EXMO. SR. JUIZ DE
DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DO FORO REGIONAL DE PINHEIROS
O
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO,
por seu Promotor de Justiça designado, vem, mui respeitosamente à presença de
V. Exa. para, nos termos do art. 129, inc. III da Constituição Federal, art.
25, inc. IV, a, da Lei 8.625/93, art.
103, VIII da Lei Complementar Estadual 734/93, arts. 4º e 5º da Lei 7.347/85 e
arts. 208 e ss. da Lei 8.069/90, propor esta AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO
DE MEDIDA LIMINAR em face da FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO,
representado judicialmente em Juízo, por força do art. 12, I, do Código de
Processo Civil, por seu Procurador Geral do Estado, domiciliado no Pátio do
Colégio, s/n, prédio da Procuradoria Geral do Estado, nesta Capital, e que, por
sua Secretaria de Estado de Educação, tem negligenciado sistematicamente a
prestação de ensino regular de primeiro e segundo grau a número considerável de
crianças e adolescentes, não apenas nesta Capital, mas em todo o Estado,
abusando de seus poderes e exorbitando suas funções com manifesta afronta a
expressa e literal disposição de lei federal (art. 56 da Lei 8.069/90 -
Estatuto da Criança e do Adolescente), desta feita, por força do contido no art.
15 da famigerada e já atacada tantas vezes Resolução 164/97, que é responsável
pelos descalabros mais sérios da educação estadual, pelos fatos e motivos a
seguir expostos.
I.
DOS FATOS
Consta da inclusa Resolução nº 164, da
Secretaria de Estado da Educação, publicada no Diário Oficial do Estado de 26
de novembro de 1996, p. 81, que dispõe sobre as diretrizes para o atendimento à
demanda em 1998, na Rede Estadual de Ensino, em seu art. 15, que:
Art. 15. Será cancelada a matrícula do aluno que não
comparecer, sem justificativa, nos primeiros 10 (dez) dias letivos.
Os termos dessa Resolução tornam evidente o
cerceamento do direito de permanência na escola às crianças e adolescentes
matriculados e impossibilitados de comparecimento imediato às aulas por
diversos motivos, muitas vezes, alheios à vontade das mesmas.
Com tal Resolução, a Secretaria Estadual de
Educação impede que criança ou adolescente em idade escolar matriculado
regularmente em escola da rede estadual, em caso de não comparecimento nos primeiros
dez dias de aula, venha a ser contatado pelo Conselho Tutelar e seja resgatado
para a escola em que deveria estar matriculado e cursando a série competente,
simplesmente porque a Secretaria Estadual de Educação, optando uma vez mais
pelo caminho curto e preguiçoso, ao invés de fazer a comunicação ao Conselho
Tutelar da área de circunscrição, resolve,
por capricho diletante e irresponsável da d. Secretária de Educação, cancelar
a matrícula, pouco importando à autoridade, que deveria ser mais vocacionada
para a educação, o destino que venha a ter a criança ou o adolescente.
II.
DOS DISPOSITIVOS LEGAIS E CONSTITUCIONAIS PERTINENTES À EDUCAÇÃO:
A própria Constituição Federal já consagrara a
educação como direito social fundamental, dispondo sobre ela, dentre outros,
nos seguintes artigos:
Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o
trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade
e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 205. A educação, direito de
todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
A Constituição Estadual Paulista dispõe com rara
riqueza, em diversos dispositivos, o sistema de prioridade estabelecido para
educação, mormente nos níveis fundamentais do ensino básico, do seguinte modo:
Art. 233 - As
ações governamentais e os programas de assistência social, pela sua natureza
emergencial e compensatória, não deverão prevalecer sobre a formulação e
aplicação de políticas sociais básicas nas áreas de saúde, educação,
abastecimento, transporte e alimentação.
Art. 238 - A lei
organizará o Sistema de Ensino do Estado de São Paulo, levando em conta o
princípio da descentralização.
Art. 239 - O
Poder Público, organizará o Sistema Estadual de Ensino, abrangendo todos os
níveis e modalidades, incluindo a especial, estabelecendo normas gerais de funcionamento
para as escolas públicas estaduais e municipais, bem como para as particulares.
Art. 241 - O
Plano Estadual de Educação, estabelecido em lei, é de responsabilidade do Poder
Público Estadual, tendo sua elaboração coordenada pelo Executivo, consultados
os órgãos descentralizados do Sistema Estadual de Ensino, a comunidade
educacional, e considerados os diagnósticos e necessidades apontados nos Planos
Municipais de Educação.
Art. 249 - O ensino fundamental, com
oito anos de duração, é obrigatório para todas as crianças, a partir dos sete
anos de idade, visando a propiciar formação básica e comum indispensável a
todos.
§ 1º - É dever do Poder Público o
provimento, em todo o território paulista, de vagas em número suficiente para
atender à demanda do ensino fundamental obrigatório e gratuito.
§ 2º - A atuação da administração
pública estadual no ensino público fundamental dar-se-á por meio de rede
própria ou em cooperação técnica e financeira com os Municípios, nos termos do
inciso VI artigo 30, da Constituição Federal, assegurando a existência de
escolas com corpo técnico qualificado e elevado padrão de qualidade.
§ 3º - O ensino fundamental público
e gratuito será também garantido aos jovens e adultos que, na idade própria, a
ele não tiverem acesso, e terá organização adequada às características dos
alunos.
§ 4º - Caberá ao Poder Público
prover o ensino fundamental diurno e noturno, regular e supletivo, adequado às
condições de vida do educando que já tenha ingressado no mercado de trabalho.
§ 5º - É permitida a matrícula no
ensino fundamental, a partir dos seis anos de idade, desde que plenamente
atendida a demanda das crianças de sete anos de idade.
Art. 255 - O Estado aplicará,
anualmente, na manutenção e no desenvolvimento do ensino público, no mínimo,
trinta por cento da receita resultante de impostos, incluindo recursos
provenientes de transferências.
Parágrafo único - A lei definirá as
despesas que se caracterizem como manutenção e desenvolvimento do ensino.
Art. 257 - A distribuição dos
recursos públicos assegurará prioridade ao atendimento das necessidades do
ensino fundamental.
Parágrafo único - Parcela dos
recursos públicos, destinados à educação deverá ser utilizada em programas
integrados de aperfeiçoamento e atualização para os educadores em exercício no
ensino público.
Por sua vez, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em inúmeros de seus dispositivos, registra o dever do Poder Público para com a educação, com ênfase no ensino fundamental e na educação infantil, premissas maiores de intervenção do Município na condução da gestão educacional. Destaca-se, nesse contexto, o próprio art. 4º do Estatuto, assim descrito:
Art. 4º É dever
... do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos
direitos concernentes à ... educação.
Parágrafo único. A garantia de
prioridade compreende:
(...).
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de
recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à
juventude.
Depois desse, também os arts. 53 e 56 do
Estatuto ao dispor que:
Art. 53. A
criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e
qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:
I - igualdade de
condições para o acesso e permanência na escola
[...]
Art. 56. Os
dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho
Tutelar os casos de:
[...]
II - reiteração
de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos escolares.
III.
DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Em face do disposto nos arts. 127, caput, da Constituição Federal, incumbe
ao Ministério Público promover a defesa da ordem jurídica, do regime
democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Nesta ordem que ora se requer, competem em
igualdade harmônica a defesa desses três paradigmas legitimantes da intervenção
ministerial e que pode ser sumularmente descrita como a defesa da ordem jurídica-democrática na proteção dos interesses
sociais.
Mais ainda, o Estatuto da Criança e do
Adolescente, Lei 8.069/90, em seu art. 208, I, registra que:
regem-se
pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos
assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou
oferta irregular do ensino obrigatório.
Recentes pronunciamentos da jurisprudência
referendam integralmente a legitimidade do Ministério Público para questões
como esta posta em debate. Veja-se sobre o tema, dentre outras decisões:
MINISTÉRIO PÚBLICO - Legitimidade de parte ativa - Defesa da ordem jurídica, sobretudo no que diz respeito aos direitos básicos do cidadão - Recurso provido.
Não se deve negar ao Ministério Público a
legitimidade ativa ad causam, na defesa do cumprimento das normas
constitucionais, sob o argumento da independência entre os Poderes. São
independentes, enquanto praticam atos administrativos de competência interna
corporis. Não são independentes para, a seu talante, desobedecerem à Carta
Política, às leis e, sob tal pálio, permanecerem, cada uma seu lado, imune à
reparação das ilegalidades. (TJSP, Apel. 201.109-1, Rel. Villa da Costa,
04.02.94).
IV.
DA COMPETÊNCIA DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE
Não suscita dúvida a competência absoluta para
processo e julgamento da causa por qualquer Vara da Infância e da Juventude da
Capital, não sendo razoável pretextar-se que vigora a competência do juízo
especializado em causas em que figurem como parte a Fazenda Pública, sendo esta
inquestionável, segundo os arts. 35 e 36 da Lei de Organização Judiciária do
Estado de São Paulo.
O art.
148, inc. IV do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que é Lei Federal (nº 8.069, de 13 de julho de 1990), estabelece
que:
Art. 148. A
Justiça da Infância e da Juventude é competente para:
(...).
IV - conhecer
de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos
à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209;
O art. 209, por seu turno, dispõe que:
Art. 209. As
ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do local onde ocorreu ou
deva ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta para
processar a causa, ressalvada a competência da Justiça Federal e a competência
originária dos Tribunais Superiores.
Vale dizer, apenas a competência da Justiça
Federal e dos Tribunais Superiores prefere a da Vara da Infância e da
Juventude. Nada ficou registrado quanto à competência da Vara da Fazenda
Pública, que não goza da mesma qualidade daquela atribuída por Lei Federal à da
Infância e Juventude. Mais, tal competência é absoluta.
Dispõe o aludido artigo 35 do Código Judiciário
do Estado de São Paulo, Decreto-Lei Complementar Estadual nº 3 de 27 de agosto
de 1969, com a alteração dada pelo artigo 17 da Lei Estadual nº 6.166 de 29 de
junho de 1988, que:
Art. 35. Aos
Juízes das Varas da Fazenda do Estado compete:
I - processar,
julgar e executar os feitos, contenciosos ou não, principais, acessórios e seus
incidentes, em que o Estado e respectivas entidades autárquicas ou paraestatais
forem interessados na condição de autor, réu, assistente ou opoente,
excetuados:
a) os de
falência;
b) os mandados de
segurança contra atos de autoridade estaduais situados fora da Comarca da
Capital; e
c) os de acidentes do trabalho.
II - conhecer e
decidir as ações populares que interessem ao Estado ou às autarquias e
entidades paraestatais; e
III - cumprir
cartas precatórias e rogatórias em que seja interessado o Estado.
Parágrafo único.
As causas perante outros juízes desde que o Estado nelas intervenha como
litisconsorte, assistente ou opoente, passarão à competência das Varas da
Fazenda do Estado.
O artigo 17 da Lei Estadual nº 6.166 de 29 de
junho de 1988 apenas dá nova denominação à Vara Especializada (para Vara da
Fazenda Pública).
Os dois dispositivos em análise decorrem da
competência dos Estados para organizar sua Justiça, nos termos do artigo 125 da
Constituição Federal, e do teor do artigo 93 do Código de Processo Civil, e
devem se harmonizar expressamente com o artigo 22 da referida Constituição, que
prevê competência exclusiva da União para legislar sobre direito processual.
Como harmonizar os referidos preceitos? Torna-se
evidente que ao organizar sua Justiça, os referidos Estados podem criar Foros
Privativos (não privilegiados), desde que seus dispositivos se harmonizem com
os preceitos de natureza processual, emanados de lei federal.
E nesse aspecto, temos que o Estado da Criança e
do Adolescente, ao trazer em seu bojo normas de competência próprias, afasta
por completo a possibilidade de aplicação do Código Judiciário do Estado,
tornando patente a competência absoluta das Varas da Infância e Juventude para
ações referentes a essa matéria, excetuando expressamente somente a Justiça
Federal e as competências originárias dos Tribunais Superiores.
Diz o artigo 208 da Lei nº 8.069/90,
expressamente:
Art. 208.
Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa
aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não
oferecimento ou oferta irregular:
I - do ensino
obrigatório;
(...).
Logo a seguir, no mesmo
Capítulo, prossegue o Estatuto com o art. 209, já citado, afirmando que:
As
ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do local onde ocorreu ou
deva ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta para processar a causa, ressalvadas a
competência da Justiça Federal e a competência originária dos Tribunais
Superiores. (grifo nosso).
Finalmente, sobre o tema, diz ainda a lei
especial em comento com o também já citado art. 148, onde se esculpe que:
A Justiça da Infância e da Juventude é competente
para: ... IV - conhecer de ações civis públicas fundadas em interesses
individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado
o disposto no artigo 209;...
A análise dos artigos em questão demonstra com
segurança a competência absoluta em razão da matéria do Juízo da Infância e da
Juventude, que não poderia ser afetada pelos foros privativos criados por
normas de organização judiciária, que, aliás, é anterior a sua edição.
Outro, aliás, não poderia ser o entendimento.
De fato, desde a Constituição Federal de 1988
foi estabelecido o princípio da absoluta prioridade da criança (artigo 227) e o
Estatuto da Criança e o Adolescente, ao repetir o princípio, perfilhou a
doutrina da proteção integral da criança e do adolescente, estampada no seu
artigo 1º. A intenção do legislador foi de criar leis específicas para a
proteção da pessoa humana em desenvolvimento e o aplicador dessa lei deve atuar
especificamente no Juízo da Infância e Juventude, ressalvadas unicamente as
competências expressamente previstas em seu texto legal, entre as quais não se
situa o foro da Fazenda Estadual.
Embora a matéria seja nova em nossos Tribunais,
já houve julgado em que foi admitida a Fazenda Pública do Estado no pólo
passivo, discutindo-se unicamente se a competência seria da Vara Especial ou
não.
Entre a doutrina, também a matéria não é
analisada, excetuando-se aqui apenas o entendimento do Ilustre Promotor de
Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, JOSÉ LUIZ MÔNACO DA
SILVA, (Estatuto da Criança e do
Adolescente - Comentários - ed. Revista dos Tribunais, 1994, p. 365), que
com maestria, enfrentou a questão em foco, explicando:
Tratando-se de ato comissivo ou omissivo que importe em violação dos direitos assegurados pela Constituição Federal e pelo Estatuto, a ação será proposta no foro do local onde o dano ocorreu. Se determinada cidade deixar de oferecer ensino obrigatório aos seus munícipes mirins, a demanda será proposta na comarca a que pertencer tal município, cujo Juízo da Infância e da Juventude terá competência absoluta para processar a causa.
A questão assumirá
contornos mais complexos quando o ato comissivo ou omissivo for praticado
dentro dos limites geográficos de uma grande cidade, como é o caso da Capital
Paulista, cuja comarca apresenta mais de uma dezena de Juízos da Infância e da
Juventude. Desses juízos, qual será o competente para o processamento e o
conhecimento da ação? Um exemplo, decerto, responderá a indagação: se na Zona
Norte de São Paulo o ensino público mostra-se deficitário devido a contínuas
greves do corpo docente, dando azo a que o corpo discente passe a maior parte
do ano letivo sem aulas, a ação será proposta perante o juízo que tenha
competência para açambarcar toda a região, no caso o Juízo da Infância e da
Juventude do Foro regional de Santana. No pólo passivo figurará o Estado, caso
a rede de ensino seja estadual, ou o Município, se municipal. E mais: não
prevalecerá, ante expressa disposição do artigo em estudo, o foro privativo de
que gozam essas pessoas jurídicas de direito público.
V. DO
FORO COMPETENTE
A passagem citada de lavra do ilustre Promotor de
Justiça JOSÉ LUIZ MÔNACO DA SILVA, suscita-nos o tema da competência
territorial para a presente ação, posto que a ação deveria ser prestada pelo
ESTADO DE SÃO PAULO em áreas correspondentes aos mais diversos foros regionais
da Capital.
O problema pode ser facilmente resolvido
mediante algumas singelas considerações. Inicialmente, cabe ponderar que a
competência territorial é relativa e, portanto, prorrogável.
Nos termos do art. 102 do Código de Processo
Civil, a competência em razão do território poderá ser modificada pela conexão
ou continência. Os juízes por onde se processam as ações conexas são
competentes, isoladamente, para o julgamento das causas. A conexão é causa
modificadora dessa competência, fazendo com que as causas conexas sejam
reunidas para obter julgamento conjunto, a fim de se evitarem decisões
conflitantes.
Em tema assim, expressa a lei, que ocorrendo
conexão ou continência, o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, pode
ordenar a reunião de ações propostas em separado, a fim de que sejam decididas
simultaneamente. (art. 105, do CPC).
Ora, se assim pode agir o magistrado, ex officio, ou a requerimento das
partes, pode o autor, ab initio, ao
invés de propor diversas ações idênticas em diversos foros, reuni-las em uma
única e propô-la em qualquer daqueles que fosse competente para o julgamento de
parte da demanda global, por força de sua jurisdição local.
Economia processual manifesta se concentra em
tal proceder, obtendo-se maior celeridade e concentração de esforços da Justiça
Pública na solução geral da causa.
Não fossem argumentos suficientes, há outro
mais, quase desconhecido. As atuais Varas da Infância e da Juventude dos Foros
Regionais foram criadas por força do art. 2º das Lei Estadual 3.947/83, à época
denominada simplesmente Vara de Menores. Foi distribuída a competência
territorial geral, sem referência específica às Varas de Menores de então pelo
mesmo art. 2º. No art. 4º, inc. IV, e com a norma expressa no art. 7º, quando
ficou assentado que:
Art. 4º A
competência de cada foro regional será a mesma dos foros distritais
existentes, com os acréscimos seguintes e observados, no que couber, os
demais preceitos em vigor:
(...).
IV - em matéria
de menores, a mesma competência da atual Vara de Menores da Comarca de São Paulo,
excluídas, porém, as infrações imputadas a menores e observado o disposto no
artigo 7º desta Lei.
Art. 7º Os atos
normativos dos juizados de menores da Comarca de São Paulo serão adotados, em
conjunto, pelos titulares das respectivas varas regionais e central, ou das
especiais, com a coordenação de um deles, designado, periodicamente, pelo
Conselho Superior da Magistratura.
Vale dizer, há um nível de coesão e uniformidade
na atuação das Varas da Infância e da Juventude, quer pela competência idêntica
vigorante entre elas, quer pela atividade administrativa que deve ser
conjuntamente desenvolvida por seus magistrados titulares. Tal aspiração de
coesão reforça o sentido identificador de qualquer uma das Varas da Infância e
da Juventude é igualmente competente para apreciar o tema da presente ação
civil pública.
VI.
DO DIREITO À EDUCAÇÃO
Uma das mais inquestionáveis formas de omissão
na oferta regular de ensino obrigatório consiste no cerceamento de permanência
da criança ou do adolescente nos níveis escolares. Uma das preocupações mais
constantes do Estatuto da Criança e do Adolescente foi o combate à evasão
escolar, criando a obrigação prevista no art. 56 de comunicação ao Conselho
Tutelar de reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar para
propiciar àquele órgão a possibilidade de averiguar os fatos e pugnar pelo
retorno da criança ou do adolescente à escola.
Pois é esse elevado espírito legislativo que vem
corrompido por mais uma medida arbitrária, autoritária, ilegal e atrabiliária da
Secretaria Estadual de Educação. Tudo porque sua titular, ávida por apresentar
estatísticas que coloquem o Estado de São Paulo no Primeiro Mundo, achou de
entender que a forma adequada para combater evasão escolar era cancelar as
matrículas dos faltosos. Assim, como se nunca tivessem existido nem se
matriculado, não poderiam ser considerados evadidos, mas não matriculados.
Perverso sofisma e gesto de ilegalidade galopante.
A lei federal é clara ao prescrever que os
dirigentes das escolas (estabelecimentos de ensino fundamental) deverão
comunicar ao Conselho Tutelar (a forma empregada é imperativa e não admite
margem para descumprimento) a reiteração de faltas injustificadas (precisamente
o que se coloca no art. 15 da famigerada Resolução) e de evasão escolar (o que
parece estimular a Secretaria Estadual de Educação).
VII.
DO PERICULUM IN MORA
Fácil de ser visto o periculum in mora com a determinação da Secretaria de Educação de
mandar cancelar as matrículas dos faltosos sem determinar que os diretores de
escola oficiem aos Conselhos Tutelares para que averiguem a situação concreta e
busquem recuperar a criança ou adolescente para a escola.
Qualquer governo decente e honesto tomaria,
antes de qualquer coisa, esses cuidados, para, somente depois, bem depois,
mandar cancelar as matrículas.
Atira-se na lata do lixo o Estatuto da Criança e
do Adolescente e seu propósito de combate à evasão escolar.
Trata-se de dano irreparável a direitos
fundamentais de todo cidadão, que merece redobrada tutela jurisdicional liminar
em casos de defesa dos interesses de crianças e adolescentes.
A jurisprudência, sobre a concessão de medida
liminar, inclusive em ação civil pública, tem se manifestado em termos
seguintes:
Na decisão liminar o juiz valoriza situações a fatos, sem ficar eqüidistante dos reais sentimentos de justiça correntes na sociedade procurando uma interpretação amoldada àqueles sentimentos, dando maior utilidade aos provimentos jurisdicionais.
O periculum in mora, desprendendo-se de vinculação privada, pode
estar sob a vigilatura do interesse público, favorecendo a atividade criadora
pela convicção do juiz, sob o signo da provisoriedade, adiantando solução
acautelatória. (STJ, Ag. Reg. 209-93-DF, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJU
07.03.94, p. 3606)
VIII.
DO PEDIDO
Diante desse quadro, requer-se:
A concessão de medida de liminar,
face ao claro periculum in mora a que
estão sujeitas às crianças e os adolescentes, nesta Ação Civil Pública para que
seja imediatamente compelida a FAZENDA
PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por sua Secretaria Estadual de Educação, a
determinar a todos os direitos de escolas de primeiro e segundo grau de todo o
Estado de São Paulo que, ante a falta injustificada de criança ou adolescente
matriculado por 10 (dez) dias consecutivos, seja o fato comunicado ao Conselho
Tutelar da circunscrição para as providências legais daquele órgão,
cumprindo-se assim o art. 56 do Estatuto da Criança e do Adolescente, e seja
compelida Ré, conseqüentemente, a abster-se de cancelar as matrículas das
crianças e adolescentes nessa situação.
Para que se
assegure esse direito de permanência da criança ou do adolescente na escola, requer-se, ainda liminarmente, seja a
Secretária de Estado da Educação notificada a fazer publicar no Diário Oficial
determinação nesse sentido a todos os Diretores de Escolas da rede estadual,
comunicando-se o fato também por ofício a cada Escola no prazo de 24 (vinte e
quatro) horas seguintes à notificação, explicitando que assim o faz em virtude
de medida liminar em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público e
proferida por essa E. Vara.
Outrossim, nos
termos do art. 213, § 2º do mesmo Estatuto, requer-se a imposição de multa cominatória diária, no valor
correspondente a R$ 10.000,00 (dez mil reais) por dia de atraso na publicação
desse ato.
Oportunamente
requer seja citado o réu, por intermédio de seu Procurador Geral do Estado, no
Pátio do Colégio, s/n prédio da Procuradoria Geral do Estado, para responder
aos termos da presente ação, assim como, querendo, contestá-la, no prazo legal,
sob pena de revelia.
Requer-se sejam
as intimações ao autor expedidas para a Promotoria de Justiça de Defesa dos
Interesses Difusos e Coletivos da Infância e da Juventude da Capital, à Rua
Major Quedinho, nº 90, 8º andar, tels. 257.2899, r. 214/215/216.
Protesta-se pela
apresentação de todos os meios de provas admissíveis.
Dá-se à causa o valor simbólico de R$ 1.000,00 (um mil
reais).
Termos em
que
Pede
deferimento.
São Paulo, 03 de fevereiro de
1998.
Promotor
de Justiça
Promotor
de Justiça Substituto