Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. Art. 149, II. Participação de criança em gravação de programa de televisão sem a devida autorização judicial. 1. A participação de menor em novela, com acesso ao estúdio de gravação, está subordinada ao art. 149, II, do ECA, não incidindo, no caso, o inciso I do mesmo artigo. 2. Recurso especial não conhecido. ( RESP nº 278.059/RJ, Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator: Min. Carlos Alberto Menezes Direito, Julgado em 15/10/2002).
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os
autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso
especial. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Castro
Filho e Ari Pargendler votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Sustentou oralmente,
o Dr. Luiz Carlos Lopes Madeira, pelo recorrente.
Brasília (DF), 15 de outubro de 2002. (data do
julgamento)
MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO
Relator
RECURSO ESPECIAL
Nº 278.059 - RJ (2000/0094547-1)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS
ALBERTO MENEZES DIREITO:
TV Globo Ltda
interpõe recurso especial, com fundamento na alínea a) do permissivo constitucional, contra Acórdão
do Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro,
assim ementado:
"REPRESENTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO -
PROGRAMA DE TELEVISÃO - AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO (ART. 258 DO ECA) - CONDENAÇÃO EM MULTA - REINCIDÊNCIA - PENA ADEQUADA
- LITISPENDÊNCIA INEXISTENTE. Não há litispendência quando os sujeitos são
diferentes e a matéria aludida no texto da lei não se refere ao programa
propriamente dito, mas a cada criança em particular. Participação de menor em
programa televisivo sem prévia autorização judicial, aplicação das regras
contidas nos artigos 149, II, a, E 258 da Lei nº 8.069/90. A inclusão de
menor em programa televisivo sem o competente alvará e fiscalização do M.P. ofende ao texto legal que exige a formalidade.
Eventual óbice partido do órgão de fiscalização não é suficiente para ensejar o
descumprimento da lei que, em ocorrendo, merece punição. É adequada a pena da
multa no valor máximo ante a reincidência, não sendo o juiz obrigado a aplicar
a pena de fechamento do estabelecimento, já que o texto outorga tão somente
faculdade ao juiz confiando-se no seu prudente arbítrio." (fls. 81)
Sustenta a
recorrente ofensa ao artigo 149, inciso I, alínea e), da Lei nº 8.069/90, aduzindo que a presença
e a autorização dos pais tornam desnecessária a expedição de Alvará para a
participação de menores nas gravações realizadas em estúdios de televisão.
Conclui pela "desnecessidade da expedição de alvará no caso vertente quando os
pais do menor o acompanham, seja porque não há provimento legal para tanto,
seja porque tal hipótese constituiria destituição do Pátrio Poder" (fls.
92).
Colaciona
julgados de outros tribunais.
Contra-razões juntadas por linha
(fls. 110), o recurso especial (fls. 86 a 95) foi admitido (fls. 111 a 113).
Os autos foram encaminhados ao
Ministério Público Federal em 17/10/00 (fls. 133), retornando em 09/11/01 (fls.
137), com parecer do Dr. Wagner de Castro Mathias Netto
"pelo não conhecimento do recurso e,
se conhecido, pelo seu desprovimento" (fls. 136).
Em 05/03/02 o Relator do processo,
Ministro Gilson Dipp, proferiu despacho determinando
que os autos fossem remetidos à Secretaria de Autuação, Classificação e
Distribuição de Feitos (fls. 147), sendo-me redistribuídos em 09/04/02 (fls.
152).
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 278.059 - RJ
(2000/0094547-1)
EMENTA
Estatuto da Criança e do
Adolescente - ECA. Art. 149, II. Participação de criança em gravação de
programa de televisão sem a devida autorização judicial.
1. A participação de menor em
novela, com acesso ao estúdio de gravação, está subordinada ao art. 149, II, do ECA, não incidindo, no caso, o inciso I do mesmo artigo.
2. Recurso especial não conhecido.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS
ALBERTO MENEZES DIREITO:
O Ministério Público do Rio de
Janeiro representou em face da empresa recorrente alegando que esta requereu
autorização para que a criança Leonardo Pereira da Costa participasse da novela "Zazá";
que antes de expedido o alvará, o programa foi ao ar; que houve desrespeito aos
artigos 149, II, a), e 258 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA.
A representação foi julgada
procedente e aplicada à recorrente a multa de 20 salários mínimos, recolhida ao
Fundo da Infância e Adolescência do Conselho Municipal dos Direitos da Criança
e Adolescente.
O Conselho da Magistratura do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve a sentença. Afastou a
litispendência porque "em que pese
poder ser a mesma a causa de pedir, no caso, os sujeitos são diferentes e a
matéria a que se referem os autos diz respeito a infração
à Lei n° 8.069/90 que alude não ao programa televisivo em si, mas a cada
criança em particular"; no mérito, asseriu "que a empresa recorrente fez justiça,
se é que assim se pode chamar, pelas próprias mãos; ou seja, ante óbice que lhe
teria sido imposto pela autoridade, e precisando atender ao seu interesse,
sobrepôs-se a tudo e a todos e realizou o ato no qual participou quem não
podia".
O especial aponta negativa de
vigência ao art.149, I, e), do ECA. Ocorre que o
Acórdão recorrido assentou sua decisão no inciso II do requerido artigo,
afastando a incidência do inciso I.
A questão é interessante do ponto
de vista jurídico, porque depende, apenas, da interpretação da disciplina do
art. 149 do ECA. A construção feita pelo especial e
reforçada da tribuna com a vigorosa argumentação do eminente advogado, Dr. Luiz
Carlos Madeira, é rica, apoiada no fato de que a participação na novela
significou a entrada do menor no estúdio cinematográfico, vinculando-a ao
exercício do pátrio poder.
Mas, com todo respeito, entendo
não ser correta a interpretação desejada pela recorrente.
Primeiro, o art. 149 regula a
expedição de alvará tanto para o ingresso nos estúdios cinematográficos como
para a participação em espetáculos públicos. A diferença é, apenas, quanto ao
acompanhamento do menor. O inciso I, na verdade, cuida especificamente do só
ingresso do menor em auditório; segundo, quando o dispositivo cuida do
espetáculo público está alcançando a participação da criança, incluindo, até
mesmo, os ensaios. Ora, afirmar que, no caso, não incide o inciso II carece de
apoio.
Correto, portanto, o Acórdão
recorrido quando entendeu que não era caso de ingresso em auditório, mas, sim,
de participação do menor em espetáculo público, uma novela vista por milhares
de pessoas.
Anoto, ainda, que houve o prévio
pedido de expedição de alvará, ou seja, a empresa estava consciente da
necessidade da autorização judicial. Mas, não aguardou a decisão, deixando que
o menor participasse da novela sem a devida permissão, exigida pela lei
especial de regência.
Por último, não tem pertinência a
alegação de que a incidência do art. 149, II, do ECA,
malfere o pátrio poder. Como pôs o Acórdão recorrido, a intervenção do Estado
por meio da autoridade judicial competente, com o objetivo de proteger o menor,
não arranha o exercício do pátrio poder.
Com essas razões, eu não conheço
do especial.