Normal e Problemático...

Isso é normal?

Como saber o que é "normal" e o que é "um problema" no comportamento instável e desafiador do adolescente?

23/03/2000

Ronald Pagnoncelli de Souza

Quem tem um filho adolescente com certeza já deve se ter feito esta pergunta. Afinal, como definir os limites da "normalidade" num período de vida marcado por tantas mudanças? São tão rápidas e intensas as transformações físicas da puberdade, as oscilações de humor e as diferenças de comportamento que surgem durante o transcorrer da adolescência que as atitudes dos jovens quase sempre parecem, aos adultos, estranhas e "fora de controle".

Definitivamente, eles não são mais os mesmos de alguns anos atrás, quando faziam o que o professor mandava, não questionavam as ordens do pai e da mãe e eram pouco influenciados pelo grupo de amigos. Agora, eles precisam se livrar do que os prende à infância.

E são justamente as tentativas de afirmar a independência dos pais que marcam o início da adolescência – período que vai dos 10 aos 14 anos. Enquanto tenta se acostumar com seu novo corpo, o adolescente corta os laços com a infância. Para ele, é vital essa sensação de ruptura, a "separação psicológica", porque sem ela não consegue se ver como um indivíduo único, em busca da sua autonomia. O curioso é que esse aspecto, tão básico na formação de sua identidade, faz com que ele adote atitudes e comportamentos que os adultos em geral só conseguem enxergar como rebeldes...

É "normal" o adolescente protestar, opor-se às idéias dos mais velhos, testar a autoridade, adquirir hábitos e repetir gestos que desagradam, criticar ostensivamente as características maternas ou paternas. Ele se volta para os companheiros e é em seu grupo de iguais que consegue encontrar refúgio psicológico, pode expressar suas idéias e se sentir mais forte e independente.

Onde ficam os pais? Uma de suas tarefas mais importantes seria ajudar os filhos a se tornar independentes. Mas como é difícil trocar o antigo papel de proteção pelo de orientação e confiança, estimulando responsabilidades crescentes enquanto o amadurecimento se processa!

No meio da adolescência, mais ou menos entre os 15 e os 17 anos, o jovem procura, ao lado de uma imagem de seu corpo que o faça se sentir bem com ele mesmo, a identidade e a satisfação sexual. O início das relações sexuais tem sido cada vez mais precoce. A pressão do grupo, o estímulo da mídia e a falta de uma educação sexual eficiente dificultam a reflexão do jovem sobre até que ponto ele se encontra pronto para uma prática sexual madura e consciente.

Os pais, mais uma vez, não conseguem ajudá-lo muito. Na maioria das famílias, não há um diálogo livre sobre questões de sexualidade. Muitos pais ainda pensam e agem com discriminação. Enquanto estimulam que o filho se inicie o mais cedo possível, não querem nem imaginar que a filha também tenha desejos sexuais.

No final da adolescência, entre os 17 e os 20 anos, a turma perde um pouco a importância, e o jovem começa a aprofundar seus relacionamentos a dois, que se tornam mais íntimos e duradouros. Também se interessa em procurar trabalho, em morar sozinho, defende com convicção as próprias idéias e é movido por um forte sentimento de idealismo e solidariedade.

Todos esses comportamentos caracterizam a adolescência normal, embora sejam estranhos para muitos adultos. Um adolescente pode ser grosseiro, agressivo e insolente – uma conduta normal, ainda que não admirada. Pode vez ou outra participar de uma molecagem em grupo, até destruir objetos, esvaziar pneus, ficar bêbado ou experimentar alguma droga e, dentro de certos limites, também isso pode ser considerado normal. O que seria "anormal" em seu comportamento?

O que seria uma conduta "fora de controle" que deveria, esta sim, preocupar seriamente aos pais? A prática de vandalismo, o roubo, agressões e mentiras sistemáticas, o abuso de drogas, fuga de casa, promiscuidade sexual e até a gravidez indesejada podem ser considerados condutas "fora de controle". Algumas delas escondem uma depressão grave – às vezes resultado do fim de uma relação afetiva, do insucesso na escola ou no trabalho, da perda do apoio dos pais, de baixa auto-estima. O adolescente pode chegar ao desespero, e é preciso levar muito a sério certos comportamentos autodestrutivos, como ameaça ou tentativa de suicídio e acidentes freqüentes com ferimentos graves. O descuido pessoal persistente, o isolamento social, a queda de rendimento escolar, a interrupção das atividades esportivas também devem chamar a atenção dos pais. Podem ser sinais de alerta, de que algo não vai bem com o adolescente, de que ele pode estar precisando de ajuda.

Ronald Pagnoncelli de Souza é pediatra e médico de adolescentes, autor, entre outros livros, de Nossos Adolescentes (Ed. da Universidade/UFRGS, 3ª edição, Porto Alegre, 1996).

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