O PAPEL DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA POLÍTICA DE
ATENDIMENTO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE[1]
Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo.
01. Introdução
Pensadores contemporâneos
como T. H. MARSHAL e NORBERTO BOBBIO revelam que, na evolução dos direitos dos
homens, encontramos três grupos distintos: os direitos civis (correspondentes às liberdades individuais); direitos políticos (referentes ao
exercício do poder, com mecanismo de participação social e política) e direitos sociais (regidos pelo signo da igualdade e
visando o bem-estar social).
Estes
direitos garantir-se-iam, num primeiro momento, da seguinte forma: os tribunais
para a garantia dos direitos civis; as assembléias, câmaras e congressos locais
e nacionais como salvaguardas dos direitos políticos, e o conjunto de ações
públicas com fins sociais das diversas instituições para garantia dos direitos
sociais. Na Inglaterra, lembra MARSHAL, tais direitos consolidaram-se de forma
escalonada, ou seja, os direitos civis no século XVIII, os políticos no século
XIX e os sociais no século XX.
No Brasil,
a afirmação de tais direitos ocorreu tardiamente (a partir do século XIX) e de
forma diversa, ou seja, estabeleceram-se direitos políticos, alguns direitos
sociais (principalmente na era Vargas) e os direitos civis, com dificuldades
naturais, por motivo da mutação da forma de governo e das políticas
desenvolvidas.
Neste
cenário tímido de desenvolvimento da cidadania ocorrido no Brasil, difícil se
torna conceber o atendimento da comunidade pelo poder público como um exercício
de direito, como uma garantia da concretização de políticas públicas. Como
afirma MEKSENAS:
“A postura da população frente ao
poder público se reveste das atitudes, permeadas pela submissão, de quem se vê
recebendo um favor” (2002, p. 59).
No entanto,
este cenário parece estar mudando e, com ele, a situação das crianças e dos
adolescentes. Com efeito, a partir da Constituição Federal de 1988, o novo
paradigma absorvido pelos legisladores constituintes proporcionou outra
roupagem à questão dos direitos sociais[3], incluindo
a proteção à infância, com caráter de prioridade absoluta[4].
Contemplar
a infância como direito social implica conceber obrigações de caráter positivo
por parte do Poder Público, com o objetivo de proporcionar o bem-estar e a
justiça social, a fim de assegurar, a esta parcela da comunidade, uma
existência digna, com a diminuição das desigualdades, possibilitando o desenvolvimento
pessoal e social.
Nesse
particular, assevera CANOTILHO que os direitos sociais “abrangem um conjunto de tarefas conformadoras,
tendentes a assegurar uma verdadeira ‘dignidade social’ ao cidadão e uma
igualdade real” (1999:336).
De outra
banda, proporcionou a atual Constituição Federal a consolidação do Instituto do
Ministério Público, que se apresenta como o guardião dos direitos fundamentais
assegurados ao homem, defensor dos ideais democráticos e dos interesses
sociais.
Este novo perfil constitucional, envolvendo os direitos sociais (proteção
à infância) e o Ministério Público, possibilita uma busca pelo nivelamento de
oportunidades e de direitos, que passa necessariamente pela questão das
políticas públicas para o setor.
Nesse
sentido, a tríade: Criança e Adolescente – Ministério Público – Políticas
Públicas, corresponde a uma nova dimensão no envolvimento dos direitos do
homem, que busca afastar o caráter assistencialista, de submissão e de favor
que sempre impregnou o tema. Na análise de cada tópico constata-se esta
realidade.
02. Políticas públicas
Uma vez
compreendido que a questão da proteção à infância resume-se a um direito
social, o problema que se vislumbra a seguir é como garantir ou tornar efetivo
esse direito.
O tema é
analisado com muita propriedade por BOBBIO, que assim se manifesta em relação
aos direitos sociais:
O problema que temos, diante de nós, não é filosófico mas
jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata
de saber quais e quantos são esses direitos, qual é a sua natureza e seu
fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas
sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das
solenes declarações, eles sejam continuamente violados.
Descendo do plano ideal ao plano real, uma coisa é falar dos
direitos do homem, direitos sempre novos e cada vez mais extensos, e
justificá-los com argumentos convincentes; outra coisa é garantir-lhes uma
proteção efetiva. Sobre isso, é oportuna a seguinte consideração: à medida que
as pretensões aumentam, a satisfação delas torna-se cada vez mais difícil. Os
direitos sociais, como se sabe, são mais difíceis de proteger do que os
direitos de liberdade
(1992, p. 25 e 63).
No plano
real, uma das formas de se garantir a proteção à infância é através de
políticas públicas, envolvendo ações do Estado, bem como da família e da
sociedade em geral.
A infância
foi devidamente tratada pelo legislador constitucional (art. 226/230), bem como
infraconstitucional (Lei n. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente).
Logo, verifica-se que o problema relativo à criança e ao adolescente não é
legislativo e sim da execução das normas traçadas pela legislação. Esta
realidade é bem diferente da vivida em outros tempos como, por exemplo, na
época pós-1964, quando as políticas públicas não tinham uma relação com o
direito. Hoje, existe a garantia legal, consubstanciada no Estatuto da Criança
e do Adolescente, mas a realidade que se apresenta é a de “um
país real, vivendo à margem de um país legal” (MEKSENAS, 2002, p.
66).
Nesse caso,
a questão centra-se na administração pública e na participação da comunidade
com a execução de políticas públicas que visem a dar o integral cumprimento ao
que foi estabelecido no capítulo da ordem social e na legislação menorista.
Como
esclarece FRISCHEISEN, esta legislação:
“Orienta a administração na
implementação das políticas públicas necessárias ao efetivo exercício dos
direitos sociais, fixando pontos que não podem ser descumpridos e tampouco
modificados, sob pena de inconstitucionalidade ou ilegalidade, resguardando o
cidadão, oferecendo-lhe garantia quanto à omissão do Estado” (2000, p.
37).
As
políticas públicas, nesse sentido, devem ser compreendidas como as ações que
buscam dar executoriedade à lei, ou seja, “aquelas ações voltadas para a concretização
da ordem social, que visam à realização dos objetivos da República, a partir da
existência de leis decorrentes dos ditames constitucionais” (FRISCHEISEN.
2000, pág. 80).
A propósito,
pontifica VERONESE:
“Política pública não é sinônimo de assistencialismo e,
muito menos, de paternalismo, antes é conjunto de ações, formando uma rede
complexa, endereçada sobre precisas questões de relevância social. São ações, enfim,
que objetivam a promoção da cidadania” (1999, pág. 193).
Com este
referencial, ou seja, com ações conjuntas que possibilitem o cumprimento do que
estabelecem a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente, é
possível fazer uma análise das políticas públicas de atendimento à criança e ao
adolescente, principalmente as políticas sociais básicas referentes à educação,
saúde, trabalho, esporte, habitação, cultura e lazer. Tais políticas devem:
a) buscar a
efetivação da cidadania das crianças e dos adolescentes: o que implica
reconhecer que não são benesses ou favores políticos. Há necessidade de superar
os papéis tradicionais desempenhados pelas crianças, adolescentes e seus
responsáveis de “meros clientes, consumidores ou pacientes” dessas políticas
públicas, concebendo-os como sujeitos de direitos.
b) a sua
implantação decorre da nova sistemática jurídica: o que requer uma vontade
política do administrador em fazer cumprir o que estabelece a lei. A
discricionariedade administrativa direciona-se pela prioridade que se deve dar
à criança e ao adolescente. O administrador vincula-se ao que estabelecem a
Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente. O discurso
econômico não pode suplantar os direitos fundamentais da população
infanto-juvenil.
c) as
políticas públicas desse setor devem estar nas mãos de pessoas éticas e
comprometidas com a causa menorista.
Nem sempre
se encontra este referencial nas políticas destinadas ao atendimento da criança
e do adolescente, o que contribui para a permanência e continuidade do que se
pode designar de “crise das políticas públicas”.
Esta crise
gera um círculo vicioso, onde quem mais perde são a criança e o adolescente, já
que, na falta de atendimento adequado, permanecem em situação de risco social
ou pessoal. Contribuem para esta crise, entre outros fatores, os seguintes:
a) falta de
vontade política do administrador;
b) a
fragilidade dos mecanismos de garantia de continuidade da política de
atendimento à criança e ao adolescente;
c) a
alocação de recursos em programas que seguem o interesse do administrador em
detrimento das políticas pré-estabelecidas por Conselhos para a criança e ao
adolescente;
d)
despreparo dos responsáveis, que deveriam ditar as políticas públicas no município;
e) falta de
compromisso com a causa por parte de membros do Judiciário, do Ministério
Público, do Conselho de Direitos e do Tutelar.
Reverter
este quadro é de rigor, e isso passa, em parte, pelo papel do Ministério
Público que será adiante analisado.
03. Ministério público
O
Ministério Público brasileiro foi integralmente reformulado a partir da atual
Constituição Federal que, no artigo 127, definiu-o como “instituição permanente,
essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis”.
Este perfil
constitucional apresenta o Ministério Público como “fiscal da lei e defensor
dos interesses sociais”, com o dever de zelar para a concretização da ordem
social, da cidadania e da dignidade da pessoa humana, que são fundamentos do
Estado Democrático de Direito.
Na área da
infância e da juventude, a atuação Ministerial está traçada nos artigos 200 a
205 do Estatuto da Criança e do Adolescente, podendo ocorrer como “parte
processual”, ou “fiscal da lei”, mas, nas duas hipóteses, como defensor
intransigente dos direitos da criança e do adolescente. E, neste caso, ciente
de que o ECA foi estrategicamente, estruturado como
meio para a materialização das políticas públicas, não se pode olvidar que a
inserção do Ministério Público nesta legislação ocorreu de modo consciente,
como forma de garantia de sua concretização. O Promotor de Justiça deixou de
ser um mero fiscalizador da aplicabilidade da lei para atuar como um verdadeiro
agente político. Deixou de ser o defensor do Estado para assumir a defesa das
crianças e dos adolescentes.
Este novo
papel do Ministério Público tem proporcionado uma significativa mudança no
Poder Judiciário, diante do instrumental jurídico colocado à sua disposição.
Com efeito, ações judiciais de natureza social, coletiva e difusa passaram a
integrar a rotina dos julgamentos de nossos tribunais, com a “análise de
questões que nunca haviam sido enfrentadas”. Esta nova sistemática foi
denominada por Fábio Konder Comparado como a “judicialização das políticas públicas que leva os
membros do Judiciário a não só dizer o direito tido como justo, mas também a preencher
determinados conceitos a partir da interpretação constitucional” (FRISCHEISEN.
2000, p. 18).
Nesta nova
sistemática institucional, especificamente em relação à criança e ao
adolescente, o Ministério Público passou a exercer dois papéis distintos:
a)
usufrutuário da política pública;
b)
garantidor da formulação e execução da política pública.
A primeira
situação é detectada na área da infância, quando da aplicação das medidas de
proteção previstas no ECA. É sabido que o Promotor de
Justiça, ao conceder remissão ao adolescente infrator, pode, de forma
cumulativa, aplicar-lhe medida de proteção. Esta, muitas vezes, traduz-se em
ações de política pública, como programas de auxílio à família, à criança e ao
adolescente (101, IV), ou de auxílio, orientação e tratamento de alcoólatras e
toxicômanos (101, VI).
Assim, com
o emprego desse mecanismo estatutário, o Promotor de Justiça acaba por utilizar
as políticas públicas existentes no município em sua atuação prática.
Por outro
lado, no caso de omissão, inexistência, ou deficiência de políticas públicas,
pode o Ministério Público, via ação judicial, ou extrajudicial, intervir para a
sua concretização. Judicialmente, através das ações civis públicas e,
extrajudicialmente, mediante o inquérito civil, procedimento preparatório de
inquérito civil (com o compromisso de ajustamento) e recomendações. Pode ainda,
utilizando-se da estrutura da Promotoria, auxiliar indiretamente aqueles órgãos
que também exercem a função de formuladores de política pública, através de
fornecimento de informações, ou dados relativos a questão tratada.
De uma
forma ou de outra, as políticas públicas e atuação do Promotor de Justiça,
principalmente na área de infância, guardam uma relação tão estreita que fazem
com que os direitos sociais e fundamentais previstos na legislação se tornem
realidade.
04. A questão das políticas públicas na prática
O Ministério Público, ciente de seu papel e
procurando cumprir o que determina a legislação, tem buscado efetivar as
políticas públicas necessárias às crianças e aos adolescentes, com ações
judiciais ou extrajudiciais, como já afirmado.
4.1. – Atuação judicial
No que diz
respeito às ações judiciais, trata-se de inovação legislativa, via ação civil pública
(de caráter individual inclusive) que nem sempre encontra ressonância nos
tribunais, diante do caráter inovador e de ruptura de um sistema.
Com efeito,
até o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente, a atuação judicial do
Ministério Público mostrava-se limitadíssima, apresentando um caráter
individual. O novo modelo rompe com este sistema, admitindo todo tipo de ação
judicial para a proteção dos direitos das crianças e dos adolescentes, em
caráter individual, ou coletivo, o que representa algo significativo e
inovador.
Este
sistema altera a sistemática tradicional, rompendo com o sistema quase absoluto
da independência dos Poderes, vez que permite ao Judiciário, com base na lei,
ditar os caminhos a serem seguidos quanto às políticas envolvendo criança e
adolescentes. Mais uma vez, vale lembrar FRISCHEISEN:
“A interpretação constitucional
necessária ao julgamento de algumas destas ações civis públicas leva ao
enfrentamento dos limites da discricionariedade do administrador e do campo
decisório do Juiz, em um processo que tem sido denominado de politização do
Judiciário” (2000, p.18).
São
exemplos desta situação as seguintes decisões:
4.1.A -
MENOR – Creche – Garantia de vaga a criança em unidade da rede
municipal. Obrigação do Poder Público. Concessão de liminar e procedência do
pedido que não configura indevida ingerência do Poder Judiciário em poder
discricionário do Executivo. Direito fundamental que deve ser preservado.
Inteligência dos artigos 208, inciso IV e 211, § 2º da Constituição da
República e 54, inciso IV e 208, “caput”, e inciso 213, parágrafo único, do
Estatuto da Criança e do Adolescente. Ação Civil Pública procedente. Sentença
confirmada. – LEX- JTJ 252/174. Voto vencido.
Nesta
decisão ocorreu voto vencido, no qual o Desembargador defendia a improcedência
da ação, vez que é “inviável que obrigue o Poder Judiciário à prática, pelo
Poder executivo municipal, de ato próprio de sua atuação e administração”.
Defende a discricionariedade administrativa referente à conveniência e oportunidade
do Município realizar os atos físicos de administração (obras e contratações,
por exemplo).
4.1.B – MUNICÍPIO – Fornecimento de
medicamentos. Menor necessitado. Incapacidade financeira demonstrada. Sistema
Único de Saúde – Responsabilidade concorrente entre União, Estados e
Municípios, sem estabelecimento de ordem de preferência – Artigos 18, inciso I,
da lei Federal nº 8.080/90, 196 da Constituição da República, 11, “caput” e §
2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Fornecimento pela Municipalidade
determinado. Ação Civil Pública procedente. Sentença confirmada. LEX – JTJ
252/178.
Em posição
contrária, não admitindo a intervenção judicial nas ações do Poder Executivo,
tolhendo desta forma o encaminhamento de políticas públicas na área da infância
e da Juventude, podem ser citados:
4.1.C – TRANSPORTE ESCOLAR – CATRACA
LIVRE. CONSTRUÇÃO DE CRECHE EM MONTALVÃO.
Em duas ações civis públicas promovidas pela Promotoria de Justiça da
Infância e da Juventude de Presidente Prudente foi prolatada decisão que não
acolhia a pretensão ministerial, tendo como fundamento principal a independência dos Poderes e a discricionariedade do poder
público quanto a esta questão, ou seja, a questão cinge-se ao juízo da
conveniência e oportunidade do administrador público.
É certo
que, nas três ações, foram apresentados recursos, estando os autos no Tribunal
de Justiça para análise do inconformismo.
4.1.D – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Obrigação de
fazer. Criação de programa de auxílio, orientação e tratamento de alcoólatras e
toxicômanos – Imposição à municipalidade - Inadmissibilidade – Ato físico da
Administração sujeito à sua discricionariedade – Impossibilidade de ingerência
do Poder Judiciário – Matéria que envolve questões de orçamento e
disponibilidade do erário público com dotação específica. LEX – 251/364.
Trata-se de
ação judicial proposta pela Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude de
Santos, com fundamento no artigo 101, VI do ECA, para
implantação de programa para atendimento de crianças e adolescentes viciados no
uso de entorpecentes e inclusão de previsão orçamentária respectiva, com adoção
de providências administrativas cabíveis. A ação foi julgada IMPROCEDENTE em
primeira instância. No Tribunal, em recurso de apelação a referida decisão foi
reformada, tendo como fundamentos a necessidade de se observar a resolução baixada pelo Conselho Municipal de Direitos da
Criança e do Adolescente e a obrigação do Poder Público em dar cumprimento às
normas programáticas previstas na Constituição Federal. Contra esta decisão
foram interpostos embargos infringentes, cuja decisão, conforme ementa, deu
acolhimento ao recurso, com base na discricionariedade da Administração
Pública.
4.2. – Atuação extrajudicial
Ocorre esta
atuação quando o Promotor busca garantir a efetivação das políticas públicas,
sem a necessidade de se socorrer do Judiciário.
Este
trabalho pode ser realizado diretamente pelo Promotor de Justiça, junto ao
Prefeito, Vereadores, Secretários Municipais, Conselhos de Direitos, ou mesmo
junto aos órgãos da administração Estadual, para o direcionamento das políticas
que melhor atendam à população infanto-juvenil.
Também pode
efetivar-se mediante a instauração de inquérito civil, onde se buscará a
lavratura de um termo de ajustamento de conduta, com homologação do Conselho
Superior do Ministério Público.
São
exemplos dessa atuação:
4.2.A – Evasão escolar:- Atuação da
Promotoria de Justiça no combate à evasão escolar – Projeto de lei elaborado
pelo Deputado Estadual Edmir Chedid
- Projeto de Lei nº 518, de 2002, que dispõe sobre medidas a serem
adotadas em caso de evasão escolar ou reiteração de faltas injustificadas
de criança ou adolescente, em estabelecimento de ensino. Tal projeto, segundo
informou o próprio Deputado, foi elaborado com base em artigo da Promotoria,
disponibilizado no site do Ministério Público, referente à campanha “Volte pra
ficar” de combate à evasão escolar.
4.2.B – Violência escolar: trabalho
realizado em parceria com a UNESP que possibilitou identificar os delitos que
mais ocorrem no âmbito escolar, para direcionamento de políticas públicas no
setor. Com base nas informações tornou-se viável traçar o seguinte diagnóstico
Com base
nesses dados e com a análise de outros colhidos na Promotoria, é possível
desenvolver uma política pública para o setor educacional na cidade de
Presidente Prudente, na área de violência escolar, que deve voltar-se para a
conduta do adolescente infrator que pratica lesões corporais. Com base nestas
informações, oficiou-se ao Conselho Municipal para o devido encaminhamento.
4.2.C – Inquérito civil – termo de ajustamento de
conduta partes: Promotoria de Justiça de Piracicaba e o Município de
Charqueada. Agosto / 2001.
Objetivo:
viabilizar a gestão ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e para
erradicação de lixões e trabalho de criança e adolescentes na catação de lixo.
Cláusula 18
– O Município de Charqueada se compromete a erradicar o trabalho
infanto-juvenil no lixo, elaborando e implementando propostas de proteção
integral à criança e ao adolescente, conforme exigido no Estatuto da Criança e
do Adolescente.
4.2.D – Inquérito civil – termo de ajustamento de
conduta
Partes:
Promotor de Justiça da Infância e Juventude e Prefeitura Municipal De Ribeirão
Preto - dezembro de 1997
Objetivo:
criação de Programa Municipal de Auxílio às Famílias, Crianças e Adolescentes
Carentes de Recursos Materiais, que objetivará a orientação, acompanhamento,
apoio psicossocial e complementação da renda dos grupos familiares com
dificuldades específicas e em situações difíceis; Atendimento de até 60
famílias.
a) famílias
com até 4 (quatro) crianças/adolescentes receberão R$ 100,00 (cem reais)
mensais;
b) famílias
com 5 (cinco) crianças/adolescentes receberão R$ 130,00 (cento e trinta reais);
c) famílias
com 6 (seis) ou mais crianças/adolescentes receberão R$ 160,00 (cento e
sessenta reais).
d) O
período de fruição do auxílio em dinheiro será definido pela equipe técnica do
Programa, observado o planejamento elaborado juntamente com as famílias
beneficiadas;
O Programa
somente atenderá às famílias, crianças e adolescentes submetidas às medidas
previstas no art. 101, inciso IV, e art. 129, inciso I,
ambos do Estatuto da Criança e do Adolescente, aplicadas pelos Conselhos
Tutelares de Ribeirão Preto ou pelo Juiz da Infância e da Juventude de Ribeirão
Preto;
4.2.E – Inquérito civil – termo de ajustamento de
conduta
Partes:
Promotoria de Justiça e a Prefeitura do Municipal da Estância Climática de
Cunha. Março de 1998
Objetivo:
instituir no município uma entidade abrigo, com capacidade de acomodação de no
mínimo dez crianças e adolescentes, destinada a servir como moradia provisória
para situações de abandono e risco.
5. Considerações finais
Mudaram-se
os paradigmas relativos a criança e adolescente e
também mudou o perfil constitucional do Ministério Público. Contempla-se, hoje,
uma legislação garantidora de direitos e uma mudança estrutural de caráter
político. Com todas estas mudanças, não há como deixar de sonhar com um futuro
melhor para as crianças e os adolescentes. Temos o direito de sonhar com esta
nova realidade e lutar para a sua efetiva concretização. Na verdade, temos de
sonhar, como Eduardo Galeano nos lembra, em trechos
deste poema:
DIREITO DE SONHAR
Sonhar não faz parte dos trinta
direitos humanos que as Nações Unidas proclamaram no final de 1948. Mas, se não
fosse por causa do direito de sonhar e pela água que dele jorra, a maior parte dos
direitos morreria de sede.
Deliremos, pois, por um instante. O
mundo, que hoje está de pernas para o ar, vai ter de novo os pés no chão.
Nas ruas e avenidas, carros vão ser
atropelados por cachorros.
O ar será puro, sem o veneno dos
canos de descarga, e vai existir apenas a contaminação que emana dos medos
humanos e das humanas paixões.
O povo não será guiado pelos
carros, nem programado pelo computador, nem comprado pelo supermercado, nem
visto pela TV.
A TV vai deixar de ser o mais
importante membro da família, para ser tratada como um ferro de passar, ou uma
máquina de lavar roupas.
Vamos trabalhar para viver, em vez
de viver para trabalhar.
Em nenhum país do mundo os jovens
vão ser presos por contestar o serviço militar. Serão encarcerados apenas os
que quiserem se alistar.
Os economistas não chamarão de
nível de vida o nível de consumo, nem de qualidade de vida a quantidade de
coisas.
Os cozinheiros não vão mais
acreditar que as lagostas gostam de ser servidas vivas.
Os historiadores não vão mais
acreditar que os países gostem de ser invadidos.
Os políticos não vão mais acreditar
que os pobres gostem de encher a barriga de promessas.
O mundo não vai estar mais em
guerra contra os pobres, mas contra a pobreza. E a indústria militar não vai ter
outra saída senão declarar falência, para sempre.
Ninguém vai morrer de fome, porque
não haverá ninguém morrendo de indigestão.
Os meninos de rua não vão ser
tratados como se fossem lixo, porque não vão existir
meninos de rua.
Os meninos ricos não vão ser
tratados como se fossem dinheiro, porque não vão
existir meninos ricos.
A educação não vai ser um
privilégio de quem pode pagar por ela.
A polícia não vai ser a maldição de
quem não pode comprá-la.
Justiça e liberdade, gêmeas
siamesas condenadas a viver separadas, vão estar de novo
unidas, bem juntinhas, ombro a ombro.
Estes
sonhos anunciam uma realidade possível. Para as crianças e adolescentes esta
realidade depende da concretização de políticas públicas e de uma atuação eficiente
e comprometida do Ministério Público.
06. Bibliografia
CANOTILHO,
J.J. Gomes. Direito Constitucional e
Teoria da Constituição. Coimbra - Portugal: Livraria Almedina,
1999.
FRISCHEISEN,
Luiza Cristina Fonseca. Políticas
públicas – A responsabilidade do administrador e o Ministério Público. São
Paulo: Ed. Max Limonad, 2000, p. 80.
MEKSENAS,
Paulo. Cidadania, Poder e Comunicação.
São Paulo: Cortez Editora, 2002.
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos da Criança e do Adolescente. São
Paulo: Ed. LTr., 1999, p.193.
[1]
Palestra proferida no Curso de Capacitação para Conselheiros Municipais
realizado pela Fundação Prefeito Faria Lima – CEPAM – 10 e 11 de outubro de
2002 em Presidente Prudente.
[2]
Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Home page: www.pjpp.sp.gov.br -
e-mail: lamfer@stetnet.com.br
[3]
Constituição Federal, art. 6º: São direitos sociais a educação,
a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados,
na forma desta Constituição.
[4]
Constituição Federal, art. 227.