PAIS E FILHOS POR ADOÇÃO: UM AMOR
CONQUISTADO
Psicóloga.
Em quase todos os tempos,
culturas e civilizações sempre existiram e sempre existirão mães que, por
inúmeras razões, abandonam ou entregam os seus filhos e, pessoas que, por não
conseguirem ter filhos biológicos ou por razões humanitárias, criam, educam,
amam e reconhecem como filhos crianças nascidas de outras mulheres. A
humanidade sempre criou diversos arranjos sociais para o estabelecimento de
outros tipos de dinâmicas familiares que não aquelas embasadas por laços de
sangue. Atualmente a adoção é compreendida como a melhor maneira para proteger
e integrar uma criança em uma família substituta.
Faço pesquisas sobre “abandono e adoção” de crianças no Brasil há mais de
dez anos e continuo surpreendendo-me com o fato de que, apesar da adoção
existir desde os primórdios dos tempos, ainda hoje repete-se
o estereótipo que “filhos adotivos dão problemas, cedo ou tarde” ou “uma mãe
nunca vai gostar do seu filho adotivo como gostaria de um filho da barriga”. Isso tende a ser reforçado pelo sensacionalismo
de casos dramáticos através da mídia e até pela inadvertida generalização de
casos clínicos por parte de muitos psicólogos e psiquiatras, que publicam
artigos e falam em congressos que “a perda dos pais biológicos é irreparável”
e, conseqüentemente, determinante de
todos os problemas.
A “cultura dos laços de sangue” é tão presente que faz com que as pessoas
acreditem que estes laços são os únicos
“fortes” e “duráveis”
por serem “naturais” e “verdadeiros”. Quando se fala comparativamente de
famílias adotivas e não adotivas, geralmente são utilizadas as expressões:
família adotiva versus família
natural; ou filho adotivo versus
filho verdadeiro, denunciando o preconceito por trás das palavras. Isso quer
dizer que a filho adotivo não é nem “natural” nem
“verdadeiro”? As pessoas perceberiam o
ridículo se dissessem que o filho adotivo é artificial e falso... Em disputas
judiciais sobre a guarda de crianças, as mães biológicas sempre têm
preferência, mesmo quando abandonam seu filho e ficam longos anos sem dar a
menor notícia, como acontece freqüentemente. Mesmo quando deixam seu filho em
instituições e internatos durante anos a fio sem sequer fazer-lhe uma visita, o
Ministério Público e o Poder Judiciário entendem que são essas famílias as
detentoras do “pátrio poder”, ou seja, a tutela legal dessa criança.
Geralmente os técnicos desta área (psicólogos, assistentes sociais,
juízes) ressaltam que as pessoas que desejam adotar precisam de muita
preparação, que devem desejar muito um filho, não terem motivações
“inadequadas”, tais como, escolher o sexo do filho ou não elaborar
primeiramente o “luto” de sua própria esterilidade etc., senão “a adoção não
vai dar certo”. Até um certo ponto esses fatores podem contribuir para uma
relação saudável. No entanto, ninguém fala da preparação que pais biológicos
também deveriam ter. Quantas pessoas têm filhos “por acaso”, ou “para salvar um
casamento”, ou fazem inseminação in vitro “para poderem escolher o sexo da criança”? Essas
motivações seriam “adequadas” simplesmente por virem de pais biológicos?
Ao longo desses anos tenho encontrado a
maioria absoluta das famílias adotivas tão “normais” quanto as
biológicas, e algumas até muito mais especiais. Gostaria de afirmar a diferença entre uma família adotiva e uma
biológica é simplesmente a contingência pela qual foram formadas, mas a sua
essência e sua importância são exatamente as mesmas. Os pais e filhos por adoção
não são cidadãos de segunda categoria e devem assumir-se por inteiro, sem culpa
e nem vergonha. Afinal, os “laços de sangue” e o tão falado “instinto materno”
nem sempre garantem uma boa relação.
Afinal, quantas crianças são abandonadas, ou jogadas em terrenos ou latas de
lixo pela suas mães biológicas? E quantos pais maltratam e espancam crianças
“de seu próprio sangue”? Todos nós sabemos que o amor não está condicionado a
laços genéticos; mesmo o amor de pais e filhos, sejam eles biológicos ou
adotivos, é sempre construído sendo que esta conquista pode ser a longo prazo ou pode ser um “amor à primeira vista”. Alguns
depoimentos mostram essa conquista:
·
“nosso amor
foi um amor conquistado e o meu filho nos adotou também” (Paulo, pai por
adoção);
·
“tenho muito orgulho de dizer que as minhas filhas
são filhas do coração”;
·
“me sinto feliz, orgulhosa e enriquecida pelo fato de
ter filhos adotados”;
·
“tenho orgulho em dizer que tenho um filho adotivo e
voto que as pessoas peguem carona no meu orgulho: meu filho também já tem
orgulho em dizer que é adotivo”;
·
“tenho prazer em dizer que minha filha é adotiva; foi
um presente de Deus”;
·
“sinto orgulho
de ser mãe, independente do meu filho ser adotivo; ser mãe é bom demais”;
·
“tenho muitas satisfações, realizações e
gratificações em minha vida mas nenhuma se compara a
satisfação e alegria que meu filho me proporciona” (Beth, mãe por adoção);
·
“eu
os amo muito, muito mesmo, meu pais e meus dois irmãos; eles sempre me
trataram como a princesa da casa. São ótimos, e eu não vivo sem eles” (Roberta,
13 anos, filha por adoção);
·
“sinto amor por meus pais. Fui gerada no coração deles!” (Maria, 15
anos, filha por adoção);
·
“tirando a parte genética completamente, não conseguiria me imaginar com
outros pais nem mesmo os biológicos” (Bruno, 16 anos, filho por adoção).
Recentemente defendi minha Tese de
Doutorado sobre Adoção no Brasil (pela Universidade de São Paulo) e está publicada em livro – PAIS E FILHOS POR
ADOÇÃO NO BRASIL, Editora Juruá (2001). O tema é ainda pouco explorado de
maneira empírica em nosso país e esta pesquisa desmistifica algumas questões
arraigadas pelo imaginário da população.
A pesquisa para a tese foi realizada com 400 pais adotivos, filhos adotivos e filhos biológicos que têm irmãos adotivos, moradores de 17 Estados e 105 cidades diferentes do Brasil. A análise dos resultados mostrou as características da população de famílias adotivas no Brasil, abrangendo suas motivações e sentimentos acerca do processo de adoção e verificou a existência de algumas relações entre as diferentes variáveis descritas de uma forma geral. O quadro seguinte mostra alguns mitos e asa verdades encontradas na pesquisa empírica:
MITOS
|
VERDADES |
Filhos
adotivos sempre têm problemas |
O
filho adotivo não tem dificuldades na escola, nem com a educação ou relacionamento
afetivo |
Pais
adotivos preferem não revelar a adoção para o filho |
Os
pais adotivos contam sobre a adoção, mas não gostam de falar sobre isso com
mais freqüência com seu filho |
Filhos
adotivos sempre pensam na família de origem e querem conhecê-la |
O
filho adotivo não quer ter muitas informações nem conhecer a família
biológica, mas quer conversar com os pais adotivos sobre a adoção |
Escolher
a criança a ser adotada facilita o vínculo afetivo |
A
escolha da criança não determinou maior ou menos qualidade no relacionamento
afetivo |
A
motivação para a adoção é sempre a infertilidade |
63%
dos adotantes adotaram por infertilidade e 37% alegaram motivações altruístas
= ajudar a criança |
A
motivação para adoção é fundamental para o sucesso da adoção e adoções “por
caridade” não” dão certo |
A
motivação (altruísmo ou infertilidade) não determinou melhor relacionamento
afetivo |
Somente
pessoas ricas podem adotar |
Existem
adotantes em todas as faixas econômicas, mas há predomínio de pessoas com
melhor poder aquisitivo e melhor condição sócio-cultural |
Pessoas
mais esclarecidas são menos exigentes e têm menor
preconceito |
São os adotantes de menor poder aquisitivo e nível
sócio-cultural que mais fizeram adoções altruístas e
apresentaram exigências menores em relação à criança. A proporção de pessoas
das religiões espíritas e protestantes é mais alta entre os adotantes do que
na população em geral |
Os
adotantes preferem bebês recém-nascidos |
Sim,
os adotantes adotam bebês até 3 meses (71%), com leve preferência por meninas
de cor branca e saudáveis. |
Adotar
deve ser natural e não é preciso preparação especial |
Os
adotantes e filhos adotivos afirmam que é fundamental ter uma preparação para
a adoção |
Atualmente
as adoções são através do sistema legal |
52%
das adoções são legal – feitas nos Juizados e 48%
são adoções informais – registro da criança como filho biológico |
Atualmente
ninguém mais discrimina os adotivos |
Famílias
por adoção sofrem discriminação e os filhos afirmam que ela vem quase sempre
da família extensa e dos amigos e não de estranhos |
Filhos
adotivos de cor de pele diferente têm mais problemas em relação à
discriminação |
A
cor da pele da criança adotada não trouxe maior discriminação ou tratamento
preconceituoso |
Pais
que têm filhos biológicos e adotivos têm sentimento maior pelos biológicos |
Pais
e filhos biológicos afirmam que o tratamento é igual, mas os filhos adotivos
dizem que, às vezes, os biológicos têm melhor tratamento |
É
melhor a criança adotada não saber de sua adoção |
Um
dos maiores problemas encontrados nas famílias foi quando houve ocorrência de
revelação tardia (após os 6 anos) e/ou inadequada (feita por terceiros) |
É
melhor não falar muito do assunto com o filho adotivos para
não potencializar a importância da origem |
Os
pais devem sentir-se confortáveis, falar disso com o filho adotivo. Filhos
adotivos dizem que o “diálogo” é um fato importante para o sucesso da relação
adotiva. |
Adotantes que adotaram legalmente tem opinião
positiva sobre os Juizados |
Tanto
aqueles que fizeram adoções legais quanto informais, tem
uma imagem negativa dos serviços de adoção dos Juizados |
Filhos
adotivos têm dificuldade em amar seus pais adotivos |
92,5%
dos filhos adotivos afirmaram amar seus pais; os pais adotivos citam o
atributo “ser afetivo” como o principal em seus filhos adotivos |
RESUMO DOS RESULTADOS
1.
Os Adotantes
Apesar de o
método de amostragem utilizado nesta pesquisa não
oferecer garantias de que ela represente a população brasileira de adotantes e
adotados, os dados que utilizamos incluíram famílias adotivas de 17 Estados e
105 cidades brasileiras, o que representa grande diversidade da amostra. Estes
dados mostram padrões e tendências homogêneas acerca do procedimento e
comportamento da família adotiva brasileira.
·
Estado
civil dos adotantes: casados (88,5%);
·
Idade dos
adotantes: a idade média da mãe adotiva no momento da adoção era de 32
anos e do pai adotivo, 37 anos;
·
Cor da pele
dos adotantes: 96,2% das mães e 85,5% dos pais são brancos;
·
Religião: predomina
a religião católica (65,2%); os adotantes protestantes (17,8%) e os espíritas
(1,5%) estão representadas nas família adotivas
pesquisadas em maior número do que na população em geral (10,0% e 1,5%,
respectivamente);
·
Escolaridade
dos pais adotivos: aproximadamente metade das mães adotivas (50,4%) e dos
pais adotivos (48,4%) está cursando ou possui curso superior;
·
Renda
salarial familiar: é bastante variada, encontrando-se famílias cuja
renda é de três salários mínimos mensais até famílias com mais de 100 salários
mínimos mensais. A maioria das famílias adotantes (72,5%) possui renda familiar
variando entre 3 e 30 salários mínimos mensais;
·
Profissão
dos adotantes: as mães adotivas dividem-se em profissões que exigem nível
superior (34,2%), em outras profissões de nível primário ou secundário (30,7%),
não exercerem atividade remunerada fora do lar (27,3%) ou estão aposentadas
(5,0%). Em relação aos pais adotivos, 31,3% deles exercem atividades
profissionais que exigem nível superior; 57,7% dos pais têm uma profissão que
exige nível primário ou secundário e 8,7% estão aposentados. É interessante
observar que 87% das mães adotivas solteiras têm curso superior e profissão
compatível com a escolaridade;
·
Existência
de filhos biológicos: aproximadamente metade (49,2%) das
famílias adotivas desta pesquisa têm filhos biológicos, sendo que 84,2%
dos filhos biológicos foram gerados antes da adoção;
·
Motivo para
não ter filhos biológicos: dentre os adotantes pesquisados que não tinham
filhos biológicos, 79,8% afirmaram que não geraram filhos por questões de
infertilidade ou esterilidade; 8,9% são solteiros; 6,5% afirmaram que optaram
por não ter filhos biológicos e 4,8% relataram “outros motivos”;
·
Número de
filhos adotados: a maioria dos adotantes (54,4%) adotou somente uma
criança e 45,6% adotaram duas ou mais crianças:
·
Idade da
criança adotada: a maioria absoluta dos adotantes
(71,4%) adotaram um bebê com até três meses de idade; 13,8% adotaram
crianças até dois anos de idade (consideradas adoções precoces). Houve,
portanto, somente 1,8% de adoções de crianças com mais de 2 anos de idade
(consideradas adoções tardias);
·
Idade
máxima com que uma criança pode ser adotada: 27,9% dos pais adotivos afirmaram que uma criança
pode ser adotada com qualquer idade, mas sua exigência foi um bebê com até três
meses de idade;
·
Cor da
criança adotada: a maioria absoluta (70,5%) adotou uma criança de cor
branca; 23,8% adotaram uma criança de cor parda; 5,3% adotaram uma criança de
cor negra e 0,4% adotou uma criança de cor amarela. Como a adoção de uma
criança mestiça por adotantes brancos é considerada, no Brasil, como adoção
inter-racial, houve 27,9% de adoções inter-raciais se for considerada a cor da
pele da mãe e, 25,7%, se for considerada a cor da pele do pai; desse total de
adoções inter-raciais, somente 4,1% foram de adotantes brancos e crianças
negras[1];
·
Saúde da
criança adotada: a maioria absoluta de crianças era perfeitamente
saudável (74,9%); os outras possuíam algum problema de
saúde no momento da adoção, mas este era, geralmente, sem gravidade, tal como
sarna, anemia ou desnutrição;
·
Gênero da
criança adotada: a preferência por meninas (56,6%) em relação a
meninos (43,4%) não é estatisticamente significativa;
·
Período de
tempo transcorrido desde a primeira adoção: a
maioria dos adotantes (55%) realizaram a primeira adoção há mais de
cinco anos.
Os
adotantes brasileiros são geralmente casais de cor de pele branca, idade média
de 34 anos, religião católica mas com uma tendência maior de a adoção ocorrer
entre espíritas e protestantes quando se leva em conta a proporção deles na
população; aproximadamente metade das mães e dos pais
adotantes possuem nível superior, o que representa um perfil de
escolaridade muito superior à população; a renda familiar média é de 25
salários mínimos o que também representa um nível econômico superior à
distribuição da população; a maioria absoluta das mães e dos pais adotivos tem
atividade remunerada e exercem profissões que exigem nível de escolaridade
secundário ou superior; as mães pesquisadas apresentaram maior nível de
escolaridade do que os pais. É possível encontrar famílias adotantes em todos
os níveis sociais e de escolaridade, mas como os adotantes com nível de
escolaridade superior e com renda acima de 30 salários mínimos estão super
representados entre os adotantes em relação à população em geral, é possível
concluir que há uma forte tendência para a adoção ocorrer com pessoas de maior
poder aquisitivo e de maior escolaridade[2].
Aproximadamente 51% das famílias não têm filhos biológicos por problemas de
infertilidade e adotam uma ou duas crianças. Os adotantes brasileiros adotaram,
em maioria absoluta, bebês de até três meses de idade, brancos, saudáveis e com
uma leve preferência pelo gênero feminino.
Os
adotantes dizem que adotam por problemas de infertilidade e, por isso, querem um
bebê parecido com sua família, “porque
existe muito preconceito dos outros”, e que “possa ser cuidado desde pequenininho para poder sentir tudo o que tenho
direito, até noites sem dormir”. Também preferem crianças saudáveis porque “não têm habilidade emocional, tempo ou
dinheiro para cuidar de crianças com problemas”. Muitos daqueles que já
possuíam filhos biológicos resolveram adotar por causa de infertilidade
apresentada na segunda gestação ou novo casamento. Os adotantes preferem adotar
crianças mais novas, mas existe um bom número que acha que é possível adotar
crianças com qualquer idade. É preciso trabalhar e preparar a população de
adotantes para essa situação. O padrão de adotantes e de crianças adotadas é
bastante homogêneo e é o que se considera “adoção clássica”, ou seja, a adoção
que visa à satisfação das necessidades dos adultos. Os adotantes simplesmente
cadastraram-se e ficaram esperando o bebê ideal, ou procuraram intermediários
para realizar uma adoção informal.
Idade média de 16 anos, solteiros, sem
filhos biológicos ou adotivos, cursando o segundo grau ou curso superior.
A maioria absoluta gostou de participar
desta pesquisa: “pude mostrar que nem
todo filho adotivo é problemático, isso é papo furado de quem não entende do
assunto”; “meus amigos ficam perguntando e enchendo de como é ser filho adotivo
e nem ligo mais, gostei de falar com vocês”; “tenho orgulho de ter um irmão
adotivo”; “no começo foi difícil a vinda do meu irmão,
fiquei até com ciúmes, mas agora somos irmãos de verdade”.
Embora
nesta amostra aqui utilizada praticamente metade das adoções
tenham sido legais e metade informais, estima-se que na população o
número de adotantes informais seja superior aos adotantes legais, pois muitas
adoções informais são realizadas completamente em segredo e estes adotantes,
por conseqüência, não participam de pesquisas. Além do mais, o grande número de
abandono de bebês em nossos país e a imagem negativa
que a população tem do Poder Judiciário, no que tange às adoções, e a falta de
campanhas para conscientização, também determinam esse tipo de adoção. No
entanto, a tendência é que o número de adoções informais esteja em franca
diminuição por causa da maior facilidade para adoção legal proporcionada pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente. Os adotantes legais e informais
desacreditam e reclamam do trabalho dos Juizados da Infância e da Juventude, e
adoções legais e ilegais são feitas tanto nas capitais quanto nas cidades do
interior, mas os dados mostram que existe preferência dos adotantes legais com
maior poder aquisitivo de realizá-las fora do seu Estado de moradia. Baixo
nível de escolaridade e baixa renda familiar dos adotantes estão correlacionados
com adoções informais.
A maioria absoluta dos adotantes adotam uma criança para resolver um problema de
infertilidade, mas o número de adoções altruístas, mais características de
países desenvolvidos, está em ascendência. Quem tem motivação mais altruísta
acha que não se deve escolher a criança, mas ficar com a criança designada e
apresenta menor tendência de fazer exigências em relação às características
físicas da criança a ser adotada, mas, assim como quem adotou por infertilidade,
tem receio de adotar uma criança que viveu muitos anos
em instituições. A comparação de adotantes de religião católica, protestante e
espírita revela que, ao contrário dos católicos, os protestantes e espíritas
apresentam maior tendência a realizar adoções altruístas. São os adotantes de menor renda familiar que apresentam maior
tendência de realizar uma adoção por solidariedade.
A motivação para a adoção (infertilidade
ou altruísmo) não apresentou relação com a dificuldade no relacionamento afetivo,
nem com a educação do filho adotivo, mas os pais adotivos motivados pelo
altruísmo tendem a ser mais críticos em relação a seus
filhos, atribuindo-lhes maior número de atributos negativos do que os pais cuja
motivação foi a infertilidade.
Os adotantes adotam porque querem exercer
a parentalidade: “era
meu grande sonho ser mãe e agora estou realizada”; “quando descobrimos que não
poderíamos ter filhos, resolvemos adotar, mas antes passamos por tratamentos
dolorosos e acho que deveria ter adotado antes; “casei
novamente e tive dificuldade de ter outro filho, então resolvemos adotar”.
Muitas pessoas fazem uma adoção por motivos altruístas: “deixaram uma criança na porta da minha casa, como não ficar com ela?
Agora estamos completamente apaixonados”; “penso que
mais pessoas deveriam adotar essas crianças que estão nos orfanatos”; “era uma
prima que não podia cuidar daquela criança e nós ficamos com ela”. Os
filhos adotivos acham que seus pais decidiram pela adoção porque não podiam ter
filhos: “meus pais queriam ter uma
menina”; e os filhos biológicos pensam que seus pais fizeram uma adoção por
solidariedade: “eles queriam ajudar uma
criança ter um lar”.
Os filhos adotivos e filhos biológicos que têm irmãos adotivos apresentam
um discurso no qual afirmaram, com maior freqüência, que desejam adotar uma
criança, mas ficaram em dúvida em relação ao desejo de gerar filhos naturais.
Essa pode ser uma fala socialmente correta, pois contrasta com a opinião dos
filhos adotivos, que vêem a adoção, em primeiro lugar, como uma solução para a
infertilidade. Os adotantes estão divididos em relação à importância de se
escolher a criança a ser adotada, mas a maioria afirmou que não fez exigências.
Aqueles que determinaram as características do adotado preferiram um bebê,
branco e saudável. No entanto, não foi a escolha da
criança que determinou maior ou menor dificuldade no relacionamento afetivo. Os
filhos adotivos e biológicos não pretendem fazer exigências, caso decidam
adotar. Filhos adotivos insatisfeitos não têm intenção de adotar uma criança,
mas aqueles que pretendem adotar justificam a adoção quando houver
infertilidade, reproduzindo o modelo de seus pais.
A história de adoção afeta a probabilidade de adotarem uma criança:
tantos os filhos adotivos quanto os filhos biológicos de famílias mistas falam
mais freqüentemente de adotar um filho do que de procriar: “eu gostaria de adotar uma criança que não tivesse família, como
aconteceu comigo” (Filho adotivo); “penso
que a adoção deve ser parte do planejamento familiar” (filho biológico). A
questão da escolha é subjetiva e não se sabe exatamente o se limite: “nós não escolhemos nada, só a idade e a cor
da pele”; “eu acho que a gente deveria poder ir até o orfanato e escolher a
criança que tiver mais empatia”; “eu queria uma menina loira como eu e ganhei
uma mulata que eu adoro”.
A maioria dos adotantes afirmaram que não
tem medo que características hereditárias possam afetar o comportamento dos
filhos adotivos, mas o número de adotantes que concordaram que “não adotariam um criança que fosse filho de
marginais porque isso poderia passar para a personalidade do filho”, já é
suficiente para se afirmar que é preciso preparar os adotantes e esclarecer
noções de hereditariedade e de comportamento, pois, além de tudo, acham que se
deve escolher a criança para minimizar esse aspecto. A noção de que a adoção
inter-racial é mais fácil do que a adoção de uma criança com
deficiência prevaleceu, mas o discurso, especialmente dos pais adotivos,
não condiz com sua prática. Por outro lado, os filhos adotivos que afirmaram
ser possível uma adoção inter-racial têm pele parda ou negra. Embora os
adotantes tenham afirmado que não teriam medo de uma adoção inter-racial,
novamente o discurso não condiz com o tipo de adoção realizada. Todos da
família adotiva acreditam que uma criança pode se recuperar depois da adoção,
mesmo tendo sofrido em sua história anterior, mas os filhos adotivos, mais freqüentemente,
do que pais e irmãos, pensam que existem aspectos que nunca serão superados
mesmo com uma adoção feliz. Embora tanto os filhos adotivos quanto biológicos
afirmem que o tratamento recebido foi igual, existe maior tendência dos filhos
adotivos de sentirem-se negligenciados em favor dos filhos biológicos.
O discurso dos adotantes não condiz com sua prática: “claro que é possível adotar uma criança com qualquer idade”, disse uma mãe
que adotou um bebê de um mês e que fez tal exigência. Na verdade, os adotantes
apresentaram mais um discurso socialmente correto, lembrando o direito de todas
as crianças de terem uma família. No entanto, é melhor ter um discurso correto
do que nem apresentar discurso nem comportamento, ou seja, é possível supor que
os participantes estariam dispostos a adotar crianças mais velhas, de cor, ou
mesmo com problemas de saúde, caso eles tivessem sido expostos a estas
situações, ouvido depoimentos, participado de reuniões de preparação e
conscientização, como revela uma adotante: “nós
queríamos uma menina recém-nascida. Já tínhamos filhos biológicos. Depois de
freqüentarmos um Grupo de Apoio à Adoção e visto outras histórias, adotamos
três irmãos, com 2, 3 e 6 anos de idade. Somos inseparáveis e felizes!” O
receio, tanto da “voz do sangue” como das seqüelas da institucionalização,
existe. Este receio da institucionalização não é de todo infundado, como
mostram diversos estudos sobre o tema, desde o primeiro estudo de Burlingham e Freud (1942) com crianças órfãs
institucionalizadas. Mas, alguns pensamentos sobre a possibilidade de um
comportamento marginal dos pais passar para os filhos não tem qualquer
fundamento e precisa ser cuidadosamente esclarecido: filho de ladrão não terá
genes que determinem o comportamento de roubo, furto ou assalto. Não existem
estudos nacionais sobre o desenvolvimento longitudinal de crianças adotivas, e
a comparação com estudos internacionais precisa ser sempre cuidadosa, porque a
realidade da adoção é bastante diferenciada em diferentes países e culturas. Thorburn (1994) realizou um estudo longitudinal durante 10
anos com crianças adotadas e encontrou uma taxa de rompimento de 10% para
aquelas crianças que foram colocadas antes dos 4 anos e de 40% para aquelas que
tinham mais de 8 anos.
Pais adotivos enfatizam mais atributos pessoais e subjetivos como
condições essenciais para pessoas que desejam adotar uma criança e para o
sucesso da relação, enquanto filhos adotivos falam da necessidade de condições
financeiras, responsabilidade e diálogo. Os pais, filhos adotivos e biológicos
admitem a necessidade de uma preparação para quem deseja ter um filho, ao
contrário do que ocorreu em sua história de vida; os filhos adotivos enfatizam
que deveria haver campanhas incentivando mais pessoas a adotar uma criança, mas
não sabem avaliar o trabalho dos Juizados da Infância e da Juventude, enquanto
seus pais avaliam negativamente este trabalho.
Existem algumas diferenças interessantes entre o discurso de pais e de
filhos adotivos no que concerne à avaliação de pessoas aptas para adotar e de
fatores que contribuem para o êxito de uma relação: “uma pessoa deve ter muito equilíbrio em sua vida para poder adotar uma
criança”, dizem os pais; “é preciso
ter boas condições para educar e criar uma criança”, dizem os filhos. No
entanto, para o sucesso da relação, todos falam em “amor” e poucos falam de
construção da relação, de ações concretas, como contar a verdade ao filho,
aceitar as diferenças ou os outros, e, contraditoriamente, falam que uma
preparação é importante, mas não passaram por nenhum tipo de preparação prévia.
Os adotantes que afirmaram ter feito alguma
preparação, o fizeram com amigos, vizinhos ou particularmente: “conversei muito com meus amigos e com meu
médico”; “meditei muito sobre o que eu queria fazer”. Na verdade, alguns
tipos de conversas com pessoas não especializadas podem até acentuar e
perpetuar mitos e preconceitos: “meu
médico aconselhou uma adoção porque, desta forma, seria mais fácil eu conseguir
engravidar”, afirmaram algumas mães; “muitas
pessoas me falaram bobagens e casos catastróficos e diziam que eu só teria
problemas com a adoção”, ressaltou um pai adotivo; “no começo eu achava que uma mulher sozinha não pudesse adotar porque
todos falavam isso, e agora sou mãe solteira de minha filha adotiva”.
O que é possível perceber é que a preparação para adotantes é um tema indispensável até porque muitos já fizeram suas próprias investigações que nem sempre trazem resultados positivos. Os adotantes que ouviram depoimentos de outras pessoas que já passaram pela adoção conseguem entender melhor todo o processo e compreender suas próprias motivações e expectativas. Se essa preparação for realizada pelos técnicos dos serviço de adoção dos Juizados, ela também pode servir como uma etapa inicial de conhecimento do candidato.
8.
Desenvolvimento, educação e relacionamento dos filhos adotivos
Segundo as respostas mais freqüentes apresentadas nesta pesquisa, os pais
adotivos, seus companheiros e possíveis filhos biológicos têm ótimo
relacionamento com o filho adotivo, estão satisfeitos com o desempenho escolar
e com os atributos físicos e de personalidade de seus filhos; não tiveram
dificuldades na educação nem no relacionamento afetivo, e aqueles que as
tiveram não as relacionam com a adoção, argumentando, inclusive, que os
problemas foram equivalentes entre filhos adotivos e biológicos; têm uma visão
otimista da relação; estão satisfeitos com o rumo de sua vida e nada fariam
para alterá-la e aconselham outras pessoas a adotarem uma criança.
Muitos pais assumem que não estavam absolutamente preparados para receber
uma criança adotiva em sua família, especialmente quando a criança não era mais
um bebê, e o relato de dificuldades na educação trouxe junto
dificuldades no relacionamento afetivo: “fiquei assustada e com medo de não gostar tanto da minha filha adotiva
quanto do meu filho da barriga” (mãe que adotou uma menina de 1 ano); “ele já veio com hábitos da instituição, não
sabia comer direitinho...” (mãe que adotou um menino de 3 anos); “fiquei com medo de que herdasse
comportamentos de sua família” (mãe que adotou uma menina de 2 anos).
Porém, a maioria dos adotantes, especialmente aqueles com problemas de
infertilidade, realizaram um sonho e estão satisfeitos e têm uma visão ótima do
futuro: “meu sonho era ser mãe e estou
realizada”; “não consigo pensar em uma alegria maior no mundo do que meu filho
adotivo”; “estou feliz por ter ajudado uma criança a viver em uma família”;
“encontrei minha filha em um terreno ao lado da minha casa, mas ela é a minha
alegria, o meu tudo”; “com meu segundo filho adotivo, tudo foi mais fácil”.
9.
Preconceito e discriminação social pela família adotiva
Os filhos
adotivos consideram que as pessoas em geral discriminam os adotados, mas não
sabem por que isso ocorre e, contraditoriamente, a maioria afirmou que eles
próprios nunca sofreram atos de discriminação, mas para aqueles que a sofreram,
ela veio não de pessoas desconhecidas, mas da família e dos amigos, revelando o
tamanho do preconceito social em relação às pessoas adotadas, sendo que a cor
da pele do filho adotivo não tem relação com o fato de ele ser mais ou menos
discriminado. Um quarto dos filhos adotivos sente vergonha com sua situação e
este fator não está relacionado com a sua cor da pele: de 10 crianças negras
adotadas por pais pardos ou brancos, somente uma afirmou sentir vergonha de ser
filho adotivo. A maioria dos filhos adotivos estão
satisfeitos com a sua aparência, sejam eles parecidos ou não com a família
adotiva. Um fator interessante que trouxe risco na educação do filho adotivo,
refere-se ao tratamento discriminativo de outras pessoas da família ou não,
pois os filhos adotivos que mais sofreram preconceitos, foram aqueles cujos
pais reportaram dificuldades em sua educação. O inferno, realmente, são os
outros, como disse ironicamente Sartre (1947), e é preciso uma ampla
conscientização da adoção como uma contingência legítima de constituição ou
aumento de uma família.
De maneira
geral, os pais adotivos e os filhos biológicos sentem-se mais orgulhosos com a
adoção do que o filho adotivo, que não se referiu a este
orgulho: “eu tenho orgulho de
dizer que tenho um irmão adotivo”; “nunca tenho vergonha de falar da adoção,
pelo contrário, meu filho adotivo é o orgulho da minha vida”. Boa parte dos
filhos adotivos ressente-se das discriminações: “a maioria das pessoas trata o adotivo de forma diferente, nem sei por
que, acho que por falta de cultura”; “tem
um tio meu que fala que eu não sou da família porque não tenho o mesmo sangue”;
“os amigos ficam perguntando e eu me sinto incomodado”; “procuro não falar
muito que sou adotado, as pessoas olham pra você de um jeito diferente”.
Poucos filhos adotivos falam que gostariam de ser mais parecidos com sua
família adotiva, mas aqueles que são parecidos fisicamente gostam disso: “as pessoas até falam que eu pareço muito
com o meu pai e eu gosto”; “somos diferentes em tudo, até na cor da pele, mas
amor não tem padrão de cores, tem?”; “eu acharia chato ser muito diferente
deles”; “eu gostaria de ser mais parecida, e ter olhos verdes como a minha mãe”.
10. A revelação
da adoção
Contar para o filho “desde sempre” é a
melhor maneira para que ele encare a situação como boa e que isso seja natural
em sua vida. Contar tardiamente trouxe reações negativas e o sentir vergonha
está relacionado com a idade em que a criança soube de sua adoção, ou seja, a
revelação tardia trouxe maior sentimento de vergonha, pois a criança passa a
entender que, se foi escondido, não deveria ser um fato muito bom. Geralmente é
a mãe que tomou a iniciativa quando seria um assunto que deveria ter sido
apresentado pelo casal.
Todos estão de acordo de que contar a verdade sobre a adoção é fator
fundamental para a construção de um relacionamento verdadeiro na família por
adoção. No entanto, os pais e os filhos percebem a revelação como importante
porque saber “mais tarde” pode ser pior, ou seja, não é pelo direito da
criança, pela importância na formação de sua identidade, mas porque isso pode
ser uma comportamento de esquiva de uma situação
aversiva no futuro. Assim, em muitas vezes a revelação está sendo adiada e,
conseqüentemente, ocorre de maneira inadequada, feita por terceiros e/ou
tardiamente: “fiquei sabendo por um
vizinho, quando tinha 13 anos e foi horrível”; “fiquei chocada quando soube, eu
não esperava uma mentira dessas”; “ficamos com medo de contar e ela nos
rejeitar”; “eu queria passar uma borracha em seu passado”.
Os filhos adotivos e biológicos concordam
que conhecer a história de origem do adotado é importante, No entanto, os pais
adotivos (especialmente quando estes têm somente filhos adotivos e não
biológicos) têm muitas dúvidas sobre a importância dessa história e isso pode
ser um ambiente propício para criar um clima de ambivalência e insegurança em
algumas famílias adotivas. Os filhos querem saber um pouco mais sobre suas
histórias, embora todos os detalhes não sejam importantes, mas querem conversar
mais com seus pais sobre isso, e os pais têm receio de que essas conversas
possam influenciar o comportamento de seu filho. Com isso, os filhos afirmam
que não têm muito interesse nas próprias histórias, mas muitos não conversam
simplesmente para não magoar seus pais ou deixaram a questão sem resposta,
mostrando dificuldade em respondê-la. Os dados mostram que as
informações sobre a família de origem do filho adotivo resume-se a uma
mãe sozinha e financeiramente carente, mas estes filhos imaginam, de forma mais
romântica, um casal que os abandonou por amor, por falta de condições
financeiras, assim como afirma Costa (1988, p. 212): “o estigma de mãe solteira
e a composição da família da doadora explicariam, no caso, a doação. A decisão
também estaria assentada no reconhecimento de que, sem condições econômicas e nem
morais para ficar com seu filho (temendo, como teme, a reação da família que
desconhece a sua gravidez), essa mulher termina por entregar o fruto de seu
‘deslize’ (ou ‘pecado’) para que uma ‘família boa’ (de classe média, abastada)
possa criá-lo. A doação se configura então como um ato de amor da mãe”.
Os pais adotivos gostariam de esquecer que existe uma outra origem para
seus filhos adotivos: para eles é doloroso falar disso, especialmente quando o
motivo foi infertilidade, porque a todo momento o filho
adotivo lhes lembra da sua impossibilidade de gerar um filho do “próprio
sangue” e até mostram a sua raiva com essa origem e recusam-se a chamar de
“família” ou mesmo de “mãe”: “eu não acho
que ele teve outra mãe, mas somente uma barriga que o rejeitou”; “família é a
nossa, e a gente não precisa ficar falando de outra, que nem acho que é
família”; “eu tenho raiva em pensar que a minha filha foi abandonada”. Os
filhos sentem a ambivalência dos pais sobre o tema e sentem-se inseguros: “eu queria saber algumas coisas, mas tenho
medo de magoar meus pais, porque sou feliz com eles”; “não quero deixar meus
pais adotivos tristes”.
Ao contrário do que supõe o senso comum, de que “o filho adotivo tem uma fixação em sua família biológica”, a maioria absoluta dos filhos adotivos não têm informações
sobre sua família de origem, não quer conhecê-la e nem acha importante ter
informações. A maioria dos filhos adotivos afirmaram
que não sentem nada por sua família de origem e se pudessem falar alguma coisa
para ela, falariam que estão felizes com sua família adotiva ou perguntariam o
motivo do abandono.
A maioria absoluta não tem raiva de sua
família de origem, mesmo porque já a idealizou como uma família pobre que os
abandonou por falta de condições financeiras, mais do que por falta de amor: “acho que eles eram muito pobres, mas eu
diria que estou bem demais”; “eu agradecia a eles por terem me dado a vida”;
“eu nem penso neles, eles me rejeitaram e estou super feliz aqui”; “a minha mãe
verdadeira e meu pai verdadeiro são esses que me criaram”; “não tenho outra
família além dessa que eu adoro”.
13. Sentimentos e
dinâmica familiar atual da família adotiva
Os filhos adotivos sentem-se parecidos com sua família adotiva, tanto fisicamente
quanto no temperamento, acham que a mudança de sua
vida foi para melhor depois da adoção, a maioria não se sentiu tratada de forma
diferente que outros filho biológicos de seus pais, têm bom relacionamento com
a família adotiva extensa, apesar de haver relatos de dificuldades com parentes
e irmãos que são filhos biológicos dos pais adotivos. Os filhos adotivos
imaginam-se em situação miserável se não tivessem sido adotados, relacionam a
adoção com “amor” e amam seus pais adotivos e os percebem como seus pais
“verdadeiros”.
A maioria absoluta dos filhos adotivos estão
completamente satisfeitos com sua família adotiva: “eu adoro meus pais, mais do
que tudo”; “sinto amor mesmo, nossa, não me vejo sem eles”; “eles são tudo para
mim”; “a gente nem se lembra da adoção”; “não me sinto ‘adotiva’, me sinto
filha de verdade e nem penso muito nisso”; “foi bom responder esse
questionário, para mostrar que filho adotivo não é todo problemático”; “as
pessoas discriminam e nem sabem do que estão falando; amor a gente constrói e
não vem pelo sangue”.
É possível afirmar que as famílias que adotam crianças no Brasil fazem-no
para resolver problemas pessoais de esterilidade ou infertilidade; não são
adequadamente preparadas para este papel pelos Serviços de Adoção; ressentem-se
dos preconceitos existentes sobre adoção, mas podem ser tão felizes quanto as
famílias com descendentes biológicos. Se ainda existem inúmeros problemas com a
adoção no Brasil, isso indica que temos muito ainda que estudar e que,
especialmente nós, psicólogos, devemos traçar estratégias de intervenção,
porque não tenho dúvida de que mesmo a experiência de problemas,
discriminações, preconceitos, lutas, encontros e desencontros com sua história
de origem, trazem menos dor e sofrimento do que o desamparo de uma criança
abandonada em uma instituição.
* Psicóloga, Professora da UFPR
(graduação e pós-graduação) e
Coordenadora do Projeto Criança, Mestre e Doutora em Psicologia pela USP;
membro da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB-PR.
lidiaw@uol.com.br http://sites.uol.com.br/lidiaw
.
[1] Entre
os adotantes pesquisados houve somente 8,1% de casamentos inter-raciais, enquanto
a média da população brasileira é de 22,6% (dados do IBGE, citados no Jornal
Folha de São Paulo de 23/10/00).
[2] Aproximadamente 8% da população brasileira possui
nível de escolaridade superior de acordo com o IBGE.