AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO RESCINDIDA EM RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. MENOR ASSISTIDA PELA PROGENITORA. OBRIGATORIEDADE DE INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO NO PRIMEIRO GRAU DE JURISDICÃO.

 

 

De acordo com o art. 793 da CLT, estando o menor devidamente representado ou assistido pelo pai, a intervenção do Ministério Público do Trabalho no primeiro grau de jurisdição, apesar de ser relevante, não é condição indispensável à essência do ato. Recurso desprovido.

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em Ação Rescisória nº  TST-ROAR-613.152/99.0 , em que é Recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO   e são   Recorridos PANIFÍCIO SANTO AGOSTINHO LTDA  e  JOYCE JULI VEIGA KROEFF .

 

O Ministério Público do Trabalho da 4ª Região   propôs ação rescisória contra  PANIFÍCIO SANTO AGOSTINHO LTDA  e  JOYCE JULI VEIGA KROEFF , objetivando desconstituir a decisão homologatória de acordo  (fl. 28 ) produzido extra-autos  (fls. 31/32),  que pôs fim à reclamação trabalhista nº 446/98, ajuizada pelo segundo réu em desfavor do primeiro réu e originária da 22ª Vara do Trabalho de Porto Alegre/RS.

Na inicial, o autor sustentou o cabimento da ação e a legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho, com base nos arts. 485, inciso V, e 487, inciso III, letra  a , ambos do CPC.  No que tange ao pedido, fundamentou-o em violação dos arts. 82, incisos I e III, e 83, incisos II e V, do CPC, 112 da Lei Complementar nº 75/93 e 202 da Lei nº 8.069/90 ante a ausência de notificação do Ministério Público para acompanhamento do processo, desde a audiência inicial, por envolver reclamante menor, não obstante estar assistida pela mãe.

 

O TRT da 4ª Região , em Acórdãos de fls. 82/85 e 96/97,  julgou improcedente a rescisória  ao argumento de que a união estável não tem o condão de emancipar ninguém; a ação rescisória não é o instrumento adequado para verificar suposto prejuízo da reclamante; e os documentos apresentados demonstram a intervenção do Ministério Público do Trabalho no

caso em tela.

 

O Ministério Público do Trabalho interpõe recurso ordinário , às fls. 100/108, repisando os argumentos tecidos na inicial.

 

Admitido o recurso (fl. 109), não foram apresentadas contra-razões, conforme foi certificado à fl. 113.

 

É o relatório.

 

V O T O

 

I   CONHECIMENTO

Atendidas as formalidades de estilo, conheço do recurso.

 

II - MÉRITO

A controvérsia está consubstanciada nos seguintes fatos:

Joyce Juli Veiga Kroeff, assistida pela mãe, ajuizou reclamação trabalhista contra Panifício Santo Agostinho Ltda. na 22ª Vara do Trabalho de Porto Alegre/RS.

Em razão da menoridade da reclamante, o Ministério Público do Trabalho também foi notificado para participar da audiência inaugural designada para 3/6/98 (fl. 27).

Essa audiência foi antecipada para 20/5/98 para que o termo de conciliação firmado entre as partes extra-autos fosse apreciado pelo juízo.

Com exceção do Ministério Público, que, segundo alega, não foi notificado da antecipação da audiência, as partes e seus procuradores, estando a autora assistida pela mãe, estavam presentes na audiência e o acordo apresentado foi homologado nos exatos termos em que foi proposto pela 22ª Vara do Trabalho de Porto Alegre (fl. 28).

A presente ação está calcada nos arts. 485, inciso V, e 487, inciso III, letra  a , do CPC e visa desconstituir a sentença homologatória do aludido acordo.

Invocando os arts. 82, incisos I e III, e 83, incisos II e V, do CPC, 112 da Lei Complementar nº 75/93 e 202 da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), que considera violados, o autor sustenta, preliminarmente, a legitimidade do Ministério Público para propor a ação rescisória ao argumento de que não foi ouvido no processo em que era obrigatória a sua intervenção, porquanto a ação envolvia interesse de menor.

Alega que o corte rescisório é medida que se impõe, uma vez que, a partir da perícia realizada pelo Ministério Público, verifica-se que a conciliação celebrada trouxe inúmeros prejuízos à reclamante.

Assevera o Ministério Público do Trabalho que deveria ter sido notificado da antecipação da audiência, viabilizando a  intervenção no feito na qualidade de  custos legis , já que o interesse público está evidenciado na existência de menor trabalhador.

Prosseguindo nas considerações, pondera que a intervenção exigida no art. 82, inciso I, do CPC não depende do fato de o incapaz possuir, ou não, representante legal.

Por fim, conclui que a falta de notificação do Ministério Público para acompanhar os feitos em que deve intervir acarreta a nulidade do processo, à luz do art. 246 do CPC.

O primeiro réu contestou a ação às fls. 41/43 alegando que, na época da composição, a ré Joyce Juli Veiga Kroeff tinha mais de 16 anos, portanto possuía conhecimento do ajuste em questão, e, além disso, estava devidamente assistida pela progenitora e representada pelo advogado.

Argumentou também que a menoridade não podia ser motivo para a intervenção obrigatória do Ministério Público do Trabalho, porquanto a reclamante possuía, quando realizou o acordo, união estável com o filho da sócia do contestante.

O TRT da 4ª Região julgou improcedente a ação rescisória por não vislumbrar a ocorrência da aludida hipótese do art. 485 do CPC, suscitada pelo autor.

No recurso, o Ministério Público renova os argumentos da inicial para justificar a hipótese de violação de lei.

A decisão rescindenda deve preservar-se na íntegra .

Inicialmente, cumpre elidir os argumentos tecidos na defesa, segundo os quais a reclamante era maior quando firmou o acordo com o primeiro réu, já que mantinha união estável com o filho da sócia da empresa-reclamada.

Como bem registrou o juízo  a quo , a união estável, prevista no art. 226 da Constituição Federal, não emancipa ninguém. A Constituição apenas a reconhece como sociedade, a ser protegida pelo Estado, sem, contudo, equipará-la ao casamento, para fins de estado civil das pessoas.

Na defesa, à fl. 42, está registrado que, quando o acordo foi firmado entre as partes, a reclamante estava com 17 anos e 9 meses, ou seja, era relativamente incapaz; e, portanto, menor, nos termos da lei civil.

De acordo com o art. 793 da CLT, que disciplina matéria relativa à intervenção do Ministério Público do Trabalho no primeiro grau de jurisdição quando está em discussão interesse de menor devidamente representado ou assistido pelo pai, a propalada intervenção, apesar de ser relevante, não constitui requisito para a essência do ato.

No que tange ao conteúdo dos arts. 82, incisos I e III, e 83, incisos II e V, do CPC e 112 da Lei Complementar nº 73/95, tidos por vulnerados pelo autor, deve-se atentar que não existe neles obrigatoriedade de intervenção do Ministério Público do Trabalho em acordo judicial em que seja parte menor. Tais dispositivos não obrigam, apenas preconizam que o Ministério Público deve intervir  como fiscal da lei nas causas em que há interesse de incapaz e interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte.

Somente  quando a lei considerar obrigatória a intervenção do Ministério Público, a parte promover-lhe-à a intimação sob pena de nulidade do processo  (CPC, art. 84), o que não é o caso dos autos.

Deve-se registrar, ainda, a impossibilidade de o Ministério se sobrepor ao pátrio poder, resguardado pela Constituição (art. 229) e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 22 da Lei nº 8.065/90).

Desse modo, a argüição de nulidade do processo, por ausência de notificação do  parquet  para acompanhar o feito deve ser rejeitada, máxime porque ficou demonstrado à fl. 32, verso, que o Ministério Público do Trabalho tomou ciência do conteúdo da reclamatória e do envolvimento de menor.

Constata-se, ademais, que as partes albergadas no acordo celebrado compareceram à audiência, devidamente representadas pelos advogados, aceitando expressamente a composição, nos termos em que foi homologada pelo magistrado. A transação judicial ocorreu nos estreitos limites das normas legais.

De outro lado, a ação rescisória não é o instrumento processual adequado para examinar eventual prejuízo da reclamante, porquanto tal ação  aprecia o próprio mérito da ação trabalhista.

Nego provimento ao recurso.

 

III - CONCLUSÃO

Negar provimento ao recurso.

 

 

ISTO POSTO

 

ACORDAM  os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao Recurso Ordinário.

 

Brasília, 19 de fevereiro de 2002.

 

 

RONALDO LEAL