CONSELHO TUTELAR. MEMBRO. ELEIÇÃO. REQUISITOS. Não há como interpretar que o Estatuto da Criança e do Adolescente atribui aos Municípios apenas a regulamentação sobre a forma de funcionamento dos Conselhos Tutelares, eis que, cada Município, pode e deve legislar supletivamente, atendendo as próprias peculiaridades, estabelecendo exigências ou condições para o registro dos candidatos ao pleito como membro do Conselho Tutelar. Tal competência está insculpida no art. 30, II, da Carta magna. In casu, a ilegalidade do ato da autoridade coatora consiste no fato de exigir requisito para a candidatura, não exigido pela lei federal (ECA), tampouco pela Lei Municipal. Confirmada a sentença que julgou procedente o mandado de segurança. (Reexame Necessário nº 595043944, 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Relator: Des. Eliseu Gomes Torres, Julgado em 08/06/1995).

 

 

REEXAME NECESSÁRIO N.º 595043944 – 8ª  CAMARA CÍVEL - NONOAI

 

IMPETRANTE: ...

IMPETRADA: PRESIDENTE DO CONSELHO MUNICIPAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE DE NONOAI.

RELATOR: DES. ELISEU GOMES TORRES

 

 

ACORDÃO

 

A 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, unanimemente, acorda em confirmar a decisão. Custas como de direito.

 

Participaram do julgamento, além do signatário, os Exmos. Srs. Des. Antônio Carlos Stangler Pereira, Presidente, e Sérgio Gischkow Pereira.

 

Porto Alegre, 8 de junho de 1995.

 

Eliseu Gomes Torres, Relator.

 

 

RELATORIO

 

Des. Eliseu Gomes Torres- Maria do Carmo Framento impetrou writ com o escopo de obter liminar para participar de debate entre os candidatos ao Conselho Tutelar de Nonoai e, no mérito, concorrer ao pleito da escolha dos Conselheiros Tutelares do Município, sendo autoridade coatora a Presidenta do COMDICAN. Juntou documentos.

 

Narra, na inicial, que preenchia, como candidata, todos os requisitos exigidos para concorrer às eleições ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Nonoai (COMDICAN), realizando-se as eleições em 15-12-94, mas que em 21 de novembro recebeu oficio expedido pela autoridade coatora informando do veto a sua candidatura, sob a alegação de que teria sofrido a censura do representante do Ministério público local, a partir de exames psicológicos realizados por determinação do COMDICAN. Aduz que o resultado dos exames tão somente recomendava a repetição dos mesmos. O magistrado deferiu a liminar pretendida com a inicial e outra, postulada a posteriori, referente à inclusão do seu nome na cédula eleitoral.

 

Prestadas as informações pela autoridade dita coatora, às lis. 25 e seguintes. O Ministério Público opinou pela concessão da segurança.

 

Julgando procedente o mandamento, determinou o Juiz a subida dos autos a este grau, para reexame necessário. Neste grau, o Dr. Procurador de Justiça opina pela confirmação da sentença a quo. E o relatório.

 

VOTO

 

Des. Eliseu Gomes Torres - Trata-se de reexame necessário, não tendo havido recurso voluntário. Nenhum reparo merece ser feito no brilhante decisum.

 

Ao contrário do afirmado pelo digno Dr. Procurador de Justiça, data venha, o legislador municipal pode, supletivamente, legislar sobre o acesso ao pleito para membro do Conselho Tutelar.

 

Reza o art. 133 do ECA: “Para a candidatura a membro do Conselho Tutelar, serão exigidos os seguintes requisitos: 1- reconhecida idoneidade moral; II- idade superior a vinte e um anos; III- residir no Município.”

 

Judá Jessé de Bragança Soares, Juiz de Direito - Coordenador da Justiça da Infância e da Juventude na Corregedoria-Geral da Justiça/Rio de Janeiro, ao comentar precipitado artigo, in “Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado”, Malheiros Ed., p. 409, diz: “A lei federal contentou-se em estabelecer os requisitos mínimos. Nada impede que o Município os amplie, pois o art. 30, II, da CF, lhe dá competência para suplementar a legislação federal e estadual, no que couber.”

 

Com efeito, a lei federal (ECA) estabeleceu as diretrizes gerais. Evidentemente que o Município pode exigir requisitos não enumerados naquela, atendendo as peculiaridades e necessidades da própria região (Município), desde que, evidentemente, não contrariem a lei hierarquicamente superior. É chamada competência supletiva dos Municípios, de suplementar a legislação federal e estadual no que couber (art. 30, II, da CF).

 

Tanto é assim que, reportando-me ao aduzido pelo autor precipitado, na mesma obra, p. 407, “a escolha dos conselheiros será feita pela comunidade local, na forma que a lei municipal determinar, obedecendo ao processo previsto no art. 139 do Estatuto” (grifei). Não há como interpretar que o Estatuto da Criança e do Adolescente atribui aos Municípios apenas a regulamentação sobre a forma de funcionamento dos Conselhos Tutelares, eis que cada Município pode e deve legislar supletivamente, atendendo as suas próprias peculiaridades, estabelecendo exigências ou condições para o registro dos candidatos ao pleito como membro do Conselho Tutelar. Tal competência, repito, está insculpida na Cada Magna.

 

Jn casu, a ilegalidade do ato da autoridade coatora consiste no fato de a candidatura da impetrante ter sido vetada, em decorrência da sua “não-aprovação” na avaliação psicológica determinada pela Comissão Eleitoral.

 

Ora, se a lei federal (ECA), tampouco a Lei Municipal nº 1.483/92 de Nonoai, que ampliou os requisitos para a candidatura a membro do Conselho Tutelar, não exige aprovação em avaliação psicológica como requisito para a candidatura, não pode a Comissão Eleitoral, através de sua Presidenta, exigi-lo.

 

Conforme brilhantemente aduz o magistrado singular, Dr. Sandro Luz Portal, no decisum, “... a decisão de se submeterem os candidatos a exame psicológico não encontra fundamento legal específico em qualquer diploma ... No caso em tela, o ato atacado, com o efeito lancinante da ilegalidade que já o precedera, exacerbou os limites da atribuição de indeferimento de candidaturas, adotando um critério unilateral e extraordinário, estranho ao que estava autorizado a agir ... Obviamente que os requisitos exigidos hão de ser buscados na lei de regência, e não unilateralmente pelo órgão administrativo gerenciador do pleito.”

 

É princípio basilar - da legalidade - que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, adstrito aos mandamentos da lei e deles não se pode afastar, sob pena de incorrer em abuso de poder.

 

No caso em julgamento, à evidência, a autoridade coatora não observou tal princípio, ao exigir requisito não exigido pela própria lei pertinente à espécie.

 

Como se vê, bem andou o magistrado ao julgar procedente a ação, mantendo a candidatura da impetrante para o cargo de Conselheira Tutelar, O voto, pois, é pela confirmação de decisum, em sede de reexame necessário.

 

Os Des. Antônio Carlos Stangler Pereira e Sergio Gischkow Pereira- De acordo.