EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA DE PORTO ALEGRE – RS:

 

 

 

 

 

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO, através da Coordenadoria das Promotorias da Infância da Juventude, pela promotora de justiça signatária, com amparo nos artigos 201, inc. III, e artigo 155 da Lei n° 8.069/90 e com base no Expediente n° 865/98 desta Coordenadoria, vem perante Vossa Excelência promover PEDIDOS DE TUTELA e REGULARIZAÇÃO DE REGISTRO CIVIL em favor das crianças XXXXXX XXXXXXX e XXXXX XXXXX e dos adolescentes XXXX XXXX XXXX, XXXXXX XXXXXX e XXXXX XXXXXX cumulados com AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DE PÁTRIO PODER contra:

 

XXXXXXX XXXXXXXXX, brasileiro, filho de XXXXXX XXXX e XXXX XXXX, residente em local não sabido, na cidade de Cachoeirinha, RS, pelos seguintes motivos de fato e de direito:

 

 

 

 

DOS FATOS:

 

O requerido é genitor da criança XXXXXX XXXX XX XXXX, nascida no dia 16 de agosto de 1992, conforme certidão de nascimento (fl. 07).

 XXXXXX XXXX XXXXX, genitora da criança, é falecida, consoante certidão de óbito (fl. 06).

 

O demandado vem descumprindo de forma grave e injustificada com os seus deveres paternos de criar, sustentar e educar sua filha, revelando um comportamento de negligência e completo abandono para com as suas necessidades desta.

 

XXXXXXX XXXX XXXXX (fls. 19/20), irmã unilateral e guardiã fática informa que ¨A declarante deseja ficar com a guarda legal de seus irmãos para que estes possuam alguém que os represente, uma vez que na situação fática é a declarante que toma conta dos mesmos. Não sabe informar o paradeiro do genitor de XXXXXX, Sr. XXXX XXXX, pois sabe apenas que este reside em Cahoeirinha, RS, não tendo paradeiro fixo.¨

 

XXXXXX reside com a irmã XXXXX e, também, na companhia de outros quatro irmãos, todos filhos da falecida XXXXX XXXX XXXXXX.

 

O Conselho Tutelar (fl. 04) noticia que ¨ Família atendida neste Conselho para encaminhamentos de recursos sociais. Família atendida no CECOVE (Centro Comunitário da Vila Elizabeth). As irmãs XXXXXX e XXXXXX não tinham certidão de nascimento. Foi possível localizar o pai e este assumiu a paternidade. Com relação a XXXXXX, foi informado pela irmã XXXXXXX, 21 anos, que esta nasceu em casa e o pai é vivo, mas não se sabe o paradeiro, portanto, XXXXXX está freqüentando escola e não tem registro de nascimento. A irmã XXXXXXX foi orientada a providenciar a guarda dos irmãos, uma vez que estes estão sob seus cuidados desde que a mãe faleceu. Família com grandes problemas sociais, sendo atendida em programa na comunidade, não há registro de maus-tratos.¨

 

Denota-se que o requerido, apesar de ter efetuado o registro de XXXXX, não forneceu o seu endereço e nem efetua visitas para a filha, objetivando não manter o vínculo ou saber acerca de seu bem-estar.

 

No dia 15 de junho de 1998, por volta das 3h, em parto domiciliar, nesta cidade, XXXXX XXXX XXXX deu à luz a uma criança do sexo feminino, conforme se demonstra pelas cópias de carteira de vacina desta das fls. 21 a 23. Esta criança não foi registrada e recebeu o nome de XXXXXX XXXXXXXX.

 

A irmã XXXXX (fl. 19) noticia que “Sua irmã XXXXX está com dez anos de idade e não possui certidão de nascimento, haja vista que sua falecida mãe teve parto domiciliar. Sabe que a criança nasceu por volta das 3h da manhã do dia 15.06.88”. Tal informação é corroborada pela tia materna, Sra. XXXXX XX XXXXX (fl. 20).

 

A criança XXXXX está na guarda fática da irmã unilateral, XXXXXXXX XXXXX XXXXXXX.

 

A adolescente XXXXX XXXXXX, nascida em 11 de junho de 1984, consoante certidão de nascimento (fl. 19), filha apenas de XXXX XXXX XXXX, portanto orfã, encontra-se na guarda fática da irmã XXXXXXXXX.

 

Os irmãos XXXX XXX XXXX e XXXX XXXX XXXX (certidões de nascimento das fls. 10 e 11) são filhos de XXXXXX XXX XXXX, sendo que foram registrados, apenas, como filhos de XXXXX XXXXXX XXXX, este já falecido, conforme certidão de óbito (fl. 63).

 

XXXXX XXXXXXX XXXXX (fl. 19/20), informa, acerca destes seus irmãos que estão, também, na sua guarda fática, que ¨XXXXX XXXX XXXX e XXXXXXX XXXXXXX são seus irmãos por parte de mãe. Sabe que XXXXXXX XXXXX XXXX é falecido já há treze anos. Nestas CRNs não consta o nome da genitora biológica, falecida mãe da declarante, porque na época esta era casada. O óbito de XXXXXX foi no ano de 1984. Acredita que o atestado de óbito de XXXXXX tenha sido feito no Registro Civil do Sarandi, uma vez que morava na vila Santa Rosa.¨

 

Não foi localizado nenhum dado fornecido pela tia materna, Sra. XXXXX XXX XXX (fl. 20), acerca do local de nascimento do adolescente XXXXX XXX XXXX. Já, no Grupo Hospitalar Conceição, foi localizada a declaração (fl. 48) sobre o nascimento da jovem XXXXXXX XXXXXXX XXXX e a carteira de vacinas de recém-nascido desta, em anexo na mesma folha, constando como genitora XXXXX XXXXXXX XXXXX, além da data de nascimento referida corresponder a ata constante na certidão de nascimento de XXXXXXX (fl. 11).

 

Ademais, na certidão de óbito da genitora, XXXXXX XXXX XXXX (fl. 06), há expressa referência a existência dos filhos ¨XXXXXXXX XXX¨ e ¨XXXXXXXXX¨.

As medidas específicas de proteção de crianças e adolescentes estão sempre associadas à regularização do registro civil.

 

No presente caso, há necessidade de retificação dos assentos de nascimento do adolescente XXXX XXXX XXXX e da jovem XXXXXX XXXX XXX, incluindo nestes o nome da mãe biológica, dos avós maternos, incluindo-se, assim, os apelidos de família e restabelecendo-se a verdade real.

 

Imprescindível, também, definir a situação jurídica de pátrio poder relativo a estas crianças e adolescentes, que estão sob responsabilidade fática da irmã, XXXXXX XXXX XXXXX, maior de idade (certidão de nascimento fl. 12), que deseja legalizar a situação de sus cinco irmãos.

 

Do narrado e apurado, evidencia-se que o requerido não tem condições de continuar exercendo o pátrio poder, justificando-se que dele seja destituído por abandono.

 

DO DIREITO:

 

A postulação encontra embasamento legal no artigo 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente como ¨verbis¨:

 

"As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta lei forem ameaçados ou violados:

 

II – por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável.¨

Dispõe o mesmo diploma legal, no artigo 24 quanto a suspensão ou perda do pátrio poder.

 

Por sua vez, o artigo 12 do Código Civil Pátrio estabelece:

 

“Serão inscritos em registro público:

 

I – Os nascimentos, casamentos, separações judiciais, divórcios e óbitos.

 

O artigo 102, § 1°, do Estatuto da Criança e do Adolescente determina que: Verificada a inexistência de registro anterior, o assento de nascimento da criança será feito à vista dos elementos disponíveis, mediante requisição da autoridade judiciária.

 

Munir Cury e outros doutrinadores ensinam que ¨As causas que ensejam retificação do assento de nascimento dividem-se em: materiais, como, por exemplo, erros de grafia; erros que exigem melhor comprovação, como, por exemplo, data de nascimento, sexo, nome dos pais, nome dos avós, inclusão ou exclusão dos apelidos de família.¨ (Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado – Comentários Jurídicos e Sociais, 2° ed., 2° tiragem, pág. 295).

 

Reza o artigo 36 do ECA que:

 

¨ Tutela será deferida, nos termos da lei civil, a pessoa de até vinte e um anos incompletos.¨

 

Roberto João Elias leciona que “Na falta dos pais, por quaisquer motivos, é necessário que alguém os substitua, amparando aqueles que, pela pouca idade e inexperiência, não têm condições de viver sozinhos e praticar todos os atos necessários a sua subsistência e a uma vida normal em sociedade. A tutela supre o poder paternal, tendo um caráter subsidiário, na falta dele. No ensino de Ruggiero, é um poder que imita em grande parte o pátrio poder, na sua espécie mais importante, que é a tutela de menores ( Instituições Direito Civil, V-2/221 e 222, Saraiva)”. (Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado – Comentários jurídicos e Sociais, Munir Cury e Outros, 2° ed., 2° tiragem, pág. 133).

 

DO PEDIDO:

Diante do exposto, requer o Ministério Público:

 

a. Liminarmente, seja determinado o assento de nascimento da criança XXXXXX XXXXX à vista dos elementos disponíveis nos autos;

 
b. Liminarmente, seja determinado a retificação dos assentos de nascimento dos adolescentes XXXXX XXXX XXXXX (fl. 10) e XXXXXX XXXX XXXXX (fl. 11) para incluir o nome da genitora XXXXX XXXX XXXXX (fl. 06), dos avós maternos XXXXXXX XXXX XXXXX e XXXX XXXX XXXXXX à vista dos elementos probatórios constantes nos autos;

 
c. Liminarmente, a nomeação da Sra. XXXXXXX XXXXX XXXXX (fl. 12), residente no Beco 2 – B, 71, na Vila Asa Branca, Bairro Sarandi, nesta cidade, como guardiã provisória de XXXXX XXXXXXXX, XXXXX XXXXXX, XXXXXXXXX XXXXX XXXXX e XXXXXXX XXXX XXXXXXX;

 
d. Liminarmente, seja deferida a guarda provisória da criança XXXXX XXXX XXXXX para a irmã unilateral XXXXXXXXXX XXXXXXXXXXX, acima referida, uma vez que o deferimento da tutela pressupõe a prévia decretação da perda ou suspensão do pátrio poder (§ único, art. 36, do ECA);

 
e. Liminarmente, a suspensão do pátrio poder do demandado em relação à filha XXXXXX XXXXX XXXXX (certidão fl. 07)

 
f. A citação por edital do requerido para contestar, querendo, a presente ação;

g. A realização de estudo psicossocial do presente caso por Equipe Técnica deste Juizado, bem como da tutora, com esta visando aferir ambiente adequado para a permanência das crianças e adolescentes;

h. A produção de todas as provas admitidas em direito, especialmente o depoimento pessoal do requerido, a oitiva da tutora e guardiã e das testemunhas arroladas.

   

           Ao final, provados os fatos que motivaram o ajuizamento desta, seja a mesma procedente, decretando-se a destituição do pátrio poder do requerido e deferindo-se a tutela das crianças e dos adolescentes para a irmã, Sra. XXXXXX XXXXXXX XXXXXX, sob compromisso.

 

 

Porto Alegre, 18 de fevereiro de 1999.

 

 

 

Magali Mannhart Hoffmann

Promotora de Justiça

Coordenadora-Adjunta

 

 

 

 

ROL DE TESTEMUNHAS:

 

XXXXX XXXX XXXXXX, brasileira, Conselheira Tutelar do CT da 2° Microrregião, nesta cidade;

 

XXXXX XXXX XXXXXXX, tia materna, residente na Rua ¨G¨, 896, DMAE 74, na Vila Pinto, nesta cidade.