMER (1987) relata que o RN dispõe de
uma organização considerável, apresentando uma performance motora ou perceptiva
que usa para comunicar-se. Para GIACOMINI (1991), o fato de o prematuro não ser
muito ativo faz com que a mãe perceba os gestos faciais e corporais como
comunicação, deixando-as mais alertas às demandas do bebê. Na atual pesquisa,
as mães conseguiram perceber os sinais de comunicação do bebê, mostrando um
maior ou menor grau de vínculo e compreensão da situação que o prematuro
enfrentava.
Para
OLIVEIRA e BUSSAB (1996), os comportamentos organizados do bebê podem orientar
e facilitar a intervenção da mãe sobre ele. A reação à voz materna foi outra
forma de comunicação dos bebês, percebida por 6 das mães entrevistadas.
Conforme KENNEL e KLAUS (1993) e BOWLBY
(1990), os RN preferem a voz humana a sons produzidos por objetos e as vozes
femininas às masculinas, confluindo com os achados da presente pesquisa.
Em
relação ao choro, 2 mães responderam ser esta a forma de comunicação do bebê
identificada por elas. Este dado concorda com MONTORO (1982) que afirma que o
bebê nasce com a capacidade de chorar e o choro é um importante elemento de
sinalização; quando ele chora é atendido e, em geral, a conseqüência previsível
que se segue ao choro é um adulto que se aproxima e tenta apaziguá-lo, para
cessar. o choro.
Os
resultados a seguir. referem-se ao Protocolo de Observação da amamentação que
foi adaptado do Protocolo "Newborn Screening and Intervention
in the Context of Health Care" de Johnson,
traduzido por Claudia XAVIER (1996). Por meio deste protocolo é possível
observar e registrar o comportamento comunicativo da díade mãe-bebê, no momento
da amamentação.
Das
mães observadas, 9 (60%) mantiveram contato visual durante todo o tempo da
amamentação, 5 mães faziam contato eventual (33%) e 1 das mães observadas, o
seu bebê estava com os olhos vendados, dificultando com isso verificar a
efetividade do contato visual. BARCELLOS e col.
(1996) reforçam que o contato face a face é essencial para as interações
normais entre a dupla mãe/bebê. KENNEL e KLAUS (1993)
observaram que as mães que tinham um contato prolongado com seus prematuros,
desde o nascimento, apresentaram um comportamento de olhar diferente quando
alimentavam seus filhos, olhando-os mais insistentemente.
Já
para XAVIER (1996), nem todas as mães de recém-nascido pré-termo (RNPT)
apresentam contato de olho. Ressalta que este item, tão importante no processo
de interação, muitas vezes demora a ocorrer com esta dupla. Com relação à mãe,
esta pode estar chocada com a aparência do RN, com seu estado de saúde geral,
utilização de aparelhos etc., donde não consegue olhar realmente para o filho.
Estas afirmações concordam com os dados encontrados na atual pesquisa.
Das
mães observadas nesta pesquisa, 9 (60%) tiveram contatos físicos durante a
mamada e 6 mães (40%) não realizaram contato físico durante a amamentação. Para
BARCELLOS (1996), os prematuros necessitam de adultos interessados e afetuosos,
tocando-os e segurando-os e falando com eles. Idealmente estes adultos deveriam
ser seus pais.
KENNEL
e KLAUS (1993) comentam que as mães de recém-nascidos pré-termo
se diferenciam das mães de recém-nascidos a termo quanto ao toque. As mães RNPT
apresentam um toque inseguro, não tocam seus bebês e demoram a pegá-los no colo,
enquanto as mães de bebês a termo não apresentam esta característica. Este dado
confirma resultados encontrados na presente pesquisa onde 40% das mães
entrevistadas não tocavam seus bebês, mesmo no colo.
Das
15 mães observadas, a maioria (73%) conversava com o bebê durante a
amamentação, e (27%) não conversava com seus bebês. Este dado deve ser
interpretado com cautela, uma vez que existem mães que verbalizam mais que
outras, independentemente do comportamento do bebê. Deve-se observar o ambiente
e verificar se ele não dificulta este procedimento de vocalização. A mãe
precisa, algumas vezes, estar sozinha para sentir-se mais à vontade e
"conversar" com seu bebê (XAVIER, 1996).
De
todas as mães observadas, 12 mães seguravam o bebê firmemente, com confiança,
durante a amamentação, 2 mães apresentaram dificuldade de manipulá-lo e 1 mãe
segurava o seu bebê de forma frouxa. Para WINNICOTT (1999), o ato de segurar
mal uma criança demonstra que a mãe não está preparada para realizar esta ação,
principalmente quando se refere a mães de bebês pré-termo, e pode ser um
indicativo de dificuldade de vinculação. Na presente pesquisa, a maioria das
mães não apresentou este comportamento.
Do
total de mães observadas, 12 mães sorriram para o bebê durante a amamentação, 2
mães apresentaram uma expressão sóbria ou pouca expressão facial durante a
amamentação e uma delas apenas olhares rápidos. Segundo XAVIER (1996), o
sorriso por parte da mãe de um prematuro demora a ocorrer. O sorriso é uma
expressão de emoção que, geralmente, transmite alegria. A mãe de um RNPT demora
a apresentar a emoção de alegria; ela consegue sorrir para o bebê quando
percebe que o mesmo é um ser humano que apresenta determinados comportamentos e
que reage a ela. Este dado concorda com os dados da pesquisa atual, onde a
maioria das mães sorriu para o seu bebê quando este se encontrava em um estágio
mais estável.
Conclusão
Os
resultados da presente pesquisa apresentam um quadro em que a maioria das mães
participantes tinha idade entre 20 a 25 anos, um baixo grau
de escolaridade, casadas e renda familiar de mais de 3 salários mínimos
A
média da idade gestacional dos bebês foi de 35 semanas e 4 dias, média de peso
ao nascer 1997g, sendo a maioria dos recém-nascidos de baixo peso. A maior
parte dos bebês fez uso de sonda e recebeu alimentação mista (seio materno mais
complemento).
Em
relação à orientação sobre amamentação, a maioria das
mães referiu tê-las recebido, sendo verificado que somente 33% foram orientadas
no pré-natal. Constatou-se que uma das mães não recebeu orientação em nenhuma
das situações. É válido lembrar que o período pré-natal é indicado como o
melhor período de assimilação das informações e preparação para a maternidade,
o que irá favorecer o aleitamento materno por mais tempo. Porém, não foi isto o
observado na presente amostra.
As
orientações mais citadas sobre a amamentação referiram-se à postura do bebê, à
pega adequada do seio e à estimulação das mamas para manter a lactação. Todas
elas são fundamentais para o sucesso ao aleitamento e demonstram que as mães
possuíam informações adequadas.
Os
resultados do protocolo de observação mostraram que a maioria das mães
apresentou comportamentos adequados propiciando a comunicação e o vínculo com o
bebê. Embora com filhos prematuros, o momento da amamentação mostrou-se uma
oportunidade de aproximação da díade.
Este
estudo possibilita concluir que a amamentação oportuniza o desencadeamento da
comunicação entre mãe-bebê, não sendo apenas um ato de nutrição, mas um meio
facilitador do desenvolvimento de uma interação e de um vínculo sadio,
especialmente importante no que se refere a bebês pré-termo. A Fonoaudiologia, neste contexto, deve assumir o seu papel de
incentivador do aleitamento materno como uma forma de prevenção dos distúrbios
da comunicação.
[1]
Universidade Luterana do Brasil. Compus Canoas-RS.
Fonoaudióloga. Docente do Curso de Fonoaudiologia.
Mestranda em Saúde Coletiva. E-mail:
sudel.ez@terra.com.br
[2]
Universidade Luterana do Brasil. Campus Canoas-RS.
Curso de Fonoaudiologia. Fonoaudióloga.
*
Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso de Fonoaudiologia,
Universidade Luterana do Brasil, 2002: A comunicação entre mães de mais de 20
anos e seus bebês prematuros durante a amamentação.
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