IMPLEMENTANDO O

NÚCLEO DE ATENDIMENTO INTEGRADO

 

APONTAMENTOS E ORIENTAÇÕES

DE UM CAMINHO PERCORRIDO

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

  1. O NAI E O ECA
  2. UM POUCO DE HISTÓRIA

a)      A realidade vivida em outubro de 99

b)      A reunião na FEBEM em Janeiro de 2000

c)      De um terreno ao aluguel de um imóvel

  1. PASSOS QUE PRECEDERAM O NAI

a)      A municipalização da L. A. e P. S. C.

b)      A criação da Comissão de L. A.

c)       O projeto da Semiliberdade

  1. ELEMENTOS QUE VIABILIZAM O PROCESSO

a)      A participação do Judiciário e do Ministério Público

b)      O envolvimento de uma Entidade de apoio

c)      A parceria com a FEBEM

d)      A participação do Poder Público Municipal

  1. A PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE

a)      O papel da imprensa

b)      A parceria com a iniciativa privada

c)      O corpo-a-corpo

  1. PRESSUPOSTOS DO TRABALHO

a)      A integração dos setores

b)      O adolescente trabalhado no seu contexto social

c)      A realidade local

  1. O PROJETO NAI

a)      A proposta de funcionamento

b)      Organograma de funcionamento

c)      A estrutura física

d)      A UAI e a UIP

e)      CONCLUSÃO

  1. ANEXOS

 

 

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

 

 

              Se há um ano e meio atrás alguém tivesse nos perguntado sobre Núcleo de Atendimento Integrado (NAI) para trabalhar com infratores, nós não saberíamos o que seria. Se alguém nos tivesse perguntado há nove meses atrás como deveria funcionar o NAI, nós teríamos mais dúvidas do que certezas. Na verdade, tínhamos uma única convicção, de que somente através de um trabalho conjunto, integrado, nós teríamos condições de prestarmos um serviço eficaz, eficiente, humano e educativo ao adolescente que comete ato infracional.

              O convencimento era tão grande que nos lançamos de modo decidido na busca da concretização desta idéia. Cada passo que dávamos nos revelava sempre um novo aspecto desta proposta que visava dar cumprimento ao artigo 88, inciso V do Estatuto da Criança e do Adolescente.

              Hoje, com 70% do Núcleo já em funcionamento, podemos perceber os benefícios desta forma de atendimento, seja para os adolescentes, seja para a comunidade. Estamos certos de estarmos construindo uma proposta alternativa e desafiadora de trabalho com adolescentes autores de ato infracional. Estamos certos, contudo, de que o caminho é este.  Acreditamos nesta proposta e estamos investindo nossos esforços não apenas em concretizá-la em nossa cidade, mas também em socializá-la com todos aqueles que tenham interesse em aplicá-la.

              Estas páginas, ainda em forma de apontamentos e sem uma redação mais aprimorada, quer ser um instrumento de divulgação da idéia, um estímulo para aqueles que quiserem concretizá-la no próprio município e quer, também,  oferecer algumas orientações que possam facilitar esta caminhada.

                         

 

 

Dr. João Baptista Galhardo Jr.

Juiz da Inf. e Juv. de S. Carlos

 

Pe. Agnaldo Soares Lima

Diretor do Salesianos e NAI

 

 

 

1        O NAI E O ECA

 

Grandes e muitas são as críticas constantemente feitas ao Estatuto da Criança e do Adolescente. Daqueles que deveriam cuidar do seu cumprimento àqueles que o teriam, através do seu uso, como um importante instrumento na construção da cidadania partem ferozes críticas a esta importante legislação. O que ocorre, na verdade, é que o desconhecimento e o descumprimento desta lei ainda não permitiram que se pudesse experimentar, concretamente, a sua eficácia. A verdade é uma só: critica-se pela falta de conhecimento e critica-se porque não se conseguiu tirar do papel propostas que qualifiquem e dêem eficácia a qualquer trabalho com o adolescente.

Se quisermos buscar alguns exemplos da afirmação acima basta pensarmos nas qualidades dos abrigos, na atuação  tímida de tantos Conselhos Tutelares, na pouca divulgação - por parte do governo - no que diz respeito ao ECA, sobretudo se comparado ao novo Código de Trânsito... e assim por diante.

No que diz respeito ao trabalho com o adolescente autor de ato infracional a situação é ainda pior. As poucas estruturas que existem não funcionam e ainda conservam o ranço do Código de Menores, haja vista a experiência das FEBEMs. Do conjunto das medidas sócio-educativas, o pouco que se tem aplicado é a Liberdade Assistida e, raramente, a Prestação de Serviço à Comunidade. No entanto, nos lugares onde este trabalho vem sendo feito de modo organizado e com os recursos sociais e pedagógicos necessários, o resultado tem sido muito gratificante.

Um exemplo claro do desconhecimento e a conseqüente falta de aplicação de algumas propostas do ECA pode ser o artigo 88  no seu inciso V. Quantos de nós já fizemos atenção àquele enunciado. No país conta-se nos dedos de uma mão as tentativas de passá-lo para a prática e no Estado de São Paulo, após onze anos de vigência do Estatuto, está sendo construindo agora, em São Carlos, a primeira experiência de um Núcleo de Atendimento Integrado.

Assim reza a lei:

Art. 88 - São diretrizes da política de atendimento:

V- integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Segurança Pública e Assistência Social, preferencialmente em um mesmo local, para efeito de agilização do atendimento inicial a adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional;

Como pensar que um trabalho do gênero possa não dar resultados? Unir, efetivamente, o trabalho de tantos órgãos e considerar infrutífera a integração, seria declarar a incompetência generalizada do sistema. Se algo não funciona não é, certamente, o Estatuto da Criança e do Adolescente, mas sim o nosso empenho e a nossa mobilização, enquanto governo e sociedade civil, para sermos capazes de valorizarmos devidamente “aqueles que trazem dentro de si o futuro” e oferecermos a eles estruturas dignas e eficazes de vida, de educação, de formação, de ressossialização.

 

 

 

UM POUCO DE HISTÓRIA

A realidade vivida em outubro de 99

 

Há momentos na vida em que dizemos que “estamos no lugar errado, na hora errada”. Pode ser também que, em determinadas ocasiões, tenhamos que dizer que “estamos no lugar errado, na hora certa”.

Quem vivenciou a rebelião da FEBEM em outubro de 1999, não esquecerá tão facilmente aquela experiência. Entre tantos outros, um dos episódios mais tristes da história da Instituição. A incerteza do número de mortos, pedaços de corpos carbonizados, um pedaço de orelha de um funcionário cortado diante dos nossos olhos e atirado na nossa direção, a incerteza e a angústia de pensar que dos mortos não identificáveis poderia ser um dos nossos garotos... são algumas das lembranças que, contrariando o nosso desejo, insistem em povoar e assombrar a nossa mente.

Não! Não premeditamos estar ali naquela circunstância.

Para apresentarmos uma proposta de Semiliberdade para São Carlos tínhamos - o juiz e o padre - marcado uma reunião com o Presidente da FEBEM para o período da tarde. Fiz um convite para o Juiz da Infância para que, no período da manhã, fosse comigo até a UAP[1] porque eu gostaria de fazê-lo conhecer a FEBEM da Imigrantes. Antes mesmo de chegarmos à entrada do complexo pudemos perceber a situação que os jornais já noticiavam, mas que não tivemos tempo de tomar conhecimento. Felizmente! Tê-lo sabido antes nos teria desestimulado de realizarmos tal empreitada, o que quase já ia ocorrendo diante do campo de batalha e clima de guerra que se apresentou aos nossos olhos. Recuar teria sido talvez a atitude mais sensata, não fosse a consciência nos advertir que dentro daquele inferno estavam alguns dos adolescentes da nossa cidade. Ao menos aqueles eram responsabilidade nossa. De fato, ali permanecemos até que, já ao anoitecer, conseguimos retirar todos os nossos.

Não é propósito nosso descrever aqui todos os horrores presenciados naquele dia e momento, mas os “nós na garganta”, que por inúmeras vezes nos cortavam as palavras, nos convenceram de que havia uma única atitude digna a ser tomada: - Não podemos mandar mais para cá nenhum adolescente de nossa cidade!

A reunião daquela tarde não aconteceu, mas naquela mesma semana articulamos uma outra, fundamental para a história do nosso município e para o destino de tantos adolescentes.

Não obstante o curto espaço de tempo para prepará-la e o convite feito às vésperas, foi possível reunir no teatro da Casa da Cultura mais de oitenta pessoas de relevância para a comunidade: cinco ou seis secretários municipais, diversos vereadores, conselheiros do CMDCA[2] e o CT[3], Dirigentes de Entidades Sociais, Professores das Universidades, Ministério Público, simpatizantes e toda a imprensa escrita, falada e televisiva do Município. Eram todos formadores de opinião pública e iniciou-se ali um importante trabalho de sensibilização da comunidade. O momento era propício, pois não era possível permanecer indiferente mesmo diante das imagens plásticas da televisão.


A reunião na FEBEM em Janeiro de 2000

 

 Nova reunião com a FEBEM para apresentarmos nosso projeto de Semiliberdade somente voltou a acontecer em janeiro de 2000, agora ainda mais convencidos da necessidade de sua municipalização. Saímos cedo de São Carlos para, no Prédio da Bela Cintra, discutirmos com técnicos, coordenados pela Dra. Laura Keiko, um convênio novo com o Salesianos. Nosso propósito era implantarmos esta medida  e reduzirmos a quase zero nossas internações na FEBEM.

Após discutirmos os diversos aspectos do projeto, os termos da parceria quanto ao que estaríamos oferecendo e com o que a FEBEM nos apoiaria, ouvimos então a apresentação do novo Projeto que o Estado pretendia incrementar. Foi nesta reunião que, pela primeira vez, ouvimos falar do Núcleo de Atendimento Inicial ou Integrado. O propósito da FEBEM seria estar instalando em poucos meses 14 destes Núcleos. Os municípios escolhidos - São Carlos não estava incluído - deveriam disponibilizar uma área de 5.000 m2 para a construção.

Se nós conseguirmos uma área em São Carlos, podemos fazer funcionar lá um destes Núcleos?

Esta foi a pergunta que imediatamente fizemos e o novo compromisso que procuramos alcançar da Fundação.

 

De um terreno ao aluguel de um imóvel

 

Negociar com a administração pública para que comprasse a idéia da nova forma de atendimento a adolescentes autores de ato infracional foi a nova tarefa assumida. O que tínhamos ouvido em S. Paulo sobre a inovadora forma de acolhimento para os adolescentes infratores nos parecia realmente interessante. Ambiente digno, possibilidade de um banho e alimentação, um sistema amplo de identificação. Tínhamos a certeza de que este era um caminho condizente com a realidade de uma cidade como São Carlos e, sobretudo, com a qualidade do trabalho que se queria prestar aos adolescentes. Seriam tratados com dignidade e respeito.

Convencer o Prefeito Municipal sobre a doação do terreno para o Estado não foi tarefa difícil. O tempo, porém, mostrou que a viabilidade de tais construções não era algo tão rápido quanto se imaginava. A determinação em fazer o Núcleo acontecer - e isto é fundamental neste processo - fez com que se buscasse outras alternativas à construção. Alugar um imóvel amplo foi nossa contraproposta para a FEBEM.

As tratativas demoraram alguns meses e diversas idas e vindas de ambas as partes a São Paulo e a São Carlos. A realidade existente de um trabalho construído através da busca de uma integração foi o convencimento de que tínhamos já o pressuposto básico para a nova proposta.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

PASSOS QUE PRECEDERAM O NAI

 

A municipalização da L. A. e P. S. C.

 

O NAI é a porta de entrada de um processo de atendimento, como veremos mais avante. É fundamental, para que possa atingir seus objetivos, que tenha também as necessárias portas de saída. Boa parte dos adolescentes que passam pelo NAI deverão ser inseridos em medidas sócio-educativas. Para tanto, é necessário que estas estejam funcionando no município e atuem de modo eficaz.

Número de técnicos adequado, espaço físico bem estruturado, trabalho em rede, opções de atividades são alguns elementos que garantem qualidade e eficiência a estas medidas sócio-educativas de meio aberto.

Após anos de atendimentos feitos diretamente pelos técnicos da FEBEM, em condições bastante limitadas, a partir de 1999 municipalizamos o atendimento em S. Carlos. A Entidade SALESIANOS, interessada na causa, firmou convênio com o Estado e passou a contratar diretamente os técnicos bem como a organizar a proposta pedagógica. Com uma infra-estrutura básica de salas para atendimentos e de telefone, computador, TV, Vídeo e uma pequena cozinha, foi possível ampliar a média de atendimento de 35 para 85 adolescentes. Tudo isto com qualidade e resultado.

 

O atendimento expande-se, contudo, para outros espaços: cursos de formação profissional que já acontecem em sindicatos e entidades, práticas esportivas no SESI e em academias particulares, oficinas com a participação de alunos das Universidades, passeios e visitas culturais.

Em muitos municípios este tipo de convênio tem sido firmado diretamente pela Prefeitura Municipal.

 

 

A criação da Comissão de L. A.

 

A Comissão de Liberdade Assistida foi a precursora do Núcleo de Atendimento Integrado. Ela realiza de um modo simples o pressuposto fundamental do NAI: a parceria e a integração.

Quando ainda estávamos estruturando a Liberdade Assistida e a Prestação de Serviço à Comunidade, percebíamos a dificuldade de conseguirmos determinados apoios e ocuparmos certos espaços seja junto ao Executivo Municipal, seja junto a própria comunidade. Foi aí que surgiu a idéia de fortalecermos este trabalho envolvendo nele diversos segmentos. Convidamos, então, as Secretarias da Assistência Social, da Saúde, da Educação, a Coordenadora Regional da FEBEM, o Conselho de Direitos e o Conselho Tutelar, a Segurança Pública, a Universidade, uma advogada e outros voluntários, a representante do SADS e Entidades interessadas. Judiciário e Ministério Público foram peças chaves neste processo, juntamente com o Salesianos que, posteriormente, assumiu o convênio. De se ressaltar que nós, Salesianos não premeditamos, antecipadamente, ser a instituição conveniada. Como tantas outras, nossa participação inicial nesta empreitada tinha por princípios a consciência da importância e o engajamento na causa. Era o que nos induzia e motivava à cumplicidade com todos imbuídos do mesmo propósito.

Com este grupo se reunindo mensalmente começamos a discutir desde a dificuldade de espaço para os atendimentos, da alimentação para os adolescentes, dos passes de ônibus... até o projeto da Semiliberdade. O trabalho em comissão trouxe inovadoras idéias, abriu novas portas, fortaleceu o projeto e deu complementaridade aos serviços.

 

O projeto da Semiliberdade

 

 A idéia e o empenho de São Carlos de evitar, ao máximo, o envio de adolescentes para a FEBEM de São Paulo desencadearam a necessidade de implementarmos mais e melhor o atendimento para os autores de ato infracional na cidade. Eram propostas que se somavam visando à garantia da qualidade da assistência a ser prestada. A assim chamada Comissão de L. A. começou, então, a debater o Projeto da Semiliberdade. O sonho de ter um projeto do gênero, funcionando em uma chácara, vinha sendo acalentado desde 1993, quando, alguns dos que agora faziam parte da comissão, já, então, participando de um grupo de reflexão, tinham esboçado a proposta.

A medida de semiliberdade, embora contemplada no ECA, funciona em raríssimas unidades no Estado de São Paulo. Até a implantação do Projeto de São Carlos, apenas cinco ou seis programas eram executados na Capital e interior.

São Carlos inovou já nesta proposta. Buscou-se implantar no Município a primeira semiliberdade conveniada pela FEBEM com uma Entidade particular. As unidades que a operacionalizavam eram sempre administradas pela FEBEM e, no caso de Mogi Mirim, tendo como parceira a Prefeitura Municipal.

O local encontrado para funcionamento foi uma chácara, cedida por um empresário da cidade, o Sr. Oscar Marcomini, proprietário da Real Imóveis e Construção Ltda. A Entidade Salesianos assumiu a administração de um programa novo e desafiante. O sistema é aberto. Todo o programa está sendo montado e desenvolvido por uma equipe de técnicos que, nova na área, aceitou construir a proposta.

            Um convênio com a FEBEM garante um per capta por adolescente para o custeio das despesas. O programa de São Carlos tem previsão de atendimento para até 20 adolescentes.

            A Chácara, denominada “CASA DE CONVIVÊNCIA LUCAS PERRONI JR.”, é um espaço agradável. Ali se desenvolve o trabalho pedagógico formativo (atendimento individual, de grupo, dinâmicas, etc.) e parte das atividades: horta, viveiro de mudas, centro de artesanato. Outras atividades acontecem fora deste espaço. Os adolescentes que ora ali se encontram, sem a casa de semiliberdade, estariam hoje na Internação.

 

 

 

ELEMENTOS QUE VIABILIZAM O PROCESSO

 

A participação do Judiciário e do Ministério Público

 

 A proposta de um atendimento integrado para o adolescente autor de ato infracional vai muito além de uma simples aplicação da lei. O que se busca, na verdade, é uma forma pedagógica de cobrar seu erro e recupera-lo. Este é, aliás, o pano de fundo do Estatuto da Criança e do Adolescente. Basta pensarmos que às medidas aplicadas aos infratores dá-se o nome e o caráter de sócio-educativas.

A função do Ministério Público e do Poder Judiciário é garantir a aplicação e o cumprimento da lei. Para que isto possa se dar de um modo efetivo é necessário que tanto se possa contar com os meios, ou seja as estruturas que viabilizem a aplicação da lei, quanto a sintonia com o espírito pedagógico da mesma. Se faltar um desses quesitos torna-se impossível equacionar a “não impunidade” com um processo pedagógico que resgate o adolescente infrator para a sociedade.

A descrença no Estatuto e no trabalho da Justiça é a falta dos meios necessários para se cumprir o que está contemplado na lei. As penas aplicadas aos adultos são igualmente previstas para o adolescente. Estes não são nem mais e nem menos responsáveis. O que diverge é o caráter que, no caso do adolescente, procura levar em conta sua condição peculiar de desenvolvimento. Não são indivíduos acabados na sua formação. Muito pelo contrário. Possuem toda uma vida e um amadurecimento pela frente.

Com as medidas sócio-educativas em meio aberto (L.A. e P.S.C.) e com aquelas de meio fechado (Semiliberdade e Internação), a justiça pode ser aplicada. Cabe então garantir a eficácia pedagógica destas medidas, com um trabalho e uma proposta bem estruturados e a sensibilidade de juiz e promotor para usá-las da forma melhor para a recuperação do adolescente. No caso do adolescente, pelo próprio espírito que permeia o Estatuto, há que se considerar a gravidade dos delitos, mas há que se considerar também em que condições obter-se-á um resultado melhor para seu desenvolvimento psicossocial.

Na realidade de São Carlos, temos casos de homicídio, roubo e reincidências que, numa análise fria, poderiam ser considerados casos de internação. Graças ao bom senso do Promotor e Juiz estão sendo tratados no programa de semiliberdade. Os resultados estão sendo satisfatórios também graças à qualidade da proposta pedagógica. O fato mais significativo é que os resultados almejados estão sendo alcançados. Isto é o que importa.

Por fim, há que se enfatizar que, perante a sociedade, a participação direta do Promotor e do Juiz confere credibilidade à proposta, sem a qual, todo o esforço dos demais órgãos, poderia ser em vão.

 

O envolvimento de uma Entidade de apoio

 

Afirma o dito popular que “a teoria, na prática, é outra” e um provérbio italiano (numa tradução livre) que “entre o falar e o executar tem em meio o mar”. Ambas as afirmações são verdadeiras e reforçam a necessidade de que as belas idéias e reflexões que podem surgir de uma comissão interdisciplinar e integrada não fiquem apenas no papel. Há que se conseguir pessoas e estruturas que garantam que o que foi pensado e planejado aconteça.

Uma Entidade social bem estruturada e, principalmente, que se sinta capaz de se comprometer com a causa, é elemento determinante neste processo. As estruturas governamentais correm muitas vezes o risco de se perder em burocracia. Órgãos como Judiciário, Ministério Público, OAB, Universidades e outros não são, necessariamente, órgãos executores. Elaborados os projetos e propostas, é determinante que estes sejam implementados.

Competência e arrojo pedagógico são características que devem marcar a escolha de uma Instituição Social executora. Mesmo que não domine o conhecimento exigido pelo trabalho, que possui inúmeras experiências bem sucedidas mas não uma fórmula consagrada, mas é necessário que seja capaz de ir amadurecendo com vigor, nas experiências do dia-a-dia, um caminho pedagógico de resultados.

Esta Instituição também não precisará ser completa nos serviços que oferece. Sua capacidade de articulação em rede permitirá encontrar os parceiros de que necessita para uma ação ampla.

Destacamos, finalmente, um elemento fundamental que deve ser característica marcante da Entidade ou Entidades, que estarão atuando no programa: credibilidade, confiança, respeito... perante à comunidade. Sabemos que o trabalho com o adolescente autor de ato infracional desperta grande preocupação na comunidade. Cenas antes vistas com freqüência, em episódios que envolviam a FEBEM, esparramaram medo e desconfiança nas pessoas em relação a este tipo de trabalho. Uma Instituição que já vem mostrando bons resultados e que goze de ampla aceitação da comunidade diminuirá sensivelmente a resistência da população.

 

Certamente, este terá sido um dos fatores que em São Carlos contribuiu para que se pudesse instalar estes programas no centro da cidade, sem que nenhuma mobilização ocorresse. Neste sentido teve papel preponderante, também, a participação da imprensa que, por sua vez, terá sempre dificuldade de lançar desconfiança sobre um trabalho reconhecido pela comunidade e que já vem obtendo sucessos.

 

A parceria com a FEBEM

 

 A responsabilidade no que tange à Segurança Pública diz respeito ao Estado. Nas questões relativas ao adolescente que infraciona, o órgão responsável pela aplicação da lei é a Fundação Estadual do Bem Estar do Menor – FEBEM. Este órgão tornou-se complexo ao longo dos anos, carece de uma reestruturação e, principalmente, de uma descentralização.

Não há nada mais inócuo do que pensar que o problema do infrator é do Estado e que, portanto, eles devem ser mandados para a Febem e ponto. Este modo limitado de refletir e tentar resolver o problema dos adolescentes, que são originários de uma determinada cidade, fez com que as estruturas da capital, e mesmo algumas do interior, inchassem e se tornassem um caldeirão em contínua ebulição. Esta forma de pensar desconsidera que um adolescente não irá viver para sempre dentro da instituição Febem e que, consequentemente,  irá um dia retornar para o seu Município. Vale lembrar que retornará com os vícios que levou para o grande centro e todos os demais que ali adquiriu.

 

Consideradas tais premissas, seremos levados a entender que a Instituição Febem não deve ser tomada como responsável única na solução do problema do infrator, mas como aquela que, tendo a responsabilidade primeira, deve apoiar de forma efetiva para que os municípios encontrem os caminhos e possam contar também com o apoio de recursos para uma solução eficaz do problema.

“Quem sabe faz a hora”, já cantava Geraldo Vandré. Não esperamos que a Febem nos mostrasse o caminho, mas apresentamos as nossas propostas. Discutimos alternativas e solicitamos os recursos. Podemos dizer que esta é a parceria que deu certo e que vem mostrando horizontes seja para o Estado seja para as comunidades que começam a buscar alternativas para os próprios municípios.

Um adolescente acompanhado nas medidas de meio aberto custa muito menos para o Poder Público. Cada adolescente que o interior deixar de internar na capital significará uma economia para a Febem e para a Comunidade local. Economiza-se não apenas pelo montante que se deixa de gastar, mas, sobretudo, pelo valor social: maior chance de recuperação e, em decorrência, um cidadão positivo para a sociedade; mais segurança e bem estar para a comunidade; menores despesas com deslocamento da família; maior facilidade de inserção na educação formal e profissional; índices mais baixos de criminalidade infanto-juvenil, etc.

O Estado entra com a economia gerada e o Município antecipa o investimento pelos benefícios que vai obter.

 

A participação do Poder Público Municipal

 

 À raiz de todo o problema do adolescente estão questões relacionadas à família, à saúde, à educação, à assistência social. Há que se trabalhar o conjunto destes aspectos para que se possa efetivamente combater a causa e se alcançar resultados. Tal trabalho não é possível sem a participação da esfera municipal com os seus diversos campos de atuação.

            O Núcleo de Atendimento Integrado somente poderá funcionar em rede com todo o trabalho realizado no Município. Mais ainda, ele pode ser o espaço que abraça e congrega formas de atendimento voltadas especificamente para crianças e adolescentes em situação de risco. Um trabalho de prevenção, visto que estará viabilizando encaminhamentos para os adolescentes antes que ocorram as primeiras infrações.

            A administração conjunta com o Estado na formulação deste modelo de atendimento  permite otimizar recursos existentes e conseguir serviço de qualidade a baixo custo.

 

 

A PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE

 

O papel da imprensa

 

Não podemos negar o poder da mídia. Ela é capaz de ajudar a por e a depor governos. A questão carcerária dos adultos e a da Febem, no caso dos adolescentes, tem ocupado constantemente os meios de comunicação.

Na coletividade, como já dissemos acima, a sensação é sempre de medo, tensão, rejeição a este serviço. Ninguém quer ter na própria cidade este tipo de trabalho. Esquece-se que, adultos ou adolescentes, aqueles que infringem a lei foram gerados no seio da própria comunidade.

A preocupação é gerada e sustentada pelas informações que jornais e televisão alimentam constantemente. No caso do adolescente, particularmente a mídia mais popular, tem o poder de estigmatizar, tornando-o, forçosamente, um bandido perigoso. A realidade, porém, tem mostrado uma situação bem diferente. O número dos adolescentes que podem de fato oferecer perigo para a comunidade não passa de 10% da totalidade dos que se envolvem em atos infracionais. Uma cidade como São Carlos, com quase 200 mil habitantes, tem mostrado que esta porcentagem não chega a 5%. Todos os outros são adolescentes plenamente recuperáveis com um trabalho educativo sério.

É necessário que a comunidade acredite nisto e ofereça oportunidade para que se comece um trabalho e avalie os seus resultados. Para tanto, a participação dos meios de comunicação é imprescindível. Se rádio, jornal e televisão comprarem a idéia da municipalização do atendimento e do ganho que isto significa para a comunidade local, um longo caminho já terá sido trilhado.

 

A parceria com a mídia não apenas é necessária para que não trabalhem contra, mas, principalmente, para que reforcem de maneira positiva o envolvimento da sociedade civil. A comissão que estiver trabalhando a implantação do NAI deverá ter pessoas respeitadas no seu ambiente social e capazes de se colocar com habilidade diante dos meios de comunicação local para fazer veicular todo tipo de informação que mostre aprovação, a importância da empreitada e os resultados alcançados.

O padre e o juiz em São Carlos, e por vezes também o promotor, ocuparam este espaço. Vale destacar que nunca, em nenhum momento, foi feita a pergunta para saber se não haveria risco para a comunidade. Colecionamos quase uma centena de entrevistas, reportagens escritas, faladas e televisivas mostrando o percurso da implantação do NAI. Podemos considerar a imprensa como um dos grandes parceiros.

Penso que seja útil destacar, por fim, que mesmo a imprensa “barata” e sensacionalista, que procura explorar a delinqüência como forma de ganhar audiência e que, geralmente são vozes contra o Estatuto da Criança e do Adolescente, não foi colocada de lado. Aceitamos os debates públicos ao vivo, concedemos entrevistas e procuramos tornar este mesmo espaço adverso um meio para passarmos para a comunidade que o “bicho não é tão feio quanto parece”.

 

 

A parceria com a iniciativa privada

 

O espaço utilizado para a implantação do NAI foi conseguido e é mantido através de uma parceria entre Estado e Prefeitura. O espaço utilizado para o programa de Semiliberdade, como declaramos acima, foi conseguido através do apoio da iniciativa privada.

A sociedade conta com pessoas generosas e interessadas no bem comum. É possível conseguir o apoio de empresas e cidadãos para que se possa alavancar os recursos que viabilizem a implantação e o funcionamento de um programa para adolescentes. Mesmo que estes sejam infratores. Tudo depende do enfoque que se dá e da credibilidade que se tem. Uma lata de tinta, um material para reforma, mesmo um espaço para atividade recreativa, uma horta, etc., sempre poderão vir através de parcerias com a iniciativa particular.

Com o SESI conseguimos um espaço de lazer para os adolescentes, com a Multisport um espaço para jogos e natação, com a ENCALSO o viveiro de mudas, com a Vídeo XXI os vídeos usados quase que diariamente... e assim por diante.

 

 

O corpo-a-corpo

 

Não podemos pensar que o trabalho de conscientização e mobilização da sociedade para uma causa com tantas implicações seja uma tarefa fácil. Exige muita dedicação e gasto de tempo. O grupo para pensar e articular pode ser grande, mas algumas tarefas vão exigir o esforço de alguns abnegados que terão que se envolver de forma mais decidida.

Um dos trabalhos importantes e empenhativos em todo este processo é aquele de divulgar a idéia entre os formadores de opinião. É um verdadeiro corpo-a-corpo, que faz com que a proposta se torne conhecida e sensibilize as pessoas para o problema de modo que divulguem positivamente a idéia. Toda ocasião é oportuna para expor a proposta: clubes de serviço, escolas, Conseg, reuniões de bairro, seminários, conferências, comunidade paroquial, o açougue da esquina, a polícia militar e civil, a reunião das entidades sociais, os conselhos.

Se quiser comparar, pode-se dizer que é um trabalho de formiguinha que vai, gradativamente, arregimentando um exército. Faça a conta de que uma pessoa sempre comentará o assunto com pelo menos mais cinco. Quando falo para um grupo de 50 pessoas, no mínimo estou atingindo pelo menos duzentos e cinqüenta.

Importante, a proposta bem trabalhada e apresentada de modo a fazer com que as pessoas percebam que a situação não é tão grave quanto se crê, e nem os adolescentes maus como às vezes se imagina, produz um efeito otimista e de esperança naqueles que nos ouvem. Após apresentar a proposta em uma reunião de professores e coordenadores no início do ano, destacando os resultados já obtidos e aquele que se poderia obter, a afirmação de uma coordenadora foi exatamente esta: “saímos desta palestra com mais esperança e otimistas”. Eles ainda não tinham sido capazes de perceber que o ECA aplicado é um grande instrumento de trabalho na educação da juventude.

 

 

2        PRESSUPOSTOS DO TRABALHO

 

a.      A integração dos setores

 

A sigla NAI foi, em um determinado momento, lida como Núcleo de Atendimento Inicial. Simultaneamente, falava-se também de Atendimento Integrado. Esta última terminologia foi a que ficou.

 

Inicial identificaria a porta de entrada do caminhado do adolescente, após infracionar. A expressão Integrado vai muito mais na essência da proposta: um trabalho onde segmentos e órgãos diferentes sincronizam a própria ação, até mesmo através da condivisão de um espaço comum.

O que se busca com o NAI é uma agilização com eficiência nos procedimentos que envolvem o adolescente desde o momento em que ele praticou o ato infracional, e foi pego pela polícia, até o momento final do cumprimento da medida sócio-educativa imposta pelo Ministério Público e Juiz da Infância. Neste percurso há que se pensar nas questões da justiça, nas questões sociais, nas questões da saúde e da educação que envolvem ou passarão a envolver a vida do adolescente e sua família. Toda esta tratativa não pode ser feita de modo estanque e isolado, mas sim de forma complementar e continuada.

Há municípios em que entre a apreensão pela polícia até a aplicação da medida sócio-educativa o lapso temporal é de até dois anos. Este mesmo itinerário no NAI de São Carlos tem se processado com um tempo médio de três dias. Em alguns casos até num único dia. Claro que o processo não se esgota aí, mas envolve todo um acompanhamento posterior com o adolescente inserido ou não em medida sócio-educativa. O acompanhamento acontece mais rápido e de forma a alcançar melhores resultados porque todos órgãos envolvidos estão em sintonia com a problemática e com o adolescente em si.

 

b.      O adolescente trabalhado no seu contexto social

 

Todos sabemos que as realidades sociais no nosso país mudam de lugar para lugar. A vivência de um jovem da capital e de um jovem do interior diferem grandemente entre si, seja quanto às possibilidades e oportunidades, seja também quanto à complexidade das situações e problemas. Na capital, um crime grave é um homicídio, um estupro ou coisa parecida. Num contexto de cidade mais interiorana, um simples furto pode já se tornar um grande problema.

As relações pessoais, as facilidades de locomoção, os riscos urbanos são muito diferentes nas cidades pequenas, nas de porte médio, nas de porte grande ou mesmo na capital. O adolescente acostumado nas cidades menores terá muito mais dificuldade de ser inserido e acompanhado num grande centro. Além do mais, seu círculo familiar, de amigos, os ambientes com os quais está abituado, etc. estão todos no seu local de origem.

Manter o adolescente no seu meio e próximo aos seus é, sem sombra de dúvidas, a maneira mais adequada de educá-lo e ressocializá-lo. A este fato podemos acrescer o da possibilidade de um trabalho mais personalizado: número menor de adolescentes, o contato dos técnicos com as pessoas que fazem parte de sua vida, ou seja, sua família, o diretor da escola, o patrão, o clube que ele freqüenta, os coordenadores dos programas sociais do município, etc.

 

c.       A realidade local

 

            Qual a dimensão ideal do NAI, qual deverá ser sua capacidade de atendimento, como deve ser sua estrutura física? A melhor forma de responder a estas perguntas é a análise da realidade local. Um levantamento estatístico da problemática, tipos de infrações, número de atendimentos e demanda não atendida pela falta de estrutura... são elementos determinantes na hora de montar a proposta de trabalho.

            As condições sociais de uma comunidade em um determinado momento podem variar muito. Há cidades maiores com um número “x” de homicídios, roubos e furtos praticados por adolescentes e cidades menores com números superiores. Isto não significa necessariamente um contexto melhor ou pior, mas, sim, a existência ou a ausência de uma rede de serviços que atua na linha de prevenção e/ou ressocialização.

            O trabalho integrado ajudará a avaliar e a dimensionar seja a problemática, seja as possibilidades de solução. Partir da realidade é fundamental.

           

 

 

3        O PROJETO NAI

 

a.      A proposta de funcionamento

A idéia central que permeia todo o trabalho do NAI é a de que a vida de um adolescente é algo muito mais amplo do que um ato infracional olhado isoladamente, fora do contexto maior da sua existência. Em outras palavras, o furto, o roubo, ou qualquer outro delito cometido pelo adolescente tem um “antes”, um “durante” e um “depois”. Não se trata simplesmente de julgar a transgressão cometida, mas, principalmente, de conhecer o adolescente e o significado do delito na sua história de vida.

Partindo deste pressuposto, o ponto inicial é aquele de procurar conhecer o adolescente. Tão logo este chega ao NAI, encaminhado pela polícia, uma técnica do serviço social entrevista-o assim como seus responsáveis, elaborando um relatório bio-psicossocial. Este relatório, encaminhado juntamente com o Boletim de Ocorrência ao Ministério Público e ao Juiz da Infância, torna-se parte integrante do processo, oferecendo elementos que permitam avaliar a melhor medida a ser aplicada ao adolescente.


Antes ainda da decisão da justiça sobre qual medida sócio-educativa cabível, os técnicos do NAI empreenderão esforços para oferecer ao jovem os necessários apoios na área da saúde, da educação, do lazer e da família. Se inserido depois em Liberdade Assistida, Prestação de Serviço à Comunidade ou Semiliberdade, este acompanhamento far-se-á também pelos técnicos destas medidas. Se é concedida a remissão, os órgãos do NAI continuarão a oferecer um suporte de acompanhamento para o adolescente e sua família.

Todo este apoio oferecido num mesmo espaço, ainda que alguns serviços depois aconteçam necessariamente fora, permite uma ação integrada, mais ágil e mais fácil para a família, que não tem que sair procurando auxílio nos quatro cantos da cidade. Importante, também, é o fato de se criar um serviço inteiramente voltado ao adolescente e que, portanto, tem a preocupação de dar uma atenção especial ao mesmo e oferecer um local e uma condição onde ele se sinta bem e aceite ser ajudado.

As várias etapas de abordagem do adolescente veremos a seguir, acompanhando o organograma de funcionamento e entendendo cada momento a partir das exigências legais do ECA.

 



Corro                                                             UIP - NAI

 

b.      Organograma de funcionamento

 

            Seguindo os passos do organograma é fácil entender toda a tramitação do adolescente desde o  sua apreensão até o momento de receber uma das medidas sócio-educativas contidas no art. 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Vale destacar, aqui, que todo este processo que chega a demorar de seis meses a dois anos em muitos municípios, dentro do NAI, nos casos mais simples, acontece no período máximo de uma semana e, em casos mais graves, bem antes dos 45 dias propostos pelo ECA.

           

 


ROTINA DE TRABALHO:


A) Adolescente pego em flagrante mas que não fica custodiado por não ser ato infracional grave

 

 

 

* Pede-se à Delegacia para já fazer contato com o técnico do NAI enquanto se elabora o B.O.

** RBPS = Relatório Bio- Psico-Social

 

 

ROTINA DE TRABALHO:


B) Adolescente pego em flagrante e que fica custodiado por se tratar de ato infracional grave

* UAI = Unidade de Atendimento Inicial   /

UIP = Unidade de Internação Provisório

** RBPS = Relatório Bio- Psico-Social

 

 

 

 

 

 

 

 

Há que se destacar, ainda, alguns pontos:

 

-         1º. A agilização do trabalho da Polícia. Se o caso não envolve apreensão de arma, drogas, objetos de roubo ou furto, a Polícia Militar já encaminha diretamente ao NAI, conduzindo junto os responsáveis. O Boletim de Ocorrência elaborado pelos PMs é fotocopiado, estes são imediatamente liberados e o simples BO é suficiente para os procedimentos da Justiça. Nestes casos, elimina-se a passagem pelo Distrito. Nos casos de apreensão, como referidos acima, passa-se pelo Distrito Policial, que depois encaminhará o adolescente e seus responsáveis ao NAI.[4]

 

-         2º. As audiências ocorrem todas as semanas, com dia e hora já previamente estabelecidos em comum acordo com o Juiz e o Promotor. Assim sendo, ao passarem, adolescente e responsáveis, pelo plantão social, saem  dali intimados para comparecerem na audiência no NAI. Nos casos de custódia, as audiências são marcadas também no Fórum, quando necessário. Em São Carlos, estão acontecendo todas as sextas-feiras às 13h.

 

-         3º. Ao sair da audiência, quando da inserção em medida de Liberdade Assistida ou Prestação de Serviço à Comunidade, o adolescente e responsáveis já são encaminhados imediatamente aos técnicos da medida que, após uma entrevista inicial, marcam a data do primeiro atendimento.

 

Outros detalhes sobre o funcionamento do NAI poderão ser observados através do regimento interno, que acompanha este texto como anexo. As Unidades de Atendimento Inicial (art. 175) e de Internação Provisória (art. 108), trataremos num item específico logo abaixo.

 

A estrutura física

 

A estrutura física do NAI é algo simples, uma vez que se compõe essencialmente de salas, que poderão ser de uso interdisciplinar. Um espaço para a Segurança Pública, para o Juiz e para o Promotor, um salão mais amplo que funciona como espaço de reunião e de espera, quando se tem um elevado número de pessoas para as audiências.

Muito importante será o espaço da custódia, que definitivamente deverá deixar de acontecer nas pequenas celinhas das delegacias. Ainda que pequenos, devem ter características condizentes com toda a proposta, sobretudo o de respeito à pessoa humana.

Apresentamos, a seguir, as plantas do NAI de São Carlos ressaltando que, mesmo em espaços mais simples, o Núcleo poderá funcionar. O essencial é o espírito da proposta que deve estar presente no trabalho.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1- recepção                             6- Cozinha                              11- Secret. Educação e Esporte

2- Segurança Pública               7- Defensoria Pública              12- Conselho Tutelar

3- Ministério Público               8- Secret. Saúde                     13- Centro de Defesa

4- Vara da Infância                  9- Almoxarifado                      14- Febem - Diretoria

5- Assistência Social                10- Entidades                          15- Sala de reuniões

 

 

 

A  U.A.I. e a U.I.P.

 

Para que todo o trabalho do NAI seja efetivamente educativo, são necessárias que todas as etapas revistam-se deste mesmo caráter. Assim sendo, não é suficiente que a acolhida e o acompanhamento realizem-se de um modo pedagógico. Também a custódia, naqueles casos em que esta medida se faz necessária, precisa acontecer num ambiente adequado. Em boa parte dos municípios do interior do Estado o artigo 175 e, muitas vezes, até mesmo o 108, são aplicados nos famosos “corrós” das nossas delegacias. Quase sempre, um lugar escuro, apertado, com péssimas condições de higiene, que possibilita um contato - mesmo que indireto -  com o adulto. Não seria possível pensar o NAI, sem alterar esta condição básica de atendimento.

Em meio ao processo de discussão com a FEBEM sobre o funcionamento do Núcleo em São Carlos, é que se tomou consciência de que tais espaços não poderiam faltar. Concretamente,  ele já havia sido pensado na edícula situada no fundo do imóvel alugado para a Instalação do NAI. O que, na verdade, ficou claro em meio às nossas tratativas era que Internação Provisória envolve Segurança Pública e, conseqüentemente, seria de inteira responsabilidade da FEBEM. Ficou definido para todos os que tratávamos da questão em uma reunião na sede da Fundação em São Paulo, que esta deveria manter uma pequena unidade no NAI, com um diretor próprio e com os necessários agentes de proteção e de educação. Começou-se, então, a detalhar melhor os espaços, as responsabilidades, o pessoal necessário e os procedimentos burocráticos.

A planta do local ajudará a visualizar como foram concebidas estas instalações, dimensionadas para um atendimento de até 10 adolescentes simultaneamente.

 

 

Quanto ao funcionamento, segue-se a burocracia própria da FEBEM para a parte documental e para os cuidados de segurança. No aspecto pedagógico a organização da UAI e da UIP permite um tratamento mais personalizado para o adolescente. Para o Juiz, oferece a possibilidade de um uso mais flexível e mais eficiente desta medida, visando confrontar o adolescente com os limites e a necessidade de respeitar as regras sociais.

 

 

 

4        CONCLUSÃO

 

Quem já teve a oportunidade de visitar “in loco” as estruturas e o trabalho que vem sendo realizado em São Carlos ficou, de um modo geral, impressionado com aquilo que já conseguimos. Podemos, de fato, alegrarmo-nos com o que alcançamos, mas temos também a certeza de que ainda estamos no início do caminho.

Neste momento, nossa palavra quer ser de estímulo para aqueles que estão se propondo a iniciarem este trabalho. Não importam as estruturas, mas importa, sobretudo, começar. Fundamental é a determinação e a capacidade de trabalhar a integração das várias forças vivas da sociedade. Com a boa vontade do Poder Público, a participação comprometida do Poder Judiciário e do Ministério Público, o apoio da Segurança Pública e o envolvimento da comunidade e da iniciativa particular.

Esperando que este nosso despretensioso trabalho possa ajudá-los na implantação do NAI no maior número de Municípios do Estado de São Paulo, colocamo-nos, desde já, à disposição para contribuirmos naquilo que pudermos ser úteis.

Boa Sorte e uma feliz empreitada!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ANEXOS

 

-         Regimento Interno

-         Relatório 4 meses

 

 

Notas

 

[1] Unidade de Atendimento Provisório, que era unidade de recepção na FEBEM da Imigrantes

[2] Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente

[3] Conselho Tutelar

[4] A instalação da DIJU (Delegacia da Infância e Juventude) em municípios maiores poderá facilitar ainda mais este procedimento.