Drogas...

Por que os jovens usam drogas?

23/03/2000

Içami Tiba

A adolescência é um segundo parto. Só que às avessas: é o adolescente que expulsa seus pais da sua vida porque se liga agora muito mais aos seus amigos que à própria família. Seus corpos, inundados por hormônios, ganham novos contornos e funcionalidade, experimentam novos pensamentos e comportamentos.

O adolescente incorpora com muita avidez tudo o que estiver ao seu poder e alcance, principalmente o que encontrar fora de casa, porque está se abrindo para o mundo. Por isso a adolescência representa um amplo e voraz mercado, que tanto os comerciantes de moda, música, comida, quanto os traficantes de drogas descobriram. Os pais que convivem com seus filhos, realmente participando de suas vidas - não só a escolar, mas também a social, esportiva, afetiva, etc. -, conhecem-nos bem, a ponto de perceberem qualquer alteração de comportamento ou aparência. A droga é uma traição à família. Se a família sempre foi contra drogas, experimentá-las é sentido pelo jovem como um desvio que magoará os pais.

Como qualquer pessoa que tem consciência do erro, o experimentador torna-se arredio, evitando olhar nos olhos dos pais, ou compartilhar com eles o seu dia-a-dia, temendo ser descoberto. Na traição está implícita a mentira. Já nas primeiras experimentações da droga o adolescente começa a mentir, omitir, esconder comportamentos. Quanto mais convive com o seu erro, menos errado este lhe parece, e assim passa aos poucos a achar "normal" usar drogas. Neste momento o jovem já não se preocupa tanto em esconder o fato dos pais, chegando até mesmo a enfrentá-los. Pode até admitir que "simplesmente experimentou umas vezes", sempre minimizando o problema.

Em alguns casos a experimentação e mesmo o uso ostensivo de drogas pode representar uma agressão à família. Ao experimentar drogas, sabendo que podem lhe fazer mal, o adolescente está se expondo a um perigo desnecessariamente. Significa que sua auto-preservação não é mais tão importante, e que ele está abrindo uma brecha no seu mecanismo de auto-proteção. Cada vez que a droga passa, aumenta a brecha, sem que o próprio usuário perceba este aumento. Por outro lado, o adolescente só irá repetir a experimentação se obtiver com isso algum lucro: prazer físico, status com amigos, enfrentar desafios, aumentar a auto-estima, saciar curiosidade, anestesiar sofrimentos físicos ou psicológicos, etc.

No começo pode se sentir confortado, mas depois vem a necessidade da droga.. Se o adolescente sentiu prazer usando a droga, ele deu uma opção a mais - até então desconhecida - para o seu corpo em busca de prazer. Principalmente nos momentos em que estiver sem nada para fazer, ou não gostar do que estiver fazendo, ou mesmo para "turbinar" o que estiver sentindo. Crianças e adolescentes impulsivos são candidatos a experimentar drogas. Aqueles que desde a infância já se expõem a riscos sem medir seus próprios limites, gostam de experimentar tudo que é novidade antes de avaliar as possíveis conseqüências e riscos, não suportam ser contrariados e acham que podem fazer tudo sem ter de cumprir com suas obrigações. Pais que não conseguem determinar claramente os limites, que são coniventes com este padrão de comportamento, favorecem com que o filho use e permaneça na droga, e depois não terão condições de levá-lo a um tratamento, já que ele não fará nada que o contrarie.

O limite entre o jovem controlar a droga e por ela ser dominado é muito tênue. Assim, ele pode passar de um lado para o outro sem perceber. Mesmo que perceba, não vai admitir esta inversão por uma questão de orgulho. A tendência de muitos dependentes é afirmar que usam a droga quando querem e que conseguem parar quando quiserem. Já estão psicologicamente tão alterados que acham normal o que fazem, que não têm que prestar contas a ninguém, e que a família não tem que se intrometer na sua vida. Isto mostra que a droga interferiu tanto nos seus afetos, que eles perderam seu compromisso relacional com as pessoas que o amam.

Se os pais desconfiam que seu filho esteja usando alguma droga, antes de abordá-lo é muito importante procurar se informar sobre ela. Só o amor não basta. É preciso ter informações sem preconceitos negativos nem positivos, pois os jovens são preconceituosamente contra quem tem preconceitos ou ignorância sobre o assunto. Quando os pais percebem, seu filho já está usando drogas há muito tempo. Os pais são pegos de surpresa e, cada um à sua maneira, tentam tirar o filho das drogas naquele exato momento. Acabam enfiando os pés pelas mãos, porque tentam cortar num só golpe um comportamento que vem se instalando há um bom tempo, com sucessivos usos, doses cada vez mais fortes, e novas drogas. O pai se torna violento e agressivo, a mãe entra em depressão com fortes sentimentos de culpa. Neste estado emocional é mais comum os pais descarregarem seus próprios sentimentos sobre o filho, do que agirem ponderadamente para poderem oferecer a ajuda necessária.

É importante que os pais admitam que não sabem o que fazer, e que neste caso vão pedir ajuda a uma pessoa mais experiente. A resposta tem que ser clara, firme e conseqüente. Assim o filho também aprende a buscar respostas em outras pessoas, e a buscar um melhor caminho.

Içami Tiba é psiquiatra e psicoterapeuta de adolescentes, autor - entre outros livros - de "123 Respostas sobre Drogas" (Ed. Scipione) e "Saiba mais sobre Maconha e Jovens" (Ed. Agora).

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