ARGUMENTAÇÃO PARA CANCELAMENTO DE DETERMINAÇÃO DE RELATÓRIOS SEMESTRAIS NA SENTENÇA - Forma adaptada para constar como item em apelação.

 

 

 

POSSÍVEL ADAPTAÇÃO PARA HABEAS CORPUS

                                                       

 

 

Impõe-se a reforma da r. decisão, ainda, quanto à estipulação de prazo semestral para a vinda de relatórios.

                                               

                                                Não pode o juiz predeterminar que o primeiro relatório técnico do caso seja elaborado somente daqui a um semestre. Tal decisão, ao impedir eventual revisão do regime antes deste período, fixou, em verdade,  prazo mínimo de duração da medida, o que é atentatório à sistemática legal vigente.

 

                                                O art. 121, parágrafo 2o. do ECA estabelece que a medida de internação não comporta prazo determinado. Vale dizer, sua duração depende única e exclusivamente da assimilação mais ou menos rápida da terapêutica por parte do jovem. O nível de aproveitamento do regime mede-se ao longo do programa sócio-educativo. É paralelo a ele. Trata-se de circunstância fora do alcance cognitivo do magistrado sentenciante e, portanto, excluída, pelo legislador, de seu âmbito de decisão.

 

                                                A intenção da lei ao determinar que a manutenção da internação seja judicialmente avaliada no máximo a cada seis meses (art. 121, parágrafo 2o.) foi outorgar ao interno a garantia de que não permanecerá privado de liberdade por mais de um semestre sem que juiz reexamine seu caso. Sim, trata-se de uma garantia, consagrada para que a inoperância estatal não deixe no esquecimento jovens subtraídos de seu direito de locomoção. Todavia, ao  vedar a realização de relatórios em prazo inferior ao semestre, o ilustre julgador, subvertendo a idéia da lei, transforma o prazo máximo dentro do qual o caso não pode deixar de ser avaliado em prazo mínimo dentro do qual a avaliação não pode acontecer.

 

                                                Impedir a reavaliação do caso em determinado período atinge, por conseguinte, a letra da lei em vigor, em especial a regra da indeterminação a priori do tempo mínimo de duração da medida de internação (art. 121, parágrafo 2o.). Conseqüência direta deste princípio é a total liberdade de manifestação nos autos por parte da equipe técnica que acompanha o cumprimento da medida. Se o que vale é o tempo psicológico, ou seja, o processo interno de elaboração acerca de sua própria condição, pode o jovem, por um sucessão de insights, mostrar-se apto a resgatar sua liberdade a qualquer momento. Portanto, também a qualquer momento deve ser facultado ao técnico reportar tal fato ao magistrado. Manietá-lo, impedindo que se pronuncie sobre o caso antes de determinado prazo é ilegal, ilógico e arbitrário. Mesmo porque tal prazo vem fixado a partir de critérios preordenadas pouco rigorosos, tal como reincidência e gravidade infracional, que não guardam nenhuma correlação com a capacidade individual de assimilação do trabalho pedagógico.

 

Se o magistrado tem razões para não desinternar o jovem antes de certo período, que indefira eventual sugestão técnica liberação superveniente, arrolando seus motivos e submetendo-os ao duplo grau de jurisdição. Impedir  que o técnico se pronuncie, que omita fala possivelmente favorável ao jovem, é que não cabe, vez que atenta contra a ampla defesa e aos ideais do ECA. Não se olvide que a medida de internação é regida pelo princípio da brevidade.

 

                                                Não bastassem todos estes argumentos, ilegal a determinação de relatório semestral também porque atropela  o sagrado direito de o jovem de ser reavaliado, por decisão judicial fundamentada, no máximo a cada seis meses (art. 121, parágrafo 1o.).  A reavaliação judicial, depende, como se sabe, do relatório técnico oriundo do centro de internação. Se o envio de tal relatório fica condicionado ao decurso de um  semestre, a decisão judicial,  que lhe é superveniente, ultrapassará necessariamente o prazo estabelecido em lei . Ainda porque, juntado aos autos o relatório, manifestação do Ministério Público e da defesa necessariamente precederão o pronunciamento jurisdicional. Em outras palavras, relatório semestral implicará decisão fundamentada da autoridade judicial mantendo ou não a medida em prazo superior a seis meses, e, por consequência, desrespeito à regra do parágrafo 2o. do art. 121 do ECA.  E os responsáveis por tal violação responderão pelo crime do art. 235 do ECA: descumprir, injustificadamente, prazo fixado nesta lei em benefício de adolescente privado de liberdade.  Pena - Detençãode seis meses a dois anos.

 

                                                Sem respaldo legal, portanto, a fixação de relatório semestral. De qualquer maneira, ainda que fosse em tese possível tal determinação, ela deveria ser fundamentada, porque implica exceção à regra legal e notório prejuízo ao direito de locomoção do recorrente. No caso dos autos, todavia, não tomou o magistrado o cuidado de dizer porque fixava em um semestre o prazo mínimo de cumprimento da medida. O art. 93, IX  da Constituição Federal condiciona a validade de qualquer decisão judicial à sua fundamentação. Embora a medida de internação recebesse motivação no decisório, o prazo de reavaliação -  que poderia variar de  mensal a semestral - foi estipulado na forma mais gravosa sem que se apontasse qualquer razão de ser. A fixação do prazo, assim, deve ser declarada nula, caso não se a retire por completo do decisório pelos motivos acima expostos.

 

                                                Diante de todo exposto, requer seja provido o recurso ao menos para que se cancele - ou se declare, subsidiariamente, nula - a imposição de reavaliação semestral na r. sentença atacada.

                                               

 

 

 

 

FORMA REDUZIDA

 

 

                                                Impõe, ainda, a modificação da r. sentença no ponto em que fixa prazo de semestral de relatório.

 

                                                Em primeiro lugar porque tal estipulação, evidentemente gravosa ao direito de locomoção do jovem, não veio fundamentada. Seus motivos não se confundem com os da medida, ainda porque a internação poderia receber relatórios mensais. A ausência de fundamentação torna nula a decisão judicial (Constituição Federal, art. 11111), que assim deve ser declarada.

 

                                                De qualquer modo, descabida, ainda que motivada, a fixação de prazo dentro do qual a medida não pode ser reavaliada. Os seis meses a que alude o parágrafo 2o. do art. 121 do ECA são o tempo máximo dentro do qual a internação não pode deixar de ser revista, garantia outorgada ao adolescente contra o descaso estatal. Converter tal garantia em prazo mínimo de internação, avessa, à sistemática legal, é francamente equivocado. Depois, o prazo legal de seis meses disposto na lei é para a decisão judicial de manutenção ou não da medida e não para a elaboração de relatório técnico. Ultimado o relatório somente após um semestre, a decisão judicial advirá já esgotado o prazo fixado em prol do adolescente internado, tipificando o crime previsto no art. 235 do ECA.