EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA DE PORTO ALEGRE-RS:

 

 

 

 

 

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO, por seu agente no fim assinado, com base no Expediente n° 214/96, no uso de suas atribuições legais (art. 201, inc. III, do Estatuto da Criança e do Adolescente), vem à presença de V. Exa. propor, como por proposta tem a presente AÇÃO DE DESTITUIÃO DO PÁTRIO PODER cumulada com PEDIDO DE ALIMENTOS (art. 22, do Estatuto da Criança do Adolescente, cumulado com os arts. 155 e seguintes, do mesmo diploma legal) contra

 

XXXXXXXXXXXXX, brasileiro, solteiro, maior, natural deste Estado, filho de XXXXXXXXXXX e XXXXXXXXX, com idade e profissão desconhecidos, antes residente XXXXXXXXXXXX nesta Capital, atualmente em local incerto e não sabido, e

 

XXXXXXXXXXXXXXXXXXX, residente na rua XXXXXXXXXXXXXXXXX, em relação a sua filha

XXXXXXXXXX brasileira, solteira, menor, com onze anos de idade, filha dos requeridos, natural de Porto Alegre, atualmente abrigada junto ao Abrigo Infantil Feminino, tendo em vista os fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos

 

 

DOS FATOS:

 

1) Que os suplicados mantiveram relacionamento amoroso durante certo lapso de tempo, fato em razão do qual veio a nascer, em data de 05 de junho de 1986 a menina XXXXXXX, consoante Certidão de Nascimento acostada aos autos na fl. 115;

 

2) Ocorre que desde tenra idade a menina apresentou problemas comportamentais e necessitar de cuidados especiais, em função de perturbações psicológicas;

 

3) Com efeito XXXXXXX, desde os oito anos de idade, começou a necessitar de tratamento tendo em conta sua conduta agressiva e o uso de substâncias químicas capaz de causar dependência psíquica, fato em razão do qual foi internada junto ao Hospital Psiquiátrico São Pedro, por vez primeira em novembro de 1994 (fl. 16), o que voltou a se repetir em ocasiões posteriores (fls. 16 e 17);

 

4) Não obstante tais problemas, não demonstraram os pais interesse pela situação vivida pela filha, o que determinou tivesse a mesma que ser abrigada junto ao IJF (fl. 14);

 

5) Diante da negligência dos pais, viveu e vive a menina em constante situação de risco, tendo, nos últimos tempos, sido abrigada inúmeras vezes (fls. 12, 26, 75, 85; 94 e 140) e voltado a se evadir da instituição de abrigo outras tantas (15, 41, 73, 91, 97);

 

6) O risco acima referido, que em princípio constituía situação em potencial, passou a se verificar de forma concreta, tendo em conta que a adolescente foi vitimada por aliciamento praticado por terceiros (um elemento conhecido por "Coronel" - fl. 65), o que deu ensejo tivesse a autoridade policial instaurado o competente inquérito para a apuração da responsabilidade pelos fatos praticados (fls. 38 a 67);

 

7) No mesmo sentido, a confirmar a necessidade de acompanhamento do seu caso pelos genitores, o que nunca ocorreu, a adolescente teria sido abusada pelo padrasto XXXXXXXXXXXX, sem que a mãe tivesse tomado qualquer providência (fls. 101 a 103);

 

8) Diante de tal quadro, tomou Conselho Tutelar da Microrregião 8 a iniciativa de aplicar medidas pedagógicas à genitora, tendo advertido-a formalmente (fl. 110) e orientado a mãe a fazer tratamento psicológico-(fl -111 );

 

9) A genitora, embora devidamente cientificada da necessidade de cumprir tais medidas e mesmo tendo comparecido junto à Coordenadoria das Promotorias da Infância e da Juventude em três oportunidades (fls. 20, 114 e 136), jamais cumpriu as determinações do Conselho, o que levou aquele Órgão representado à destituição do pátrio poder (fls. fl. 122 e 146);

 

10) O genitor varão, por seu turno, nunca se comprometeu com o caso, jamais tendo prestado auxílio material à filha (fl. 114) e tendo mudado do endereço anteriormente fornecido ao Órgão da Microrregião 08, sem comunicar seu novo paradeiro (fl. 130 v. e fl. 133);

 

Assim, diante do mais absoluto desinteresse dos pais em prestar atendimento à filha que deles tanto necessita em função das dificuldades acima apontadas, lança mão o Ministério Público do presente remédio jurídico.

 

DO DIREITO:

 

1) Diz o art. 98 do Estatuto da Criança e do adolescente:

 

"As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos em lei forem ameaçados ou violados."

I...

 

II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável".

 

2) O art. 22, do Estatuto refere que: "Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes, ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais".

 

3) Por sua vez, o art. 24, da mesma lei estabelece "A perda e a suspensão do pátrio poder serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22".

 

4) Ora, dentre as situações capazes de ensejar a perda do pátrio poder encontramos no art. 395, inciso, II do Código Civil, "abandono", circunstância esta caracterizada no caso em tela, em função dos fatos acima articulados.

 

DO REQUERIMENTO:

 

Em face do antes exposto, o Ministério Público requer:

 

a) Sejam suspensos os pais do poder que lhes é conferido por lei, independentemente de suas prévias oitivas;

 

b) Sejam fixados, desde logo, alimentos provisórios em trinta por cento (30%) do salário mínimo a serem pagos mensalmente, pelo genitor varão no dia cinco do mês subseqüente, determinando-se a abertura de conta judicial em nome da menina;

 

c) Sejam citados os pais para que, querendo, ofereçam resposta escrita, no prazo de lei;

 

d) Seja realizado o estudo social do caso e designada audiência para oitiva das testemunhas abaixo arroladas, franqueando-se ao Ministério Público a produção de todo o gênero de prova em Direito admitido; 

 

e) Por fim, seja decretada a Destituição do Pátrio Poder, bem como seja condenado o genitor a prestar alimento na base de trinta por cento do salário mínimo, a ser pago no dia cinco do mês subseqüente, segundo o que foi estipulado na liminar, se deferida, possibilitando futura colocação da adolescente em família substitua.

 

Por inestimável, dá-se à causa o valor de alçada.

 

 

 

Porto Alegre, 29 de abril de 1998

 

 

 

Luciano Dipp Muratt

Promotor de Justiça