EXCELENTÍSSIMO SENHOR
DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA DE
ADAMANTINA
O MINISTÉRIO
PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, pelo Promotor de Justiça da Infância e da
Juventude infra-assinado, vem, mui respeitosamente, à presença de Vossa
Excelência, com fundamento nos arts. 5º e seu inciso XXXVI, 6º, 205 a 208, 211,
§ 3º e 227, da Constituição Federal, arts. 3º a 6º, 53, 54 do Estatuto da
Criança e do adolescente ( Lei nº 8.069/90) e legitimado segundo os artigos
129, III, da CF, art. 25, IV, “a”, da Lei Orgânica Nacional do Ministério
Público (Lei nº 8.625/93)), art. 103, VIII, da Lei Orgânica do Ministério
Público de São Paulo (Lei 734/93), art. 201, V, do Estatuto da Criança e do
Adolescente (Lei 8.069/90) e art. 5º, “caput” c/c o seu § 3º, da Lei federal nº
9394, de 20/12/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA contra a FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, representada
pelo Procurador Geral do Estado, que poderá ser encontrado no Pátio do Colégio,
s/nº, São Paulo-SP, no prédio da Procuradoria Geral do Estado, pelos motivos de
fato e direito adiante expostos, em favor dos seguintes educandos:
Nome data de nascimento
01- A. H. D. J. P. 21/09/90
02- A. B. M. 03/09/90
03- A. B. D. C. 15/07/90
04- A. D. S. O. 13/07/90
05- A. D. S. G. 05/12/90
06- A. L. C. 08/09/90
07- B. F. D. C. 09/11/90
08- C. F. D. J. 28/10/90
09- C. B. D. L. 04/09/90
10- D. D. C. T. 13/09/90
11- D. C. F. D. S. 24/07/90
12- D. R. D. S. 09/12/90
13- D. O. D. S. 31/10/90
14- D. A. D. S. F. 23/11/90
15- É. F. P. 27/11/90
16- G. C. B. 03/12/90
17- G. G. D. C.
05/07/90
18- J. D. S. C. 27/08/90
19- J. L. F. 22/09/90
20- J. Q. D. A. 25/08/90
21- L. F. D. S. 24/07/90
22- L. D. O. D. S. S. 20/08/90
23- M. A. D. C. 29/07/90
24- P. N. A. 09/08/90
25- Q. M. D. S. 11/08/90
26- R. A. H. D. S. 15/09/90
27- R. S. B. M. 29/07/90
28- R. R. D. O. 10/07/90
29- T. R. S. 24/11/90
30- U. P. A. J. 30/07/90
31- V. F. A. D. 24/12/90
32- W. R. D. S. 08/07/90
33- W. P. 06/08/90
34- W. M. D. S. 29/08/90
35- W. D. D. S. 04/09/90
36- A. S. J. 26/10/90
37- A. M. D. 10/07/90
38- A. R. B. 07/09/90
39- A. A. M. 11/07/90
40- B. A. D. R. T. 21/07/90
41- B. D. M. E. 02/07/90
42- C. X. D. S. 22/08/90
43- D. A. 03/09/90
44- D. C. D. S. 09/10/90
45- D. S. V. 29/07/90
46- D. A. C. 25/09/90
47- D. A. 15/12/90
48- D. A. F. D. S. 10/07/90
49- F. F. D. S. 11/09/90
50- F. A. M. 11/07/90
51- G. B. G. 01/09/90
52- G. T. D. S. 03/08/90
53- H. F. T. 04/11/90
54- I. K. O. R. 08/08/90
55- L. R. D. S. 13/11/90
56- L. S. A. 21/07/90
57- L. M. L. 05/09/90
58- M. A. M. 17/10/90
59- M. M. A. 11/08/90
60- M. B. D. 26/08/90
61- N. C. B. 24/12/90
62- N. S. C. 24/12/90
63- N. N. T. 30/10/90
64- P. C. M. A. 06/08/90
65- P. W. D. S. C. 17/08/90
66- R. C. B. 28/12/90
67- R. A. D. S. B. 18/08/90
68- S. G. B. 02/08/90
69- T. V. R. 29/09/90
70- V. V. 29/12/90
71- A. A. D. R. 09/09/90
72- H. P. F. 17/09/90
73- R. R. P. D. M. 16/10/90
DOS
FATOS
1 - As crianças acima qualificadas, todas
residentes na cidade de Flórida Paulista, no ano letivo de 1997, por não terem
completado 7 anos antes do dia 01 de julho de 1997, apesar de terem cursado a
pré-escola na Escola Municipal de Ensino Infantil de Flórida Paulista, e
estarem aptas a cursar o Ciclo Básico Iniciante (1ª série), em face do disposto
no art. 18 da Resolução 169/96, da Secretaria de Estado da Educação deste
Estado, tiveram recusadas suas matrículas na primeira série do ensino
fundamental (Ciclo Básico Iniciante - CBI), na única escola de Flórida Paulista
a fornecer o ensino básico, a Escola Estadual de Primeiro Grau Octaviano José
Corrêa.
2 - para suprir essa injustificável recusa da
Secretaria de Estado da Educação, o Município de Flórida Paulista, mesmo não
possuindo escola de ensino fundamental, resolveu manter duas classes do Ciclo
Básico Iniciante, cedendo professores, classes estas que, mediante aquiescência
da Delegacia de Ensino de Adamantina, funcionariam, como de fato funcionaram,
em salas de aulas da própria Escola
Estadual de Primeiro Grau Octaviano José Corrêa, regidas pelas professoras
do município M. C. e R. M. Z., mas com o acompanhamento e coordenação
pedagógica prestados pela referida EEPG.
3 - Assim, em decorrência deste acordo de
cooperação mútua, o Estado e Município, em um verdadeiro sistema misto de
oferecimento de ensino de fato, instituíram duas salas de aulas para o CURSO
BÁSICO INICIAL - CBI, que foi ofertado às crianças já mencionadas, durante todo
o ano letivo de 1997 e segundo as normas curriculares do CICLO BÁSICO.
4 - O Plano de Ensino programado para essas duas
classes, em tudo, consoante os documentos anexos enviados a esta Promotoria,
foi igual ao Plano de Ensino da Escola
Estadual Octaviano José Corrêa, escola essa que, no mesmo ano letivo de
1997, manteve outras duas classes de CURSO
BÁSICO INICIAL, nas quais estudaram os alunos que já tivessem completados 7
anos ou que completassem essa idade até 30/06/97.
5 - No decorrer do ano letivo de 1997 os alunos
em prol de quem este órgão ora atua freqüentaram regularmente as aulas e
receberam os ensinamentos próprios e programados no Plano de Ensino, conforme
se pode constatar pela simples análise dos diários de classe ou cadernetas de
professor.
Dessas cadernetas constam o controle de
freqüência e as atividades desenvolvidas durante todo o ano, compatíveis com o
Plano de Ensino do Curso Básico Inicial.
6 - Essas classes, além de funcionarem no
próprio da EEPG Octaviano José Corrêa, como se disse e como era inevitável,
receberam o acompanhamento e coordenação pedagógicas da própria Escola Estadual
Octaviano José Corrêa e foram supervisionadas pela Delegacia de Ensino.
De fato, os alunos foram cadastrados na rede
estadual de ensino fundamental, recebendo o Registro Escolar e a respectiva
Carteira de Aluno, através da Delegacia de Ensino, documentos estes que
instruem a inicial e se constituem em prova bastante do reconhecimento da
Delegacia de Ensino quanto à existência das classes.
Das
Carteiras de Identidade Escolar constam: GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO e EMEG
OCTAVIANO JOSÉ CORRÊA. Segundo consta, o nome EMEG foi inserido justamente para
diferenciar os alunos das classes regidas por professores municipais dos alunos
matriculados oficial e regularmente na rede pública estadual.
Prova
irrefutável de que essas classes receberam acompanhamento da Escola Estadual
Octaviano José Corrêa, o que até foi afirmado pela Secretária da Educação do
Município (ofício incluso), se verifica do visto passado no diário de classe da
professora M. C., em maio de 1997, pela Diretora da Escola Estadual. Como se
disse, as classes funcionavam dentro da EEPG e o acompanhamento e orientação às
professoras municipais era mesmo inevitável. Nenhum educador, na prática, se
omitiria em dar as necessárias orientações para uma boa formação educacional.
O fato é que, essas classes onde estudaram os
alunos mencionados na inicial, foram supervisionadas e acompanhadas pela
Direção da Escola Octaviano José Corrêa e pela Delegacia de Ensino de
Adamantina.
8 - Mas não é só. Ao final do ano letivo, foram
submetidos ao provão realizado em todas as Escolas pela Delegacia de
Ensino e, com o auxílio da EEPG, foram avaliados e, com exceção dos três a
seguir nomeados, foram considerados capazes de prosseguir no CURSO BÁSICO EM
CONTINUAÇÃO - CBC (2ª série), consoante se observa dos inclusos documentos:
FICHA DE AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DO ALUNO DE CICLO BÁSICO.
Aliás, a
própria coordenadora pedagógica da EEPG Octaviano José Corrêa, professora N. d.
C. F. e S., que acompanhou todas as atividades desenvolvidas nas classes das
professoras M. e R. concluiu que, com exceção de três, os demais alunos
adquiriram os conhecimentos próprios do CBI e estão aptos a cursar o CBC (termo
de declarações em anexo).
Apenas os alunos A. A. R., H. P. F. e R. R. P.
d. M. não teriam tido um bom desempenho.
No entanto, nos termos da legislação que
instituiu o CURSO BÁSICO, conforme se verá, mesmo estes três alunos deverão
cursar o CBC.
9 - Em resumo, os alunos aqui relacionados
cursaram normalmente as aulas do CBI e, por isso, devem prosseguir nos estudos,
na fase seguinte, que é no CBC.
Imagine, se isto não for possível, o quão seria
frustrante para esses alunos, que, como é óbvio, estão ansiosos por cursar a
segunda série uma vez que já sabem que passaram de ano.
10 - Em verdade, a sorte destes educandos está
nas mãos da Justiça.
11 - Ocorre que, o Município de Flórida
Paulista, acatando decisão do Conselho Municipal de Educação (atas anexas),
optou por se integrar ao sistema estadual de ensino e compor um único sistema
de educação básica com o Estado, nos termos do art. 11, parágrafo único, da Lei
nº9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) e, em conseqüência, não mais
cederá professores para reger classes no ensino básico, mas, tão somente na
pré-escola.
Por outro lado, a Delegacia de Ensino, não exigiu
e nem regularizou o curso ministrado a esses alunos.
12 - Em conseqüência, aos alunos e seus pais só
restaram uma alternativa: requerem a matrícula na ÚNICA escola de ensino fundamental da cidade de Flórida
Paulista que é a Escola Estadual de
Primeiro Grau Octaviano José Corrêa.
13 - Todavia, ao fazê-las, apesar de estarem
capacitados para cursar o CURSO BÁSICO
EM CONTINUIDADE, acabaram sendo, consoante se observa do incluso ofício
subscrito pela Diretora da EEPG
Octaviano José Corrêa, novamente,
matriculados no CBI e não no CBC, como é o correto e justo, sob o argumento de
que não se enquadravam no disposto no art. 14 da Resolução SE 164/97, da
Secretaria de Estado da Educação, ou seja, por terem sete anos completos devem
ser matriculados na primeira série.
14 - A recusa da matrícula no CBC por parte da
EEPG, embora se compreenda tenha sido executada em obediência aos termos de
incompreensível ordem superior (Resolução nº 164/97), sem dúvida, ofende o
direito social básico à educação regular (art. 6º, da CF), pois impede que
esses alunos possam continuar recebendo a adequada educação, compatível com os
conhecimentos adquiridos no CBI, ou seja, impede que possam cursar a série para
a qual já estão plenamente habilitados e, o que é pior, na única Escola
Estadual da pequena Flórida Paulista.
15 - Em decorrência desse ato está ocorrendo uma inconcebível
interrupção da continuidade de prestação de serviço educacional e, por
conseqüência, da conclusão da formação pedagógica-escolar, o que, se concretizado,
acarretará aos alunos sérios e irreparáveis prejuízos no aprendizado, já que,
no caso, é no CBC que será concluído o processo de alfabetização (ler, escrever
e contar), prejuízos estes que só poderão ser evitados se os alunos, como de
direito, forem matriculados no CBC.
DO
DIREITO
O direito à educação fundamental, tal sua
importância, foi erigido pela Constituição da República, comum dos direito
sociais básicos, a teor do art. 6º, in
verbis:
Art. 6º - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
E, das diretrizes traçadas pela Magna Carta,
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e também pela Lei de Diretrizes e
Bases da Educação, como logo se verá, colhe-se que a educação básica é direito
subjetivo público e dever prioritário do Estado, importando na obrigação de
desenvolvimento de ações governamentais integradas e conjuntas com o objetivo
de propiciar a todos, e com padrão de qualidade, o pleno desenvolvimento da
personalidade, e, especialmente em relação às crianças e aos adolescentes, com
observância nesse mister de sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
De fato, a CF, assim trata a questão da
educação:
Art. 205 - A educação, direito de todos e
dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 206 - O ensino será ministrado com
base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e
permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar,
pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
...
VIII - garantia de padrão de qualidade;
Art. 208 - O dever do Estado com a educação
será efetivada mediante a garantia de:
I - ensino fundamental obrigatório e
gratuito, inclusive para os que não tiverem acesso na idade própria;
V - acesso aos níveis mais elevados do
ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
§ 1º - O acesso ao ensino obrigatório e
gratuito é direito público subjetivo.
§ 2º - O não-oferecimento do ensino
obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa
responsabilidade da autoridade competente.
Art. 211 - A União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de
ensino.
§ 2º - Os Municípios atuarão
prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.
§ 3º - Os Estados e o Distrito Federal
atuarão no ensino fundamental e médio.
Art. 227 - É dever da família, da sociedade
e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o
direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,
ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de
toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
O Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação, na esteira da Lei Maior, reafirmam o direito
à educação com absoluta prioridade e, por conseqüência, o dever do Estado, não
só de prestá-la, mas de prestá-la de forma regular.
Em suma, para que o Estado cumpra o seu dever a
contento, não basta ofertar o ensino obrigatório, mas deve fazê-lo, como visto,
de forma regular (art. 208, V e §
2º, da CF e 54, § 2º, ECA) e, com observância não só de todos os princípios de direito,
mas, e principalmente, das diretrizes maiores que norteiam e dão estrutura ao
ensino fundamental, na verdadeira acepção do termo.
No caso retratado nos autos não foi o que
ocorreu.
O Curso ministrado a esses alunos não foi
regularizado, nem reconhecido pela Delegacia de Ensino, a quem compete à
fiscalização e até a autorização para o funcionamento de Escolas.
Como se vê dos inclusos documentos, esse curso,
na prática, foi mantido, num sistema híbrido, pelo Estado e Município. Este
cedendo professores e aquele todas a infra-estrutura necessária: prédio,
coordenação pedagógica, etc.
No entanto, não está reconhecido, o que implica
em dizer que a oferta de ensino, formalmente, não foi regular, o que impede,
por exemplo, que os alunos possam ser transferidos para outros estabelecimentos
de ensino, até para escolas particulares.
Assim, estes alunos, por negligência do Estado,
acabaram iniciando seus estudos em uma escola não oficial e em razão disto
estão impedidos de cursarem o CBC.
Mas não é só essa a questão, que, diga-se de
passagem, nem foi apontada pela EEPG ao responder o ofício desta Promotoria.
A matrícula dos alunos concretizou-se na
primeira série (CBI) por imposição da Secretaria de Estado da Educação através
da Resolução nº 164/97, ou seja, em razão da idade. Sim, tendo as crianças
apenas sete anos completos, não podem, conforme entendimento da Diretora,
cursar a segunda série, ou seja, o CBC.
A não efetivação da matrícula no CBC por parte
da Escola Estadual Octaviano José Corrêa, dentro do quadro acima relatado, fere
não somente os mais comezinhos princípios pedagógicos, como também de
princípios de direito, inclusive garantidos pela mais alta Lei deste país.
Vejamos:
A convalidação de matrícula no CBI levada a
efeito pela EEPG Octaviano José Corrêa, implica na interrupção do processo
educacional, vez que os alunos (que já estão habilitados a freqüentar a segunda
série do ensino fundamental), terão de cursar, novamente, a primeira série.
Sem dúvida, tal medida, constituiu um dos mais graves
equívocos pedagógicos e, principalmente no caso em exame, de conseqüências
incomensuráveis, porquanto causará o rompimento do processo de alfabetização, que é justamente o conteúdo desenvolvido
no CURSO BÁSICO, como se pode
verificar dos Planos de Ensino para o Ciclo Básico Inicial e Ciclo Básico em
Continuação (documentos anexos).
Além disso, a medida contraria as propostas da
escola e os objetivos do ensino constantes do Plano de Ensino para o Ciclo
Básico Iniciante da própria EEPG, que são, justamente, a garantia do ensino e
do aprendizado e o dever da escola de contribuir para que a criança permaneça
na escola e se interesse em aprender e, por parte dos professores, o estimular
os alunos para o estudo, em um ambiente acolhedor, interessante e participativo.
E, sem nos alongarmos na exemplificação, das
conseqüências maléficas, no aspecto pedagógico-educacional, em se obrigar um
aluno a rever ou reestudar algo que já domina ou aprendeu, acredito suficiente
sejam mencionadas apenas duas, que, por si mesmas bastam demonstrar o erro
pedagógico:
Primeira: O reestudo de um mesmo ponto provocará
profundo desestímulo no aluno, que, por sua vez, gerará o desinteresse em
aprender, o desgosto pelo estudo, e, por conseqüência, virá a indisciplina, ou
seja, todos fatores prejudiciais a um bom aprendizado.
Segunda: suprimirá do aluno oportunidades de
receber novas informações, o que afetará sua capacidade natural de
desenvolvimento, de criação, de progresso.
De fato, como os objetivos maiores da educação e
do Plano de Ensino serão atingidos se o aluno for obrigado a estudar em uma
classe na qual se ministrará as mesmíssimas atividades já desenvolvidas no ano
anterior? Haverá interesse em aprender?
O não fornecimento de novas informações a um
aluno que já está apto a recebê-las, por óbvio, também constitui um abuso,
porquanto provoca um atraso inconcebível de seu aprendizado, que prejudicará
sua liberdade de criação e de desenvolvimento de toda a sua potencialidade,
violando o escopo traçado no art. 58 do ECA.
Se não forem dadas ou ensinadas coisas novas e
variadas, como poderá o aluno progredir, criar?
Como
leciona ELIZABETH D’ANGELO SERRA, da
Fundação Nacional do Livro Infanto-Juvenil:
A variedade alimenta o olhar, o pensar e o sentir. É o que possibilita o fazer criador. ...
Criar
é potencialidade de qualquer ser humano. É a criação que possibilita ao Homem e
à Humanidade resolverem seus problemas. É o criar que viabiliza a liberdade, a
autonomia. Porém, criar não surge do vazio. É necessário, para criar, conhecer
sempre coisas novas, ler, escutar, conversar e trabalhar com persistência.
É assim que cientistas e artistas criam. A curiosidade que toda criança traz
consigo - e que nós, adultos, quase sempre calamos, autoritariamente - é o
sinal mais importante da potencialidade humana de criar (in ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
COMENTADO - Comentários Jurídicos e Sociais, Coordenadores Munir Cury e
outros, Malheiros Editores, 1992, pág. 180, em comentário ao art. 58).
Em resumo, a medida imposta pela EEPG Octaviano
José Corrêa em efetivar a matrícula desses alunos no CBI e não no CBC, sob o
ponto de vista pedagógico é totalmente desaconselhável tendo em vista impedir o
pleno desenvolvimento dessas crianças, especialmente em face da sua condição
peculiar de pessoa em formação, em clara violação ao que o Estatuto da Criança
e do Adolescente preconiza nos seus artigos 3º e 6º, que rezam:
Art. 3º - A criança e o adolescente gozam
de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da
proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por
outros meios, todas as oportunidades e
facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental,
moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade;
Art. 6º - Na interpretação desta Lei
levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem
comum os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em
desenvolvimento.
Ao depois, sob o ponto de vista legal, trata-se
de medida que viola direitos constitucionais fundamentais, passível até de
sanção, como preconiza o art. 5º, do ECA, que diz:
Art. 5º - Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei, qualquer
atentado, por ação ou omissão, aos seus
direitos fundamentais;
De fato,
a não-efetivação da matrícula no CBC, mas no CBI, em desobediência à Resolução
164/97, da Secretaria de Estado da Educação, viola o princípio constitucional
da isonomia, bem como o direito adquirido, proclamados, respectivamente, no
art. 5º e seu inciso XXXVI, da Magna Carta, a seguir transcritos.
Art. 5º -
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
XXXVI - a lei não prejudicará o direito
adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
Os alunos aqui nomeados, em relação aos alunos
que estudaram no CICLO BÁSICO INICIAL na rede de ensino estadual, estão
recebendo tratamento diferenciado, porquanto, detendo os mesmos conhecimentos,
tendo participado das mesmas atividades e na mesma escola e estando aptos a
continuar os estudos na série imediatamente seguinte, foram matriculados,
novamente, na 1ª série (CBI), enquanto aqueles que foram promovidos para o CBC.
Mais
ainda. Está infringindo o que dispõe o art. 53, I, do ECA, que garante a
igualdade de condições para o acesso e permanência na escola:
Art. 53 - A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e
qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:
I - igualdade
de condições para o acesso e permanência na escola;
Ou seja, apesar de terem estudado na mesma
escola e recebido o mesmo conteúdo pedagógico e obtido aprovação final, estão
impedidos de continuarem seus estudos, e, por conseqüência, não está sendo
garantida a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.
Essa discriminação não será compreendida, não só
pelos pais e professores, como também e especialmente pelos próprios alunos,
que, por óbvio, chegarão à conclusão de que foram reprovados.
Outrossim, é inquestionável a desobediência ao
dever que ao Estado é imposto de assegurar à criança e ao adolescente o ensino
fundamental e acesso a níveis mais
elevados do ensino... segundo a capacidade de cada um, tal como definido no
art. 208, I e V, da CF, repetidos no art. 54, incisos I e V, do ECA:
Art. 54 -
É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente:
I - ensino fundamental, obrigatório e
gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
V - acesso a níveis mais elevados do
ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um.
Aliás, o aluno do CICLO BÁSICO, mesmo não tendo
um bom desempenho não pode ser retido no CBI. Apenas poderá haver retenção no
CBC.
De fato, o Decreto nº 21.833, de 28/12/1983, que
instituiu o Ciclo Básico nas escolas estaduais, no seu art. 1º, parágrafo
único, determina que o Ciclo Básico terá duração de dois anos.
E a
Resolução nº 13/84, da Secretaria de Estado da Educação, que fixa normas
atinentes ao Ciclo Básico, no seu art. 3º, § 2º, determina que:
Os alunos que não atingirem ao final dos dois anos letivos o disposto no art. 7º, deste Regulamento, permanecerão neste Ciclo por mais tempo, garantindo o seu atendimento a partir do estágio em que se encontrem.
O art. 7º
da referida Resolução reza:
Ao
final do Ciclo Básico os alunos serão promovidos às etapas posteriores desde
que tenham adquirido os mecanismos básicos da leitura e da escrita, bem como os
demais conhecimentos e habilidades estabelecidos pelo programa curricular
referido no artigo anterior.
A bem da verdade, a sistemática de avaliação ao
término do CBI servirá para diagnosticar
os progressos apresentados pelo aluno, em relação ao seu saber anterior, bem
como os resultados de um trabalho pedagógico visando à tomada de providências
posteriores.
Servirá,
assim, para dar indicações a respeito da maneira de atuar do professor e da
própria escola numa situação concreta e sugerir caminhos para o reforço, para a
intensificação e/ou reformulação do ensino, pois só ela permite ao professor
tomar decisões não aleatórias. (Artigo
de Elba Siqueira de Sá Barretto e Marília Claret Geraes Duran sob o título:
Reorganização do Ensino de Primeiro Grau: Ciclo Básico, publicado pela
Secretaria de Estado de Educação, São Paulo - ATPCE/CENP (Coordenadoria de
Estudos e Normas Pedagógicas), pág. 16).
Ou seja, a contrário senso das referidas
disposições, não pode haver retenção no primeiro ano, ou seja, no CBI.
Logo, até os alunos A. A. d. R., H. P. F. e R.
R. P. d. M., automaticamente, devem cursar o CBC.
Note-se
que a recente Lei de Diretrizes e Bases da Educação - Lei 9394/96, fiel aos
ditames maiores do ensino, no seu artigo 23 e § 1º, conferiu à escola o poder
de reclassificar, com base na idade, na competência ou outro critério, não só
os alunos recebidos de outras unidades escolares, como os seus próprios alunos.
A respeito da reclassificação, o Conselho
Estadual de Educação, ao fixar normas para a elaboração do Regimento Interno
dos estabelecimentos de Ensino Fundamental e Médio (Deliberação 10/87,
publicada no Diário Oficial do Estado, Poder Executivo, Seção I, em 04/09/97),
assim elucidou:
O sistema, ao só permitir o ingresso até a série
correlata com a idade, resguarda o interesse do candidato. De qualquer forma, ficará aberta ao interessado a possibilidade de
obter reclassificação para série mais adiantada, nos termos do art. 23, § 1º,
quando demonstre cabalmente grau de desenvolvimento e maturidade para tanto
(grifo nosso).
E, como já se demonstrou, é indiscutível a
competência, a maturidade, a aptidão dos alunos aqui nomeados para estudarem no
Ciclo Básico em Continuidade (2ª série), que, jamais poderão ser prejudicados
pela negligência dos Poderes Públicos.
Apesar de o ensino fundamental prioritariamente
competir ao Município, o Estado, nos termos do art. 211, § 3º, da CF (acima
citado) continua sendo responsável pela oferta de ensino fundamental. Em
verdade, em se tratando de ensino fundamental, ambos são solidariamente
responsáveis pela educação e oferta regular de ensino.
No caso dos autos, a responsabilidade do Estado
se avulta uma vez que os alunos estudaram dentro de uma Escola Estadual,
recebendo todo o acompanhamento e coordenação da própria Escola Estadual.
Apenas receberam aulas de professores pagos pelo Município. E, além disso, a
ÚNICA escola de ensino fundamental existente na cidade é mantida pelo Estado e
nela os alunos já estão matriculados.
Por conseqüência não há falta de salas, nem de
vagas.
O direito ao estudo no CBC está demonstrado e é
imprescindível que os alunos continuem recebendo os estudos.
E isso só será possível se forem matriculados no
CBC da Escola Estadual de Primeiro Grau Octaviano José Corrêa, de Flórida Paulista.
DA
LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
A legitimidade do Ministério Público para
defender os interesses de crianças e adolescentes e, especialmente, para
assegurar o direito à educação no ensino fundamental, é incontestável o teor do
art. 127 da Magna Carta, já que a educação, especialmente a do ensino
fundamental, como vimos, deve ser prestada de forma regular pelo Estado e
constitui direito público subjetivo.
Na defesa
deste direito, como não podia deixar de ser, a própria Constituição Federal, conferiu
ao Ministério Público, o poder-dever de promover as medidas necessárias a sua
garantia (art. 129, II e III) e o ordenamento jurídico infraconstitucional não
deixa qualquer dúvida quanto a sua legitimidade para propor ação civil pública.
Tais diplomas legais, dada a clareza de seus
textos, dispensam qualquer comentários.
De fato, a Lei Orgânica Nacional do Ministério
Público (Lei nº 8.625/93), no seu art. 25, dispõe:
Art. 25 - Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:
IV -
promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:
a)
para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao
consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico e
paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais
indisponíveis e homogêneos:
A Lei Orgânica Estadual do Ministério Público
(Lei nº 734/93), no seu art. 103, VIII, confere a mesma incumbência.
E o Estatuto da Criança e do Adolescente não dá
margem a qualquer entendimento diverso:
Art. 201 - Compete ao Ministério Público:
V -
promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos
interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à
adolescência, inclusive os definidos no art. 220, § 3º, inciso II, da
Constituição Federal.
E,
recentemente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei Federal nº 9394, de
20/12/1994), em seu artigo 5º, “caput”, estabeleceu que:
o acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda o Ministério Público, acionar o Poder Público para exigi-lo.
O § 3º desta disposição legal, por sua vez,
consagra:
Qualquer das partes mencionadas no Caput deste artigo tem legitimidade para peticionar no Poder Judiciário, na hipótese do § 2º do art. 208 da Constituição Federal, sendo gratuita e de rito sumário a ação judicial correspondente:
Em suma,
assistindo aos interesses das crianças abusivamente impedidas de cursarem a 2ª
série do ensino fundamental, cumpre o Ministério Público o papel que lhe foi
conferido pelo ordenamento jurídico na defesa dos direitos sociais e
individuais indisponíveis.
DA
COMPETÊNCIA DO JUÍZO
O
conhecimento e julgamento da presente ação compete à Vara da Infância e da
Juventude desta Comarca.
Com
efeito, o art. 148, inciso IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente,
estabelece:
Art. 148 - A Justiça da Infância e da Juventude
é competente para:
IV -
conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou
coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209.
Por outro
lado, o art. 209, que está no Capítulo VII - DA PROTEÇÃO JUDICIAL DOS
INTERESSES INDIVIDUAIS, DIFUSOS E COLETIVOS, reza:
Art. 209 - As ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer à ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta para processar a causa, ressalvadas a competência da Justiça Federal e a competência originária dos Tribunais Superiores.
Trata-se, portanto, de competência absoluta em
razão da matéria. Por outro lado a norma faz expressão remissão às ações
previstas no Capítulo VII, dentre as quais acham-se as que se referem ao
não-oferecimento ou oferta irregular do ensino obrigatório (art. 208, I).
Outro não
é o entendimento da doutrina, podendo ser citada a seguinte lição de José Luiz
Mônaco da Silva, em sua obra Estatuto da
Criança e do Adolescente - Comentários (Ed. RT, pág. 365, 1994), assim
exposta:
Tratando-se de ato comissivo ou omissivo que importe em violação dos direitos assegurados pela Constituição Federal e pelo Estatuto, a ação será proposta no foro do local onde o dano ocorreu. Se determinada cidade deixar de oferecer ensino obrigatório aos seus município mirins, a demanda será proposta na comarca a que pertencer o município, cujo Juízo da Infância e da Juventude terá competência absoluta para processar a causa.
DA
LIMINAR
José Afonso da Silva (Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros, São
Paulo, 11ª Edição, pág. 50) nos ensina que:
O princípio da supremacia requer que todas as situações jurídicas se conformem com os princípios e preceitos da Constituição. Essa conformidade com os ditames constitucionais, agora, não se satisfaz apenas com a atuação positiva de acordo com a Constituição. Exige mais, pois omitir a aplicação das normas constitucionais, quando a Constituição assim determina, também constitui conduta inconstitucional.
Nenhum diploma legal pode ferir a Lei Maior,
especialmente um regulamento, cujo objeto se restringe a esclarecer e traçar
normas para o fiel cumprimento da lei.
É inegável que a Secretaria de Estado da
Educação, através de seus órgãos, ao negar a matrícula no CURSO BÁSICO EM CONTINUIDADE a alunos que, sabidamente, estudaram e
concluíram com aproveitamento o CURSO
BÁSICO INICIAL, curso este que, embora ministrado por professores
municipais, contou com conhecimento e a supervisão e apoio da Delegacia de
Ensino e, principalmente, por motivo de idade, fixada em regulamento,
desrespeitou o princípio da supremacia constitucional.
Urge que estes alunos continuem recebendo o
ensino que lhes é devido, no caso, na segunda série ou CICLO BÁSICO EM
CONTINUAÇÃO, sendo a tutela antecipada medida imprescindível à eficácia do
provimento jurisdicional pleiteado.
Estão
presentes os requisitos legais para a concessão da liminar, que como nos ensina
Hely Lopes Meirelles são:
a relevância dos motivos em que se assenta
o pedido na inicial e a possibilidade de ocorrência de lesão irreparável ao
direito do impetrante se vier a ser reconhecido na decisão de mérito - fummus
boni juris e periculum in mora - A medida liminar não é concedida como
antecipação dos efeitos da sentença final, é procedimento acautelador do
possível direito do impetrante...
(Mandado de Segurança, Malheiros Editores, 15ª ed., pág. 56).
Os motivos para a propositura da presente ação
civil pública são relevantes, já que a educação cuida-se de direito social
básico (art. 6º, CF), e, a despeito, não está sendo oferecido de forma regular
(art. 208 e § 2º e 227 da CF), principalmente por motivo de idade, com
violação, como já explicitado, a diversos princípios constitucionais e
disposições legais e cujos prejuízos serão irreparáveis acaso o direito venha a
ser reconhecido apenas na decisão de mérito, uma vez que terão perdido meses de
aula, provas e, principalmente, correrão risco de não receberem uma adequada
alfabetização.
É preciso restabelecer o princípio da supremacia
da constitucional o quanto antes até porque se trata de ofensa a direito
social.
Como
leciona Paulo Afonso Garrido de Paula (in Cadernos de Direito da Criança e do
Adolescente, Malheiros Editores, 1995, pág. 94):
atender ao direito social protegido pela lei significa cumprir qualitativa e quantitativamente, as obrigações que dele decorrem, produzindo ações e serviços que satisfaçam os titulares daquele direito. Existindo oferta irregular dessas ações e serviços por parte do Estado, a força subordinante do direito social violado conduz à necessidade de prestação jurisdicional, de modo que a ordem social violada pelo Poder Público, notadamente através do seu Poder Executivo, possa ser restaurada pelo Poder Judiciário.
Para a requerida, nenhum óbice haverá em atender
a demanda, posto que dispõe de classes e professores, valendo registrar que os
alunos já estão matriculados na rede estadual de ensino na primeira série.
Portanto, basta que os matricule na segunda série e, por conseqüência, forneça
o ensino adequado às suas aptidões e de forma regular.
Aguarda-se,
assim, seja deferida a liminar, inaudita
altera pars, para que as crianças já iniciem o ano letivo de 1998
freqüentando a segunda série (ou Ciclo Básico em Continuação), como é de
direito, na EEPG, a única da rede pública existente.
DO
PEDIDO
Em face
de tudo o que foi exposto, requer:
1 - a concessão de liminar, para
que a Ré seja compelida a matricular os alunos acima relacionados no CURSO BÁSICO EM CONTINUIDADE, na Escola
Estadual de Primeiro Grau “Octaviano José Corrêa”, de Flórida Paulista e, para
tanto, que seja expedida ordem diretamente à Diretora da Escola e Delegacia de
Ensino, uma vez que as aulas iniciar-se-ão em alguns dias;
2 - a cominação à Ré, em liminar,
de multa diária equivalente a um salário mínimo, para o caso de descumprimento
de tutela antecipada, nos termos do art. 213, do ECA, cujos valores deverão ser
revertidos ao Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de
Flórida Paulista (art. 214 do ECA).
3 - a citação da Ré, para que
conteste a ação no prazo legal, sob as penas da Lei, cientificando-lhe que a
ausência de defesa implicará em revelia e em reputar-se como verdadeiros os
fatos articulados nesta inicial.
4 - provar o alegado por todos os
meios de provas em direitos admitidos, mormente a documental, vistorias,
perícias, testemunhal, cujo rol será depositado em Cartório no prazo facultado
pelo art. 407 do CPC, depoimento pessoal do representante legal da requerida,
além daquelas produzidas pela Ré;
5 - após a produção da mais ampla
prova, seja julgada procedente a presente ação, condenando-se a requerida, por
seus órgãos competentes, a:
a) efetivar definitivamente as
matrículas dos educandos acima qualificados, no CURSO BÁSICO EM CONTINUIDADE (2ª série), da Escola Estadual de
primeiro Grau “Octaviano José Corrêa”;
b) garantir a continuidade do
ensino básico com a efetivação das matrículas nas séries subseqüentes, salvo se
houver impossibilidade por motivos pedagógicos (não aproveitamento, etc.) ou
outros legalmente previstos, abstendo-se, assim, de impedir a continuidade do
ensino por motivo de idade;
c) reconhecer a regularidade do
CURSO BÁSICO INICIAL ministrado aos
alunos acima qualificados, no ano letivo de 1997, na EEPG “Octaviano José
Corrêa”, fazendo os devidos registros, anotações e comunicações junto aos
órgãos competentes;
d) reconhecer que os educandos
beneficiários da impetração cursaram com aproveitamento o CBI e que estão
capacitados para cursar o CBC;
DO
VALOR DA CAUSA
Dá-se à presente, para efeitos meramente fiscais, o valor de
R$ 1.000,00 (hum mil reais).
Termos em
que,
P.
Deferimento.
Adamantina,
23 de janeiro de 1.998.
Promotor de Justiça da Infância
e da Juventude
1.
Presentes motivos relevantes para a concessão da liminar pleiteada. As crianças
foram inscritas na 1ª série do ensino fundamental, receberam os ensinamentos
conforme plano de ensino do Estado, em escola do Estado, por professores do
Município, mas sob orientação e supervisão do Estado (como reconhecido nas
informações a fls. 461), sendo a final avaliadas como alunas do Estado e
consideradas aptas a continuar no Curso Básico. Se alguém infringiu as normas
da educação foram os agentes do Município e do Estado, e as crianças não podem
ser prejudicadas por culpa de adultos e profissionais, sendo obrigadas a rever
conhecimentos já devidamente assimilados, isso sim evidente dano à educação e
formação da personalidade.
2. Por
isso, concedo liminar para que as crianças sejam imediatamente matriculadas no
Curso Básico em Continuidade (2ª Série) da Escola Estadual de Primeiro Grau
“Octaviano José Corrêa”, de Flórida Paulista, sob pena de multa de um salário
mínimo por dia de atraso e sem prejuízo de processo criminal por desobediência.
3.
Intimem-se para cumprimento da liminar, inclusive a sra. Dirigente Regional de
Ensino e a Diretora da EEPG “Octaviano José Corrêa”, tendo em vista o início do
ano letivo.
4. Após,
aguarde-se a devolução da carta precatória e o prazo de contestação.
5.
Intimem-se.
Adamantina, 06 de fevereiro de
1998.
Juiz de Direito